sexta-feira, 7 de setembro de 2018

Licantropia 101 - Tratando dos Mitos sobre Homens que se transformam em lobos


Com base no trabalho "A Base Histórica da Licantropia" 
de Martim Wettstein

O mito do Lobisomem diz que um indivíduo mordido por um homem-lobo ou que tem um ancestral que sofreu da mesma aflição (a licantropia) está fadado a se transformar em uma besta selvagem com sede de sangue.

Ainda segundo o mito, lobisomens vivem entre nós, ocultando sua natureza e se transformam em lobos nas noites de lua cheia. Eles são mais rápidos e fortes do que qualquer homem, seu corpo é coberto de pelos, seus dentes e unhas se tornam presas e garras afiadas usadas para morder e dilacerar suas vítimas. Quando o frenesi assassino passa, eles revertem a sua forma original muitas vezes sem memórias do que fizeram. Lobisomens caçam outros seres humanos nas noites de lua cheia e matam sem nenhum arrependimento. A única coisa capaz de parar um lobisomem é a prata, uma substância pura, cujas propriedades afetam a criatura. Uma lâmina ou uma bala de prata pode matar um lobisomem. Todas as outras armas são ineficazes.    

O conjunto de lendas e regras que cerca os lobisomens parece ser antigo, mas de fato ele é bem recente. Junto com vampiros, zumbis e múmias, o mito do lobisomem foi exaustivamente explorado pela literatura e cinema que contribuiu para a construção de sua imagem atual. Contudo, a lenda do monstro selvagem em forma de lobo, é muito mais antiga, com raízes profundas no folclore da Europa Medieval, principalmente da França e Alemanha.

Esse artigo explora a base dessas lendas que levaram a criação de tal monstro.

1) Aqueles que mudam de forma


Lendas a respeito de indivíduos capazes de mudar de forma estão presentes em várias culturas ao redor do mundo. Mesmo em Gilgamesh, o primeiro épico, escrito na antiga Babilônia, o personagem título culpa a deusa Ishtar por ter transformado um pastor em lobo. Embora no livro a transformação seja uma metáfora, a alusão ao homem que se torna uma fera é bastante clara.

Os guerreiros nativos-americanos bem antes da chegada dos europeus vestiam peles de urso, coiotes e lobos para ganhar a força desses animais em batalha. A ideia era que a natureza feroz e temível do animal era transmitida para o guerreiro que usava a pele sobre seus ombros. Tomado por essa energia mística, o guerreiro ganhava a fúria, a agilidade, a resistência e a astúcia do animal. Também existia uma forte crença de que ancestrais mortos podiam visitar seus descendentes, habitando a forma de animais em momentos de necessidade. Mesmo os deuses dos nativos possuíam avatares na forma de animais.  

Do outro lado do mundo, na India havia uma infinidade de Deuses e Demônios que assumiam a forma de animais. No panteão indiano, o Rakshasa era um dos mais conhecidos e temidos demônios, capaz de mudar de forma, transformando-se à vontade em tigre. Mas não apenas o Rakshasa assombrava os indianos, haviam demônios em forma de homem-lobo habitando as profundezas das florestas. Existia ainda lendas de crianças que haviam sido perdidas na floresta e criadas por lobos e cães selvagens aprendendo a viver e até se comunicar com eles.

No Egito, há muitos deuses com traços antropomórficos, com destaque para Anúbis, o deus do submundo com cabeça de chacal. Sacerdotes de Anúbis usavam máscaras semelhantes a representação do deus e tinham por ritual de iniciação devorar um coração, simbolizando o julgamento dos impuros.

Na África sub-saariana, caçadores que realizavam sua primeiro abate, tinham como ritual de passagem sujar o rosto e as mãos com o sangue do animal ou ainda devorar o coração deste para obter seus atributos, força e coragem. Os mesmos caçadores tribais, inclusive a tribo massai, vestia adereços e enfeites retirados de animais selvagens a fim de personificar as feras, e quando saíam para a selva cumpriam o ritual de imitar os sons e a atitude desses animais.

O que não falta, são exemplos de homens personificando animais na cultura nórdica. Tribos germânicas, conhecidos como Berserks, vestiam a pele de ursos e lobos sobre suas costas. Essas tribos eram extremamente temidas pela sua selvageria e sede de sangue. Antes de partir para a batalha, realizavam uma espécie de ritual visando assumir a personalidade do animal, entrando em um frenesi que supostamente lhes garantia faculdades sobrenaturais. Os berserker eram guerreiros indomáveis. A força e resistência que demonstravam quando em transe se tornou legendária e muitas tribos inimigas acreditavam que o espírito do animal de que eles tiravam a pele, possuía seus corpos.

O temperamento dos berserker os levava a ações temerárias de fúria incontrolável e massacres sanguinários. Segundo rumores, durante o transe eles chegavam a atacar os próprios companheiros, incapazes de diferenciar aliados de inimigos. Alguns berserkers chegavam a se banhar em sangue e devorar partes dos corpos dos oponentes. Até hoje a expressão "lutar como um berserk"  (fight like a Berserk) é usada para apontar um lutador feroz.

Na obra "Metamorphosis" do poeta Ovídio, o rei grego Lycon, é amaldiçoado por Zeus e transformado em um lobo como punição. Os gregos acreditavam que os descendentes de Lycon eram atormentados pela mesma maldição, que passou a ser chamada de Lycantropia, a disseminação da maldição que transforma homem em fera, razão em fúria, civilidade em selvageria incontida. Os licantropos eram sinônimo de loucos, maníacos e homicidas para os gregos.

A ideia de homens que se transformam em animais não é portanto nova. Ela é familiar em muitas culturas e em diferentes épocas.  

2) A Humanização dos Lobos



Uma questão que surge quando se analisa o mito do licantropia, é, porque o lobo foi escolhido como o animal preferencial para representar a transformação de homem em fera. É claro, existem muitas lendas a respeito de homens que se transformam em ursos, pássaros ou outros animais, mas lobos são de longe a representação mais frequente. De Gilgamesh a Ovidio, a transformação de homem em lobo está presente em várias culturas.

Uma das explicações talvez seja a ideia de perigo que está associada ao lobo. A presença de um lobo próximo a uma vila sempre representou uma ameaça a todos seus habitantes. O lobo forçava as pessoas a ficar em casa, impedia que se buscasse água ou comida na floresta, impedia que se visitasse quem precisava de auxílio... o lobo era a representação clara e inequívoca da ameaça à vida.

Além disso, nenhum outro animal selvagem está presente em tantas regiões do mundo quanto o lobo. Lobos podem ser encontrados na Ásia, Europa e América, das regiões polares aos climas mais amenos e quentes. Desde o início dos tempos, o homem aprendeu a respeitar e temer esses animais. Lobos sempre estiveram por perto e para muitos antropólogos a formação das sociedades se deveu entre outros fatores a necessidade dos homens de se proteger de animais selvagens, entre os quais, o lobo.

É possível que o medo do lobo esteja ligado a um tipo de memória primitiva coletiva, inerente a toda a humanidade. O medo do predador, da fera, da besta assassina sempre à espreita.

Nas fábulas e contos de fada ao redor do mundo, lobos ocupam uma posição proeminente. Eles são quase sempre o elemento que define a ameaça e o terror. Nas fábulas germânicas, como chapeuzinho vermelho ou os Os três porquinhos, o lobo é o antagonista. Ele também aparece na estória russa de "Pedro e o Lobo". Eles estão presentes no folclore da Grécia, na India, no Alasca, na cultura dos Celtas e na Península Ibérica...

O lobo foi por muitos séculos o catalizador dos temores mais primitivos do homem: o medo de estar sozinho na floresta, de estar perdido, de ser perseguido, ferido gravemente e de acabar devorado...

Curiosamente na maioria dessas estórias, a transformação existente ocorre de forma inversa. Não é o homem que se torna lobo, mas o lobo que ganha atributos humanos, age e pensa como um homem. O lobo que fala, que anda nas patas traseiras, que se disfarça, que emprega estratégia e artimanhas e que se comporta de forma ousada.

Então, pessoas em diferentes partes do mundo cresceram ouvindo estórias a respeito de lobos com características humanas. O passo seguinte para a construção do mito de que homens se transformam em lobos sob certas condições ainda estava para ser dado...

3) Os Wargs



Em textos legais dos países nórdicos, presentes em documentos do século XIII, é possível encontrar um costume que ajuda a explicar a extensão do medo do homem-lobo.

"O criminoso que comete um crime contra sua comunidade deve ser expulso. Ele será banido para as profundezas da floresta, sem uma casa, arma ou ajuda de qualquer pessoa. Pois ele é uma fera, e como tal deve viver e morrer".  

O princípio é que o indivíduo banido teria que viver sozinho, sem um teto e sem nenhum apoio da família, amigos ou conhecidos. Muitos desses homens eram chamados de "wargs", ou lobos, uma vez que o lobo é um exemplo de animal solitário que depende unicamente de sua astúcia e crueldade para sobreviver.

O local onde esses homens banidos passavam a viver eram chamados de "Floresta do Warg", a morada selvagem do criminoso. O reduto do "homem-fera", alijado de todo e qualquer contato social, temido e proibido de viver entre os iguais.

Os nativos dessas regiões, é claro sabiam da natureza do crime e da identidade do criminoso. Sabiam que ele não era realmente um homem-lobo, mas para estrangeiros, não familiarizado com esses costumes acreditava que o "warg" era exatamente o que o nome dizia: um homem-lobo. 

O termo "warg" na cultura nórdica também está associado a "conspiração". O lobo é um traidor por natureza, "falar com língua de lobo" (talking with wolfs tongue") é um ditado que indica aponta aqueles que contam mentiras ou envenenam uma pessoa contra outra. No folclore nórdico, o nome do Deus da mentira, Loki deriva de uma raiz primitiva germânica da palavra "lok" - ou lobo. 

Portanto, haviam homens-lobo na Escandinávia. Mas em sua gênese eles não tinham o poder de mudar de forma, eles não mordiam outros homens ou passavam a sua maldição dessa forma, e tampouco eram suscetíveis a prata. Mas eles eram considerados como lobos, para todos os efeitos.

4) A Mordida do Lobo



Um dos mais temidos poderes do lobisomem é transmitir a licantropia através de sua mordida.

A origem desse mito não se encontra no folclore escandinavo, onde homens-lobos eram criminosos, mas pode ser achada na Alemanha Medieval.

Naqueles dias muitas estórias eram contadas nos vilarejos da Europa Central. Como não havia quem escrevesse essas estórias, elas eram compartilhadas de forma oral, contadas muitas e muitas vezes. E a cada vez que uma dessas estórias era relatada, ela mudava um pouco, obtendo um tom cada vez mais assustador e inacreditável.

Nessa mesma época, a raiva também era um perigo constante. Lobos nas florestas carregavam a raiva que contaminava cães, e é claro, homens. Um cão infectado com a raiva, não responde as ordens de seu mestre e "morde a mão que o alimenta". Um cão acometido pela raiva, não por acaso era chamado de "lobo".

Esse animal produz espuma em sua boca, e o mesmo se verifica na boca de um homem infectado pela raiva. O animal infectado ataca seu dono, um homem infectado ataca sua família. Quando um homem contaminado pela raiva se comportava como um animal selvagem, as pessoas não compreendiam o que havia acontecido com ele. A única coisa que eles compreendiam é que um homem mordido por um animal raivoso, podia se comportar como esse animal. E assim começaram a surgir estórias sobre lobos (ou cães assim chamados) que transformavam homens em bestas. 

Além disso, um outro tipo de homem-lobo surgiu na Alemanha Medieval. Um monstro chamado "Roggenwolf" (literalmente "lobo do centeio"), que espreitava nos campos de centeio e que mordia os agricultores que ali trabalhavam. Segundo o mito, ele tinha uma mãe maligna (como Grendel da saga 'Beowulf'), que era chamada de 'Roggenmutter'. A criatura era tão insidiosa que por vezes a pessoa atacada sequer sentia a mordida e não sabia que havia sido contaminada pela maldição da licantropia até ser tarde demais. 

Aqueles que retornavam dos campos contaminados apresentavam uma mudança física. A vítima tinha sintomas como falta de ar e sofria desmaios. Ela sentia uma sede e fome constante. Eles viam e ouviam coisas que mais ninguém era capaz de perceber. Tornavam-se agressivos, violentos, irracionais. Depois de algum tempo o nariz mudava, ficava achatado, escuro e frio. A ponta das orelhas ficavam  pontudas e escuras. As gengivas sangravam e recediam. A ponta dos dedos escureciam e as unhas cresciam. Com efeito, os sintomas da mordida do "Roggenwolf" tornavam a vítima cada vez mais animalesca.

Hoje, a ciência sabe que esses são os sintomas do ergotismo, uma doença causada pelo contato com a toxina produzida por um fungo (Aspergillus fumigatus) que cresce nos campos de centeio. Uma pessoa intoxicada por essa substância sofre alucinações bastante vívidas uma vez que o princípio ativo da toxina age sobre os neuro-transmissores do cérebro. As alucinações não são o único sintoma. O ergotismo causa o afinamento nos vasos sanguíneos e uma falta de irrigação nas extremidades do corpo. Dedos, nariz, gengivas e orelhas começam a escurecer gradativamente. Então as pernas e braços, órgãos até que, em casos crônicos, a vítima morre.

Essas duas doenças na Alemanha medieval contribuíram para o surgimento de histórias sobre lobisomens escondidos nos campos de centeio, capazes de transmitir a maldição. Um homem infectado estava fadado a mudar, a agir como uma fera e até se transformar em uma até finalmente morrer da maldição.

5) Herança Maldita



Mas a licantropia não se transmitia apenas através da mordida da fera. Ela podia ser herdada por laços de sangue. A herança maldita era passada de pai para filho, para neto e bis-neto e todos os seus descendentes podiam sofrer do mal.

 A explicação para esse mito pode ser explicada pela medicina moderna.

Existem várias desordens genéticas que podem levar uma pessoa a desenvolver uma aparência lupina. 

A CGH (Congenital generalized hypertrichosis) é uma desordem extremamente rara caracterizada pelo crescimento excessivo de pelos na face e na parte superior do corpo. Chamada comumente de "síndrome do lobisomem" os indivíduos com esse raro fenótipo até pouco tempo eram tratados como aberrações e figuravam como atrações de circos e galerias bizarras sendo chamados de "homens cães" ou "homens macacos". Até o século XIX, um espetáculo circense que se apresnetava de forma itinerante nos Estados Unidos reunia uma família inteira de "lobisomens", indivíduos que na verdade sofriam de CGH, condição transmitida hereditariamente. 

Outra doença rara, a Porfíria é uma desordem genética que torna o corpo incapaz de produzir Heme (a molécula presente nas células vermelhas do sangue responsável por transportar o oxigênio). Como efeito, mesmo uma fraca luminosidade solar é capaz de provocar ulcerações, bolhas e lesões permanentes na epiderme. Não raramente a pele desses indivíduos assume uma coloração castanha escura. As mucosas também são afetadas, os lábios e gengivas secam, e os dentes parecem maiores do que realmente são. Não bastasse esses efeitos, o crescimento excessivo dos pelos, cabelos e barba constitui um dos possíveis sintomas. Finalmente a porfíria pode causar alterações mentais e comportamentais e assimilação de conceitos. Alguém chamado de "lobisomem" pode muito bem acreditar que realmente está amaldiçoado pela licantropia.

Infelizmente, a porfíria também é hereditária. Um indivíduo pode passar anos sem que a condição se desenvolva, mas quando ela se instala, não existe cura e a desordem progride rapidamente. Nesse contexto, o filho de alguém infectado pela porfíria pode nascer normal e viver muitos anos sem manifestar os sintomas de seu parente, até que a desordem se faz sentir.

Para povos incapazes de compreender noções básicas de genética, sofrer do mesmo mal de um parente, equivalia a compartilhar de sua maldição. Assim surgiu a maldição hereditária da licantropia.

6) A Lua Cheia



Outro famoso aspecto do mito do lobisomem é sua conexão com a lua cheia. Muitos lobisomens modernos são capazes de se transformar em bestas ferozes apenas quando a lua cheia se ergue nos céus. Mas essa é uma peculiaridade consideravelmente recente introduzida pela literatura francesa do século XVI. O lobisomem francês, o "loup-garou" foi o primeiro a ser " influenciado pelas fases da lua.

A cultura francesa possui raízes celtas. Apesar do mito na Europa ter se originado entre as tribos germânicas, os Celtas contribuíram com várias características que aumentaram a lenda. No folclore celta, a lua é de suma importância. As fases da lua influenciam vários acontecimentos na Terra, e as criaturas sobrenaturais por vezes ganham poderes ou fraquezas em decorrência de sua fase. Para os celtas, fantasmas  normalmente invisíveis podiam ser vistos, e em alguns casos até tocados, quando banhados pela luz da lua cheia. Os vampiros, por sua vez podiam ser afetados pela luminosidade lunar quase tanto quanto o brilho do sol.

Não é de se surpreender, portanto, que na França (pós-Celtas) a transformação mística de um homem em lobo estivesse de alguma forma conectada com o aspecto lunar. Para os celtas, a lua cheia era capaz de "trazer à tona", a forma bestial e fazer com que a selvageria incontida do animal emergisse. O lobo afinal, "canta" para a lua em seu lacônico uivo. A lua portanto seria um emissário da loucura animalesca, um fator de transformação. 

Uma outra razão para o surgimento da lua no mito do Lobisomem pode estar ligado a alguma doença psicológica. A ciência médica reconhece que a lua possui um grande poder de sugestão na mente de indivíduos afetados por problemas mentais. Não por acaso, os alienistas do século XIX sagraram o termo "lunático", que designa uma pessoa de mentalidade instável sujeito a mudanças comportamentais, tão frequentes quanto as fases da lua sobre sua cabeça. Para os antigos gregos, a lua podia ser causa e efeito de episódios de loucura. Em algumas culturas, indivíduos com episódios de loucura eram trancafiados ou colocados em correntes, ou ainda marras, quando o calendário se aproximava da lua cheia.

Mesmo em nossos tempos atuais, a lua continua exercendo fascínio e talvez, realmente influenciando comportamentos estranhos. Existem criminólogos e pesquisadores convencidos de que as fase da lua, influenciam o aumento de crimes violentos. Estudos nesse sentido ainda carecem, contudo de fundamento científico.

7) Como matar um Lobisomem



Ainda mais farto do que as descrições a respeito do Mito do Lobisomem, são os métodos infalíveis de lidar com a Besta. Em alguns momentos parece que cada história a respeito de licantropia trata o assunto de uma forma diferente. Muitas dessas maneiras diferentes devem sua existência a herança cultural da região em que ela surgiu. Algumas delas são bastante recentes, enquanto outras parecem enraizadas em mitos e lendas que acompanharam o próprio surgimento de alguns povos.

Vejamos alguns exemplos:

- A medida que as histórias sobre lobisomens foram se difundindo entre os povos católicos da Europa, começaram a aparecer alguns métodos para eliminar as feras. Em alguns vilarejos da Europa central existia a crença de que se a identidade da criatura fosse conhecida e seu nome de batismo repetido três vezes ele reverteria a sua forma humana. O princípio é que a repetição do nome cristão ajudaria a restaurar a humanidade da pessoa agindo como um tipo de "exorcismo" da besta presente em seu corpo. 

- As lendas celtas tratavam de lobisomens em vários de seus mitos. Uma das formas de escapar de um ataque de lobisomen envolvia escalar uma Árvore de Freixo. Esse tipo de árvore segundo o folclore Celta é sagrada e nenhuma fera é capaz de fazer mal a alguém que busca refúgio no alto dela. 

- Outro ritual Celta que deu origem a uma tradição cristã envolvia acertar a cabeça do lobisomen três vezes. Supostamente isso fazia com que a fera vertesse três gotas de sangue que removiam a sua fúria e diminuíam o seu ímpeto de matar. O problema, é claro, deveria ser acertar a cabeça do lobo.

- A planta venenosa Acônito, não por acaso chamada em inglês de Wolves Bane (Danação do Lobo) se tornou um dos métodos consagrados da cartilha dos caçadores. Os gregos podem ter sido os primeiros a reparar que lobos evitavam a planta e por isso associaram o seu uso ao extermínio dos lobisomens. Se um lobisomem recebesse uma dose do extrato da planta, ele imediatamente se sentiria doente e fraco, morrendo em poucas horas se não revertesse à forma humana. Não por acaso, a planta era oferecida a pessoas de quem se desconfiava sofrer de licantropia e para conter a transformação ela podia ser colocada em volta do pescoço. 
- Um dos métodos mais famosos de eliminar a ameaça de um Homem Lobo envolve utilizar prata. Segundo a mitologia grega, homens feras seriam suscetíveis a prata, uma vez que o metal era considerado como tendo um efeito purificador. Um ferimento causado pela prata era capaz de remover a fúria da criatura, fazendo com que o lobisomen revertesse à sua forma humana.

- Posteriormente, as lendas germânicas afirmavam que a prata poderia matar o lobisomem. A prata, era o metal associado à Lua, que segundo as lendas fascinava as feras e as incitava. A famosa lenda  "Der Werwolf von Hüsby", escrita no século XVI trata de um lobisomem que é morto por uma lança feita de prata. Alternativamente, temos histórias de homens lobo que foram destruídos por armas que recebiam um banho de prata em sua lâmina e que assim se tornavam letais para as criaturas.

- Isso nos leva à bala de prata. É  método favorito empregado pelos caçadores de lobos de Hollywood. Uma bala produzida com prata maciça, de preferência de um crucifixo ou outra regalia religiosa derretida, era infalível contra um lobisomem. Em algumas versões da lenda, a bala tem que ser abençoada por um sacerdote para que tenha efeito. O princípio é exatamente o mesmo das lendas de armas de prata empregadas contra os lobisomens, o metal seria eficaz uma vez que tem propriedades curativas e purificadoras.

- Mas haviam outros métodos estranhos de enfrentar a Besta: enterrar uma lança de prata no coração do lobo (como se fazia no caso do vampiro), queimar a pele de uma fera caçada na lua cheia, matar uma ovelha e rechear a carcaça com determinadas ervas (em especial acônito), fincar no chão estacas de madeira verde em um padrão de cruz, pendurar na porta de casa uma faca com a lâmina recém afiada, entre outras maneiras.

Assim como acontecia no mito do vampirismo, a licantropia oferecia várias soluções, sendo que a maioria deles não eram muito fáceis.

8) Sumário



Conforme vimos, lendas sobre homens-animais estão presentes em várias partes do mundo como pare da herança culturas e folclore. A lenda predomina obviamente em países que possuem a presença de lobos. A capacidade de se transformar em lobo e voltar, constitui a base da lenda, já uma transformação em uma mistura de "homem e lobo" é algo relativamente novo na Europa.

Os lobisomens tem diferentes origens.

O warg da Escandinávia bem como o Werwolf das tribos germânicas só se transformavam em lobo através da magia contida em um cinturão encantado confeccionado com a pele de um lobo. Raiva e Ergotismo também poderiam causar a transformação. Essas versões da lenda sofreram alterações durante o período medieval, quando o cristianismo passou a associar a Besta Fera com as depredações do Demônio.

É importante ter em mente entretanto que a maior parte das lendas a respeito de lobisomens se desenvolveu muito lentamente. Levou mais de 200 anos para que o mito ganhasse força e chegasse a cidades, sendo que ele era difundido quase que exclusivamente nas regiões rurais. Cada geração parece ter adicionado um pequeno elemento ou detalhe à lenda e ela cresceu. A mais recente adição a esse mito pode ser a noção de que a licantropia seria transmitida por intermédio de um vírus contido na saliva da criatura. Uma mordida disseminava a doença que se alastrava dessa maneira sob uma perspectiva científica, encontrando similaridade na raiva canina. Julgando-se que nosso conhecimento de vírus datam do final do século XIX e só encontraram pleno conhecimento no século seguinte, é justo afirmar que elementos e detalhes continuam sendo adicionados pelas atuais gerações. A lenda, portanto, continua muito viva e em constante transformação.

Eu francamente não acredito que lobisomens existam, ao menos até ter a má sorte de encontrar um cara a cara.

8 comentários:

  1. Post incrível! Eu, particularmente, gosto muito do mito dos lobisomens, é a minha criatura fantástica favorita. Parabéns!

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  2. Magnífico artigo! Lobisomens me fascinam desde sempre, são minha criatura mítica favorita.

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  3. Muito bom o post , lobisomens sempre foram a minha preferência , dentre todas as outras criaturas lendárias.

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  4. Adorei o artigo, muito bem pesquisado e escrito, virou base para qualquer referência futura minha sobre lobisomens.

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  5. Ótimo Post, sobre a bala de prata não poderia deixar de citar que o uso se popularizou, também, após a morte da Fera de Gévaudan pelas mãos de Jean Chastel, que segundo se diz, usou balas de prata para abater o monstro, tais balas teriam sido confeccionadas a partir de uma medalha de prata de Nossa Senhora e benzidas pelo padre da região.

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  6. Realmente muito bom.. Trás muitos elementos desconhecidos para se trabalhar na mesa de RPG.

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  7. Lobisomens sempre foram minhas criaturas mitológicas preferidas! Excelente texto! Continue e se possível, mais na frente, fale um pouco sobre bons filmes de lobisomem (q infelizmente são bem raros)! :)

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