domingo, 4 de março de 2018

Visard - A máscara das damas e uma tragédia assustadora


Para damas refinadas da alta sociedade na Europa do século XVI, bronzear a pele, especialmente o rosto podia representar um desastre social. 

As implicações de ter o rosto avermelhado era que a pessoa teria trabalhado ao sol, e portanto, era pobre. Pensando nisso, as damas da época precisavam de algo que as protegesse e evitasse que sua palidez natural fosse maculada. Assim surgiu uma das peças do vestuário medieval mais estranhas e bizarras já concebidas: o visard.

O visard (ou vizard) nada mais era do que uma máscara simples de tecido. As peças mais refinadas eram feitas em veludo com uma ou duas camadas internas de papel de seda. A máscara oval cobria perfeitamente a face, acomodando-se sobre o nariz, contando com pequenos buracos para os olhos e uma abertura para a boca.


Apenas alguns poucos visards sobreviveram aos dias atuais, mas a existência da peça é comentada em alguns documentos da época e pinturas que mostram como ele era utilizado. O espécime mais intacto é a "Máscara Daventry". Que foi encontrado enfiado em um buraco numa parede na cidade de Daventry em Northamptonshire, a máscara provavelmente pertenceu a uma dama de posses que podia pagar por uma peça de veludo preto de alta qualidade. A máscara possuía ainda três camadas de papel de seda e uma adicional de veludo que lhe dava firmeza. 
  
Junto com a máscara foi achada uma conta de vidro que era usada para fixar a peça no rosto. Ao contrário de máscaras normalmente amarradas atrás, uma dama usando o visard a mantinha no lugar segurando a conta entre os dentes. Se ela precisasse falar, a máscara tinha de ser removida ou ela precisava segurá-la com as mãos.

Uma das primeiras referências a essa peça vem de um texto do século XVI escrito por William Harrison intitulado "Descrição da Inglaterra". O autor descreve o uso dessas peças e como a moda se espalhou para a França. Por algum tempo, o visard foi uma peça desejada; popular entre os ricos e nobres.


Entretanto, em 1583 um religioso chamado Phillip Stubbes publicou um panfleto chamado "Anatomia dos Abusos Femininos". Entre vários comentários, Stubbes escreveu:

"Algumas mulheres usam uma estranha peça na face para andar pelas ruas, cavalgar ou tratar de assuntos em público, escondendo a face quase que por completo sob uma folha de veludo. Tudo o que se pode ver através desse visor são os seus olhos. Então eu pergunto a todos que sabem da influência do demônio por este mundo: Não estaríamos fornecendo a ele uma maneira de se ocultar bem diante de nossos olhos? Não seria essa máscara que esconde as feições das mulheres uma maneira de disfarçar uma face demoníaca em plena vista? Se uma face oculta pode pertencer a qualquer um, então como saber se o que se esconde atrás dessas máscara não é uma monstruosidade"?

O panfleto divulgado por Stubbes não ganhou muita popularidade, mas as palavras reverberaram na mente de um nobre da corte Elizabetana chamado Robert de Gloucy. De Gloucy (ou De Glacy) pertencia a uma casa menor extremamente religiosa. Ao saber que sua esposa fazia uso da peça, ele ordenou que ela se livrassem do visard, uma vez que este poderia ser usado para o mal. A mulher assegurou que havia jogado a máscara fora, mas na verdade decidiu mantê-la escondida, para usar apenas quando o marido estivesse fora.


Certo dia, De Gloucy retornou de uma viagem antes da hora e procurou a esposa. Acabou encontrando-a no pátio, vestindo a peça sobre a face. Surpreso, ele ordenou que a figura removesse a máscara e revelasse seu rosto. A mulher pega de surpresa provavelmente não conseguiu articular as palavras e esse momento de hesitação foi o suficiente para que De Gloucy a atacasse com um punhal. O ataque foi direcionado contra a face oculta e a lâmina aguçada se enterrou profundamente quase até o cabo na maçã do rosto. A mulher morreu imediatamente.

Apesar de ter assassinado a esposa daquela maneira brutal, De Gloucy teve a chance de se defender perante um tribunal. Diante da corte ele contou uma história bizarra, assegurou que havia matado a mulher em legítima defesa uma vez que ela estaria possuída por um demônio oculto sob a máscara, exatamente como alardeava o panfleto de Stubbes. O nobre jurou que quando se deparou com a mulher, percebeu um brilho sobrenatural emanando de baixo da máscara. Da mesma maneira, os olhos luziam com perversidade odiosa. Percebendo que sob a máscara se escondia algo diabólico, ele tomou o punhal e sem pensar duas vezes desferiu o golpe fatal.


O testemunho deve ter impressionado os juízes, já que De Gloucy foi considerado inocente da acusação de assassinato e imediatamente liberado. O cadáver da mulher foi exumado, desmembrado e incendiado, conforme ditavam as leis a respeito de bruxaria na Inglaterra.

Depois desse acontecimento aterrador, os visards deixaram de ser usados no Reino, embora tenham permanecido na moda em outras partes da Europa até o início do século XVII, quando caíram na obscuridade e saíram de cena de uma vez por todas.

Em uma época de fanatismo, superstição e ignorância, cuidar da aparência e aderir a modismos podia ter um custo muito elevado.

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