quinta-feira, 2 de março de 2017

Tsathoggua - O Hibernante Faminto (conclusão)


Acesse o link para ler a primeira parte do artigo: Tsathoggua primeira parte

Alto Sacerdote do Culto de Tsathoggua é geralmente um feiticeiro habilidoso e zeloso de seu status. Ele aprende rapidamente a comungar com as Crias Amorfas e utilizam seus serviços e proteção. A proximidade com o Deus garante ao Alto Sacerdote um conhecimento mais amplo dos Mythos que raramente é dividido com seus subalternos. A estrutura do culto se assemelha a uma pirâmide, com o líder ocupando o topo. Alguns poucos discípulos, escolhidos à dedo e de inteira confiança, servem a ele, que em troca, oferece alguma instrução. A função dos aprendizes é coordenar os demais cultistas e mantê-los na linha. O Alto Sacerdote e seus discípulos se importam bem pouco com esses cultistas subalternos, eles não passam de material para abastecer com energia vital os rituais ou sacrifícios nas ocasiões em que o Deus desperta e sua fome precisa ser aplacada.

Os maiores e mais importantes ritos devotados a Tsathoggua são realizados na véspera do Halloween. É nesse período que o Deus desperta brevemente de sua hibernação e é invocado para abençoar o Culto com sua presença nefasta. Nessas ocasiões ele aparece esperando um tributo e em troca oferece ensinamento, magias ou artefatos coletados pelo Alto Sacerdote. Os rituais são sempre realizados nas noites de lua nova entre a meia noite e as três da manhã. Em geral, tais rituais se iniciam na superfície e passam para um ambiente subterrâneo com um acesso a cavernas ou grutas profundas. Tsathoggua costuma se manifestar nesses lugares subterrâneos onde surge através de portais que abre unindo as Cavernas de N'Kai ao local de invocação. Imediatamente ao se manifestar ele espera receber seu sacrifício. Se satisfeito após se alimentar, ele passa para a segunda parte do ritual, no qual agracia os cultistas com presentes, retornando à escuridão onde desaparece logo a seguir.

Muito se fala da ira de Tsathoggua quando o tributo de sangue não é suficiente para saciar sua fome voraz. O Deus-Sapo se alimenta de carne, e devora todos aqueles que lhe forem oferecidos, contudo sua fome varia, assim como seu humor. Se por acaso ele ainda estiver faminto após devorar os sacrifícios, o Deus simplesmente começará a se banquetear dos cultistas. Não se sabe quando a fome será aplacada, mas para evitar problemas, os cultistas tendem a capturar um grande número de vítimas a serem oferecidas nos festivais para que não haja riscos. Sabe-se de alguns cultos que foram virtualmente exterminados por Tsathoggua em sua glutonaria.


Ironicamente, dentre os seres dos Mythos de Cthulhu, Tsathoggua talvez seja o menos inerentemente maligno. Ainda assim, ele não poderia jamais ser considerado benigno. Sua característica mais marcante é sua indiferença diante da condição humana. É bem provável que o Deus-Sapo simplesmente prefira ignorar os seres humanos e seus pequenos dramas uma vez que para ele, tais seres mortais em sua irritante transitoriedade nada representem. A única instância em que o Deus devota alguma ínfima parcela de atenção para com humanos, é quando ele está faminto.

A gula de Tsathoggua aliás é bem conhecida. O Livro de Eibon - outro texto que trata detalhadamente sobre o Deus-Sapo, menciona que ele está SEMPRE faminto e que sua plena satisfação é impossível. Ele pode entretanto, ignorar momentaneamente a sua fome para tratar de outros assuntos prementes, como por exemplo barganhar com seus cultistas. Não se sabe ao certo, entretanto, se comer é uma necessidade ou um prazer pelo qual ele tem grande apreço. Na maioria das representações em que é retratado, Tsathoggua surge se alimentando ou prestes a se alimentar de algum sacrifício que lhe é ofertado. Também há imagens dele refastelado numa cama de ossos triturados ou com vítimas desesperadas tentando escapar de sua bocarra. Em todas cenas, Tsathoggua parece sempre disposto a devorar mais vítimas, dando a impressão de que nada pode aplacar sua fome.

Outra característica marcante nas imagens de Tsathoggua diz respeito a sua indolência. O Deus é tratado com epítetos como o sonâmbulo, o hibernante, o adormecido e até de preguiçoso ele é chamado. Tais adjetivos dizem respeito ao fato de que Tsathoggua ser um Deus de pouca atividade, que se mantém dormindo ou meditando a maior parte do tempo, acordando por poucos e preciosos momentos.


Fisicamente Tsathoggua é uma entidade impressionante pelo seu porte, tendo pelo menos seis metros de altura. Ele é contudo, um ser de corpanzil atarracado e mau distribuído, com uma barriga saliente em forma de bojo na qual se formam inúmeras dobras de pele flácida. O abdomen é tão vasto que dá a impressão de poder comportar dúzias de pessoas ao mesmo tempo, o que é verdade. A aparência geral do Deus lembra uma mistura de uma preguiça gigante e de um sapo boi, inchado além da conta. O Deus tem um aspecto morbidamente obeso, mas ainda assim rotundo, sendo que a flacidez se resume ao imenso ventre.

As pernas são curtas e compactas terminando em enormes pés adaptados para sustentar seu imenso peso. Unhas escuras e recurvas se projetam dos quatro dedos em cada pé. Os braços são bastante longos e também terminam em quatro dedos dotados das mesmas unhas escuras. Quando se move, ele o faz com um balançar que lembra o movimento de um imenso urso se equilibrando nas patas traseiras. Ele jamais se move nas quatro patas, sendo um humanoide. Tsathogua é coberto de um pelo grosso, com fios semelhantes aos de um gorila que descem pelas suas costas e se acumulam no peito, pernas e na área dos genitais. Esse cabelo corporal é áspero e tende a reter emplastros de sujeira e restos de comida que ficam presos produzindo um fedor de putrefação nauseante. A coloração varia: nas costas ele é majoritariamente negro com uma tonalidade verde escura pendendo para o cinza no peito.

Tsathoggua possui uma longa cauda que se arrasta pelo chão e permite a ele um pouco mais de equilíbrio ao se mover. Essa cauda curiosamente não possui pelos, sendo lisa e musculosa quase como o apêndice de um anfíbio ainda em formação. Além de auxiliar no equilíbrio, a cauda não tem nenhuma função prática. Ela se enrola na sua frente quando ele está sentado. Tsathoggua aliás é encontrado quase sempre sentado, deixando o peso do corpo se acomodar sobre as pernas que ficam acocoradas, os braços pousados sobre a circunferência da barriga como uma caricatura de um macabro buda.


A respiração do Deus é possante, produzindo um leve som esfolegante a medida que a pança sobe e desce ritmadamente. Fora isso, ele emite sons parecidos com pigarros e grasnados que reverberam ruidosamente. Tsathoggua não fala verbalmente, ao invés disso comunica-se através de telepatia. Ele conhece todas as línguas humanas e se dirige aos seus interlocutores com um timbre gutural de barítono que soa imensamente desagradável. Ao se comunicar permanece totalmente imóvel sem olhar na direção da pessoa e na maioria das vezes, sem abrir os olhos.

A face de Tsathoggua é horrivelmente alienígena, mas ainda assim, encontra similaridade em animais terrestres. Alguns comparam sua cabeça a de um imenso morcego vampiro, com orelhas longas e pontudas se projetando nas laterais. Os olhos são comparativamente pequenos e arredondados com órbitas negras, embora permaneçam no máximo semi-cerrados. Abaixo dele pendem bolsas de pele cobertas de remela. O focinho talvez seja o que mais remeta a um morcego; empinado e com fossas nasais profundas das quais brotam filetes de muco escorrendo abundantemente. 

A boca é larga como  a de um sapo, estendendo-se longitudinalmente de um lado ao outro da face. Dela escorre uma baba caudalosa pelos cantos, pingando constantemente sobre a barriga. A bocarra é dotada de pequenos dentes, todos do mesmo tamanho e formato em "v" dispostos em fileiras lado a lado. Os dentes não são necessariamente afiados, mas a força da mandíbula se assemelha a uma prensa hidráulica podendo cortar um homem adulto ao meio com uma única mordida. Os dentes cumprem seu papel de processar os alimentos, triturando os ossos e cartilagens que são empurrados goela abaixo pela saliva. Tsathoggua possui uma língua comprida que se assemelha a de um sapo. Essa língua é vermelha e musculosa, coberta por uma saliva grossa e pegajosa que serve para colar as presas e puxa-las para a bocarra. Uma vítima colhida dessa maneira é engolida inteira de uma vez só. O destino dessa vítima é irreversível uma vez que a bile ácida e os sucos digestivos do estômago do Deus são especialmente potentes. Uma pessoa engolida, no entanto, pode ter a sorte de morrer rapidamente, esmagada pelos movimentos estomacais.


Acredita-se que Tsathoggua seja capaz de alterar sua forma de acordo com o ambiente em que se encontra. Em Saturno ele parecia bastante diferente do que na Terra - ou assim dizem alguns textos. Há indícios suficientes sugerindo que ele possa voluntariamente mudar sua forma e tamanho conforme suas necessidades. Se isso for verdade, é provável que o Deus utilize como "matéria-prima" para a forma escolhida o perfil de animais nativos, o que explica porque um ser alienígena teria traços de seres da fauna terrestre.

Provavelmente imortal pela passagem do tempo, Tsathoggua é uma das entidades principais entre os Grandes Antigos, um ser de grande poder e vasto conhecimento que tende a ser em alguns momentos subestimado como um Deus menor. Enganam-se entretanto aqueles que confundem a aparente leniência de Tsathoggua com complacência, o Deus sempre foi, e continuará sendo uma das forças cósmicas mais importantes a habitar nosso Sistema.  

4 comentários:

  1. Respostas
    1. Em contos do Lovecraft ele é apenas citado. Mas aqui você encontra historias de outros autores sobre esse cidadão: https://en.wikipedia.org/wiki/Tsathoggua#The_Tsathoggua_Cycle

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  2. Muito bom, faz um blog diferenciado grandes antigos de deuses exteriores

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