quarta-feira, 20 de janeiro de 2021

Caverna Proibida - Os misteriosos painéis rupestres de Lascaux


Nós ainda estamos muito longe de documentar e compreender todos os grandes mistérios da nossa Pré-História. Contudo, há lugares que nos permitem ter um breve vislumbre do passado remoto. Ao redor do mundo, certos lugares escondidos de nosso olhar, encontram-se preservados como verdadeiras cápsulas de tempo que resistiram a passagem das eras e encontram-se exatamente iguais a como eram na aurora de nossa existência.

Um destes lugares aguardou sepultado em meio a escuridão e esquecimento por dezenas de milhares de anos. Enquanto a marcha das eras seguia seu curso natural, ele permanecia estacionado no período em que nossos antepassados o usaram como uma tela para expressar sua criatividade. Localizado no interior da França, trata-se de um magnífico complexo subterrâneo de cavernas e túneis que se estende por quilômetros abaixo da superfície. Mas o que realmente chama a atenção nele são as enigmáticas pinturas deixadas por homens pré-históricos.

Sua descoberta foi considerada um divisor de águas na arqueologia. Ela demonstrou toda a engenhosidade dos homens primitivos e abriu as portas para conceitos que revolucionaram nossa forma de ver o passado. Contudo, após a sua descoberta, as cavernas foram novamente seladas, mantidas fora do alcance da maioria das pessoas; seus segredos hoje são conhecidos apenas por alguns poucos pesquisadores e especialistas. 

A fantástica descoberta arqueológica, uma das mais importantes da era moderna aconteceu por mero acidente. Em 12 de setembro de 1940, um rapaz de 18 anos chamado Marcel Ravidat estava explorando as montanhas próximo do vilarejo de Montignac na região de Dordogne, na companhia de seu fiel cão. Era um dia perfeitamente normal até que o animal encontrou um buraco na encosta da colina conhecida como Lascaux (lê-se Lascô). Ravidat achou que aquilo era um perigo e que uma pessoa andando por ali poderia cair na fissura e desaparecer. Ele chamou alguns amigos com a intensão de fechar o buraco antes que acontecesse um acidente. Os amigos o acompanharam até o local e verificaram a fissura, descobrindo que ela era muito mais profunda do que imaginaram. Amarraram uma lanterna na ponta de uma corda e a desceram pela rachadura descobrindo que ela media aproximadamente 15 metros. A imaginação dos rapazes se concentrou então no que poderia existir oculto naquela escuridão indevassável. Imaginavam incríveis maravilhas e quem sabe até tesouros perdidos. De certa forma, estavam certos!

Marcel Ravidat e seus amigos mostram a sua descoberta

Um grupo de acadêmicos explora as cavernas logo após a descoberta

O grupo formado por quatro rapazes escavou a borda da fissura o bastante para que um deles fosse capaz de escorregar para dentro. Amarraram uma corda em sua cintura, enquanto ele escalava usando uma segunda como guia. Na cabeça levava um capacete de mineiro com uma lanterna presa que permitia enxergar em meio às trevas. Assim, ele se tornou a primeira pessoa em milênios a penetrar na caverna e em um mundo perdido.    

O poço conduzia até uma câmara estreita com um túnel baixo com pouco mais de 70 centímetros de largura. O rapaz teve de se arrastar através desse corredor por quase três metros até encontrar uma câmara maior que na luz de sua lanterna parecia não ter nada de mais. Entretanto, a medida que ele concentrava a luz da lanterna nas paredes lisas, uma miríade de desenhos começou a surgir na luminosidade tênue, pinturas antigas que representavam estranhos animais, homens e curiosos símbolos abstratos, tudo retratado com tinta vermelha, amarela e preta. Excitados com esse incrível painel, verdadeira janela para o passado, os rapazes retornaram no dia seguinte e exploraram mais fundo no complexo, encontrando novos corredores e alcovas, todas adornadas com as mesmas pinturas misteriosas. As Cavernas de Lascaux eram uma verdadeira galeria de arte da antiguidade, suas paredes recobertas com os mais bem preservados e impressionantes murais de arte rupestre encontrados até então.

Sabendo que haviam feito uma descoberta de importância transcendental, os rapazes retornaram para Montignac onde compartilharam a incrível descoberta com um professor. Estes entrou em contato com outros pesquisadores conceituados. A arqueologia na França estava em seu ápice, com achados sendo feitos regularmente desde que o Incidente Glozel acendera o fascínio por tais descobertas. Lascoux era entretanto a maior de todas as descobertas.       


Detalhes do interior das Cavernas de Lascaux

Nas semanas seguintes, experientes espeleólogos exploraram o subterrâneo mapeando suas cavernas e perfazendo os caminhos. Descobriram que ela se dividia em várias áreas cada qual formada por centenas de câmaras, a maioria delas contendo as notáveis pinturas. As representações deixadas nas paredes traziam uma variada fauna, que incluía pássaros, alces, ursos, equinos, auroques e grandes felinos, bem como animais que não existiam na Europa há milênios como leões, girafas, mamutes e rinocerontes. Traziam ainda figuras humanas bastante detalhadas além de símbolos abstratos como círculos, triângulos e losangos e também sóis, luas e estrelas. A natureza pré-histórica surgia em desenhos de plantas, árvores e até paisagens conforme foram apreciadas pelos olhos de homens num passado remoto.  

A maioria dos desenhos de animais retratavam antepassados de animais atuais e outros extintos há tempo. Outros desenhos, mais estranhos e perturbadores retratavam animais desconhecidos e seres monstruosos que provavelmente identificavam deuses e demônios da antiguidade. Homens com chifres de alce, criaturas humanoides com pele de pantera, monstros com aparência de bisões mas dotados de terríveis presas e garras, além de pássaros monstruosos com asas gigantescas. O que eram essas coisas? Teriam elas existido? Ninguém sabe se foram vistas ou se não passam de uma invenção dos artistas primitivos nascidas de suas superstições. 

Os pesquisadores dataram a caverna como pertencente ao Paleolítico Superior. Provavelmente elas serviram com abrigo para um grande número de pessoas, contudo em determinado momento de sua ocupação, ela se tornou algo muito mais importante e marcante. Um tipo de templo ou quem sabe até galeria onde os homens antigos vinham para ver, conhecer e quem sabe até venerar aquelas imagens. Cobrir as paredes com todos aqueles painéis deve ter demandado gerações, com o segredo de retratar o mundo à sua volta, sendo passado através da tradição oral.    


Representações de animais nas paredes da Caverna 

Os desenhos foram executados com pigmentos minerais, mas a medida que foram se tornando mais e mais elaborados é possível perceber o uso de outros ingredientes misturados para criar a tintura. Cada desenho cobre as paredes de rocha nuas e lisa que realmente parece uma tela apenas aguardando por um artista. Mesmo onde ângulos e curvas se formavam naturalmente, as paredes foram pintadas, incorporando às representações o traçado da caverna. Em geral, as pinturas apresentam enorme grau de habilidade e cuidado em sua criação, evidenciando uma habilidade artística nata e técnicas que até então se imaginava desconhecidas pelos homens pré-históricos. 

Entre as diferentes seções das cavernas encontra-se uma câmara batizada como Salão dos Touros, que apresenta paredes cobertas de representações de touros, búfalos, cavalos e cervos, incluindo uma imensa imagem de um touro medindo mais de 5 metros de comprimento. Outra câmara é chamada de "Nave", e contém uma famosa pintura conhecida como "O Bisão Cruzado" que usa um aprimorado truque de perspectiva muitíssimo avançado para a era em que foi concebido. Em outra câmara menor batizada como Abide (Ápice), temos uma parede coberta por centenas de pequenas pinturas que sugerem terem sido feitas ao longo de séculos por diferentes artistas cada qual com uma técnica distinta. Várias outras câmaras se estendem pelo complexo, cada qual com nomes sugestivos como "Fosso do Homem Morto", "A Câmara das Gravações", "A Galeria Pintada", "Câmara dos Felinos" e assim por diante.

Toda a Caverna de Lascaux é de tirar o fôlego um trabalho majestoso que até hoje desafia nossos conceitos e preconceitos sobre nossos humildes antepassados.


Representações antropomórficas mostrando caçadores e presas 

Contudo, a Caverna também possui uma aura de mistério que é debatida desde sua descoberta. Há muito o que não sabemos a respeito dela e que permanece envolto em dúvidas.

Uma das questões mais debatidas envolve a idade das pinturas. Nunca se chegou a uma conclusão definitiva sobre o quão antigas elas são. Pelas espécies de animais retratados e as várias ferramentas encontradas largadas pelas cavernas, acredita-se que o lugar tenha sido ocupado em um período entre 17,300 a 20,000 anos atrás, mas ainda existe muitas dúvidas à respeito. 

Outra questão central diz respeito aos motivos para as pinturas terem sido feitas em primeiro lugar. Embora existam várias outras pinturas rupestres cobrindo as paredes de cavernas em toda região, nada chega sequer perto da escala megalomaníaca que encontramos em Lascaux. Isso sugere que o lugar era de alguma forma importante, tendo um significado especial para as pessoas que a fizeram. Há teorias de que as pinturas teriam sido criadas como uma forma de aprendizado para crianças, como um modo de explicar o mundo exterior antes de permitir que elas deixassem a segurança da família. Outra possibilidade é que as imagens estivessem ligadas a um tipo de misticismo primitivo no qual a representação devidamente "capturada" nas paredes serviria para obter parte da força do que era retratado. Ou seja, ao pintar um mamute, por exemplo, o artista trazia parte da sua força ou resistência para a caverna e aqueles que dormiam aos pés da imagem seriam de alguma forma "abençoados" pelas características daquele ser, ganhariam ao menos em parte sua força e resistência. Nesse sentido, as imagens teriam uma serventia similar aos totens animistas usados por povos que adotavam animais como seus espíritos guias.

Uma possibilidade é que as paredes contavam histórias sobre lendas, mitos e grandes feitos realizados por heróis da tribo. Uma importante caçada podia ser retratada numa determinada câmara e antes de uma nova caçada ser realizada, os envolvidos sentavam aos pés da pintura para contar a história e compartilhar a experiência. Desse modo, acreditavam que seriam abençoados e teriam o mesmo grau de sucesso.

Como as Pinturas de Lascaux foram feitas pelos homens primitivos


Outro detalhe que torna a façanha ainda mais impressionante é que parte dos pigmentos usados nas pinturas se vale de óxido de manganês substância que não está presente na área. Estudos da composição geológica apontam que a única fonte desse material se encontra a 250 quilômetros, significando que os artistas tinham de empreender jornadas consideráveis para obter os ingredientes necessários para fazer suas obras. Além disso, teriam que produzir uma mistura usando proporções perfeitas de gordura animal para produzir a tinta. 

Seja como for, a maioria das perguntar permanecem sem uma resposta visto que cada vez menos pessoas recebem autorização para conhecer as Cavernas de Lascaux que se tornaram nas últimas décadas um lugar proibido para os curiosos.

Nem sempre foi assim! As cavernas um dia foram abertas ao público atraindo um número cada vez maior de visitantes interessados em ter um vislumbre do passado. Em 1948, ano em que as Cavernas abriram pela primeira vez para turistas, uma verdadeira multidão foi até lá. Contudo, as análises dos cientistas concluíram que essa súbita movimentação causou uma alteração na temperatura, no nível de luminosidade e humidade nas cavernas, fatores que ameaçavam seriamente as pinturas.

Por volta de 1960 descobriu-se concentrações de cristais, algas e liquens crescendo na caverna, elementos que foram sem dúvida trazidos de fora. Em 1963, as cavernas foram definitivamente fechadas para o público e apenas estudiosos credenciados passaram a receber autorização para visitá-la. Mesmo assim, em 2000, um tipo de contaminação de bolor branco tomou as pinturas causando danos irreparáveis. A ameaça retornou em 2007 na forma de uma espécie desconhecida de fungo que se espalhou por algumas câmaras.

Uma vez que esses problemas constituem uma ameaça constante à integridade do sítio, o acesso de visitantes foi ainda mais limitado, significando que ainda menos pessoas recebiam o privilégio de ver as pinturas de perto. Mesmo pesquisadores conceituados e experts em seus campos, tiveram pedidos de visitação negados. Tudo isso torna o estudo das pinturas um processo lento e agonizante com apenas uma elite acadêmica especialmente constituída gozando do privilégio de explorar o local. O mais perto que a maioria das pessoas pode chegar das Cavernas é um túnel adjacente que revela apenas uma pequena parcela das maravilhas ocultas.

Isso não impede que de tempos em tempos algumas pessoas tentem invadir ou penetrar na área proibida. Apenas em 2017 houve seis tentativas de invasão, com os envolvidos capturados e multados em milhares de euros.

Com toda essa aura de mistério e proibição a respeito das Cavernas de Lescaux, Teóricos da Conspiração formularam hipóteses a respeito dos "reais motivos" para que o acesso seja tão restrito. Pare estes, as Cavernas embora frágeis à contaminação, foram lacradas por outras razões. 



Em 1962, boatos a respeito da descoberta de uma nova e mais impressionante câmara nas profundezas do complexo foram alardeados por estudiosos. Estes imediatamente exigiram que o acesso de visitantes ao local fosse proibido para a realização de estudos. A caverna foi isolada e entre os meses de maio a outubro daquele ano apenas um grupo de acadêmicos selecionados teve permissão para entrar nas cavernas e conhecer as tais descobertas. Pouco depois, alguns experts vieram à público e relataram que o que havia sido descoberto era um poço que levava a uma nova galeria. Fotografias da área foram apresentadas, mas ninguém além dos estudiosos recebeu permissão de conhecer o lugar. No ano seguinte a caverna foi definitivamente fechada para visitantes.

Algumas pessoas acreditam que a descoberta de uma câmara contendo pinturas de alguma forma sensíveis para o público em geral, deu causa ao fechamento do complexo. 

Mas o que poderiam ser essas pinturas tão chocantes?

Os teóricos defendem que as pinturas se dedicariam a algo inesperado, algo inexplicável ou que lançaria uma dúvida sobre a própria origem do homem. Supõem que nessas paredes mantidas em segredo constariam representações de entidades divinas aos olhos dos homens primitivos. Na verdade seriam seres alienígenas, objetos voadores, passagens dimensionais e até de paisagens extraterrestres para onde os artistas de Lascaux teriam sido levados em algum momento. Posteriormente, estas pessoas teriam retornado e retratado nas câmaras mais profundas tudo aquilo que viram.

Obviamente todas essas teorias controversas carecem de confirmação e até onde se sabe existem apenas no campo das hipóteses. Oficialmente as Cavernas de Lascaux constituem um frágil tesouro arqueológico que precisa ser protegido à todo custo.      

É triste pensar que peças tão importantes sobre nosso passado tenham de ficar escondidas por sabe-se lá quanto tempo, até que surja uma solução para sua deterioração. Mas será que haveria algum motivo ulterior para todo segredo que recobre esse lugar?

Quem sabe um dia possamos entrar novamente nas Cavernas Proibidas e saber de uma vez por todas, vendo com nossos próprios olhos, o que nossos antepassados mais distantes deixaram como seu mais valioso legado. 

2 comentários:

  1. 'Este'. Excelente, um dos melhores artigos tratando de arqueologia que já li nesse blog. Talvez o melhor.

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  2. OLÁ!!!
    Se LASCAUX interessa, qual o motivo que o sítio de GLOZEL foi esquecido, já que são da mesma época?

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