domingo, 7 de fevereiro de 2021

Unidos pela Carne - Gêmeos Siameses e suas incríveis histórias


Irmãos Gêmeos Siameses não são nem de longe tão raros quanto foram no passado.

Isso acontece por várias razões, a principal, é que anomalias de nascimento se manifestam em uma porcentagem da população, portanto havendo mais nascimentos é normal que haja mais casos verificados. Outra razão envolve os progressos dos procedimentos médicos que tornam muito mais provável a sobrevivência dos gêmeos siameses. Hoje os médicos são capazes de realizar a separação de gêmeos siameses em várias circunstâncias e mesmo quando não são capazes de fazê-lo, há meios de aliviar os efeitos da condição. Finalmente, há muito menos temor e desconfiança do que existia no passado. Séculos atrás, o nascimento de gêmeos unidos podia ser visto como uma maldição, uma tragédia ou um indício de forças demoníacas.

Na história existem narrativas vindas de várias partes do mundo a respeito de como era encarado o nascimento de gêmeos siameses. Na maioria das vezes, as crianças não sobreviviam a tentativas de separação ou acabavam sofrendo nas mão de pessoas supersticiosas.

 Contudo, haviam exceções dignas de nota.

Alguns gêmeos siameses sobreviveram à despeito do medo e das suspeitas, chegaram a idade adulta e tiveram vidas plenas e perfeitamente produtivas. É inegável, entretanto que gêmeos unidos sempre despertaram o interesse e muitas vezes foram tratados como atrações por um público ávido por novidades. Outro preconceito é que eles sempre foram explorados e tiveram vidas sofridas nas mãos de pessoas inescrupulosas, forçados a viver nos infames Shows de Estranhezas (Freak Shows). Muitos foram muito bem sucedidos e tiveram vidas confortáveis por se apresentarem em tais espetáculos itinerantes. 

Aqui estão algumas histórias notáveis de Gêmeos Siameses.

Os Irmãos de Bizâncio


No século X, por volta do ano 940, dois irmãos gêmeos unidos por uma camada de pele pelas costas sobreviveram à infância e chegaram à idade adulta. Segundo vários cronistas do período, eles eram nativos da região da Armênia ou Capadócia, mas ficaram conhecidos no coração do Império Romano Oriental.

Não há muitos documentos a respeito da existência de gêmeos unidos nesse período, o que torna os registros a respeito desse caso ainda mais significativos. Os próprios historiadores do período que comentam a respeito do caso dizem que os gêmeos chegaram a adolescência como por milagre já que a maioria desses nascimentos eram tratados como mau agouro e as crianças mortas pouco depois do nascimento. O cronista bizantino Leão Decano afirma que nos pequenos povoados e vilarejos, crianças nascidas sob o signo de deformidades dessa natureza eram misericordiosamente afogadas em bacias ou atiradas no rio para que se afogassem. Por vezes, os pais podiam até ser multados ou banidos por conta do nascimento de bebês com tais morbidades.

É provável que os pais tenham ocultado o nascimento dos gêmeos até que eles atingissem os três ou quatro anos de idade, quando estariam à salvo de serem executados. Os meninos em algum momento  teriam se tornado uma espécie de atração para curiosos que pagavam para vê-los no que poderia ser compreendido como um "Show de Esquisitice" do Mundo Antigo. Dessa forma, eles viajavam pelos confins do Império. Eventualmente ganharam fama o suficiente para viajar até a corte de Constantinopla durante o reinado de Romanus Lecapenus (919-944). 

Segundo outros historiadores do período eles se tornaram bastante conhecidos sendo admirados como uma curiosidade por todos que vinham vê-los. Isso os levou a serem convidados a visitar a corte e desfrutar de seu luxo e opulência por algum tempo. Em determinado momento, os rapazes, já adultos foram expulsos de Constantinopla, acusados de terem causado uma praga. Por pouco eles não foram linchados por uma turba furiosa que os via como os culpados pela doença que se espalhava pela cidade.

Anos depois, já no Reinado de Constantino VII, eles puderam retornar. Viveram então sob a proteção Imperial participando de eventos nos quais eram apresentados como uma curiosidade aos visitantes da corte. Pelas descrições, os irmãos eram física e mentalmente saudáveis e muito bem quistos por todos que os conheciam. Teriam chegado a casar e ter filhos, mas não há detalhes a respeito desse pormenor.

Ao que parece, um dos gêmeos acabou ficando doente e morreu, forçando os médicos a realizar a primeira tentativa de separação de gêmeos unidos de que se tem notícia. A cirurgia realizada por um dos médicos pessoais do Imperador infelizmente não teve sucesso e o gêmeo sobrevivente veio a falecer três dias depois.      

As Irmãs Hungaras


As irmãs gêmeas Helena e Judith nasceram no Reino da Hungria em meados de 1701, supostamente com três horas de diferença. Seja isso verdade ou mentira, a experiência supostamente foi tão terrível para a mãe que ela não sobreviveu. As meninas eram unidas pelo osso da pélvis o que fazia com que elas ficassem de costas uma para a outra. Segundo histórias da época, o filho da parteira que realizou o procedimento recebeu as crianças em uma trouxa e foi ordenado a lançá-las num lago. Quando ele estava prestes a fazê-lo, ouviu um choro e descobriu que as meninas estavam vivas. Não teve coragem de matá-las e retornou com elas para o vilarejo.

As meninas acabaram adotadas por uma companhia de artistas itinerantes que as colocou em sua rotina de espetáculos. Elas passaram a ser apresentadas como atração e viveram na estrada dos dois aos onze anos de idade, viajando pela Europa. Elas também receberam vários convites para serem examinadas por médicos e especialistas que se mostravam fascinados pela sua condição.

As meninas aprenderam vários idiomas e se tornaram excelentes cantoras.

Parte do espetáculo elaborado por elas envolvia colocar uma divisória no palco em que elas se apresentavam. Elas cantavam primeiro em separado e depois, com a remoção da divisória, em conjunto. Esse tipo de apresentação se tornou muito popular e as meninas ganharam enorme fama. As turnês as levaram a visitar diversas capitais da Europa recebendo grande reconhecimento e aplausos. Elas teriam até sido cortejadas por nobres e pessoas importantes atraídos pela sua beleza e talento.

Infelizmente, Judith a irmã que demorou mais tempo a nascer acabou sofrendo um derrame  e ficou parcialmente paralisada. Isso forçava Helen a carregá-la o que dificultava as apresentações e impunha enormes dificuldades.

Elas acabaram abandonando a vida no palco e escolheram morar em um convento onde tiveram uma existência tranquila até a morte prematura de Judith. A outra irmã morreu poucas horas depois. Elas tinham 24 anos de idade.  

As Irmãs Rouxinol


A vida de Millie e Christine McCoy é tão cheia de reviravoltas e elementos surreais que por muitas vezes parece obra da ficção. No entanto, historiadores garantem que a maioria das situações realmente ocorreram.

As meninas nasceram na Carolina do Norte em 1851, em uma família de escravos que pertencia a um fazendeiro chamado Jabez McKay. Ele vendeu as meninas e sua mãe a um comerciante quando elas tinham apenas oito meses de vida. A outra opção além de se desfazer delas era sacrificá-las, já que McKay ficou chocado com as gêmeas unidas por uma camada de pele nas costas. Pervis por sua vez as negociou com Joseph Pearson Smith um conhecido Empresário no ramo dos espetáculos itinerantes que administrava um conhecido "Show de Esquisitices". As duas ficavam em uma tenda e a entrada para dar uma espiada nelas custava 1 níquel.

Quando tinham apenas um ano, as crianças foram raptadas e desapareceram sem deixar vestígios. Por algum tempo, supôs-se que elas teriam sido assassinadas, mas surpreendentemente ressurgiram na Inglaterra como atração principal em outro show itinerante que viajava pela Inglaterra. 

Após passar alguns anos na estrada, elas conseguiram retornar para os Estados Unidos. A medida que cresciam, as meninas foram aprendendo a cantar e harmonizar suas vozes se tornando uma das principais atrações de um circo. Quando o dono deste morreu elas passaram a integrar um Show de Esquisitices com o nome artístico de "Billie, o Rouxinol de Duas Cabeças". Elas usavam um vestido largo para fingir que compartilhavam do mesmo corpo. No show não precisavam fazer nada a não ser ficar paradas em uma tenda para que os curiosos as vissem. Certo dia, as duas ficaram irritadas com aquilo e decidiram cantar, o que as transformou em um grande sucesso.

Com a abolição da escravatura, as irmãs escolheram deixar os espetáculos itinerantes, convertendo-se em uma das atrações principais em Casas de Espetáculo na cidade de Columbus. A dupla cantava e se apresentava para os frequentadores, tocando piano e dançando. Elas ganharam dinheiro suficiente para se estabelecer em uma fazenda e ter uma aposentadoria confortável. 

As duas viveram até os 61 anos de idade, morrendo de tuberculose por volta de 1912.       

Os Irmãos Sagrados de Monbali


Os irmãos gêmeos Noor e Noon Mareek nasceram em meados de 1889 no vilarejo de Monbali na India. Eles tinham uma condição extremamente rara na qual compartilhavam do mesmo torso em extremidades opostas do corpo.

Ao contrário do que acontece em muitos lugares do mundo, o nascimento de crianças unidas não é visto como uma maldição ou mau agouro, mas como uma benção dos Deuses. Na religião hindu, várias divindades são dotadas de múltiplos braços e pernas e a condição dos gêmeos os fazia parecer fisicamente com estas divindades. As crianças receberam milhares de visitantes que acreditavam que elas poderiam atender pedidos e fazer com que as preces chegassem ao plano espiritual.

A vida das crianças, no entanto, era extremamente complicada e os pais enfrentavam enormes dificuldades para cuidar das suas necessidades especiais. Elas acabaram sendo entregues para um Monastério que as criou até completarem os 13 anos, idade na qual escolheram se converter em monges. Quando desejavam sair do monastério em que viviam, Noor e Noon eram carregados em uma liteira e apresentados aos fieis como uma espécie de benção divina. 

Em uma peregrinação feita a uma cidade santa em 1911, os meninos atraíram uma multidão de fieis que os cercaram em busca de iluminação. Alguns acreditava que eles eram capazes de operar milagres e que o toque deles podia curar as mais variadas enfermidades do corpo e da alma. O resultado de sua aparição foi uma enorme confusão e um tumulto no qual centenas de pessoas foram pisoteadas, feridas e mortas. 

Após essa grande comoção, os dois decidiram se resguardar e levar vidas discretas atrás dos muros de seu monastério. Quando os irmãos morreram em 1920 seus corpos foram expostos em uma cerimônia religiosa que arregimentou uma multidão de quase 50 mil pessoas que desejavam chegar perto dos dois meninos tocados pelos deuses. Os corpos foram depositado em uma sepultura que até hoje é visitada por milhares de pessoas anualmente. 

Há uma crença de que casais que se conhecem perto dessa sepultura e que posteriormente tem filhos estão fadados a terem gêmeos. Muitos pais indianos expressam um desejo franco de que seus filhos venham ao mundo unidos ou com múltiplos membros.

Fulvio e Erico Goduño


Muito se fala a respeito da noção de gêmeo bom e gêmeo ruim. A ideia de que um gêmeo herdava o lado benigno e o outro o lado maligno do ser, era muito comum no passado. Mas o que fazer quando tal coisa ocorre em gêmeos unidos?

A história de Fulvio e Erico Goduño envolve esse conceito levado ao extremo.

Nascidos em Málaga na Espanha, em 1914, em uma família pobre, os gêmeos vieram ao mundo unidos pela pélvis através de uma camada de cartilagem. Era impossível separá-los sem colocar os irmãos em risco direto. Os pais biológicos não aceitaram as crianças e por isso as deram para a adoção. Eles tiveram a sorte de serem adotados por uma família rica que deu a eles estudo e educação esmerada. Contudo, havia algo errado com s gêmeos: enquanto Fulvio era tranquilo e amável, seu irmão Erico era agitado e dissimulado. Em geral, irmãos siameses possuem personalidades que se encaixam, como um mecanismo para funcionarem em conjunto dada a necessidade de interação. No caso dos gêmeos espanhóis as personalidades eram totalmente adversas e conflituosas.

Com o passar do tempo, as diferenças foram se acentuando. Fulvio era obediente, já Erico construía uma personalidade cada vez mais rebelde. Não se conformava da interdependência do irmão e tentava exercer sobre ele domínio, impondo sua vontade pela força. Fulvio começou a aparecer frequentemente com marcas roxas e machucados pelo corpo, produzidas por Erico em seus acessos de raiva. Quando o irmão não concordava com algo sua reação era furiosa. Os meninos chegaram a estudar um um colégio, mas foram afastados por conta de Erico que atacava as outras crianças e as aterrorizava.

Quando atingiram a idade adulta, Fulvio desejava se tornar engenheiro, já Erico não tinha perspectivas sérias e embora tivesse sido persuadido a seguir o irmão nos estudos se ressentia dele. Erico chegou a atacar uma empregada e tentou violentá-la, sendo impedido pelo irmão. O escândalo resultante se tornou um debate no qual a justiça tentava definir como processar um irmão sem punir o outro. 

Por fim, os irmãos acabaram concordando em se submeter a uma arriscada cirurgia de separação em 1936 por médicos franceses. Durante o procedimento Fulvio acabou não resistindo e morreu na mesa de cirurgia, seu irmão sobreviveu mas desenvolveu um problema na coluna e morreu 12 dias depois.

Os irmãos Goduño são o único exemplo conhecido de irmãos gêmeos siameses antagonistas.

3 comentários:

  1. Como posso entrar em contato com o autor ?

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    1. Oi André, tudo bem? Dê uma olhada nos contatos do Mundo Tentacular ou no grupo do Facebook que talvez seja o mais fácil.

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  2. O ser humano ainda não evoluiu o suficiente para aceitar aqueles que são diferentes dele

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