quarta-feira, 25 de junho de 2014

"Ele foi a Lenda" - Nota de falecimento do escritor Richard Matheson


Richard Matheson, cujas novelas, estórias curtas, roteiros para cinema e televisão criaram a base para dezenas de filmes e séries de ficção científica e horror, morreu sábado passado em sua casa em Calabasas, Califórnia. Ele tinha 87 anos.

O Sr. Matheson era dono de uma imaginação prolífica, uma questão central em sua obra era "E Se?", na qual ele lançava possibilidades para acontecimentos e eventos inimagináveis e forçava seus leitores a perguntar como a humanidade enfrentaria esses dilemas. Apesar de se concentrar no universo da ficção, Matherson sempre gostou de dizer que mesmo as suas estórias mais incomuns tinham um quê de realismo e verossimilhança. Por exemplo, depois de ter uma experiência assustadora, sendo perseguido por um caminhão numa rodovia isolada, ele escreveu o conto "Duel". Nesse conto, Matherson demonstrava uma de suas características mais marcantes: a construção do suspende, mistério e um final inesperado. A estória se tornou a base para o primeiro filme da carreira de Steven Spielberg, estrelado por Dennis Weaver.

Uma de suas primeiras novelas, "Eu sou a Lenda" se tornou um de seus trabalhos mais conhecidos. A estória sobre o último humano sobrevivente em um mundo habitado por vampiros, foi publicado em 1954 e adaptado pela primeira vez para o cinema em 1964 com o título "O Último Homem na Terra", estrelado por Vincent Price. Em 1971 ele recebeu uma segunda adaptação chamada "The Omega Man" com Charlton Heston e finalmente em 2007 uma terceira com o título original; "Eu sou a Lenda", estrelada por Will Smith.

Matheson contava que a inspiração para seu conto mais popular surgiu depois dele assistir a versão de 1931 do filme "Drácula": "Enquanto eu assistia o filme, pensei comigo mesmo, "Se um vampiro já é assustador, o que poderia ser mais assustador do que uma cidade inteira deles, um país inteiro, um mundo inteiro habitado por essas criaturas terríveis?” 

Matheson afirmava que diferente dos vampiros clássicos, os seus, tinham um componente do mundo real e da paranoia que marcou sua época. "Eles não eram seres sobrenaturais, resultado de maldições góticas ou punição divina, meus vampiros surgiam mediante mutações ou contaminações. Eles eram pessoas comuns transformadas por algo terrível que podia fazer seus amigos, sua esposa, seus filhos se tornarem monstros famintos dispostos a devorá-lo". 

Stephen King, um dos grandes fãs de Matheson, falou a respeito da influência dele em sua carreira: "Matheson incentivou a imaginação de três gerações de escritores de ficção científica e horror. Sem o seu trabalho seminal em "Eu Sou a Lenda", não existiria "A Noite dos Mortos Vivos"; e sem "A Noite dos Mortos Vivos", não haveria "The Walkind Dead", "28 Dias depois" ou "Guerra Mundial Z".

A famosa novela "O Homem que Encolheu", a assustadora fantasia sobre um homem que é miniaturizado através de exposição radioativa, e tem que lutar pela sua vida em um mundo microscópico foi adaptado em duas ocasiões para o cinema - uma vez como uma estória de horror, "O Incrível Homem que Encolheu" (1957), e outra como comédia, "A Incrível Mulher que Encolheu" (1981).

No final dos anos 1990 dois de seus livros, "A Stir of Echoes" (Ecos do Além) uma estória de fantasmas, e "What Dreams May Come" (Amor além da Vida) sobre um homem perdido entre a vida e a morte, também foram adaptados para o cinema com sucesso, estrelando Kevin Bacon e Robin Williams respectivamente.

Outra novela, "Hell House" (1971), sobre quatro pessoas envolvidas na investigação sobrenatural de uma mansão assombrada, foi descrita como "O Monte Everest dos filmes sobre Casas Mal-assombradas". Ele se tornou um filme em 1973, com o título "The Legend of Hell House", estrelando Roddy McDowall. O livro, considerado uma das grandes obras sobre o tema, demonstrava o dom de Matheson para construir uma atmosfera sinistra.

Em algumas ocasiões Matheson escreveu os roteiros para a adaptação de seus livros, incluindo "Duel" e "The Legend of Hell House"; ele adaptou estórias de Edgar Allan Poe para várias produções dos anos 1960, incluindo "House of Usher," "Pit and the Pendulum" e "Tales of Terror"; ele também escreveu o roteiro para o filme "Die! Die! My Darling!," estrelado por Tallulah Bankhead que interpretava uma mãe enlouquecida que aterrorizava uma jovem culpada pela morte de seu filho.

Matheson também esteve ocupado escrevendo roteiros para a televisão. São de sua autoria os westerns "Have Gun, Will Travel," "Cheyenne" e "Lawman," e vários episódios do drama de guerra "Combat!". Mas seu nome em geral é mais associado a trabalhos de ficção científica e suspense: "Alfred Hitchcock Presents," "Star Trek" (a série clássica) e principalmente "The Twilight Zone," série em que ele escreveu mais de uma dúzia de episódios, incluindo o clássico "Nightmare at 20,000 Feet," estrelado por William Shatner como um passageiro às voltas com um gremlin disposto a derrubar o avião onde ele está viajando.

Lembrando a respeito desse episódio, Matheson contou: "Eu estava em um avião e quando olhei pela janela, em meio a todas aquelas nuvens pensei, "Nossa, parecem montanhas de neve, e se houvesse alguém lá fora esquiando nessas nuvens?". Mas quando sentei para escrever a respeito, as coisas não estavam muito assustadoras, então eu transformei o esquiador num gremlin avariando a asa do avião e as coisas começaram a tomar forma".

Stephen King escreveu uma breve mensagem a respeito da morte de Matheson: "Ele foi um pioneiro nos gêneros do horror e fantasia, um mestre tão importante quanto Poe e Lovecraft."

King prosseguiu: "Suas estórias eram pura inspiração. Ele acendeu minha imaginação situando seus horrores não em castelos europeus ou em universos lovecraftianos, mas nas cidades americanas que eu podia reconhecer ou relacionar com o meu dia a dia. Quando eu li Matheson pela primeira vez, pensei comigo mesmo "É isso que eu quero fazer, é isso que eu preciso fazer" Matheson mostrou o caminho e eu o segui".

Richard Burton Matheson nasceu em Allendale, Nova Jersey e, 20 de fevereiro de 1926, mas cresceu no Brooklyn. Seus pais eram imigrantes noruegueses; seu pai, Bertolf, foi assistente de balcão em bares ilegais durante a Lei Seca. 

Um leitor voraz quando criança, Matheson se graduou na Escola Técnica do Brooklyn. Ele serviu no exército na Europa, durante a Segunda Guerra Mundial, uma experiência que serviu como fonte para várias de suas estórias. Estudou jornalismo na Universidade do Missouri, época em que começou a escrever suas primeiras estórias de ficção. Por algum tempo ele trabalhou na Douglas Aircraft. Sua primeira estória publicada foi "Born of Man and Woman" sobre um casal que dava a luz a um monstro e o mantinha preso no sótão de casa, foi lançada em 1950.

Matheson casou-se apenas uma vez em sua vida, com Ruth Ann Woodson em 1952. Ele deixou quatro filhos, sete netos e dois bis-netos.

Perguntado a respeito de seu pai, com quem trabalhava em uma companhia, seu filho mais velho disse que Matheson mantinha sobre a mesa uma placa onde se lia a seguinte citação: "Aquilo que você imagina se torna o seu próprio mundo".

*     *     *

Essa é sem dúvida uma grande perda.

Richard Matheson foi um gigante entre os autores de ficção e horror, um mestre do gênero que deixou um legado incrível na forma de pesadelos vívidos e maravilhas indescritíveis.

Eu sou fã de três dos trabalhos mais famosos de Richard Matheson: "Eu Sou a Lenda", o conto, que é muito melhor do que qualquer de suas adaptações para o cinema merece aplausos, e qualquer entusiasta de horror precisa ler essa estória.

Em se tratando de filmes eu indico "The Legend of Hell House", difícil de encontrar, mas um filmaço que vale o trabalho. Quem cresceu nos anos 1989/1990 talvez tenha assistido esse filme de casa mal assobrada nos corujões da vida, que passavam ao longo da madrugada. Se você não está ligando o título ao filme, é aquele da infame Mansão Belasco. É um tremendo filme, na minha opinião um dos melhores do gênero casa assombrada.

Finalmente tem um episódio de Twilight Zone escrito pelo Matheson e citado nesse artigo. O nome é "Terror at 20,000 feet". Esse é o meu episódio favorito de Além da Imaginação, eu simplesmente morria de medo dele quando era criança e assim que terminei de escrever esse artigo, tratei de assistir mais uma vez. É incrível como, embora ele seja antigo, ele ainda consegue me causar calafrios.

Eu consegui encontrar "Terror at 20,000 Feet" no You-Tube, quem conhece o episódio sabe como essa pequena estória de horror é bem construída, quem não a conhece, indico ver o quanto antes.

Bons sustos!

3 comentários:

  1. "Terror at 20,000 Feet" teve uma versão/parodia em um dos especiais de Dia das Bruxas dos Simpsons.

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  2. Sim, um dos primeiros especiais do Dia das Bruxas!

    "Born on Man and Woman" também foi parodiado no desenho, é o episódio em que o gêmeo maligno do Bart vive no sótão se alimentando de cabeças de peixe.

    Tem um episódio de Family Guy que também é inspirado na estória "The Splendid Source".

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  3. Eu acho muito mais aterrorizante a versão de 1983 do episodio "Nightmare At 20,000 Feet", é uma das poucas vezes onde o remake supera o clássico. Tanto as atuações como o roteiro, são melhores. E com certeza a morte de Richard Matheson, mesmo tendo ocorrido ano passado, ainda é sentida pelos amantes da ficção científica e do horror, ele simplesmente era genial, um excelente contador de histórias.

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