Quando a pavorosa entidade conhecida como Grande Cthulhu cruzou incríveis distâncias e chegou à Terra, ele veio acompanhado de quatro dos seus filhos mais importantes (Cthylla, Ghatanathoa, Ythogtha e Zoth-Ommog) e por uma horda de criaturas conhecidas como Crias Estelares (Star Spawns).
As Crias Estelares são súditos fiéis do Grande Cthulhu, devotados de corpo e alma a servir e proteger seu mestre. Muito se discute a respeito da natureza destes seres titânicos, qual sua relação com Cthulhu e por qual razão eles o acompanharam em sua migração cósmica. Acredita-se que eles possam ser os habitantes originais do sistema binário de Xoth, visto que são conhecidos comumente como Xothianos (pronuncia-se Zofianos), enquanto Cthulhu seria seu Deus máximo ou então Sumo-Sacerdote. Em outra suposição, eles seriam todos seus filhos, gerados à sua imagem e semelhança, devendo a ele obediência incondicional.
Seja como for, as Crias sempre acompanham o Grande Cthulhu acatando suas ordens e satisfazendo seus desejos. Quando seu Mestre se retirou para o Mausoléu submarino de R'lyeh, eles o seguiram retirando-se para as câmaras inundadas afim de hibernar. Seus sonhos reverberam das profundezas, gerando emanações psíquicas que chegam aos homens e moldam seus sonhos. Quando Cthulhu despertar, eles também irão acordar para submeter o planeta ao seu novo Senhor.
À despeito de muitos deles terem acompanhado Cthulhu no seu sono milenar, outros tantos se mantiveram despertos, habitando as trincheiras e abismos marítimos. Eles se movem sob as ondas, nas profundezas insondáveis, onde pressão estrondosa e escuridão opressiva são insuportáveis para nossa frágil constituição. Alguns deles habitam a periferia das cidades erguidas pelos Abissais, sendo venerados por estes e servidos por outros horrores aquáticos. Cavernas e grotões são o seu refúgio mais comum, ainda que eles também povoem arrecifes, paredes de coral e fendas grandes o bastante para acomodar seu tamanho colossal.
Entidades similares às Crias Estelares ainda habitam as estrelas; seu lar original. Tais seres infestam o Lago de Hali em um planeta próximo da estrela de Aldebaran, em Touro. Outras esferas planetárias e luas também podem ser a morada de Crias Estelares. Civilizações não-humanas e povos alienígenas extintos ergueram no passado templos em homenagem a estes seres. Se um dia, a humanidade chegar às estrelas, estes monumentos serão encontrados, instalando terror e medo no coração dos pioneiros espaciais. Apesar da distância imensurável, estas Crias se mantém fiéis ao Grande Cthulhu. Supõe-se que estes serão convocados da imensidão cósmica para reunir-se ao seu mestre quando as estrelas estiverem certas.
As Crias um dia formaram as legiões de choque do Grande Cthulhu e foram usadas em suas conquistas planetárias. Milhões de anos atrás, quando desceram dos céus e se instalaram no continente primevo de R'Lyeh, as Crias abriram o caminho para a invasão. Na época, o planeta pertencia quase que em sua totalidade à Raça Ancestral, que havia estabelecido cidades tanto nos mares quanto nas massas continentais então existentes. O conflito entre estes dois poderes foi inevitável e fez tremer o então jovem planeta.
As Crias Estelares se lançaram em seu plano de conquista, arquitetado pelo Grande Cthulhu e lançado à partir de R'lyeh. Várias cidades da Raça Ancestral foram devastadas por esses titãs alados que venciam as muralhas e reduziam as edificações de pedra à escombros. Para terror da Raça Ancestral, os Xothianos além da destruição desenfreada desenvolveram um gosto particular pela carne da Raça Ancestral, devorando-os aos montes. A devastação de suas cidades, arranhou o orgulho da Raça Ancestral que revidou à altura. Recorrendo à sua tecnologia avançada, empregaram artefatos nucleares e de perturbação molecular para se defender, contudo sua maior arma decorria de seu conhecimento genético: Os Shoggoth. Servos protoplasmáticos criados em laboratórios com a cepa de Ubbo-Sathla, os Shoggoth se tornaram sua arma principal. No início, eles não faziam frente às Crias Estelares que em matéria de força bruta e violência pareciam inigualáveis. Entretanto, aos poucos, os Shoggoth projetados para a Guerra (cada vez maiores e mais poderosos) foram descobrindo seus trunfos. O surgimento de cada vez mais dessas armas biológicas equilibrou a batalha que até então pendia para as forças do Grande Cthulhu.
Sem um vencedor, a contenda parecia fadada a um incômodo impasse que só foi decidido pela conjunção estelar que obrigou o Senhor de R'Lyeh a hibernar nas profundezas. Uma vez que muitos Xothianos o seguiram, isso pôs termo às hostilidades, forçando um armistício.
Com efeito, a maioria das Crias Estelares abandonaram as hostilidades, simplesmente aguardando o dia em que as estrelas devidamente alinhadas apontarem para o momento propício de seu retorno.
Segundo alguns raros tomos de conhecimento arcano, há cinco Crias Estelares que se sobressaem diante de todas as outras. O decadente Necronomicon os chama de Observadores e afirma que sua função envolve antecipar os sinais que irão marcar o retorno de R'lyeh. Uma vez que os presságios forem reconhecidos, eles próprios irão despertar e juntos conduzir um ritual para romper o sono letárgico do Grande Cthulhu.
Essas cinco poderosas Crias Estelares se encontram adormecidas em localidades chave ao redor do globo. O tomo afirma que um deles dorme abaixo das Montanhas de Bayan Kara Shan na China central, outro sob as areias escaldantes que cobriram a Cidade sem Nome na Arábia, um abaixo das calotas de gelo da Groenlândia, o quarto em uma imensa caverna natural na Costa da Nova Inglaterra e o último na bacia do Rio Amazonas no Brasil. Supostamente a existência de tais seres jamais foi percebida visto que eles se encontram muitos quilômetros abaixo da superfície, enterrados ou submersos em localidades isoladas, em profundezas insondáveis.
Ainda segundo o texto, os Titãs adormecidos possuem capacidades psíquicas semelhantes ao Senhor de R'lyeh - ou seja, eles sonham. E seus sonhos podem ser captados pela humanidade e percebidos como um chamamento. Aqueles que ouvem esse chamado acabam de alguma forma cooptados para as fileiras dos Cultos que veneram o Grande Cthulhu. Verdade ou Mito, sabe-se que facções do terrível Culto de Cthulhu operam justamente nesses lugares.
Na China o Culto do Adormecido existe há milênios, nascido em monastérios que pontuam as montanhas na fronteira com o Nepal. A Cidade sem Nome foi por séculos um destino buscado pelos iniciados nos segredos do Mythos, visitado inclusive pelo célebre árabe louco, Abdul al-Hazred que lá encontrou os resquícios de um antigo Culto devotado a Cthulhu. Embora na Groenlândia as populações humanas sejam raras, antropólogos se surpreenderam com a existência de grupos reunidos ao redor de bizarras divindades. Próximo de Boston, na decrépita vila pesqueira de Innsmouth, a Ordem de Dagon formada por híbridos com sangue abissal a correr em suas veias, conduzia rituais em homenagem a Cthulhu. Finalmente, tribos como os Okitos, habitantes da selva amazônica, próximo da fronteira entre Brasil e Venezuela praticam rituais sangrentos em honra de um Deus blasfemo que dorme aos seus pés.
Todos esses Cultos possuem princípios e ritos semelhantes que envolvem a adoração a entidades enterradas ou submersas que por sua vez estão fadadas a um dia acordar um Deus ainda mais poderoso.
A maioria das Crias Estelares permanecem em um estado de letargia perene, que pode ser confundido com a morte. Nos covis onde jazem imóveis, as eras transcorrem sem os afetar, visto que são vitualmente imortais pela passagem do tempo. Tampouco eles precisam comer ou respirar, pois as necessidades biológicas de outros seres, para eles, não possuem consequência. Os milênios vem e vão, mas durante todo esse tempo, as Cria Estelares sequer flexionam seus músculos ou permitem um bater de coração. Suas mentes, outrossim, continuam afiadas, vivas, sondando os arredores.
Contudo, isso não significa que sob certas circunstâncias, as Crias Estelares não possam voltar à viver, caminhar e nadar como um dia fizeram antes do surgimento do homem. Afortunadamente, tal ocorrência é muito rara, ainda que os registros de Cultos contenham testemunhos de tais eventos e estes sejam muitíssimo aguardados pelos cultistas.
Há relatos ligando o despertar de Crias Estelares a incidentes naturais e intempéries como erupções, terremotos e maremotos.
Semanas após o devastador terremoto que atingiu Lisboa em 1755, marinheiros teriam avistado uma criatura de dimensões absurdas ("como uma montanha andante") em algo mar. A criatura, semelhante, mas não inteiramente igual a um enorme polvo contornou a Costa de |Caparica como se estivesse observando a destruição deixada pelo terrível cisma que atingiu 9,1 na escala Richter. Na época, uma epidemia de pesadelos e paranoia varreu a capital portuguesa atingindo os já traumatizados sobreviventes da tragédia.
Outro incidente marcante teria ocorrido em 1816, dias antes da acachapante erupção do Vulcão Tambora que decretou a destruição do povo Sumbawa que vivia naquela ilha. Rumores de indivíduos que estiveram na ilha semanas antes afirmavam que vários locais experimentaram o que se poderia compreender como sonhos premonitório sobre a tragédia que se aproximava. Mas além da eclosão do Tambora, tinham visões de entidades colossais que viviam sob a ilha e que eram venerada pelos seus antepassados em tempos remotos. Após a explosão que decretou a extinção do modo de vida dos Sumbawa, bem como de sua cidade e das 20 mil pessoas que lá viviam, houve rumores a respeito de uma criatura gigantesca avistada por embarcações passando perto da área atingida pela conflagração. "Enorme", "impossível", "monstruoso", foram algumas palavras usadas por quem viu a coisa para descreve-la.
Da mesma maneira, mais recentemente em 2010, após as erupções vulcânicas ocorridas na Islândia, uma criatura de dimensões absurdas teria sido avistada na costa de Eyjafjallajökull. A coisa, um "monstro marinho com cabeça de cafalópode" foi avistado pela tripulação do Kyllynis um navio de bandeira cipriota que navegava pelo Atlântico Norte.
Alguns acreditam que o curioso incidente conhecido como "Bloop", um ruído submarino estarrecedor e sem explicação aparente, emanado nas profundezas oceânicas na Costa da Antártida possa ter sido motivado por uma ou mais Crias Estelares.
Qual a ligação, seja ela direta ou circunstancial, das Crias Estelares com esses eventos não se sabe. O que se cogita é que eles possam ser despertados por esses incidentes perturbadores ou, como sugerem outros, podem tê-los causado de alguma forma.
Buscando em antigas lendas e mitos, não é difícil achar menções a monstros e criaturas marinhas responsáveis por enormes tragédias. Os Dragões do passado podem ser na verdade Crias Estelares e contribuíram para o surgimento destes mitos ancestrais.
Os Xothianos podem ser definidos por uma palavra: "colossais". Um típico indivíduo da espécie mede algo em torno de 20 a 25 metros de altura e centenas de toneladas, contudo alguns podem ser consideravelmente maiores, chegando aos 30 ou mais metros de altura, o equivalente a um prédio de 15 andares. Não se sabe no entanto de nenhum deles atingindo a estatura titânica do Grande Cthulhu que por sua registra mais de 40 metros.
O corpo das Crias Estelares consiste de uma substância maleável, tenra e untuosa absolutamente alienígena. Sua carne verde acinzentada é normalmente esponjosa e flácida, mas ela pode ser reforçada rapidamente assumindo uma consistência rija através do ajuntamento de células formando placas de tecido conjuntivo. Sua epiderme consiste de fibras de colágeno esticadas sobre os músculos. O sangue desses seres corre em vasos internos bombeados por um sistema de três corações branquiais. Eles possuem ainda um sistema respiratório pulmonar que lhes permite respirar tanto na água quanto na superfície. Seu sangue possui altíssima concentração de cobre que o torna viscoso e com uma cor escura oleosa.
Os Xothianos são humanoides, com pares de membros superiores (braços) e inferiores (pernas) unidos a um tronco massivo. Os braços tendem a ser longos e delgados, terminando em um conjunto de 4 dedos compridos dotados de garras afiadas ainda que flácidas e recurvas. Já as pernas são mais curtas, com pés achatados e dedos de formato quadrado também dotados de unhas. A criatura caminha ereta, mas parece mais à vontade na água, nadando com enorme desenvoltura. A maioria dos espécimes possuem um par de asas membranosas presas às costas que embora sejam descritas por muitos como "asas de morcego" são mais próximas de barbatanas adaptadas como as dos peixes voadores. Estas cumprem um papel importante no deslocamento submarino garantindo a eles enorme agilidade. As asas podem ser usadas para alçar voo na superfície e impulsionar o Xothiano pelo ar ainda que de forma desengonçada. Há conjecturas que as asas das Crias Estelares funcionam melhor no espaço, mas não há como julgar isso. As asas também auxiliam na movimentação da criatura, aumentando seu centro de equilíbrio. Em posição relaxada, as asas se dobram sobre as costas e permanecem fechadas até a criatura se mover, seja andando, nadando ou voando. As Crias de Cthulhu se movem de forma bastante rápida a despeito de seu imenso corpanzil e qualquer pessoa supondo que eles são lentos ficará surpreso com sua velocidade.
Não se sabe ao certo se Xothianos possuem uma divisão bem definida de gêneros masculino/feminino. É possível, no entanto, que eles sejam naturalmente hermafroditas, ainda que saibamos pouquíssimos detalhes sobre seu ciclo reprodutivo se é que ele funciona de uma maneira similar a algo em nosso mundo. De qualquer maneira se existem diferenças biológicas entre eles, estas não são imperceptíveis. Também não há registros de filhotes ou jovens da espécie.
Xothianos são combatentes formidáveis aliando força bruta com capacidade destrutiva condizente com seu tamanho e massa. Durante a Guerra empreendida contra a Raça Ancestral, eles foram capazes de devastar cidades inteiras reduzindo prédios e construções de rocha à ruínas. Sua notável resistência física também lhes permite resistir a ataques diretos e danos maciços como os que o armamento da Raça Ancestral podia causar. De fato, a arma mais confiável contra as Crias Estelares foram os Shoggoth que assim como eles, se valiam de força bruta. Comparativamente, mesmo hoje existem poucas armas criadas pelo homem, além de explosivos de alto impacto e artefatos nucleares, que podem ferir estes seres. Para tornar tudo ainda mais complicado, a estranha matéria que constitui esses seres possui propriedades protoplásmicas regenerativas. Em poucos minutos um Xothiano levado à beira da destruição pode sanar inteiramente ferimentos sofridos. À despeito disso, há rumores que uma Cria Estelar teria sido destruída por torpedos na Costa da Nova Inglaterra por ocasião da intervenção militar na cidade de Innsmouth. Feitiços e armas mágicas também são bastante eficientes contra os Xothianos.
Talvez a peculiaridade mais conhecida acerca das Crias Estelares diga respeito a sua bizarra cabeça. Os Xothianos possuem uma massa desproporcionalmente grande e bulbosa no topo de seu tronco. Essa cabeça é dotada de centenas de filamentos de diferentes tamanhos que pendem de sua "face", escorrendo pelo peito em enorme quantidade. Essa infinidade de tentáculos se agita e contorce como se tivesse vida própria. Os tentáculos agem como apêndices prenseis, especializados em agarrar e capturar o que estiver ao seu alcance. Cada um deles é forte como um cabo de aço, capaz de dobrar vigas e esmagar ossos com enorme torque. Apesar disso, alguns são capazes de manipulação táctil sensível e de realizar tarefas delicadas com enorme perícia.
Outra de suas funções é levar alimentos até a enorme cratera em forma de boca. Esta fica oculta sob a massa filamentosa, normalmente imperceptível, mas pode se revelar caso a Cria Estelar queira morder alguma presa. O aparato é dotado de glândulas salivares nas laterais, tentáculos bucais que auxiliam a empurrar a comida e uma faringe tubular através da qual os alimentos escorregam auxiliados pela saliva que corre em profusão. O tubo é repleto de dentes ocos afiados que retalham os alimentos enquanto estes descem pela sua garganta. Outra estrutura anatômica se assemelha a radula dos moluscos e gastrópodes terrestres, um longo órgão musculoso similar a uma língua pontuda com cerdas afiadas. A radula também empurra os alimentos goela abaixo para que os potentes ácidos estomacais façam o seu trabalho de decomposição. Xothianos são carnívoros e se alimentam de animais marinhos, engolidos por inteiro. Animais de maior porte, como baleias, lulas e tubarões podem, no entanto, ser mutilados por suas potentes mordidas.
Os olhos dos Xothianos são comparativamente grandes, arredondado e de coloração variando do verde musgo, ao amarelo baço e em alguns espécimes vermelho. Ele tende a emitir um brilho característico na escuridão. A visão dessas criaturas é bastante aguçada, perfeitamente adaptada à pouca luz das trincheiras oceânicas e do espaço profundo. As Crias estelares não possuem nariz ou orelhas, tendo somente fossas nasais e auriculares que lhe permitem cheirar e ouvir. Esses sentidos são bastante rudimentares, mas ele parece substituí-los com outras funções sensoriais exclusivas, para nós inconcebíveis.
Um adendo importante para compreender esses seres. Muitos que os observam os tratam como entidades embrutecidas, criaturas de mente simplória como o mítico Polifemo, dadas a arroubos de violência desenfreada. Nada poderia ser mais distante da realidade. Xothianos são criaturas dotadas de uma inteligência refinada, com capacidade cognitiva que lhes permite racionalizar e planejar. Eles não são monstros estúpidos, mas seres com uma mente analítica e memória de longa duração. Seus cérebros podem reconhecer objetos, associar indivíduos e aprender através da observação.
Os Xothianos são indubitavelmente uma das formas de vida mais perigosas existentes no planeta. É uma benção que a maioria deles esteja adormecida ou que mesmo ativos permaneçam na maior parte do tempo inertes à imagem de seu amo e senhor. No entanto, quando as Crias Estelares sentirem que o momento do Alinhamento Cósmico se aproxima, elas o reconhecerão de imediato. Tais Leviatãs se erguerão das suas sepulturas submarinas e se dirigirão objetivamente para a terra.
E nesse dia, a humanidade conhecerá o Horror, pois o Grande Cthulhu estará próximo de despertar.