quinta-feira, 30 de março de 2023

Stonehenge Alemão - A sinistra história de morte e sacrifício no Círculo de Pömmelte


Todos que gostam do assunto ou que tem interesse no mundo antigo, obviamente já ouviram falar do famoso Monumento de Stonehenge.

O enorme círculo de pedra localizado nas planícies da Inglaterra central desafia nossas noções sobre o que os antigos eram capazes de fazer. Ele nos oferece um vislumbre do conhecimento, das tradições e da engenhosidade dos homens do passado. Muitos tentaram explicar a razão para sua construção: seria ele um local de adoração e de importantes encontros dos druidas? Um avançado calendário celestial? Ou ainda, um templo para as religiões Pagãs?

Stonehenge continua tendo muitos mistérios. Não se sabe exatamente como ele foi construído, como as imensas pedras conhecidas como megálitos - algumas com dezenas de toneladas, foram levadas até aquele lugar, quando e por quem. Não se sabe o que ele simbolizava para os povos pagãos. Que tipo de cerimônias ocorriam no entorno das pedras? Que tipo de deuses eram reverenciados? Os mistérios são tantos que levaria tempo para colocar aqui todas as questões. 

Ocorre, entretanto, que Stonehenge não é o único círculo de pedra da Europa.


A maioria das pessoas não sabe que existem muitos outros espalhados principalmente pela Europa Ocidental, em lugares que no passado tiveram enorme importância para os povos do Neolítico.   

Um dos monumentos de pedra mais interessantes é Pömmelte considerado como a versão alemã de Stonehenge. Este majestoso monumento localizado na região da Saxônia, no leste da Alemanha, é muito semelhante ao seu homólogo britânico. A construção é bastante similar, com pedras alinhadas em círculo, dispostas em posições chave que poderiam ser usadas para observar as estrelas e acompanhar seu movimento. Os druidas alemães, assim como os britânicos, observavam o céu e através das estrelas calculavam alinhamentos, a passagem do tempo e a mudança das estações. A maioria das festividades ocorriam nas datas previstas pelos sacerdotes druídicos que planejavam quando deveria ocorrer o plantio, a semeadura e a colheita. A fecundidade do solo era uma questão de sobrevivência, portanto, de máxima importância.

Assim como ocorria em Stonehënge, Pömmelte era palco de importantes rituais que atraíam pessoas. Famílias viajavam grandes distâncias para conhecer o monumento e tomar parte nas festividades que ocorriam ao seu redor. Talvez eles viessem para receber bênçãos, para oferecer seu sacrifício ou ainda para ouvir as palavras de homens sábios que comungavam com os deuses e afirmavam conhecer os segredos do universo.

Descoberto em meados de 1991, Ringheiligtum Pömmelte - o Anel de Pedras de Pömmelte foi construído com uma mistura de madeira sólida e pedras em sete círculos. Trincheiras foram escavadas e bancos de areia erguidos para assentar as traves em um trabalho que deve ter exigido a participação de muitas pessoas ao longo de décadas. Tudo isso sem máquinas, sem equipamento e dependendo quase que exclusivamente da força bruta. Por tudo isso, Pömmelte é uma façanha notável.


A análise de artefatos indica que a construção começou por volta de 2300 aC por uma cultura proto-germânica conhecida como os "Taças de Sino". Esse povo da Era do Bronze ganhou esse nome graças aos copos de beber em formato de sino que usavam no seu dia a dia. Esta cultura, sobre a qual sabemos muito pouco, foi substituída pelos Unéticos, naturais de onde hoje fica a República Checa. Existe a possibilidade que a cultura dos Taças de Sino tenha sido dizimada justamente em função do anel de pedras, já que os outros povos cobiçavam o local e desejavam usá-lo. Em algum momento do ano 2250 aC, uma cultura avançou sobre a outra e a submeteu a um massacre que devastou totalmente o povo. Como resultado, eles foram praticamente extintos.

O Povo Unético passou a usar o Círculo de Pömmelte como lugar sagrado e para todo tipo de Ritual envolvendo astronomia. Eles olhavam para o céu com reverência e seus druidas usavam o monumento como um tipo de comunicação com o plano celestial. 

Esses druidas foram os responsáveis pela criação do famoso Disco Celeste de Nebra, possivelmente a mais antiga representação conhecida do cosmos, uma espécie de mapa celeste bastante que permitia seguir o balé das estrelas e prever acontecimentos cósmicos. Para os povos antigos da Era do Bronze, saber quando ocorreriam determinados alinhamentos de estrelas e conjunções planetárias era uma vantagem enorme. Significava basicamente saber quando rezar para os deuses na esperança de que eles recebessem e ouvissem as mensagens comunicadas. Era como ter uma espécie de calendário que permitia a comunicação com as esferas exteriores.

Considerando o tamanho de Pömmelte - que tem uma área maior que Stonehenge, e a importância dele para os povos da região, é de se supor que ele atraísse muitas pessoas para as celebrações. Escavações nos arredores do monumento encontraram ruínas de habitações de pedra usadas por pessoas que visitavam o local e que precisavam de um local adequado para dormir, comer e descansar. Em algum momento, um assentamento chegou a se desenvolver ali, com a existência de pequenos templos que acomodavam druidas vindos de outros cantos do continente. É possível que estes fizessem peregrinações para conhecer os segredos do observatório primitivo e estudar a Carta Celeste de Nebra.


O trabalho dos arqueólogos iniciado em 2000 prometia grandes descobertas sobre os povos que um dia habitaram aquela região: sua cultura, seus costumes e sua sabedoria finalmente poderiam vir à tona, depois de milênios. Havia muita expectativa à respeito do que um povo tão avançado poderia oferecer em termos de conhecimento. No entanto, a descoberta de um cemitério na extremidade norte do monumento revelou que Pömmelte tinha uma história bem mais sombria do que se imaginava no princípio.

Escavando esse vasto campo funerário os pesquisadores encontraram restos de cadáveres enterrados em covas rasas. A maioria destes pertenciam a jovens mulheres e crianças com idades variando entre 2 e 21 anos. A maioria deles apresentavam fraturas cranianas graves, condizentes com golpes frontais brutais provavelmente desferidos por porretes ou clavas.  

Os cientistas concluíram que essas mortes teriam ocorrido em rituais religiosos bastante elaborados, o que aponta para o fato de que em Pömmelte ter sido um centro em que ocorriam Sacrifícios Humanos. Além dos golpes frontais que produziam uma fratura devastadora bastante comum nos restos encontrados, outras vítimas apresentavam fraturas nas mãos, dedos, joelho e múltiplas fraturas nas costelas. A análise determinou que muitos desses ferimentos poderiam ser condizentes com surras brutais ou ainda com torturas.  

"Tudo indica que no final da ocupação principal, por volta de 2050 aC, a religião local sofreu uma grande mudança de procedimento. As oferendas até então eram grãos, madeira e vinho, ocasionalmente algum animal colocados em nichos nas pedras ou ainda queimados em valas. Contudo, em algum momento isso mudou e sacrifícios humanos se tornaram comuns", disse Heinrich Spatzier um dos arqueólogos envolvidos nos estudos do círculo.


"É possível que o aceso a recursos tenha diminuído consideravelmente e que as pessoas se viram diante de um cenário onde não havia muito a oferecer. Isso motivou as pessoas a buscar outro tipo de sacrifício que pudesse satisfazer suas divindades", ele conclui.

Historicamente, muitos povos da Idade do Bronze praticavam algum tipo de ritual envolvendo sacrifício, isto não era em absoluto, incomum. Os povos germânicos pagãos eram conhecidos por louvar seus deuses através de uma série de ritos que buscavam estabelecer um contato com as divindades e honrá-los com a vida dos mortais. Em Pömmelte, contudo, isso parece ter sido levado às últimas consequências.

Há indícios de que as ruínas encontradas e que se supunha serem habitações ou pensões para visitantes vindos de longe tinham outra função. Elas poderiam ser usadas como masmorras onde futuras vítimas de sacrifícios seriam mantidas como prisioneiras. Mas pior do que simples prisões esses lugares poderiam ser usados como instalações onde estupro, tortura e morte eram realizadas comumente. Muitos dos druidas germânicos podiam exercer direito de vida e morte sobre as pessoas. Eles teriam liberdade para fazer o que bem entendessem sem temer qualquer reprovação.

Os pesquisadores ainda tentam entender quais eram as práticas sociais e religiosas da cultura Unética, que construiu a maioria das instalações hoje em ruínas. O que se sabe é que eles realmente praticavam alguns rituais que para nossos padrões seriam considerados abomináveis pela barbárie e violência. Os poucos registros que se tem, sugerem que abuso sexual (mesmo de crianças) e tortura fazia parte dos ritos consagrados. As execuções eram conduzidas no ápice dos ritos, em meio a celebrações com dança, música e bebida. O uso de substâncias alucinógenas também permitia aos druidas ter visões. No final do rito um sacerdote acertava um golpe devastador na cabeça da vítima com uma clava de madeira sólida.


O antropólogo Harald Meller examinou vários crânios e concluiu que o ataque geralmente era letal com um único golpe. Este era desferido na têmpora direita, atingindo a vítima provavelmente em posição ajoelhada. Não se sabe se essas vítimas estariam conscientes do que aconteceria com elas, os rituais variavam muito de povo para povo. Muitas culturas ofereciam às vítimas uma infusão de ervas que as deixava à beira da inconsciência, o que facilitava o procedimento. 

Meller também encontrou vários crânios solitários sem esqueletos nas valas do cemitério. Para ele, o motivo é óbvio:

"As indicações são típicas de uma cultura que louvava a cabeça. Tais cultos acreditavam que a cabeça era a morada da alma e que portanto ela era a parte mais importante de uma pessoa. Por esse motivo, era comum guardar as cabeças cuidadosamente decepadas. Isso explica também porque o crânio em alguns rituais era rachado, isso permitia que o espírito saísse pela fissura".

A equipe ainda está tentando determinar a importância das cabeças para os rituais em Pömmelte, mas dada a quantidade de crânios achados tudo leva a crer que ela desempenhava papel central. Em uma única vala foram achadas mais de 30 crânios que foram cuidadosamente removidos. 

"Podemos supor que as paredes do templo eram decoradas com cabeças humanas, de pessoas ilustres, inimigos e líderes, cada qual ali disposta como uma espécie de conselheiro".


Ainda é cedo para dizer o que acontecia em Pömmelte, mas os muitos indícios colhidos até aqui sugerem que ele não apenas era um centro religioso importante, mas um local extremamente perigoso. Muitas das informações que se tem sobre os Unéticos envolvem suas práticas sanguinolentas e rituais homicidas, os druidas de Pömmelt pareciam aderir totalmente à essas práticas misturando tais rituais com a observação do firmamento.

"É preciso entender que aqueles eram outros tempos, algo muito difícil para nós hoje em dia concebermos. Os deuses desempenhavam uma função central na vida das pessoas e elas estavam dispostas a fazer o necessário para obter o favor deles. Talvez acreditassem que para agradecer a visão das estrelas fosse necessário arrebentar a cabeça de uma virgem de 16 anos, ou que apenas o sacrifício de uma criança poderia propiciar um determinado vislumbre. Não sabemos, mas tal coisa parecia ser uma algo muito comum, até corriqueiro".

Ainda é cedo para dizer que sabemos tudo sobre Pömmelte e sobre os rituais dos povos da Era do Bronze. É provável que jamais venhamos a compreender inteiramente seus costumes ou o propósito deles. De qualquer maneira, o Círculo de Pedras é uma descoberta fantástica que nos permite observar ao menos em parte como viviam nossos antepassados.

Um comentário:

  1. Druidas eram sacerdotes do povo celta; usar o termo para nomear os sacerdotes de tudo que é povo da antiguidade européia é um erro ( os celtas ainda não existiam e portanto não tinham penetrado na Europa no segundo milênio antes de Cristo).

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