quinta-feira, 12 de janeiro de 2023

Gênios Imperfeitos - Crowley e Tesla separados por um amigo em comum


Dois personagens do mundo real que sempre estão em evidência aqui no Mundo Tentacular são o ocultista Aleister Crowley e o brilhante inventor Nikola Tesla.

A vida dessas incríveis indivíduos é tão notável que eles parecem personagens da ficção. É difícil até separar o que é real daquilo que soa fantástico, e coisas fantásticas não faltam na história dos dois... Quando li esse artigo, imediatamente achei interessante a proposta de correlacionar esses dois e imaginar como poderia ser um encontro entre eles já que eles viveram na mesma época e inclusive na mesma cidade. 

Então, baseado no artigo "Tesla and Crowley - Two Degrees of Separation" de Artur O'Keefe aqui está a história.

O influente poeta/ocultista Aleister Crowley e o inventor Nikola Tesla viajaram em círculos semelhantes, mas nunca se encontraram. O que poderia ter acontecido se eles tivessem?

O Ocultista, o Inventor e o Poeta


Aleister Crowley (1875-1947) foi um icônico ocultista inglês cuja influência na cultura popular se estende a mídias tão variadas quanto quadrinhos, filmes e capas de álbuns. Ele é visto por alguns como um grande inovador e uma espécie de revolucionário espiritual; um profeta se preferir. Para outros, ele é um notório bruxo e até satanista, que tomou para si o apelido de “o homem mais perverso do mundo” que usou om distinção. 

Nikola Tesla (1856-1943) é igualmente icônico em seu campo, ele foi um inventor sérvio-americano, imensamente celebrado pela cultura popular. Ele se tornou conhecido pelos conceitos inovadores que ajudaram a moldar o mundo moderno, como a corrente alternada, hidroeletricidade e veículos de controle remoto. Como Crowley, o legado de Tesla não é isento de controvérsias. Louvado por muitos como um gênio muito à frente de seu tempo, outros veem suas realizações como grosseiramente exageradas, e a retórica às vezes pode parecer totalmente partidária.

Se você conhecesse esses dois caras, não tentaria reuni-los?

No início do século XX, o poeta, jornalista e editor da Revista New Yorker, George Sylvester Viereck (1884-1962) conhecia tanto Crowley, quanto Tesla. Na verdade, Viereck conhecia tão bem os dois homens a ponto de visitá-los, ter com eles jantares sociais e confraternizações frequentes. Contudo, não há nenhum registro de que ele os tenha apresentado, mesmo por correspondência.


Foi no período entre guerras que Viereck e Tesla se tornaram especialmente próximos. O biógrafo de Tesla, Marc J. Seifer, observa em seu livro "Wizard: The Life and Times of Nikola Tesla" que o jornalista e o inventor estavam conectados por meio de Robert Underwood Johnson, editor da "Century Magazine", que começou a publicar “poemas provocativos de Viereck como 'The Haunted House'” em 1906. Johnson também era amigo próximo de Tesla no início da década de 1890. Seifer coloca o início da amizade entre Tesla e Viereck em meados do início da Primeira Guerra Mundial.

Foi também durante a Primeira Guerra Mundial que Viereck e Crowley começaram uma relação de trabalho. Crowley estava morando em Nova York e escreveu para a revista de Viereck e mais tarde para outras publicações que ele supervisionava. Crowley foi tão bem que acabou sendo convidado para atuar como editor. Ele contribuiu com muitos poemas, ensaios e contos assinados com seu nome, bem como outros sob pseudônimos.

A essa altura, vocês deve se perguntar "Quem diabos foi George Sylvester Viereck?"


O homem que tinha ligação com Crowley e Tesla nasceu em Munique em 1884. Supostamente era neto do Kaiser Wilhelm I através do nascimento fora do casamento de seu pai, George Sylvester Viereck que emigrou para os EUA em 1897. Desde jovem ele exibiu aspirações literárias e por volta dos 20 anos estava publicando poesia. Ele logo alcançou fama literária e, em 1909, era, nas palavras de Seifer, "a mais brilhante estrela em ascensão no mundo da poesia".

Presumivelmente influenciado por sua herança germânica, depois que a Grande Guerra estourou, Viereck ficou alarmado com o possível envolvimento dos EUA no conflito. A entrada do páis e o rompimento da neutralidade era no seu entender algo que o afetaria enormemente. 

Tendo voltado de Berlim em meio à guerra, Viereck cortejou o importante político Teddy Roosevelt e emissários do presidente [Woodrow] Wilson. Ele tentou convencê-los a manter a neutralidade americana. Simultaneamente, começou uma nova publicação com outros importantes alemães que residiam no país. Inicialmente bem recebida, a publicação logo alcançou 100.000 assinaturas. Para a época era um sucesso editorial considerável.

Viereck, convencido de que a Alemanha estava certa, não esperava nenhuma intervenção americana contra as Potências Centrais. Explorar seu estrelato literário para fazer petições a líderes políticos demonstra o quão intenso era esse desejo e o tamanho de sua influência. Nessa época ele conheceu Aleister Crowley.


Crowley chegou a Nova York, no Halloween de 1914. Um escritor prolífico de poesia, ficção e ensaios, seu trabalho começou a aparecer na Revista Vanity Fair, bem como na Fatherland editada por Viereck. Crowley assumiu a função de editor com uma linha amplamente favorável a causa da Alemanha. Sendo inglês, Crowley foi denunciado como traidor de seu país; ainda que anos mais tarde ele tenha assegurado que suas opiniões visavam minar secretamente os esforços de propaganda alemã na América. 

Crowley afirmava que seguia ordens do Ministério das Relações Exteriores da Grã-Bretanha, agindo na qualidade de agente secreto para espionar alemães instalados nos Estados Unidos. Se isso é verdade ou não, é difícil dizer, uma vez que Crowley inventava muito à respeito de sua própria vida. Crowley escreveu repetidos artigos nos quais defendia a guerra submarina irrestrita da Alemanha que acabou levando ao naufrágio do navio de passageiros britânico Lusitania em 1915, bem como ataques a navios transatlânticos dos EUA. Tal coisa atraiu os EUA para a guerra em 1917. Segundo biógrafos de Crowley, manifestar esse sentimento pró-germânico não passava de um truque para ganhar a confiança dos alemães. Com isso, ele obtinha livre acesso e transitava entre empresários, artistas e pensadores alemães que viviam nos EUA. Ouvia o teor de suas reuniões sociais e de suas opiniões sobre a Grande Guerra, e tudo aquilo que parecia importante ou interessante era reunido em dossiês enviados para a Embaixada Britânica.

Em 1919, com a Grande Guerra finalmente terminada, Crowley voltou para a Inglaterra onde foi bem recebido. Ele afirmava ter recebido uma soma considerável como recompensa pelo seu trabalho de espionagem em Nova York.

Ele se encontraria com Viereck novamente, em Londres no ano de 1936. Os dois almoçaram algumas vezes e Crowley contou ao amigo qual era a sua função em tempos de Guerra. Aparentemente Viereck não se importou com a função de agente duplo. Pouco depois, Crowley escreveu a Viereck pedindo-lhe que recomendasse ao chanceler alemão Adolph Hitler seu "O Livro da Lei" (texto central de Thelema) como uma possível fonte de princípios filosóficos para o nazismo.


Viereck conheceu Hitler e esteve com ele várias vezes. Era uma pessoa influente que concordava com os ideias nazistas para reerguer a Alemanha destruída após a Grande Guerra. Há boatos de que Viereck atuava como consultor dos nazistas sobre a América. Não se sabe se ele entregou ao Chanceler Hitler o livro presenteado por Crowley e se o fez, o que o Führer achou dele.
 
Crowley esperava que a doutrina da Thelema, uma vez adotada pelos nazistas poderia evitar uma guerra, ou ao menos foi o que ele escreveu em suas memórias. Quando ficou claro que a Europa seria arrastada para um novo Conflito militar, Viereck se separou de Crowley e os dois deixaram de trocar correspondências, sobretudo depois que o ocultista se manifestou contra os Nazistas. 

Quando Crowley chegou a Nova York em 1914, Tesla já estava lá. De etnia sérvia, nascido em 1884, ele emigrou do Império Austro-Húngaro e passou praticamente o resto da vida morando em Manhattan. Depois que Crowley partiu em 1919, Tesla continuou na cidade e sua amizade com Viereck se intensificou.

Mesmo com Viereck adotando uma postura mais radical pró-Alemanha, depois de 1933 quando Hitler subiu ao poder, isso não se tornou um problema para a amizade com Tesla. De fato, Tesla detestava política e se mantinha neutro na maioria das questões. 

Pode ser chocante para alguns saber que um dos amigos mais próximos de Tesla era um ferrenho nazista, ou pelo menos simpatizava enormemente com a agenda Nacional Socialista. Tesla foi de alguma forma capaz de se conectar com Viereck de uma forma distinta da ideologia. O mais perto que o inventor chegou de expressar quaisquer pontos de vista político pode ter sido em uma entrevista de 1937 conduzida pelo próprio Viereck. Tesla é citado como tendo dito que avanços na tecnologia poderiam ser um meio de abolir a guerra e que os alemães haviam feito progressos louváveis em vários campos da ciência.

O que quer que Tesla pensasse sobre a política de Viereck, passada ou presente, ele gostava dele pessoalmente. Tesla chegou a escrever uma carta em abril de 1934 na qual chamava o amigo de "o maior poeta da América" e de "um dos maiores artistas de seu tempo".

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Depois que os Estados Unidos entrou na Segunda Guerra Mundial, Tesla pode presumivelmente ter adotado uma visão mais sombria das crenças de Viereck. Seu estado de saúde estava deteriorando, em face de sua condições financeira cada vez mais desesperadora. Tesla vivia em um quartinho de hotel, comendo biscoitos e ganhando a vida consertando rádios e motores de automóveis. 

Durante a Segunda Guerra Mundial Viereck teve sérios problemas. Marcado por suas atividades pró-alemãs durante a guerra anterior, em 1942, ele foi observado pelas autoridades Norte-Americanas por suspeita de espionagem. Acabou preso e condenado por não notificar ao governo dos EUA que estava realizando encontros e reuniões com outros alemães. 

Ele foi libertado apenas em 1947, no mesmo ano em que Aleister Crowley morreu de doença cardíaca e bronquite. Tesla já havia falecido, sozinho e na pobreza, sucumbindo a um ataque cardíaco em seu quarto barato de hotel em janeiro de 1943. Viereck morreu de hemorragia cerebral em 1962.

Diante disso, podemos nos questionar por que Viereck não apresentou duas figuras que eram tão próximas a ele?

Especula-se que Crowley e Tesla podem ter sido conectados através da Wardenclyffe Tower, a estação experimental de transmissão sem fio de Tesla perto de Shoreham, Long Island. Crowley era conhecido por acampar nas proximidades da estação onde raios e descargas elétricas assustavam os moradores. É bem possível que ele tenha testemunhado esses testes ou ao menos ouvido falar deles uma vez que eram bastante comentados.

Parece perfeitamente razoável assumir também que Crowley e Tesla estivessem cientes da existência um do outro, afinal eram pessoas notáveis de sua época. Jornais e revistas costumavam estampar manchetes sobre seus feitos frequentemente. Mas será que eles sabiam que Viereck era amigo comum de ambos?

Viereck pode ter pensado que Crowley e Tesla juntos seriam a combinação final de óleo e água. Qualquer que fosse a profundidade de seu compromisso com o estudo da magia (ou magick, como soletrava), Crowley era, à sua maneira, um libertino. Sua promiscuidade sexual e uso de drogas, particularmente seu vício em cocaína e heroína, são lendários. (“Sex magick”, ou rituais esotéricos nos quais a atividade sexual desempenhava papel central, era sua busca comum.) Tesla, em comparação, era notoriamente germofóbico, um bebedor moderado e aparentemente celibatário (ele nunca se casou). Ele também evitou cafeína e tabaco, enquanto Crowley escreveu uma oração elogiando o café e fumava cachimbo diariamente. 

Com tão pouco em comum e muito diametralmente oposto, talvez Viereck pensasse que Crowley e Tesla se odiariam e não queria arriscar o antagonismo de um, ou, ambos.

Ainda assim, um encontro de Crowley e Tesla certamente teria sido fascinante de testemunhar, qualquer que fosse o risco de os dois não se darem bem (ou talvez por causa disso). Quem sabe? Talvez algum dia alguém prove que eles realmente se conheceram.

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