sábado, 15 de setembro de 2018

Cinema Tentacular: A Freira - "Deus termina aqui"


Eu estudei em colégio de freiras minha infância e adolescência inteiras.

Na época em que eu estava no colégio, freiras já eram bem diferentes da ideia que boa parte das pessoas tem delas. Elas não eram amargas, ressentidas, fanáticas religiosas vestidas de pinguim e armadas com poderosas e devastadoras réguas usadas para disciplinar as crianças. Elas jogavam vôlei e dirigiam, sem falar que a maioria delas eram bem simpáticas e nem usavam hábito. É provável que a visão que muitas pessoas tem das freiras, seja uma visão um tanto estereotipada, posteriormente suavizada por simpáticas Noviças Rebeldes e/ou voadoras.

Minha mãe que também estudou em colégio de freiras sempre contou como elas eram severas, enérgicas e muitas vezes apavorantes. Talvez para a minha mãe, o filme "A Freira" (The Nun) surtisse mais efeito do que em mim. Talvez para ela fosse mais fácil associar a Freira Monstruosa do filme com as religiosas que mandavam no colégio que ela estudou.

Sem dúvida o filme "A Freira" aposta em uma imagem de Severidade e Isolamento para contar sua história de Horror. E cria um personagem bem macabro, como é possível atestar no trailer e nas fotos emoldurando essa resenha.


Mas falemos do filme em si, "A Freira" (The Nun/2018) é a quinta produção da franquia iniciada por Conjuração do Mal, que introduziu o casal de Investigadores e Demonologistas Ed e Lorraine Warren. Desde o primeiro filme, os dois se meteram com fantasmas, bonecas malditas, demônios e tiveram um entrevero com a própria freira que é a personagem central nesse capítulo. Sabendo que os Warren do mundo real estiveram na ativa e nas manchetes de tabloides por boa parte dos anos 70 a 90, é provável que ainda tenhamos mais filmes envolvendo o universo do casal. Enquanto estes estiverem rendendo uma boa bilheteria é razoável assumir que veremos outros casos paranormais seguindo o mesmo esquema.

"A Freira" é uma espécie de prequel na qual a história do macabro demônio chamado Valek é aprofundada. Ficamos sabendo mais alguns detalhes a respeito dessa criatura maligna, seus objetivos, de onde ele veio e como ele foi contido.

A história se passa no ano de 1952, no interior da Romênia, uma nação que sofreu profundamente com a Segunda Guerra e que ainda se reconstruía. Como um dos personagens comenta, viajar pelo interior do país é como retornar a Era Medieval, uma verdadeira colcha de retalhos de tradições, folclore e superstições.


Os primeiros dez minutos criam a atmosfera que vai acompanhar o espectador durante todo o filme. Não vou estragar as surpresas contando do que trata, mas a abertura é excelente, de fato, uma das melhores coisas do filme. Nela conhecemos a sinistra Abadia de St. Carta, a morada de uma rígida ordem de freiras que se dedicam a rezar e meditar sem qualquer contato com o mundo exterior. Mesmo as entregas de suprimentos para a abadia são feitas através de uma porta giratória para que ninguém entre e, mais importante, nenhuma das freiras saia. Quando o encarregado de levar os tais suprimentos chega a abadia e se depara com uma cena medonha do que parece ter sido um suicídio, ele corre para avisar.

Ciente do ocorrido, o Vaticano despacha para a região um religioso badass, Padre Burke (Demian Beshir) uma espécie de investigador sobrenatural com experiências desagradáveis durante a guerra. A missão do Padre é avaliar o que motivou o suicídio e se o local ainda pode ser considerado "sagrado". Para auxiliá-lo nessa importante tarefa, decidem enviar para acompanhá-lo uma noviça de mente aberta e atitude progressista, Irmã Irene (Tessa Farmiga). As razões para ordenar que uma jovem noviça tome parte em algo tão incomum permanecem à princípio desconhecidas, até mesmo mesmo para a própria mocinha. Depois de encontrar o sujeito que descobriu o corpo, um franco-canadense apelidado de Frenchie (Jonas Bloquet), os três acabam seguindo para a Abadia a fim de dar início a investigação e desvendar seus muitos segredos.

Um dos méritos do filme é que ele não perde tempo... assim que o grupo chega a abadia coisas bizarras começam a acontecer quase que de imediato. Uma sombria Madre Superiora os convida para passar a noite no alojamento do convento e explorar os arredores de maneira mais completa. De vultos macabros a ruídos inexplicáveis, passando por presenças invisíveis e espectros furiosos, o filme ao longo de 96 minutos de duração oferece toda sorte de manifestações sobrenaturais com o objetivo de pegar o público de surpresa e assustá-lo.


Aí está um dos problemas: ao recorrer repetidas vezes ao expediente do jump scare, o filme quase derrapa, tornando-se repetitivo. Quem realmente gosta de filmes de horror sabe que nada, nem mesmo a cena mais bem elaborada ou efeito especial mais mirabolante, consegue superar uma boa dose de horror psicológico. A Freira em alguns momentos repete a fórmula de tentar surpreender o público custe o que custar, mas não chega a realmente assustar. Por sinal, se essa for uma condição essencial para que você assista esse filme, então é possível que saia do cinema desapontado. Com todos seus jogos de câmera, sombras furtivas, gritos estridentes, o filme não chega a causar qualquer sensação de medo ou desconforto.

O que parece é que o roteiro joga para a torcida. Em um filme mais profundo e denso algumas cenas talvez conseguissem incomodar, mas o diretor parece tentar agradar a todos: aos que vieram assistir um filme de horror tradicional e aqueles que não tem muita certeza se deveriam estar na platéia. Para estes, o roteiro quebra o clima de horror inserindo aqui e ali algumas pontas de humor e piadinhas que atenuam a atmosfera de medo. Para os fãs mais hardcore isso pode ser um pecado mortal, mas a suavização deve agradar ao pessoal menos afeito ao gênero.

Visualmente "A Freira" é impecável! O filme possui uma fotografia escura, com sombras que parecem adquirir vida própria dependendo do ângulo em que elas são enquadradas. A equipe de direção de arte se esmerou em criar os ambientes soturnos da abadia nos mínimos detalhes: cada aposento, cada estátua, cada espelho e detalhe de afresco ajudam a passar uma ideia de isolamento e confinamento. Mesmo do lado de fora, o cemitério, com as suas lápides e cruzes de todos os tamanhos e formas, criam a ilusão de ser impossível escapar. Para quem aprecia os antigos clássicos da Hammer/Amicus, é possível perceber que o visual rende uma homenagem a esses velhos filmes góticos com seus castelos medievais e mansões assombradas, aqui transformados em um convento maldito. Os efeitos visuais e especiais são sólidos, mas não chegam a encher os olhos.


O elenco consegue estabelecer uma boa química: a dupla de protagonistas religiosos (padre e noviça) são suficientemente confiáveis e entregam aquilo que se espera. Tanto Beshir quanto Farmiga são bons atores e estão à vontade em seus papeis - por sinal Tessia Farmiga é irmã mais nova de Vera Farmiga que vive Lorraine Warren. O terceiro protagonista, Jonas Bloquet, serve como um alívio cômico um tantinho exagerado, mas que felizmente não chega a comprometer.

Talvez a maior decepção infelizmente seja justo o "monstro" do filme, que não rende o esperado. Embora seja um spinoff centrado em Valek, o roteiro é bastante econômico a respeito das motivações do Demônio. No fim, ele é mal, porque trata-se de um demônio, e espera-se que um demônio seja malvado. Quando ele aparece na tela existe a expectativa de que a cena vai ser assustadora, mas fica apenas nisso: Expectativa. Nenhuma das aparições chega a ser tensa ou particularmente memorável. Uma pena, pois a aparência cadavérica da Freira Demoníaca tinha tudo para causar apreensão e alçá-la a um lugar de honra na galeria de monstros memoráveis.


"A Freira" é um filme que consegue entreter, mas está longe de ser uma montanha russa de emoções e surpresas. Está mais para um passeio indolor num trem fantasma, daquele que quando termina você diz "foi isso"? Sem dúvida, aqueles que conseguirem manter as expectativas baixas vão aproveitar muito mais e sair com uma sensação de ter assistido uma matinê. Quem for esperando algo mais profundo, provavelmente vai reclamar e querer seu dinheiro de volta.

De uma forma ou de outra, a Freira está longe de ser "O capítulo mais assustador de Invocação do Mal" como promete o cartaz. Ele é divertido, mas perfeitamente esquecível.

Trailer:



3 comentários:

  1. Fui assistir ao filme ontem e,mesmo não tendo criado nenhuma expectativa prévia,sai bem desapontado.Gosto bastante dos primeiros capítulos de Invocação do Mal,mesmo ambos seguindo o já muito gasto clichê recheados de Jump Scares (*Personagem de costas abre alguma porta ou olha seu reflexo no espelho *Nada ali ou algo faz um barulho por trás *A câmera filma seu rosto ou novamente suas costas *Close no espelho e susto com barulho ou take do rosto da personagem e susto com monstro/demônio/Entidade fungando em seu cangote) que se repetem (um deles de maneira idêntica a um susto que também conta com a freira no segundo Invocação do Mal) nesse novo filme.Acho que gosto bastante dos dois primeiros filmes por lembrarem do primeiro cenário que eu e uma infinidade de Investigadores e Keepers tiveram o prazer de jogar: The Haunting (no segundo filme até uma semi réplica de Mr. Corbitt tem...)
    Mas,falando do filme em si,também fiquei surpreso de ver o quão bem feitos a fotografia e o clima do filme foram,mas,levando em conta o combo de Horror Clássico: Romênia+Castelo Antigo+Simbologia Cristã Deturpada+Decrepitude,nada podia dar errado visualmente falando.Me pareceu que a trilha sonora se inspirou claramente em Drácula de Bram Stoker em alguns trechos (como a chegada dos "investigadores" às escadarias do Castelo e a posterior investigação nos arredores),mas,ainda assim,os cantos barrocos sinistros caíram bem com o visual.Porém,falando em roteiro,o filme,sem trocadilhos,"pecou" demais,muita enrolação repetitiva com sustinhos clichês e cruzes virando de ponta cabeça,uma quase que total ausência de explicações sobre o tal Demônio/Freira (até onde entendi,ele toma a forma para se disfarçar,assumindo a forma de freira para se adaptar ao convento,o que não explica suas posteriores aparições na vida de Lorraine assumindo a mesma forma,e é aí que critico esse formato episódico de filmes de terror) e uma quantidade desnecessária de piadocas e tiradas engraçadas (talvez aumentadas pelo fato de ter assistido dublado) que,para mim,atingiram o ápice quando (SPOILERS) a freirinha como sacrifício final manda uma cusparada com o sangue de Cristo na cara da Freira (SPOILERS) isso me rendeu uma crise histérica de risos que perdurou até os créditos,e que voltou esporadicamente no caminho de volta para casa.Se em uma noite fria e escura,lembrar do filme de terror que acabei de assistir me fez rir ao invés de sentir o bom e velho calafrio com medinho,minha decepção é clara,Um bom filme para se assistir em uma noite qualquer,tomar uns sustos manjados e dar umas risadas....

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  2. Definitivamente vale muito à pena, é um dos melhores do seu gênero. Jonathan Penner Ator é uma das azoes pelas quais o filme teve resumos positivos. Mais que filme de terror, é filme de suspense, todo o tempo tem a sua atenção e você fica preso no sofá. Além, tem pontos extras por ser uma historia original.

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