quinta-feira, 13 de janeiro de 2011
Síndrome de Scooby Doo - Como lidar com grupos que se dividem
Todo mundo lembra de Scooby Doo.
No meio do desenho, Fred e Daphne decidem buscar pistas por um lado, enquanto Salsicha, Velma e Scooby (devidamente subornado com um biscoito canino) acabam indo pelo outro. Da mesma forma, grupos de RPG acabam se dividindo.
Isso acontece em qualquer ambientação: um dos jogadores decide se separar dos demais para perseguir algum objetivo ou investigar uma pista que apenas ele acha importante ou que apenas ele julga compreender.
O mestre é obrigado a separar o grupo para evitar o meta-gaming. Os outros jogadores na mesa enquanto esperam, começam a perder o interesse e dispersar a atenção com conversas paralelas. A fluidez da narrativa é comprometida, o jogo se torna moroso.
Se você já assumiu o papel de mestre, então provavelmente esteve diante dessa situação. A frustração de querer seguir adiante com a narrativa, mas não poder fazê-lo em face do desejo de um ou mais jogadores de agir em separado, é um fator de complicação.
Isso tende a acontecer muito em jogos investigativos, onde os personagens, sobretudo no início das investigações, não temem se separar voluntariamente - coisa que muda muito em aventuras posteriores quando o clima de paranóia se instala. Em cenários investigativos é bem comum que o grupo queira se dividir, principalmente quando as pistas são coletadas e as decisões são tomadas para checar cada ponta solta.
Eu costumo driblar as separações de grupo com um mantra que não canso de repetir em minhas mesas. O mantra é o seguinte:
"Normalmente dividir o grupo para investigar as pistas em separado, seria o mais lógico a se fazer nesse caso. Isso sem dúvida pouparia tempo. Porém (e aqui eu saliento bem a natureza adversativa da frase) separar o grupo significa que alguns jogadores vão ficar por longos minutos olhando para o teto. Então para evitar isso, que tal TODOS seguirem juntos. Eu sei que não é o que aconteceria na vida real, mas prometo que vou relevar qualquer implicação decorrente do número de personagens presentes na cena".
Em geral os jogadores concordam com essa proposta e as coisas funcionam, mas existem casos em que separar o grupo se faz necessário. Torna-se importante que haja alguns segredos entre os jogadores e que a personalidade independente de alguns personagens tipo "lobo solitário" possa aflorar.
Como então lidar de forma rápida e concisa com essa situação?
Com o objetivo de tornar uma divisão de grupo menos dolorosa para todos, seguem algumas dicas:
1 - Lembre-se que enquanto você dá atenção a um jogador, outros estão esperando. Trata-se de uma questão de cortesia com os demais resolver as cenas particulares com presteza.
Portanto, regra número 1 para cenas particulares: "Vá direto ao ponto".
Nada de brincadeiras, fofoca ou papo furado que vão torná-la desnecessariamente longa. Se o jogador estiver demorando muito, lembre a ele que outros estão esperando. Se ele insistir corte a cena e resolva a situação com rolamentos de dados.
É importante dar atenção a todos os jogadores. Nada cria maior ressentimento em uma mesa de jogo do que um único jogador/personagem recebendo toda a atenção do mestre enquanto os demais são negligenciados. Se você tiver de separar o grupo e conceder atenção a um personagem por algum tempo, tente equilibrar as coisas concedendo algum tempo aos outros que ficaram de fora.
2 - Divisões podem ocorrer porque certos personagens sentem que a presença de outros pode atrapalhar a tarefa desejada. Ainda que isso em alguns casos possa ser verdade, nem sempre é o que acontece.
Em cenários investigativos por vezes, o que se precisa é de alguém que esteja atento aos detalhes e que tenha um pequeno insight. Seja reparando em algum maneirismo, em algum tique nervoso ou em algum detalhe que escapa a todos os outros.
Um pequeno detalhe pode ser mais significativo do que se pensa.
Saliente isso com os demais jogadores e lembre a eles que um par adicional de olhos e ouvidos, sempre podem vir bem a calhar.
3 - Por vezes um personagem se separa do grupo para cumprir uma agenda secreta. Se possível, tente fazer essas cenas antecipadamente, de preferência antes de começar a aventura.
Se for inevitável e tiver de acontecer no meio da narrativa, tente fazer com que o jogador seja criterioso e explique claramente o que deseja para que a situação se resolva de forma mais rápida.
O keeper não precisa "correr com a cena", mas deve buscar um equilíbrio para que a cena solo não se estenda desnecessariamente. Muitas vezes é do interesse do próprio jogador manter suas atividades em segredo e resolver rapidamente o particular com o mestre é uma forma de não chamar demasiada atenção dos demais jogadores.
4 - A divisão do grupo não significa que combates não possam vir a ocorrer. Muitas vezes é até lógico que os antagonistas dos personagens esperem que um deles esteja sozinho para atacar. Instituir um clima de paranóia é uma meneira de diminuir as separações do grupo. Jogadores que sofrem um atentado uma vez e sobrevivem, dificilmente vão se aventurar solitariamente novamente.
Se um combate acontecer, tente fazê-lo rapidamente e com total discrição. Busque ocultar rolamentos de dados ou gestos para que os demais jogadores não fiquem sabendo das coisas antes da hora. Aliás, o ideal é que o mestre tenha um local para onde pode seguir com o jogador que se separa afastado dos olhos curiosos dos demais jogadores.
5 - Assegure-se de que a divisão do grupo vai trazer algo significativo para o jogo antes de concordar em fazê-la. Se os personagens decidem se separar para que possam cuidar de diferentes tarefas e um deles insiste em fazer um roleplay demorado, faça a si mesmo a seguinte pergunta: "O que essa cena acrescenta ao jogo"?
Se a resposta for "nada" ou "muito pouco" corte a cena e siga em frente para que o grupo possa se reunir o quanto antes.
Não se trata de cercear a interpretação do jogador, mas deixe claro que a aventura precisa fluir. O mestre tem a decisão final e ele tem que exercer essa autoridade se for necessário trazer o domínio da narrativa de volta às suas mãos.
Da próxima vez antes de dizer "ok pessoal, vamos nos separar" lembre-se daqueles garotos enxeridos e daquele cachorro vira-latas.
Ótimo artigo. Eu trabalho nas minhas mesas de jogo várias vezes com a separação do grupo e claro, passo por alguns problemas. Para resolver isto, resolvi das corte nas cenas, mesmo em momentos de climax ou estresse, cortando um jogador e iniciando ou dando continuidade na cena de outro jogador. Isto não é fácil, mas ganha ares de história em quadrinho ou mesmo filme, onde muita coisa acontece ao mesmo tempo. Outro ponto positivo é que impede o meta-jogo visto que o sentido de "tempo real'fica no ar. Claro, perco alguns pontos de sanidade, mas até ai vale a pena sim!
ResponderExcluirUtilizo este recurso quando quero valorizar momentos da aventura em que uma informação importante não deve ser passada a todos de uma só vez ou que cria algum tipo de mistério e urgência!
Ótimo comentário, muito útil para mestres! Grato!
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