terça-feira, 19 de março de 2019

Senhor das Máscaras - Falecimento do autor de Masks of Nyarlathotep


Ontem tivemos a triste notícia da morte de Larry DiTillio que trabalhou na industria dos RPG e que é conhecido entre os fãs de Chamado de Cthulhu como o idealizador de Masks of Nyarlathotep, uma das mais famosas e queridas campanhas.

A Chaosium, onde Larry trabalhou por anos, se manifestou a respeito de seu falecimento através de Mike Mason, editor da linha de Chamado de Cthulhu. Ele escreveu na página oficial da editora:

"Acordei hoje pela manhã e recebi a notícia do falecimento de Larry DiTillio.

Larry foi uma pessoa que deve ser reconhecida por sua participação na indústria dos jogos ou do entretenimento, e um homem cuja contribuição para Chamado de Cthulhu não pode ser subestimada.Antes dele começar a criar, escrever e roteirizar para a televisão, o primeiro amor de Larry foram os jogos de tabuleiro. É possível conferir o trabalho dele nos primeiros livros lançados pela Chaosium, como Ye Book of Monsters (Vol I & II), H. P. Lovecraft’s Dreamlands, Terror Australis (primeira edição), Demon Magic para Stormbringer, e vários artigos para a antiga revista da Chaosium, Different Worlds. Mas acima de udo, Larry será lembrado como o homem que criou Masks of Nyarlathotep, estabelecendo a visão de como deveriam ser as campanhas de Chamado de Cthulhu dali em diante. Ao criar essa campanha ele deu início a uma revolução no design de cenários cujos efeitos são sentidos até hoje.

Masks First Ed
Embora a Chaosium já tivesse publicado as Campanhas Shadows of Yog-Sothoth e Fungi From YuggothMasks era maior, mais épica, mais dinâmica, e tinha seu coração centrado na fragilidade humana e na corrupção desencadeada pelos Mythos. Ao invés de tratar de uma força invisível, Masks coloca os vilões no centro dos acontecimentos, tornando Masks um cenário repleto de personagens que viviam e respiravam. Larry contava que a ideia principal para escrever Masks veio até ele depois de escrever uma biografia a respeito de Jomo Kenyatta para um programa de televisão. Chaosium pediu a ele por algo que fosse mais do que "outro cenário de casa assombrada", então Larry usou seus conhecimentos a respeito de folclore africano para desenvolver uma trama a respeito de uma expedição perdida - A Expedição Carlyle. Desse ponto em diante, Masks nasceu e o resto é apenas história. 
Masks of Nyarlathotep foi um sucesso instantâneo, ganhando prêmios e gerando muitas horas de jogo para grupos ao redor do mundo. É um fato que todos aqueles que jogaram essa campanha, possuem histórias de batalha para compartilhar - em geral descrevendo a morte dramática de um personagem ou uma sequência de insanidade enquanto os personagens tentavam encontrar o paradeiro da Expedição Carlyle. O mais importante é que  atrama da campanha era tão empolgante que ajudava na interpretação dos jogadores. Além da ameaça do Deus Exterior em pessoa, os Cultos que Larry criou pareciam tangíveis e reais, e não funcionavam isoladamente – eles mantinham contato entre si, cooperando para completar um grande plano, além de caçar os investigadores e tornar suas vidas muito mais difíceis. Com isso, Larry ajudou a trazer a ambientação da campanha para o mundo real, rejeitando a noção estática de NPCs que participam da aventura somente através dos jogadores. 
Masks New Edition
Quando eu comecei a trabalhar na nova Edição de Masks of Nyarlathotep eu conversei e trabalhei com Larry. Embora ele estivesse afastado do meio dos jogos fazia algum tempo, mantendo sua aenção em vários desenhos animados como He-Man, She-Ra, Beast Wars, Murder She Wrote, The Real Ghostbusters, e um dos meus programas favoritos, Babylon 5, o amor de Larry pelo jogo continuava. Nós comnversamos a respeito da nova edição e modernizamos o texto e Larry estava satisfeito que Masks receberia o amor e atenção que merecia. Ele sempre foi totalmente solidário e ansioso pela nova edição, com a qual ele se mostrou muito satisfeito. Foi uma honra conversar com ele a respeito do jogo, seus pontos de vista a respeito da presença de Cthulhu nas várias mídias, e a nova série de televisão inspirada por Lovecraft em que ele vinha trabalhando – ele até mencionou seu interesse em escrever para uma série baseada nos Cthulhu Mythos, algo que seria sem dúvida incrível, mas que infelizmente agora jamais irá acontecer. 


Como mencionei no início, a criação de Larry em Masks of Nyarlathotep deu início a uma revolução no design de aventuras de RPG. Foi o seu sucesso que ajudou a popularizar o jogo Call of Cthulhu e apresentá-lo àqueles que desejavam sentir o que era cruzar o caminho dos Grandes Antigos. Graças a Larry tantas pessoas jogaram e continuam jogando Call of Cthulhu. E por isso, a contribuição de Larry não deve ser esquecida. 
Obrigado, Larry por sua visão, criatividade e sabedoria. Sentiremos a sua falta.
Mike Mason
March 2019
*     *     *
Desde a morte do autor, várias pessoas tem contado trechos interessantes e engraçados a respeito de sua experiência jogando ou mestrando com Masks of Nyarlathotep.

Eu joguei Masks em duas oportunidades e narrei uma vez, e é realmente uma campanha diferente. Não apenas por ser extremamente longa, detalhada e difícil, mas por permitir grandes momentos. Praticamente todos os capítulos possuem um grande momento em que o mestre e os jogadores tem a oportunidade de brilhar através de descrição e interpretação, e é isso, na minha opinião, que ajuda a construir uma grande história.

Minha história a respeito de Masks vem de quando eu joguei pela primeira vez. Comprei o Complete Masks of Nyarlathotep em meados de 1998 para um amigo narrar para o grupo. Nós estávamos vindo de Horror on the Orient Express e ansiosos por uma nova campanha de Chamado de Cthulhu. 

Na segunda aventura, jogamos na casa de um colega, um veterano de muitas sessões de Cthulhu. Ele interpretava um explorador britânico de família nobre. Seu background incluía um conhecimento profundo de história, arqueologia e antropologia, que nós havíamos decidido, seria extremamente valioso para o grupo quando viajássemos para a África e para a Ásia onde ele possuía uma série de contatos.

Pois bem, na aventura em Londres, o grupo já havia perdido dois membros em Nova York (quem já jogou a campanha sabe como esse capítulo pode ser brutal). O jogador em questão teve de fazer um novo personagem e o explorador britânico parecia uma boa aposta!

Infelizmente, o sujeito que deveria ter sido o responsável por nos guiar através de selvas, desertos e territórios inóspitos não sobreviveu a sua primeira aventura.

Não é ter perdido o personagem ou ter perdido de maneira feia que torna essa história curiosa, mas o fato de como o jogador tentou evitar sua morte. Muitas vezes, havíamos comentado o quanto era absurdo que no livro de regras de Chamado de Cthulhu (5a edição) havia as estatísticas para uma Armadura africana confeccionada com couro de elefante. Ninguém jamais havia ousado pedir ao mestre para ter algo semelhante pois ela era considerada uma apelação absurda.

Pois bem... o jogador, conseguiu convencer nosso mestre (sabe-se lá como) a permitir que ele tivesse uma armadura africana de pele de elefante em sua mansão londrina. Talvez o mestre não esperasse que ele tivesse a coragem de usar por conta das risadas que aquela apelação haviam rendido entre os jogadores anteriormente. Mas já diz o ditado: "Nunca subestime a capacidade de apelação dos seus jogadores". 

Em determinado momento da aventura, nós investigadores, tínhamos que seguir os rastros dos cultistas e descobrir o antro secreto onde eles estavam realizando seus rituais. O grupo se armou e preparou para invadir o covil dos cultistas, quando então, o jogador controlando o explorador sorri e diz que seu personagem vai pegar sua arma secreta, que estava no porta malas do carro.

Não demora e ele aparece vestindo a armadura de Couro de Elefante, o que provocou risos, choque e consternação em todos na mesa. Usar aquilo era o máximo da apelação, ainda mais em um cenário em plena Londres.

Para se defender o jogador disse: "Ora, meu personagem é um explorador!" e depois completou em um sussurro apenas para os demais jogadores - "além do mais, é Masks of Nyarlathotep, essa campanha é má demais e não quero perder outro personagem!"

Para encurtar a história, o grupo entrou no covil dos cultistas: enfrentou cenas que custaram sanidade, deram tiros pra todo lado e finalmente uma criatura dos confins do espaço/tempo foi invocada e lançada contra o pobre grupo. Nosso amigo com armadura de pele de elefante, até então, havia conseguido driblar os ataques normais, tiros e facadas, mas quando teve que enfrentar o bicharoco de outra dimensão, o reforço não adiantou nada. O grupo resolveu fugir, mas usando a couraça reforçada, o sujeito não conseguia correr... acabou se tornando um alvo fácil para o monstro. Não vou entrar em detalhes sanguinolentos, mas posso assegurar que ele nunca mais foi visto novamente.

E o pior de tudo é que o sujeito na armadura de Couro de Elefante acabou sendo a única baixa daquela sessão memorável. E claro, depois daquilo, ninguém jamais deixou ele esquecer que foi o ÚNICO JOGADOR ATÉ HOJE A USAR A MALDITA ARMADURA DE COURO DE ELEFANTE EM UMA AVENTURA DE CHAMADO DE CTHULHU.

Boa campanha! 

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