NPCs (Non-Player Characters - Personagem não-jogador) são parte importante de qualquer cenário de RPG.
Em geral, os NPCs são personagens secundários mais ou menos descartáveis que entram e saem da vida dos personagens principais acrescentando uma pequena informação, ajudando em algum momento oportuno ou "fazendo escada" para eles brilharem.
Nem todo NPC precisa ser memorável. De fato, alguns podem ser apenas parcialmente perceptíveis em uma narrativa: o atendente que sabe quem são os moradores mais ricos da cidade, o guarda que vigia o portão à noite e sabe quem chegou recentemente ou a vizinha fofoqueira que está sempre espionando a vida alheia. Esses personagens depois de serem consultados e lançar sua informação começam um gradual processo de desaparecimento, até sumirem por completo da memória dos jogadores.
Outros entretanto, acabam conquistando seu espaço, lançando uma sombra sobre tudo que os personagens principais fazem, tornando-se em alguns momentos eles próprios personagens memoráveis na trama. Exemplos típicos são o fiel mordomo que segue os investigadores em sua missão ao redor do mundo, o guia nativo que é incorporado ao grupo depois de salvar a pele deles em uma difícil negociação ou a secretária atrapalhada do detetive particular sempre disposta a se meter na investigação mesmo quando não é convidada.
Enquanto NPCs são essenciais para o funcionamento de um cenário, muitos mestres tem pouco tempo (ou disposição) para trabalhá-los e dar a eles a chance de se tornarem indivíduos na trama. Uma das maneiras de construir um bom NPC é focar nas razões deles estar no jogo. A partir disso, o mestre pode definir se o NPC merece ou não um pouco mais de espaço.
Os NPCs podem ser divididos em categorias baseadas em sua importância para o cenário. Eu gosto de identificá-los na seguinte ordem: Extras, Secundários, Recorrentes e Coadjuvante.
Figurantes
Os Camisas Vermelha em Star Trek entram e saem de cena sem nome. |
Esses NPC não precisam de motivação, menos ainda de fichas ou estatísticas — apenas uma breve descrição do que eles fazem e qual a sua serventia em um dado momento da aventura. Um figurante provavelmente sequer terá um nome, embora seja válido, o mestre manter uma lista de "nomes genéricos" prontos caso um dos PCs pergunte. Na maioria das vezes, não é importante saber a história de todos os NPCs que cruzam o caminho de seus personagens. Os figurantes estão ali apenas para preencher espaço e permitir a fluidez da narrativa - são como objetos de cena vivos e perfeitamente descartáveis.
Secundários
A atendente da Taverna é um ótimo exemplo de personagem secundário. |
Alguns NPC merecem um pouco mais de ponderação -- mas não muita. Alguns podem ser importantes para o desenvolvimento de uma etapa da narrativa que está sendo contada. Eles são indivíduos que têm algo a acrescentar e cujo propósito vai além de meramente figurar no fundo da cena. Em geral não precisam aparecer mais de uma vez no cenário, mas sua aparição é necessária para que a estória siga em frente.
O secundário pode ser o dono da taverna onde os Pcs se reúnem e que deseja fazer uma proposta de trabalho. Ele pode ser o advogado contratado para negociar com pessoas no submundo e achar indivíduos com certos talentos necessários para um serviço. Os secundários tem vida própria, e embora nem todos precisem de motivações, com certeza possuem um nome e características que os destacam dos meros figurantes. O mestre não precisa chegar ao extremo de descrever o secundário em detalhes, mas é interessante destacar uma ou duas peculiaridades que ajudem ele a ser lembrado.
Tome por exemplo de secundário o zelador de um prédio onde ocorreu o crime que o grupo investiga. O mestre descreve o sujeito como um senhor de meia idade, careca e relaxado que coça a barba por fazer antes de responder qualquer pergunta. Pronto: o grupo vai lembrar dele como o sujeito meio lerdo que respondeu suas perguntas lá no início da investigação. Depois de dar as informações que dispõe, a importância dele se vai e o sujeito deixa de ter importância a não ser que o grupo queira interrogá-lo novamente.
Recorrentes
Aqui os personagens começam a ter alguma importância narrativa. Os recorrentes são personagens que extrapolam o limite de uma única aparição e que podem surgir em outras circunstâncias reprisando ou não seu papel original. Obviamente eles estão presentes apenas em sequências de aventuras ou em campanhas mais longas onde eles tem tempo de conquistar seu espaço. Tome por exemplo o ajudante do diletante que recebe os Pcs na biblioteca da mansão e explica qual será a próxima missão para a qual eles estão sendo contratados. Quem sabe o recorrente pode ser o detetive de polícia, disposto a se tornar um contato valioso e revelar em que pé anda uma investigação sigilosa em troca de um agrado.
O sempre confiável Alfred é um personagem recorrente de Batman |
Esses personagens obviamente merecem ter um nome e uma descrição mais detalhada. Fichas e estatísticas podem ou não ser importantes, sobretudo se em algum momento a participação do recorrente progredir para o próximo estágio, tornando necessário saber qual suas aptidões, habilidades e capacidades. Do contrário, mantenha algumas anotações de rodapé sobre o que personagem é capaz de fazer para ajudar o grupo.
É interessante também destacar quais as atitudes e motivações do personagem recorrente para com os PCs. Uma vez que esse personagem vai aparecer repetidas vezes, sua motivação pode mudar de acordo com a maneira como ele é tratado pelo grupo.
Tente definir algumas peculiaridades para o personagem recorrente. O mestre não precisa descrever o personagem em detalhes, algumas informações, no entanto são muito bem vindas para marcar o indivíduo e fazer com que ele seja lembrado pelos jogadores.
Uma descrição adequada pode ter apenas duas ou três linhas:
"Adrian Babson é repórter do Boston Globe, um tipo bem humorado e simpático com 30 e poucos anos mas que parece mais novo por causa das sardas na face. Um pouco acima do peso ele se veste bem, com um terno risca de giz azulado e gravata com nó windsor".
Mas se você quiser ir além de caracterpísticas físicas, fique à vontade:
Talvez o sujeito fale com um leve sotaque estrangeiro. É possível que ele seja um tipo refinado e polido que jamais levanta o tom de voz e se senta emperdigado na cadeira. Quem sabe ele seja meio galanteador oferecendo cigarros e elogios à personagens femininas.
Coadjuvantes
Finalmente esse é o topo da carreira que o NPC pode almejar, ele é quase um Personagem Principal na trama.
Este personagem tem uma função essencial na aventura ou no cenário, muitas vezes movendo os acontecimentos e para isso definitivamente precisa de uma ficha e de estatísticas condizentes. Mais do que números em uma ficha, o personagem carece de personalidade e motivação que o destaque dos demais.
Seu jogo não precisa de muitos Coadjuvantes, uma aventura pode ter apenas um ou dois deles para dar o rumo na narrativa. Campanhas maiores contudo, podem ter uma grande quantidade de coadjuvantes agindo ao lado dos personagens principais e seguindo-os onde quer que eles vão.
Sallah é um coadjuvante de Indiana Jones |
Definitivamente os aliados e companheiros de seus jogadores estão nessa categoria. Esses personagens tem ainda mais importância em cenários investigativos onde o perigo espreita nas sombras podendo capturar um ou mais personagens principais. É perfeitamente aceitável que um coadjuvante venha a substituir um personagem principal que seja ferido, incapacitado temporariamente ou até mesmo eliminado da investigação. Na iminência de um coadjuvante se tornar personagem de um jogador, é interessante suas motivações e estatísticas estarem em ordem para facilitar as coisas.
"O tenente Roger McBright é seu ajudante de campo no quartel da Guarda real em Bombain. Com 20 e poucos anos, ele compensa a juventude com muita disposição. Nascido em Dover ele se alistou para poder conhecer o mundo e desde então o serviço militar o manteve ocupado. Conheceu o Cairo, Marrakesh e Bangalore onde serviu com distinção e viu um pouco de ação enfrentando um levante popular. Com grande interesse pela cultura oriental e história antiga, McBright é um sujeito responsável e bem apessoado, com uma jovialidade contagiante. Com facilidade para outros idiomas, ele se relaciona bem com os colonos e nativos".
O Vilão da trama não é um coadjuvante estando num patamar superior, mas os antagonistas imediatamente abaixo dele, seus capangas de confiança podem fazer parte da categoria de Coadjuvantes. O cultista que veste o manto cinzento e coordena os de manto vermelho no ritual blasfemo, o chefe dos assassinos armado com sua adaga recurva e o ajudante corcunda do cientista maluco são coadjuvantes que merecem um pouco mais de dedicação por parte do mestre. Eles podem não ser o chefão atrás da porta dupla, mas estão acima dos bandidos sem nome que morrem aos montes quando as balas voam pelo ar.
Chewbaca e Han Solo |
Reserve uma boa descrição para esses personagens, capriche nas peculiaridades e caraterísticas que os destacam dos outros personagens:
"Sir Reginald tem o tipo de atitude dos ricos e esnobes. Um nariz empinado e um sorriso forçado condescendente de superioridade sempre que se dirige para aqueles que ao seu ver são "inferiores". Tudo nele parece perfeitamente planejado desde o conjunto de tweed e oxford até o cabelo escuro bem aparado. Enquanto vocês se dirigem para a biblioteca ele os observa como uma aranha no meio de uma teia, ponderando sobre o melhor curso de ação. Ele não parece fazer nada sem pensar bem e definir o melhor curso de ação, é algo que os anos no comando de sua empresa o ensinaram bem".
Mas lembre-se que um coajuvante está à mercê da narrativa.
Coadjuvantes, mesmo os mais estimados morrem, são mandados para a cadeia, removidos da sociedade ou esquecidos. Para reforçar uma narrativa e mudar o panorama, nada mais interessante do que eliminar algum coadjuvante.
Como sempre,um excelente texto!!Saindo um pouco do assunto(nem tanto pois se trata diretamente sobre Lovecraft)O site "jovem Nerd" fez um podcast sobre o lendário H.P Lovecraft!!!
ResponderExcluirhttp://jovemnerd.ig.com.br/categoria/nerdcast/
Muito bom texto, simples e funcional.
ResponderExcluirMuito bacana, parabéns mais uma vez!
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