quarta-feira, 27 de abril de 2011

Em busca da verdadeira Iram a Cidade dos Pilares


Era a cidade mais rica do mundo.

O Alcorão se refere a Iram (ou Irem) como a cidade cujas avenidas eram pavimentadas com ouro e prata. Cujos prédios tentavam ascender rumo ao céu e cujo povo se cobria de jóias e riquezas que transbordavam graças ao incessante comércio.

O livro sagrado dos muçulmanos vai ainda mais longe. Diz que a cidade de Iram era uma jóia em meio ao árido deserto de Rub Al-Khali, localizado na Península arábica no atual Sultanato de Omã.

Segundo os textos sagrados Sheddad, o Rei de Iram decidiu construir um lugar na terra tão belo e rico que poderia rivalizar com o que ele imaginava ser o Paraíso. Ele chamou seus fiéis servos e ordenou que eles construíssem esse lugar mágico. As obras levaram mais de trezentos anos, incluíndo a construção de grandes palácios, gigantescas torres abobadadas, minaretes decorados, praças e mercados, além de lagos artificiais, bosques e inexpugnáveis fortalezas para defender o lugar de invasores. A entrada da cidade possuía dois portões de bronze e muradas de pedra que a envolviam por inteiro. As casas e palácios eram ornamentados com pedras preciosas encrustadas e uma arquitetura única.

Mas o orgulho seria a razão da queda de Ubar, pois o povo que lá vivia se tornou decadente e se entregou a todo tipo de excesso. Os descendentes de Sheddad acreditavam que realmente viviam no paraíso e não precisavam mais respeitar Deus para garantir sua recompensa na outra vida. Deus enviou um profeta para alertar aos habitantes de Iram, mas eles não quiseram ouvir o homem santo. O profeta foi ridicularizado, depois seu corpo foi flagelado por chicote, seus olhos vazados e sua língua arrancada e pregada em um poste na praça central. A Ira de Deus então desceu sobre Iram e seu povo.


A cidade foi fustigada pela areia do Rub al-Khali em uma tempestade jamais vista, até que as torres foram soterradas, as alamedas tomadas pela aridez e os poços secaram. O povo caiu em desespero, a ventania furiosa arrancava a carne dos ossos e a poeira cegava quem olhava para o horizonte. No último momento tentaram se arrepender, mas a ira divina que se abateu sobre a outrora orgulhosa Iram foi impiedosa. No fim, nada restou da gloriosa cidade que desapareceu da vista dos homens a não ser a memória de suas maravilhas e da corrupção de seu povo.

Para quem achou a estória familiar, saiba que ela pode muito bem ter sido a base para a parábola de Sodoma e Gomorra, as cidades que foram varridas da face da Terra pela fúria de Deus conforme o Antigo Testamento. Assim como Iram, Sodoma e Gomorra eram cidades ricas, entrepostos comerciais importantes, em que o povo havia se entregado a vícios e atos desrespeitosos (alguém já se perguntou de onde vem a palavra sodomia?). Como muitas das lendas possuem uma base no mundo real, quem sabe não foram as estórias sobre Iram que geraram o trecho sobre as cidades gêmeas.

Segundo as lendas, Iram teria sido fundada em 3000 AC e destruída dois mil anos mais tarde. Ela teria sido um importante entreposto comercial com a Europa, uma importante cidade que se localizava no coração da Rota do Incenso que levava sândalo, óleos aromatizados e incenso para os ricos e ávidos romanos. Mas a verdade é que Iram sempre foi considerada na melhor das hipóteses como uma lenda.

Há entretanto algumas poucas menções a ela além da parábola do Alcorão. Arqueólogos que descobriram as ruínas da cidade de Ebla na Síria, encontraram documentos em que uma certa Iram é citada como importante parceiro comercial. O mesmo documento afirma que a riqueza das casas mercantis de Iram era tamanha que empalidecia o próprio palácio real de Ebla.

O historiador grego Plotomeo também descreve a existência de Iram chamando-a de Ubar, nome da maior das casas de comércio em seu apogeu. Em um mapa desenhado no século II, Ptolomeo apontava uma região que chamava de "terra dos ubaritas" que segundo ele era o berço de uma civilização que construiu uma magnífica cidade no deserto. Ubar aliás passou a ser um sinônimo da cidade perdida e gerou certa confusão entre pesquisadores que em determinado momento as consideravam como cidades diferentes.

Lendas a respeito da cidade perdida coberta pelo deserto continuaram a cativar a mente de exploradores e chegaram intactas ao século XX.


Tanto que o aventureiro militar britânico T.E. Lawrence (o famoso Lawrence da Arábia) tinha planos de realizar uma expedição de busca para encontrar as ruínas de Iram. Lawrence chamava a cidade de "Atlântida das Areias" e acreditava que sua descoberta seria um marco para a arqueologia. Ainda segundo as anotações de Lawrence, Iram era um centro cultural extremamente avançado similar a Atlântida do Ocidente. Uma cidade com arquitetura megalítica cujas torres elevadas de mármore e pilares finamente decorados maravilhavam os visitantes. Mais atraente ainda era o fato de que Iram era considerada uma cidade amaldiçoada pelos beduínos. Esse temor teria preservado as riquezas da cidade da ação de ladrões ao longo dos séculos. A expedição jamais foi realizada, pois a campanha na Arábia durante a Grande Guerra preencheu todo o tempo de Lawrence.

Em 1932 coube a outro explorador britânico, Harry St. John Philby embarcar em uma expedição para encontrar as ruínas de Iram. Apesar de não ter tido êxito em localizar a cidade ele fez uma notável descoberta ao encontrar as incríveis Crateras de Wabar - que são profundas crateras no solo do deserto criadas a partir do impacto de meteoritos que transformaram a areia em vidro.

Também na década de 30, Bertrand Thomas lançou as bases para encontrar antigas rotas de comércio que segundo sua teoria levariam a Iram. Bertrand encontrou indícios de estradas usadas na antiguidade por caravanas, mas não chegou ao seu almejado destino. Na década de 50, foi a vez do arqueólogo americano Wendell Phillips de cruzar o mae de dunas em busca da Atlântida do Deserto. Infelizmente ele voltou para casa apenas com alguns poucos artefatos recolhidos no solo pedregoso.


Iram tinha tudo para permanecer como uma lenda pela eternidade, mas não foi bem assim.

No início dos anos 80, um grupo de pesquisadores conseguiu convencer a NASA a ceder seu equipamento do programa de mapeamento Landsat para investigar a lenda de Iram. A equipe concentrou as buscas em antigas rotas de caravanas de camelos que deixavam uma marca distinta no solo do deserto. Examinando essas rotas, os pesquisadores conseguiram encontrar uma série de estradas que conergiam para o mesmo local conhecido pelos habitantes como o antigo oásis de Ash Shizar.

O oásis abasteceu a região até o século XVI, ele possuía cavernas subterrâneas de calcário que até essa época acumulavam reservatórios naturais de água. Uma fortaleza chegou a ser construída para proteger o oásis que servia como rota quase obrigatória das caravanas. Com o aumento da população, o nível da água começou a baixar ocasionando o ressecamento das paredes de calcário e erosão dos reservatórios. O oásis secou e a fortaleza foi abandonada.

As análises do solo pelo Landsat, no entanto, alertaram os pesquisadores para o fato de que a região de Ash Shizar ter uma topografia que parecia ter sido manipulada pela ação humana.

Uma expedição recebeu permissão para escavar a área em 1990 e suas descobertas forma incríveis sendo alardeadas nas principais publicações como uma das mais importantes da década.

Os arqueólogos encontraram as ruínas de uma fortaleza de pedra em formato pentagonal enterrada. Ao redor dessa estrutura estavam distribuídas a base de onze torres e de uma muralha com 90 centímetros de espessura. Ao longo de ruas pavimentadas a expedição descobriu várias habitações e casas construídas para alojar caravanas (caravanserais) que passavam pela cidade. Á grande quantidade desse tipo de construção evidenciava que a cidadela tinha um grande movimento de mercadores que vinham de terras distantes trazendo seus produtos. Grandes depósitos também foram encontrados, neles eram estocadas as mercadorias, sobretudo os incensos, alocados em colossais tonéis de madeira.


As escavações conduzidas pelos pesquisadores desvendaram outras fantásticas descobertas a respeito da vida naquela época. Jarros, potes e objetos do dia a dia foram encontrados nas casas, placas recobertas de símbolos cuneiformes e no idioma semítico, estatuetas e os tão comentados pilares que deram fama a Iram das lendas. Os arqueólogos também desenterraram vidros romanos, moedas sírias e fragmentos de cerâmica grega com mais de 4000 anos, evidenciando que o entreposto recebia comerciantes de vários lugares do mundo antigo que vinham de longe para fazer negócios.

Mais impressionante foi a descoberta de estábulos nos arredores da fortaleza e de fazendas onde se adestrava animais para suprir as necessidades das caravanas. O número de esqueletos de cavalos e camelos sugere que o local foi uma rota usada ao longo de muitos séculos.

As fazendas também concederam informações aos pesquisadores que verificaram a existência de canais de irrigação que distribuíam a água e assim possibilitavam o florescimento de agricultura. Depressões mais profundas sugerem a existência de reservatórios de água que deviam aproveitar os lençóis subterrâneos nas cavernas de calcário e suprir toda a cidade com água nascendo no meio do deserto.

Considerando as realizações do povo que habitou essa região na antiguidade, é difícil não se admirar o que eles conseguiram erguer em um ambiente absolutamente inóspito.

Mas ainda restam algumas dúvidas a respeito desse entreposto e as lendas sobre Iram. Ao que tudo indica a cidade encontrada se desenvolveu a partir da fortaleza construída em uma posição elevada e esta parece ser a construção mais importante. Não foram descobertas ainda ruínas condizentes com um palácio ou prédios administrativos. Nem mesmo templos estão presentes e estes seriam comuns em uma capital.

Existem algumas dúvidas se a fortaleza seria realmente Iram ou se não passaria de uma parte da cidade que protegeria a porção mais nobre. Mas se for assim os palácios, alamedas e monumentos da Atlântida das Areias, bem como seus tesouros ainda esperam ser encontrados.

Mas porque essa notícia seria mais do que uma mera curiosidade para um blog sobre Lovecraft e os Mythos de Cthulhu?

Saiba mais na continuação desse artigo...

12 comentários:

  1. ...adorei o post parabens cara um bom material para uma investigação...abrx...aguardando a segunda parte ansioso :)

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  2. muito boa essa matéria...mas cadê a continuação?

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  3. Aqui está:

    http://mundotentacular.blogspot.com/2011/05/ruinas-do-medo-visitando-irem-dos.html

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  4. "Para quem achou a estória familiar, saiba que ela pode muito bem ter sido a base para a parábola de Sodoma e Gomorra"
    Não mesmo, a Bíblia é mais antiga que o Alcorão.

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  5. Por favor,me avisem quando sair a parte 2!
    Agora,peço seu perdão por sair do assunto,mas esse site não tem um quadro de sugestões ou algo do tipo.
    O cardgame Magic já teve muitas expansões e elas tem romances que mostram qual é a trama por trás das cartas.Vídeos no YouTube contam tudo em detalhes.
    Enquanto alguém não se dispõe a fazer o mesmo com os cardgames da Chaosium,acho que vocês podiam ao menos falar de alguns personagens mostrados nas cartas do jogo,pois eles demonstram coragem extraordinária ao encarar monstros dos Mitos(Hatched Man,John V.),tenham se tornado vassalos dos Great Old Ones(Lucas Tetlow),ou talvez nem sejam mais humanos(The Red Gloved Man,Tsu San Niang).E com certeza,algo de muito importante rolou no Congresso das Chaves, mostrado numa carta de The Shifting Sands.
    Por favor,abordem esses temas.

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  6. Somente uma errata o nome certo é Imran é a 89°surata Quran chama se "A familia de Imram.

    Parabéns sou escritora e muito bem feita sua matéria, o deserto de Rub' al-Khālī é chamado de casa vazia, casa dos jinns, ele abrange três paises da península arábica, e vos digo quase ninguém sobrevive para contar a historia, exitem demônios espíritos de toda sorte neste lugar, lembrem se exitem três portas para o iferno, uma no mar uma no oceano e outra no deserto.

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