terça-feira, 13 de outubro de 2020

A Raça Ancestral - Parte 2: Do Ocaso ao desaparecimento


Mesmo uma civilização quintessencial, com milhões de anos, pode experimentar seu ocaso e foi isso que aconteceu com os Antigos.

O passar das Eras deixou marcas profundas e mesmo a Raça Ancestral passou a sentir os efeitos do prolongado período de guerras contra poderosos adversários. Não se sabe quando ou como, mas a espécie, em determinado momento, também havia perdido o contato com os demais de sua espécie. Milhões de anos na Terra fizeram com que eles mudassem e se tornassem cada vez mais aborígenes incorporando traços que os diferenciavam daqueles seres alienígenas que haviam chegado milhões de anos antes. Com efeito, eles perderam a capacidade de voar além da atmosfera e romper os limites planetários - a Terra, inicialmente sua Colônia, tornara-se cada vez mais seu definitivo Lar.

Como um todo, eles se adaptaram às condições planetárias cá encontradas. Suas asas membranosas haviam atrofiado, seus longos e elegantes tentáculos se tornavam cada vez mais curtos e semelhantes a nadadeiras e eles respiravam sob a água. Os mares, aliás, passaram a ser seu habitat principal, as profundezas marinhas assistiam ao último suspiro da raça enquanto eles comandavam os Shoggoth na edificação de muralhas para suas novas cidades submarinas.

Mas há cerca de 65 milhões de anos no passado, a Terra enfrentou uma nova e mais dramática catástrofe. Há diferentes conjecturas sobre o que se bateu sobre o planeta, hoje, a maioria dos pesquisadores acreditam que teria sido o choque de um meteoro de dimensões consideráveis, possivelmente atingindo a atual Península do Yucatan. Este teria decretado a extinção dos grandes répteis em uma hecatombe. 


Mas há rumores de que essa tragédia possa ter sido causada em decorrência de algum experimento científico misterioso conduzido pela Raça Ancestral. O próprio meteoro destruidor pode ter sido atraído pela ciência deles, mas há outras possibilidades ainda mais assustadoras.

Naqueles tempos, a Raça Ancestral estava envolvida com a criação de engenhos cada vez maiores e perigosos. Talvez em busca de uma renovação de sua importância cósmica, eles mergulharam numa busca por algo grandioso; um mecanismo conhecido como Armadilha Divina. O conceito dele é complexo demais para a mente humana compreender, mas em linhas gerais seria como uma dimensão artificial, fabricada para atrair, capturar e confinar seres de imenso poder. O propósito dela escapa à compreensão, mas supostamente envolveria obtenção de fontes de energia.

O ousado empreendimento foi instalado sob a grande Capital na Antártida, sob as montanhas do Continente. Ele teria sido acionado uma única vez, ocasião em que capturou uma entidade desconhecida de poder incomensurável. A máquina foi submetida à enorme pressão e por pouco não acabou exaurida, mas no fim ela cumpriu seu propósito. O processo, no entanto, pode ter atraído o meteoro, ou resultado em uma explosão monumental, não se sabe ao certo. A única certeza é que algo devastador ocorreu logo em seguida e o planeta enfrentou um período de instabilidade. Com efeito, mudanças climáticas acentuadas aniquilaram formas de vida incapazes de se adaptar às alterações, em especial os grandes sáurios. O que, a longo prazo, favoreceu o desenvolvimento dos mamíferos e da raça humana.


A mesma catástrofe também atingiu a Raça Ancestral em cheio. Várias cidades foram destruídas pelos terremotos resultantes e foram responsáveis pelo surgimento da cordilheira mencionada pela Expedição Miskatonic em 1931. Muitas cidades submarinas foram varridas da existência, despencando em trincheiras subaquáticas que as engoliram para sempre. O temor se instalou sobre a maioria dos indivíduos subitamente flagelados e estes começaram a convergir para a cidade primordial que os havia recebido na aurora dos tempos. Gradualmente as demais cidades foram se esvaziando com seus habitantes migrando para a Antártida. Talvez a essa altura, muitos já soubessem que o ocaso estava próximo e que a espécie necessitava se juntar caso quisesse perdurar por mais alguns milhões de anos. Outra possibilidade é que o aparato demandasse a presença dos membros da espécie que se sentiam responsáveis pela sua manutenção permanente. 
 
Mas apesar de todos percalços, a sociedade perdurou adotando uma nova postura na qual abraçava sua nova condição como expectador e não protagonista. Nem mesmo a presença dos primitivos Abissais os incomodavam, quem dirá o surgimento de espécies conscientes na superfície. Essa foi a deixa para outras espécies surgirem e se desenvolverem no planeta até então domínio exclusivo dos seres primordiais. 

Isso trouxe um curioso desafio, lidar com a exaustão e tédio após tantas gerações. De alguma forma, a Raça Ancestral parecia estar exaurida de propósito e sabendo disso abraçou o rápido declínio. Os Shoggoth percebendo isso, ainda tentaram uma derradeira revolta, mas esta foi sufocada. 


A medida que o frio congelante se acentuava, cobrindo a luxuriante selva da Antártida com um manto branco de neve, a capital também entrou em declínio. Os prédios e esplanadas foram abandonadas e as muralhas sem manutenção ruíram diante da passagem dos milênios. Aos poucos, seus habitantes sonolentos foram se retirando voluntariamente para os oceanos gélidos, sem desejar ter mais nada a ver com o mundo da superfície. Eles passaram a habitar um vasto complexo submarino formado por cadeias de icebergs e labirintos de gelo, onde possivelmente ainda vivem, ocultos de todos os demais seres.

Aos poucos os resquícios da passagem da Raça Ancestral foram desaparecendo da superfície da Terra. Embora duradoura, sua existência espartana deixou uma quantidade relativamente pequena de artefatos na superfície. Mesmo as cidades, obras de arquitetura magnífica, sumiram, vindo a ser ocupadas por outras raças do Mythos, ou sendo apagadas pela presença dos primeiros humanos evoluídos. Alguns destes lugares, afastavam naturalmente os homens e os faziam partir em busca de locais menos assombrados pelos seus antigos habitantes. Na Amazônia, nos desertos da Arábia, na Patagônia e na África do Sul ainda podem ser achados os restos de sua passagem, enterrados sob montanhas ou engolidos pelas selvas impenetráveis.

Os poucos que se atrevem a vasculhar essas localidades, onde o eco das vozes da Raça Ancestral ainda podem ser ouvidos, são feiticeiros, místicos e dementes. Guiados por sonhos ou linhas tortuosas escritas em tomos esquecidos, eles são atraídos como mariposas para o fogo crepitante. Estes aventureiros recolheram avidamente o que podiam coletar das eras passadas e guardaram esses artefatos como tesouros inestimáveis, tendo alguns deles iniciado cultos e sociedades secretas. Alguns até chegaram à nossa era moderna, tornando-se os curiosos "artefatos fora do tempo" que por vezes emergem de escavações causando surpresa e assombro. Mesmo a controversa teoria dos "Deuses Astronautas" popularizada no século XX, parece encontrar paralelo na Raça Ancestral.


Poucos traços da Raça Ancestral foram encontrados, a não ser é claro, pelos confusos relatos obtidos por expedições como a da Universidade Miskatonic (1930-1931) e pela sua sucessora a Starkweather-Moore (1937) que supostamente encontraram não apenas as ruínas da Capital Antártica, mas espécimes preservados da Raça Ancestral. Considerando o resultado desastroso de ambas as expedições, o contato com a Raça Ancestral parece ser fortemente desaconselhável. Como cientistas práticos, qualquer interação, parece ser vista por eles, como uma oportunidade para estudo biológico. Nada além disso.

Há uma teoria, defendida por cientistas russos nos anos 50, que teriam encontrado registros da Raça Ancestral apontando que a raça humana teria sido idealizada pelo seu potencial mental. Indo mais além, estes mesmos cientistas afirmam que seria um plano de nossos arquitetos nos usar como recurso quando formos capazes de atingir a plenitude desse potencial. Os relatórios do Projeto Kharkhov (atualmente desativado), projetavam que a capacitação psíquica do homem estaria sendo aguardada pela Raça Ancestral que continuaria nos observando. Mas não há corroboração de tais teorias.

De qualquer forma é essencial se ater às proporções. De modo algum se pode considerar a humanidade, um mero subproduto de uma avançada ciência genética, no mesmo patamar que a Raça Ancestral, com suas centenas de milhões de anos. A mera presunção de tal coisa seria cômica, se tais seres tivessem capacidade para compreender ironia. Quando muito, a raça humana, é para eles, uma forma de vida inferior e simplória, ainda que, mais desenvolvida que as demais, plantadas no planeta. 

Talvez isso explique a razão para os cientistas deles terem dissecado todos humanos por eles capturados. Quem pode saber quais as implicações que traria um súbito interesse por parte dessas criaturas a respeito de nós. Melhor nem contemplar tal possibilidade, pois se há uma verdade a respeito da Raça Ancestral é que atrair sua atenção representa um grave risco para nossa existência.

4 comentários:

  1. Parabéns por esse post incrível é espetacular!Dito isso,gostaria de pedir que falassem sobre a expedição Starkweather-Moore e o Projeto Kharkhov do mesmo modo que fizeram com a expedição de 1931.

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  2. se até uma civilização alien super avançada com milhões(se não bilhões) de anos de idade pode cair assim então que esperança tem a humanidade no universo dos mythos? o niilismo é pesado.
    ótimo post.

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