segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Mestres do Horror - Ramsey Campbell e suas criaturas tenebrosas

Ramsey Campbell escreveu uma das mais prolíficas e duradouras coleções de contos sobre os Mythos de Cthulhu no século XX. Embora nos últimos anos ele tenha tentado se distanciar dos temas lovecraftianos, ele próprio admite que as estórias prediletas produzidas em sua carreira são aquelas envolvendo o horror dos Mythos ancestrais.

Um dos mais conhecidos autores de horror na atualidade, Campbell foi fortemente influenciado, é claro, por Lovecraft, mas também por Robert E Howard, Robert Bloch, Chambers e Richard Matheson.

Suas estórias são centradas em horrores mais contemporâneos e em um panorama social em constante transformação. Não à toa, grande parte de seus contos são ambientados nos anos 60 e 70. Alguns contém elementos clássicos de um período de profundo questionamento. Em meio ao amor livre, a revolução das drogas e os movimentos pacifistas, Cthulhu e seus servos tentam se infiltrar na psique humana com certo grau de impunidade.

A grande contribuição de Campbell para o Universo dos Mythos sem dúvida é o Severn Valley. O Vale de Severn é a ambientação clássica de Campbell para suas estórias. Essa região macabra, localizada no bucólico interior da Inglaterra, equivale ao Vale de Miskatonic na obra de Lovecraft com suas cidades proibidas, habitantes cheios de segredos, cultos amorais e monstruosidades esquecidas, habitando seus subterrâneos.

Os primeiros trabalhos de Campbell a respeito dos Mythos eram ambientados em Massachusetts. Foi August Derleth quem sugeriu a criação de uma localidade, tão ou mais maculada pela presença dos Mythos, para servir de ambiente para uma série de contos. Campbell optou pela região do Rio Severn, que realmente existe e que cruza o interior do Sul da Inglaterra. O autor passava férias nessa região quando criança e lembrava bem do ar opressivo de suas densas florestas, das chuvas torrenciais e dos costumes peculiares dos habitantes locais.

Campbell conjurou todas essas lembranças de infância para construir a sua versão do Severn Valley.

Brichester cumpria o papel de Arkham, e a isolada cidade de Clotton guardava semelhança com Dunwich. Muitas das estórias de Campbell a respeito do Vale de Severn se passam nessas duas localidades e nas cercanias onde se erguem vilarejos assombrados como Temphill, Berkley, Camside, Mercy Hill e Goatswood.

A bíblia negra criada por Campbell é o "Revelações de Glaaki", uma coleção de estórias, lendas e superstições locais reunidas em 12 volumes publicados pela Universidade de Brichester. O Revelações era uma obra incrivelmente complexa que explica a importância do Vale de Severn, um verdadeiro imã para atividade dos Mythos.

A Universidade de Brichester obviamente era o equivalente à Miskatonic University. Alunos estranhos e professores de passado misterioso, vagavam pelos seus corredores, sobretudo pela biblioteca local, que possui um vasto acervo de obras ligadas aos Mythos.

Como as estória se passavam nos efervecentes anos 60, havia sempre uma vibração hippie no ar: alunos dispostos a experimentar o benefício de substâncias químicas para "abrir as portas da percepção", alunas de mini-saia interessadas em expressar seu apresso pelo amor livre e a busca por uma espiritualidade alternativa. Na Severn Valley de Campbell, os Mythos pela primeira vez derrubaram o tabu e as barreiras puritanas erigidas por Lovecraft quanto ao sexo.

Todo tipo de coisas interessantes acontecia no Vale de Severn - e por "coisas interessantes" me refiro a atividade dos Mythos. Vasculhando as páginas da antologia de Campbell podemos encontrar os Dark Young de Shub-Niggurath vagando famintos pelas florestas, um deus monstro vivendo nas profundezas de um lago escuro, cultos de fanáticos devotados a deuses extremamente cruéis e até mesmo os restos de uma nave espacial que transportava uma raça de insetos alienígenas. Em um dos vilarejos, há inclusive a versão britânca da "aparência de Innsmouth", mas ao invés de assumir a aparência gradual de um batráquio, estes indivíduos vão aos poucos adquirindo as feições de bodes.

Campbell não se limitou apenas a criar o ambiente permissivo para suas estórias, ele gerou uma dezena ou mais de entidades nefastas. Um dos mais curiosos é o medonho Deus do Labirinto, Eihort, uma abominação que desova suas crias em hospedeiros humanos que vão enlouquecendo a medida que o dia do "nascimento" se aproxima.

Y´Golonac, o obeso deus sem cabeça com bocas na palma das mãos, é outra de suas criações mais sinistras. Esse Grande Antigo habita uma cela de tijolos caiados em algum tipo de dimensão ou limbo inacessível. Quando seu nome é repetido conforme descrito no "Revelações de Glaaki", ele é conjurado para possuir o corpo de sua vítima e espalhar o caos.

Daoloth, aquele que parte os véus também é um deus com a marca de Campbell. O verdadeiro horror de Daoloth não é sua aparência. Quando surge ele mostra diferentes realidades e abre portais para que outros mundos sejam contemplados, lugares bizarros repletos de maldade inenarrável. Seus cultistas costumam invocá-lo usando vendas nos olhos. A mensdagem é clara, humanos não estão preparados para contemplar a face de um Deus.

As antologias que cobrem o Severn Valley são “The Inhabitant of the Lake and Less Welcome Tenents” e “Cold Print”. Nelas estão compliadas várias estórias sobre essa região. Outro bom título é "Alone with the horrors" que possui as melhores estórias dessas duas antologias.

Além de escrever a respeito dos Mythos, Campbell também produziu vários trabalhos sobre horror, drama e fantasia. Ele foi o resposável por finalizar algumas estórias incompletas de Robert E Howard protagonizadas por Solomon Kane. Esreveu também a respeito de serial killers, possessão demoníaca e invasões alienígenas.

O nome de Ramsey Campbell é citado várias vezes nos livros de RPG dedicados a cenários inspirados por Lovecraft. Há inclusive um livro totalmente dedicado ao Vale de Severn: "Ramsey Campbell Goatswood", que contém uma série de referências ao autor e suas criações, além de várias aventuras prontas compreendendo uma pequena campanha.

Através do RPG, as entidades de Campbell ganharam notoriedade e muito mais amplitude, podendo se manifestar em outros lugares e não ficando confinadas apenas ao funesto Vale de Severn. Eu costumo utilizar essas criaturas de tempos em tempos e em mais de uma ocasião usei o Vale de Severn como ponto de partida para meus cenários.

É um dos lugares mais assustadores da ambientação. O keeper interessado em mergulhar seus jogadores em uma jornada através da loucura dos Mythos deve considerar com carinho uma excursão a este recanto obscuro do Reino Unido.

Contos Selecionados:

Abaixo uma seleção dos mais conhecidos (e na minha opinião, os melhores) contos de Ramsey Campbell envolvendo os Mythos:

- The Plain of Sound
- The Return of the Witch
- The Mine of Yuggoth
- Cold Print (primeira aparição de Y'Golonac)
- The Franklin Paragraphs
- The Interloper
- Made in Goatswood
- The Room in the Castle
- The Insect of Shaggai (primeira menção aos Insetos de Shaggai)
- The Render of the Veils (Primeira aparição de Daoloth)
- The Inhabitant of the Lake (Glaaki faz sua estréia)
- The Moon Lens (a cidade de Goatswood é apresentada)
- Before the Storm (Primeira apariçãod e Eihort)
- The Tugging (Os gêmeos Yug e Yeb aparecem)

4 comentários:

  1. Grande artigo, novamente! Parabéns! Não conhecia Ramsey como tal referência em Yog-Sothothery :)

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  2. Rasmsey é um dos grandes nomes da Literatura dos Mythos e segundo uma entrevista ele é também fã do RPG Call of Cthulhu.

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  3. Ótimo texto! Conheço pouca coisa de Campbell, mas gostei do que li dele.

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  4. Muito bom... mais um que vai para a lista de "want to read"... hehehehhe

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