terça-feira, 26 de julho de 2011

Mistério vitoriano - Bizarro crime é resolvido 132 anos depois

Um sinistro mistério que já durava 132 anos parece ter sido finalmente resolvido, após a descoberta de um crânio enterrado em um jardim. Ele foi reconhecido como o de uma mulher assassinada pela sua criada no ano de 1879.

Julia Martha Thomas, uma rica viúva de 55 anos, foi morta por sua criada particular Kate Webster de 29 anos na região de Park Road, que era um dos bairros mais elegantes do distrito de Richmond em Londres. O crime abalou a sociedade da época e causou comoção na Capital do Império por envolver fatos chocantes. O caso, um dos mais notórios crimes do século XIX (perdendo apenas para os assassinatos de Jack, o estripador) ficou conhecido como "O Mistério de Park Road" e recebeu grande destaque na imprensa sensacionalista.

A criminosa Kate Webster se apresentava como uma moça simples do interior da Inglaterra, mas na verdade escondia um gênio cruel e disposição para a violência. Nascida na Irlanda, ela já havia sido acusada de roubo e fraude em sua terra natal, para escapar da condenação migrou para Londres onde se misturou à população crescente. Inteligente e dissimulada, Kate conseguia emprego em casas de família como criada ou babá. Sempre que tinha a chance ela roubava e pedia demissão antes de ser descoberta. Eventualmente ela foi trabalhar na casa da sra. Julia Thomas depois que esta perdeu o marido. Sem checar referências, ela a contratou de imediato.

À princípio as duas mulheres se deram bem, mas aos poucos a relação começou a ficar conflituosa. A Sra. Thomas desconfiava que Kate roubava objetos da casa e negligenciava suas tarefas diárias. É possível que a criada em algum momento tenha começado a ameaçar a patroa quando esta começou a se queixar. Alguns amigos próximos, afirmavam que a sra Thomas demonstrava inquietação sempre que Kate estava perto e que em uma ocasião tentou convencer uma amiga a dormir na casa, pois "temia ficar sozinha com ela". A situação insustentável fez com que ela tomasse coragem para despedir a criada.

Kate pediu três dias para arrumar suas coisas e fazer preparativos para voltar para a Irlanda. Na verdade ela planejava se vingar. Em uma noite de domingo, quando a sra. Thomas voltava para casa, foi atacada pela criada e empurrada do alto de uma escadaria. Na queda perdeu a consciência e a seguir foi estrangulada por Kate Webster.

A partir de então a estória se torna ainda mais sinistra. Para se livrar do corpo, a criada o desmembrou usando um machado, cutelo e facão. Ossos foram cremados no forno da casa e outras partes colocadas em um grande caldeirão de ferro e fervido. Boatos na época afirmavam que Webster havia cozinhado os restos da sra Thomas e servido para a vizinhança em uma festa de Igreja no dia seguinte ao crime, contudo ela sempre negou essa acusação.

É fato, no entanto, que a criada tenha embalado braços e pernas em maletas e sacolas e se livrado delas lançando-as no Rio Tâmisa. A cabeça por sua vez, jamais havia sido localizada.

Os jornais da época deram grande destaque a maneira como Kate Webster se livrou dos restos mortais de sua patroa. Chegaram a comentar que a mulher andava pela cidade carregando malas contendo os restos da sra. Thomas e que sua frieza era tamanha que não se importava de beber em pubs e fazer visitas a conhecidos carregando seu sinistro fardo. O plano de Webster funcionou bem e quando partes de um corpo de mulher começaram a aparecer boiando no Rio, a polícia não os relacionou a sra. Thomas. Kate espalhou entre os vizinhos que a patroa havia viajado para o interior a fim de passar algum tempo na companhia de parentes. Depois de se livrar do corpo, Kate vendeu vários objetos roubados da casa e decidiu voltar a Irlanda.

Reprodução de jornal da época mostrando a descoberta de restos nas margens do Rio Tâmisa.

Enquanto Kate aproveitava o dinheiro obtido com o roubo, amigos próximos de Julia Thomas comunicavam o seu desaparecimento. A Scotland Yard assumiu o caso e concluiu que muitos objetos da casa haviam sumido e depois de investigar descobriram que eles haviam sido vendidos pela criada nos arredores. O caldeirão de ferro usado para dissolver o cadáver fôra vendido para um restaurante por 5 shillings. A essa altura as autoridades começaram a suspeitar que os restos humanos encontrados pela cidade meses antes podiam ser da sra. Thomas. A prova definitiva veio com a descoberta de um bilhete achado no fundo de uma valise usada por Webster para se livrar de um pé. A caligrafia foi reconhecida como a de Julia Thomas. Não havia mais dúvida que algo terrível havia acontecido.

Kate Webster foi apontada como suspeita principal e sua prisão decretada. O destaque na imprensa fez com que ela fosse imediatamente reconhecida, capturada e trazida de volta para Londres onde foi julgada. Ela ainda tentou incriminar outras pessoas, mas o promotor de justiça provou que Kate havia agido sozinha. Ela foi condenada à morte e enforcada.

Um mistério entretanto permanecia. A cabeça de Julia Thomas jamais foi encontrada. Kate morreu se negando a dizer onde a havia escondido, essa seria sua última vingança contra a patroa: "Me condenaram, mas irei para o inferno sem dizer o que fiz com a cabeça da maldita" teria dito a um padre pouco antes da execução. E assim foi...

Passados tantos anos não se esperava que esse mistério tivesse solução. Lendas a respeito do terrível crime e estórias de fantasmas se popularizaram ganhando as ruas como lendas urbanas. Testemunhas afirmaram ter visto o fantasma de Kate Webster vagando pelas ruas de Richmond carregando maletas pesadas que pingavam sangue. Nas margens do Tâmisa observadores afirmaram ter avistado um corpo sem cabeça caminhando sobre a plácida superfície do rio. Durante a Segunda Grande Guerra, uma brincadeira de mau gosto comparava o som das sirenes de ataque aéreo com o grito proferido pela cabeça perdida da viúva assassinada clamando para que alguém a encontrasse. Em alguns lugares as sirenes até ficaram conhecidas como Screaming Julia (Julia Gritadora). Alguns também acreditavam que o fato da cabeça jamais ter sido encontrada lançou uma maldição sobre o bairro de Park Road que decaiu muito nas décadas seguintes.

Em Outubro de 2010 um grupo de operários de construção fez uma horrível descoberta. Encontraram uma antiga caixa de chapéu enterrada contendo um crânio humano. O local não era muito distante da casa de Julia Thomas e no passado ali se localizava o pátio dos fundos de um pub chamado "Hole in the Wall", local que Kate Webster costumava frequentar.

Exames foram realizados e precisaram que o crânio pertencia a uma mulher adulta de meia idade. Em seguida antropólogos forenses comparando fotos conseguiram provar que o crânio pertencia a Julia Thomas.

"Este é um caso fascinante que continua a povoar o imaginário dos habitantes de Londres apesar de tantos anos terem transcorrido. Enfim o Caso Park Road foi encerrado" comentou o perito criminal Clive Chalk responsável pelos exame que apontou a identidade do crânio´.

Recentemente o túmulo da Sra. Julia Martha Thomas foi aberto para que ele pudesse receber o crânio há muito desaparecido e assim descansar... por completo.

8 comentários:

  1. Cara, que caso impressionante! Vou te falar, não foce o trágico fim da Sra. Julia, o crime daria uma excelente aventura de investigação do "Gaslight".

    Ótimo post! Muito sombrio, mas muito legal!

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  2. Já tinha ouvido falar sobre esse crime, mas não fazia idéia dos detalhes sombrios que envolviam o caso.

    A criminosa foi retratada como um equivalente feminino do Sweeney Todd (que também transformava suas vítimas em torta). O que não falta são casos escabrosos de tirar o sono...

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  3. A Época vitoriana cada vez mais fascinante...

    Mamedes.

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  4. Super interessante! A Era Vitoriana parece cada vez mais sombria e misteriosa... não é por acaso que é tema de tantos filmes, séries e jogos! Parabéns pelo post!

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