sábado, 6 de julho de 2013

Hindenburg - O Fim dos Gigantes do Ar (a tragédia de Lakehurst) (parte 2)


Uma viagem através do Atlântico custava US 400 dólares e durava dois dias. Viajar à bordo do maior dirigível do mundo era realmente para poucas pessoas. Os vôos que se iniciaram em 1936, no entanto, eram extremamente concorridos, tanto que havia filas de espera para passageiros interessados em desfrutar das mordomias do Hindenburg. Os jornais e colunas sociais noticiavam quem estava à bordo do dirigível e cada partida (ou chegada) era um acontecimento.

Ao longo da temporada de 1936, o Hindenburg fez seis viagens para o Rio de Janeiro e dez para Nova York carregando um total de 2,656 passageiros. Empresários, artistas, magnatas, nobres, o Hindenburg transportava a nata da alta sociedade.  

Em 3 de maio de 1937, o Zeppelin partiu do aeródromo de Frankfurt an-Mein que havia se tornado sua casa (pois era o único com hangares grandes o bastante para recebê-lo), com destino para a América do Norte. Carregando 97 pessoas entre passageiros e tripulação, seria a primeira viagem da temporada para os Estados Unidos.


Como sempre a imprensa cobriu o acontecimento, os passageiros se reuniram na plataforma especial que conduzia para o dirigível, onde entre estouros de champanhe, sorrisos e flashes fotográficos as pessoas pareciam felizes. Apesar das aparências, em 1937 a Alemanha nazista já era um estado totalitário e a segurança foi reforçada. Policiais, detetives e até membros da Gestapo inspecionavam a plataforma em busca de dissidentes políticos e indesejados que pudessem usar o Hindenburg para escapar do país.  

Não se tem, entretanto informações de problemas à bordo. A viagem transcorreu tranquilamente e por volta das 11:40 do dia 6 de maio o veículo estava sobrevoando a cidade de Boston. O pouso na Base Aérea da Marinha, em Lakehurst, no estado de Nova Jersey seria atrasado em virtude das más condições climáticas e dos fortes ventos. O experiente Capitão Max Pruss, decidiu então sobrevoar a cidade de Nova York, concedendo aos seus passageiros uma espetacular visão da cidade. No promenade, os passageiros podiam ver as luzes da grande metrópole se acendendo a medida que avistavam o Empire State Building - na época, o maior prédio do mundo, os bairros do Bronx, Harlem, o Central Park, a Times Square, e a Estátua da Liberdade.

Por volta das 16:00 o Hindenburg retornou a Lakehurst, mas o tempo havia estava preocupante. O comandante Pruss decidiu contornar com a nave em direção ao sul até atingir a costa, então virar para o norte, e só aí retornar para a Base Naval. Às 18:12 Charles E. Rosendahl, Oficial que comandava a torre de comando, enviou uma mensagem para o dirigível: "As condições agora permitem a aterrissagem". Onze minutos depois, uma nova mensagem: "recomendamos o pouso imediato".  

O Pouso e a Tragédia


Levou quase meia hora para o Hindenburg se posicionar e iniciar o procedimento de atracamento na torre. Por volta das 19:00 horas, o dirigível sinalizou com as luzes de bordo. Primeiro ele circulou a base, baixando sua altitude de 600 para 300 pés e alinhou o seu nariz na altura da torre. A medida que ele se aproximava do mastro, o Capitão Pruss corrigiu a velocidade de acordo com o vento e ordenou que a equipe soltasse um lastro para aliviar o peso na parte traseira. Em seguida, seis homens lançaram escadas de corda e desceram graciosamente, como se fossem verdadeiros acrobatas, a fim de auxiliar a equipe de chão. O procedimento foi impecável e as pessoas que estavam assistindo aplaudiram e comemoravam. 

Uma vez amarrado na torre, os motores foram desligados e o Zeppelin flutuou tranquilamente como um gigantesco balão de gás. Cordas de aço foram lançadas e o procedimento prosseguiu enquanto os passageiros assistiam e tiravam fotos. Nesse momento, o Hindenburg estava a 60 metros de altura do chão. Eram precisamente 19:25.

Assistindo a tudo, o repórter Herbert Morrison estava cobrindo a chegada do dirigível, mal sabia ele que seus comentários entrariam para a história:

...Ele está praticamente parado agora. A equipe lançou cordas e eles estão amarrando o nariz da nave à torre, e os vários homens estão tendo algum trabalho para segurá-lo. Está começando a chover novamente; a chuva é fina e venta um pouco. Os motores traseiros do dirigível estão sendo desligados, é apenas o suficiente para mantê-lo estável --"

De repente o repórter faz uma pausa e quando começa a falar, novamente seu discurso é pura emoção e excitação:

"Ele está em chamas! ... Está pegando fogo e está caindo! Ele está caindo e é terrível! Oh, meu Deus! Saiam da frente, saiam dai por favor! Ele está queimando e explodindo em chamas e está despencando na direção da torre, e todos aqui concordam que é uma tragédia. Esta é a pior das catástofes, a pior coisa que já vi...Há muita fumaça, e chamas, e a estrutura inteira está despencando no chão...Oh, a humanidade, e todos os passageiros gritando!"

Morrison narrou até não ser mais capaz de continuar descrevendo a horrível tragédia que estava testemunhando.


As chamas foram visíveis primeiro na parte traseira do dirigível, então, em poucos segundos as bolsas de gás contendo hidrogênio foram atingidas e o veículo inteiro começou a se incendiar, engolfado por labaredas amarelas e alaranjadas e por uma fumaça densa e escura. Imediatamente o Hindenburg começou a despencar e pedaços inteiros de sua estrutura se soltaram, caindo sobre as pessoas no solo. As equipes de terra, nada podiam fazer a não ser correr em desespero e se afastar antes que fosse tarde. A medida que o hidrogênio queimava, o Hindenburg  perdia sustentação e começava a adernar. O bico se inclinou em um ângulo de 45 graus para cima.

As chamas lamberam a lateral e a película prateada queimou em uma velocidade assombrosa. Os passageiros no promenade tentaram se segurar, mas alguns foram lançados sobre o peitoril, outros saltaram para tentar escapar do fogo, do calor e da fumaça tóxica. Bastaram 37 segundos desde o instante em que as chamas foram avistadas para que o maior dirigível do mundo caísse como um enorme animal abatido no solo. Seu esqueleto de aço e alumínio, ficou a mostra queimando e se arqueando dolorosamente. Dois passageiros conseguiram saltar e se agarrar à torre de atracamento, um garçom foi salvo quando um reservatório de água estourou e as suas roupas que estavam em chamas se apagaram. Aqueles que conseguiram saltar e correr, sobreviveram. Os que se precipitaram do alto e se feriram na queda não tiveram a mesma sorte. Das 97 pessoas que estavam à bordo do Hindenburg, um número miraculoso de 62, conseguiram escapar com vida, incluindo o capitão.     

Uma investigação para apurar a causa do desastre foi conduzida pelos governos dos Estados Unidos e Alemanha. Eles concluíram que um vazamento de hidrogênio em uma das bolsas de estocagem provavelmente tinha dado início a um incêndio, ocasionado por eletricidade estática residual. As comissões de inquérito de ambas nações pareciam ansiosas para arquivar o caso, os americanos porque não queriam um potencial incidente internacional em suas mãos, os alemães porque temiam que a tragédia pudesse ter ocorrido em face de alguma falha estrutural. A pressa em concluir os trabalhos levantou várias suspeitas de que pudesse existir alguma razão misteriosa, para a catástrofe e logo, teorias começaram a circular em toda parte.

A Teoria do Vazamento de Gás

Algumas teorias sugerem que durante a última manobra para o atracamento na torre, uma corda de aço teria arrebentado e atingido o revestimento externo do Hindenburg. O impacto teria sido suficiente para perfurar a película protetora de alumínio e rasgado um dos balões de hidrogênio. O gás consequentemente começou a vazar e pode ter sido incendiado por um raro fenômeno elétrico natural conhecido como Fogo de St. Elmo. O Fogo é uma descarga estática que se acumula ao redor de objetos metálicos mantidos em grande altitude (como uma cruz no alto de um campanário) durante tempestades e descargas elétricas. Uma vez que as condições no dia da tragédia incluíam tempestade elétrica, é razoável supor que o dirigível estivesse carregando uma carga considerável de eletricidade estática.

Logo depois que o fogo começou, algumas testemunhas afirmaram ter visto um tipo de miragem na parte traseira da aeronave. Muitos dizem que isso foi causado pelo escapamento de gás. Outros contaram ter percebido uma luminosidade de cor azulada que pode ter sido causada pela ação do Fogo de St. Elmo. Se o gás estava escapando de uma das bolsas internas, qualquer faísca, como por exemplo, o simples funcionamento do sistema de exaustão ou do ar refrigerado poderia causar uma explosão.


A Teoria do Relâmpago

Ao invés do Fogo de St. Elmo, um relâmpago poderia ter iniciado o incêndio. Raios sempre foram uma questão delicada para os projetistas de dirigíveis. Muitas pessoas acreditavam que uma tempestade elétrica poderia fazer um dirigível vir abaixo e que um raio tinha potencial para causar a destruição se atingisse diretamente o veículo em pleno ar. 

O que poucas pessoas sabem é que o Hindenburg já havia sido atingido várias vezes antes por raios, e em nenhuma ocasião sofreu grandes danos. A película exterior do dirigível possuía uma espécie de isolamento e era resistente a eletricidade, de modo que uma descarga podia se dissipar facilmente ao longo de sua estrutura. Em qualquer cenário, se um relâmpago causasse a tragédia, seria preciso haver um prévio agravante, de preferência um escapamento de gás, como o da teoria acima. Entretanto, nenhuma testemunha viu um raio atingindo o dirigível no momento da explosão, embora mais cedo tenha ocorrido uma forte tempestade elétrica.

A Teoria do Isolamento Inflamável

Essa teoria foi sugerida por Addison Bain, diretor do programa de estudos de hidrogênio, que defendia não ter sido um vazamento de hidrogênio o responsável direto pela tragédia. Segundo Bain, o hidrogênio tem uma queima quase invisível, mas testemunhas descreveram a explosão como chamas grandes de coloração alaranjada. Bain acreditava que o material isolante utilizado para cobrir a película externa do Hindemburg e torná-lo à prova de água poderia ter criado as condições ideais para uma catástrofe. O componente principal, uma camada de óxido de ferro coberta com acetato misturado com alumínio na opinião de Bain era extremamente perigosa.    

O engenheiro, acredita ainda que os alemães descobriram o que causou o acidente, mas que eles não estavam dispostos a reconhecer que haviam cometido um erro tão grande. O mesmo componente usado no Graf Zeppelin II, dirigível irmão do Hindenburg foi alterado depois do acidente e um tipo específico de bronze foi usado por ser menos combustível. O fogo teria se originado a partir de algum acidente casual, uma faísca no motor ou sistema de refrigeração e se espalhado pelo material externo, o que explicaria como o incêndio consumiu a nave por inteiro. O fogo se espalhando na área externa, levaria poucos segundos para que ele atingisse as bolsas de hidrogênio. 

A Teoria da Sabotagem

Alguns dos tripulantes que sobreviveram, incluindo o Comandante Pruss, suspeitavam que o fogo tivesse sido causado por sabotagem. O Hindenburg era mais do que um dirigível da Alemanha. Ele era um símbolo do poder da Alemanha Nazista, de sua competência técnica e científica. O governo de Hitler, ajudou na construção do dirigível e tinha participação na Companhia Zeppelin. Eles utilizavam o Hindemburg como uma propaganda móvel desde 1936, quando ele deslizou pelos céus de Berlim durante as Olimpíadas como uma prova da competência germânica. Se isso não bastasse, as barbatanas traseiras dele eram decoradas pelo emblema da suástica, o símbolo do partido nacional-socialista alemão. 

Meses antes do Hindenburg decolar para sua segunda temporada de voos pelo mundo, os oficiais da Gestapo demonstravam preocupação de que a nave poderia ser vítima de um ataque terrorista. Quando Hitler fez uma aparição para conhecer o dirigível, o sistema de segurança foi tão minucioso que nenhuma pessoa sem credenciais podia chegar a 500 metros da Base Aérea. Os alemães temiam a vulnerabilidade do Hindemburg e sabiam que um simples ataque poderia causar uma tragédia, por isso tomavam muito cuidado. Entre os passageiros havia sempre detetives contratados pela companhia para inspecionar os passageiros e no início de 1937 havia um programa para impedir que indivíduos com passado conflituoso ou questionador viajasse nos dirigíveis.

Se um sabotador foi responsável pela tragédia, é bem provável que ele fosse um passageiro ou membro da tripulação. A melhor maneira de ter começado o incêndio seria ter ajustado uma bomba na estrutura interior do veículo. Um dispositivo de detonação por tempo, permitiria que o sabotador deixasse a nave antes de ser vítima de sua própria ação. Algo no entanto pode ter sido errado, os problemas enfrentados na aterrissagem, quando o Capitão foi forçado a manobrar o dirigível e atrasar o procedimento podem ter causado a tragédia. Seja como for, uma explosão poderia romper facilmente as células de estocagem de gás, o que causariam uma reação em cadeia que derrubaria todo o veículo. Uma carga modesta de TNT já seria o suficiente.

Durante o inquérito, sabotagem foi uma possibilidade sugerida. Inicialmente, o nome de um passageiro foi apontado como sendo o possível responsável pela tragédia. Joseph Spah, um americano de Nova Jersey havia sobrevivido a queda. Membros da equipe disseram que Spah, havia sido visto em várias ocasiões andando sozinho no compartimento de carga, supostamente para visitar seu cão que viajava em uma gaiola. Ele realmente teria a oportunidade de dispor a bomba em uma dessas ocasiões. 

Mais tarde, outro suspeito chamado Erich Spehl foi apontado. Spehl era um introvertido membro da tripulação que morreu durante o incêndio. Segundo algumas pessoas, o técnico era um homem solitário que não estava satisfeito com o salário recebido e que tinha um histórico anti-nazista. Em uma ocasião ele teria dito que o Hindenburg "era uma propaganda abjeta dos nazistas e que alguém teria de fazer alguma coisa contra ele".  

Nenhuma prova contundente contra os dois suspeitos foi encontrada e durante a análise dos destroços não se achou nenhum fragmento de artefato explosivo. Mas até aí, curiosos removeram pedaços do Hindenburg para guardar como lembrança após a tragédia.

Os próprios alemães disseram que sabotagem era uma possibilidade, mas o chanceler Hitler colocou fim às especulações, dizendo que preferia não acreditar nesse tipo de ação.

O Fim de uma Era


Os resultados oficiais da investigação apontaram para a eletricidade estática e para o vazamento de hidrogênio como as causas da destruição do Hindenburg. pesar da controvérsia, essas foram as razões mais prováveis. 

Uma coisa no entanto é certa, o destino do Hindenburg sinalizou o fim da era dos dirigíveis e dos "veículos aéreos mais leves do que o ar". A indústria dos zepelins jamais se recuperou desse baque e as reservas existentes foram canceladas em todas as linhas ao redor do mundo. O efeito dominó, derrubou as ações da Companhia Zeppelin que fechou as portas dois anos depois. Ninguém queria viajar à bordo de um veículo que passou a ser considerado "uma bomba voadora". Ações legais se seguiram para tirar os dirigíveis do ar, pois muitos temiam que uma nova tragédia pudesse acontecer sobre alguma cidade.

Depois do acidente, as rotas do Graf Zeppelin foram gradualmente canceladas. A lembrança das pessoas correndo apavoradas, dos mortos incendiados e a narração emocionada do repórter, ficaram na memória das pessoas para sempre. Dirigíveis se tornaram sinônimo de medo, perigo e tragédia. O Graf Zeppelin II, que estava para ser inaugurado, só foi usado durante a Segunda Guerra Mundial para fins militares. Pouco depois do início da guerra, a escassez de hidrogênio obrigou o veículo a ser desmantelado e suas peças sucateadas.

Já em 1945, os motores à jato haviam sido inventados e aviões de passageiros maiores e mais confiáveis carregavam passageiros que desejavam atravessar grandes distâncias. Os dirigíveis, foram um dia considerados os veículos de massa do futuro, mas bastou uma grande tragédia para que eles se tornassem da noite para o dia uma coisa do passado.

O que restou foi a narrativa e a imagem final do Hindenburg queimando os sonhos de uma era mais elegante de viagens através do ar:


Eis aqui a famosa narrativa do repórter Herb Morrison ao vivo:

2 comentários:

  1. Se não me engano os alemães chegaram a desenvolver posteriormente meios mais seguros, incluindo outro gás, menos inflamável.

    Porém, o impacto do acidente não mudou a impressão mundial da insegurança que era um dirigível.

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  2. Os vídeos acrescentaram bastante, uma pena essa era acabar.

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