sexta-feira, 9 de abril de 2021

O Anão da Rainha - A fantástica vida de Jeffrey Hudson


A História está repleta de pessoas extraordinárias que se destacam em meio às massas comuns. Tais pessoas aparecem em todos os estratos da sociedade, e elas vem em muitas formas. São indivíduos que emergem da obscuridade para se converter em lendas que reclamam um lugar de destaque.

Uma dessas pessoas tinha uma estatura bastante pequena, o que hoje em dia poderíamos chamar de anão, mas sua existência foi no mínimo grandiosa. Ele se tornou aquele que poderia ser chamado de "o anão mais conhecido de sua época" vivendo grandes aventuras, sendo acompanhante da Rainha da Inglaterra, protetor, assassino, escravo e pária, deixando um legado que parece inacreditável, mas que os fatos atestam ser verdadeiro.     

Aquele que viria a ser conhecido como "O menor homem da Grã-Bretanha" nasceu em 1619 em Oakham, interior da Inglaterra. Quando Jeffrey Hudson nasceu, não havia como saber o quão pequeno ele seria, uma vez que ele tinha pais e irmãos de estatura normal. Mas à medida que o tempo passava, estava claro que o bebê tinha algo de errado já que ele continuava pequeno. Aos sete anos de idade ele não era maior do que um bebê de colo. 

As pessoas se surpreendiam a respeito de Jeffrey, não apenas por ele ser tão pequeno, mas por ter as proporções exatas e feições agradáveis. Aqueles que sofrem de nanismo, muitas vezes apresentam proporções inexatas em membros, cabeça e tronco, mas Jeffrey para todos efeitos parecia uma pessoa em miniatura. Onde era apresentado, todos ficavam encantados e não demorou até que sua aparência incomum acabasse atraindo a atenção de nobres do período. Em 1626 ele foi apresentado à Duquesa de Buckingham como uma "raridade da natureza" e uma "maravilha dos nossos tempos". Naquele momento, sua vida mudaria para sempre uma vez que a Duquesa imediatamente se afeiçoou por ele e se ofereceu para criá-lo.


Naquele tempo, era uma grande sorte ser escolhido para receber a tutela de um nobre e os pais de Jeffrey ficaram felizes por ele. A Duquesa o levou para casa, e o pequenino - que não tinha mais de 50 centímetros, conheceu muitas pessoas importantes na corte, inclusive Carlos I e sua jovem esposa a Rainha Henrietta Maria. Os dois se surpreenderam ao vê-lo sair de dentro de um grande bolo, vestindo uma armadura para divertir os convidados num banquete. O Rei e a Rainha também se encantaram pelo anão o que fez o Duque e a Duquesa oferecer Hudson como um presente a eles. Embora tudo isso possa parecer chocante nos dias atuais, na época, era bastante comum famílias nobres trocarem a "posse" das pessoas que as entretinham. Anões eram especialmente desejados pela nobreza europeia. Filipe IV da Espanha tinha cerca de 100 anões em sua corte, e eles desempenhavam várias funções e trabalhos, embora a maioria deles fosse usada como entretenimento. 

Segundo historiadores, a atitude de nobres europeus para com anões refletia um costume antigo. Nas cortes do Antigo Egito, China e África Ocidental, anões eram muito valorizados. Alexandre o Grande reuniu um séquito enorme de anões que o acompanhavam onde quer que ele fosse. Os Romanos coletavam anões e os criavam como "animais de estimação", colocando-os em espetáculos circenses nos seus anfiteatros. Na Idade Média, anões eram tratados como uma curiosidade, por vezes mantidos em gaiolas para serem exibidos como atrações.

Anões muitas vezes eram treinados para atuar como artistas, malabaristas, equilibristas e cômicos. Eles eram parte de Gabinetes de Curiosidades no século XVI, peças vivas de coleções. Nobres se orgulhavam de contar com anões, corcundas e até mesmo pessoas com graves deformidades para mostrar aos amigos. Eles gostavam de apresentar suas coleções e os tratavam como "maravilhas" ou "prodígios" naturais. Por sua vez, eles eram bem tratados, recebiam permissão para aprender a ler, escrever e falar outros idiomas. Em geral, anões tinham mais instrução que a média da população.

Todos os testemunhos afirmam que a Rainha tratava Hudson como sua própria criança, constantemente o adulando e mimando. Em contrapartida, ele era um amigo, confidente e companheiro da Rainha, sempre ao seu lado com permissão para opinar, aconselhar e tratá-la com intimidade desconcertante. Ele recebeu educação esmerada, contava com seus próprios serviçais, tinha um cavalo, roupas bonitas e um belo salário. Seus colegas eram outras "curiosidades", como um macaco especialmente inteligente chamado Pug e um homem conhecido como William Evans que era o contrário de Hudson, visto que media dois metros e oito de altura, o que o tornava um gigante para s padrões da época. Hudson aos 12 anos se tornou muito amigo de Evans, e os dois realizavam um espetáculo em conjunto. Seu carisma lhe rendeu enorme fama não apenas na corte, mas em todo país. 

A Rainha e o Anão eram praticamente inseparáveis, mas quando a Guerra Civil da Inglaterra começou em 1642, ela foi forçada a deixar Londres. Ela não esqueceu de reservar um espaço para o anão que foi incluído entre o grupo que ela escolheu para acompanhá-la. Em um determinado momento, os dois tiveram de se exilar na Holanda, onde tentaram arrecadar fundos para comprar armamento e enviar aos seus aliados na Inglaterra. Na ocasião, o anão provou sua coragem defendendo sua senhora quando a comitiva em que eles estavam foi atacada por assassinos contratados para matá-la. O anão, desembainhou uma adaga e se colocou entre os assassinos e sua amada Rainha ganhando tempo para que os guardas viessem em seu socorro. Depois disso, ele passou a desempenhar um novo papel, o de guarda-costas. 

Ninguém esperava que o anão, com menos de 70 centímetros de altura e que para todos os efeitos parecia uma criança trajando roupas coloridas de swashbuckler, levasse consigo uma pistola carregada e um punhal. Sua bravura era admirável e ele provou seu valor repetidas vezes, protegendo a Rainha, tirando proveito daqueles que subestimavam sua estatura. Segundo relatos, ele teria matado pelo menos 3 homens em combate franco. As pessoas podiam não levá-lo à sério como um guerreiro, mas estas não tinham tempo de se arrepender. Isso nos leva ao capítulo seguinte da incrível jornada de Jeffrey Hudson.          


Depois que a Rainha e o Anão se refugiaram na França houve certa comoção quando Hudson desafiou Charles Crofts, o irmão do cavalariço da Rainha para um duelo. Não se sabe exatamente o que provocou o desentendimento, mas é provável que tenha sido uma piada contada pelo anão que acabou indo longe demais. Os dois se encontraram em um campo, montados à cavalo, armados com pistolas para lutar até a morte. Mas se alguém imaginava que aquilo era um absurdo ou uma piada, logo teve de se calar. Hudson avançou velozmente contra Crofts e antes que esse pudesse se defender, já havia recebido um tiro fatal na testa. Testemunhas dizem que o duelo havia terminado em 15 segundos. 

Na época, duelar era proibido na França, portanto Hudson acabou sendo preso e sentenciado à morte por assassinato. Se não fosse pelas conexões da Rainha Henrietta ele sem dúvida teria sido executado e esse seria o fim de sua história, mas ela conseguiu arranjar uma maneira de livrá-lo. O anão foi posto em liberdade depois que sua senhora subornou um oficial de justiça com joias que ela mantinha.

O anão, procurado pela justiça se exilou no sul da França planejando retornar para a Inglaterra em 1648. Seu plano era se juntar a um grupo de contra revolucionários que planejavam restituir a monarquia.

Entretanto, na viagem de Marselha para a Inglaterra, o navio de Hudson foi atacado por piratas turcos que o capturaram no Mediterrâneo. Ele foi levado para o Norte da África, onde acabou sendo vendido como escravo. Os detalhes de sua vida depois disso são confusos, mas aparentemente após ter passado muitos anos na escravidão, acompanhando crianças e ensinando idiomas, ele conseguiu ganhar sua liberdade. Ele retornou para casa em 1669, já com 43 anos de idade. 

Estranhamente, as pessoas se surpreendiam com o fato dele ter crescido no período em que foi mantido cativo, afirmavam que ele tinha agora pelo menos 1,20. Ninguém conseguia explicar esse detalhe, nem mesmo Hudson. Alguns suspeitavam que o anão que havia retornado não era o verdadeiro Jeffrey Hudson e sim um impostor que havia ouvido sua história. Nunca saberemos ao certo! Mas se ele esperava uma recepção calorosa em Londres, se enganou pois o novo Rei, Carlos II ordenou sua prisão tão logo soube de seu retorno. A Rainha havia morrido poucos meses antes do retorno do anão e dessa vez ela não poderia ajudá-lo.

Hudson ficou preso numa masmorra por algum tempo mas eventualmente foi libertado do cativeiro. Liberto, porém pobre, ele viveu seus dias finais em relativa obscuridade, dependendo da bondade de estranhos. Ele faleceu em 1682, mas antes deixou uma narrativa escrita de suas aventuras que foi preservada para a posteridade. Seu corpo foi sepultado em uma cova sem identificação.

A incrível história do anão mais famoso da Grã-Bretanha é um exemplo de alguém que transcendeu os limites físicos e teve uma vida fascinante. Ainda hoje, há quadros dele em galerias e museus, sua existência é conhecida e sua história sabida. Mais do que um objeto de simples curiosidade, ele deixou sua marca na história, e isso, não é pouca coisa. 

3 comentários:

  1. Gostei da história. Obrigado pela postagem.

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  2. Ótimo e verdadeiro artigo. Gostei muito

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  3. estive no pais de Gales em 2011 e proximo do Castelo de Conwy tem uma casa onde está identificada como a moradia do menor inglês

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