Ah, nada como o cheiro de um Livro de RPG novinho em folha.
Muitas vezes, quando olhamos para o novo, precisamos fazer um aceno para o antigo. Acredito que a maioria de nós, jogadores de RPG, começamos a rolar os primeiros dados, explorando masmorras e enfrentando monstros nos clássicos cenários de Dungeons & Dragons. Para muitos, o bom e velho D&D é sinônimo de RPG, e constitui aquilo que poderia ser compreendido como a porta de entrada para nosso amado hobby.
Com o tempo, os jogadores fisgados pela brincadeira descobrem, geralmente impressionados (por vezes até maravilhados), que existem vários outros tipos de RPG e que há muito mais além de Dragões, Orcs e Elfos espreitando por aí. Existe uma vasta gama de mundos e universos a serem conhecidos e o único limite é sua imaginação.
Um dos primeiros RPG que joguei depois de passar algum tempo envolvido com D&D foi Chamado de Cthulhu, e nem preciso dizer que ele se tornou o meu RPG favorito. Mas acho que nunca me afastei de D&D, talvez por ter sido meu primeiro jogo, mas certamente por guardar uma preciosa memória afetiva de aventuras vividas em volta de uma mesa na boa companhia de amigos.
Mas D&D em determinado momento de sua história mudou e por algum tempo, aos meus olhos, perdeu seu brilho. Estaria o Império da Imaginação ameaçado de conhecer o ocaso?
Não temam, pois em 2014, a Wizards of the Coast lançou a quinta edição do D&D que se tornou um marco na história do jogo. Depois de um longo inverno causado pela controversa edição anterior, D&D conseguiu se reinventar e trazer de volta seus fãs. Mais do que isso, a 5ª edição conseguiu a façanha de agradar em cheio tantos aos novos, quanto aos antigos jogadores. Ela se tornou a mais vendida e popular da história de D&D, o que não é pouco, se consideramos que jogo já completou 50 anos.
Um cavaleiro prestes a ter um péssimo dia enfrentando um Shoggoth |
Com o sucesso da encarnação mais recente de D&D, não é de se estranhar que várias jogos queiram usar a licença para utilização de suas regras, o OGL, que permite adaptar o sistema às mais diferentes ambientações.
No outono de 2018, um Financiamento Coletivo nos Estados Unidos, ofereceu a apoiadores a chance de unir dois mundos sob um mesmo sistema e ambientação. Pela primeira vez, teríamos os pesos-pesados D&D e Chamado de Cthulhu, combinados num mesmo jogo que mistura Fantasia Medieval e o Horror Cósmico de H.P. Lovecraft. O resultado foi um monstro de dimensões titânicas chamado "Sandy Petersen´s Cthulhu Mythos", um livro que despeja doses maciças do Terror lovecraftiano em seu típico mundo de fantasia medieval.
Para quem não sabe quem é o sujeito cujo nome está no título do jogo, cabe explicar que o tal Sandy Petersen é nada menos do que o criador do RPG Chamado de Cthulhu. O cara que leu os contos de H.P. Lovecraft e teve o estalo de que aquilo poderia ser transformado em um jogo de interpretação. Petersen é uma lenda viva entre os game designers e sua importância para o RPG é pautada não apenas pelos prêmios que recebeu, mas pelos elogios dos jogadores. Sandy está para Cthulhu, assim como Gary Gaygax e Dave Arneson estão para D&D. Ele é o Grande Antigo!
Por algum tempo, Sandy esteve afastado do mercado de RPG, mas em 2015 retornou com força total através do colossal Financiamento do Boardgame Cthulhu Wars, o primeiro arrasa quarteirão de sua recém criada companhia, a Petersen Games. Quando foi feito o anúncio de uma tão aguardada fusão entre os D&D e Cthulhu, os fãs ficaram incrédulos, mas quando o nome de Sandy foi proferido, qualquer dúvida se dissipou. Afinal, se você já leu ou jogou algum dos jogos escritos por Sandy, baseados no Mythos, é impossível não reconhecer sua paixão e conhecimento sobre o tema. Para demonstrar a seriedade da coisa, o nome de Petersen foi incorporado ao título (que por algum tempo chegou a ser cogitado chamar-se Dungeons and Mythos). Seu nome na capa do produto é como uma chancela de confiança. Que outro autor além de Sandy Petersen poderia dar um carimbo de aprovação para essa mistura profana, nascida em meio a blasfêmia, gerada sob os auspícios de negras profecias? Os Mythos desembarcaram oficialmente no universo de Dungeons and Dragons e nada mais será igual! Tremam céus e terra, empalideçam deuses e demônios, nos mundos de fantasia e aventura, nem mesmo a mais alta magia poderá salvá-los da Insanidade dos Mythos Ancestrais.
O Grandaddy do Mythos, o Sr. Sandy Petersen |
A seguir, temos a nossa resenha para esse volume de insanidade incontida, repleto de maldade inaudita e horror inescrutável. Livro que está sendo publicado pela Editora Galápagos aqui no Brasil, com uma tradução primorosa e altíssimo padrão. Venha conosco examinar as páginas desse tomo de conhecimento blasfemo, e prepare-se para encarar inimigos que seu grupo jamais imaginou encontrar no extremo da espada.
Reze pelos heróis, eles estão em desvantagem.
Quando eu chamei o Sandy Petersen´s Cthulhu Mythos (doravante SPCM) de "tomo", quero deixar claro que não se tratava de um exagero. O livro é massivo tanto na forma quanto em conteúdo. Estamos falando de um calhamaço com quase 400 páginas coloridas, amplamente ilustradas e com capa dura. Tudo de primeira qualidade e com um acabamento de fazer inveja aos mais altos padrões gráficos. O Livro é grande, imponente, pesado: o tipo da coisa que impõe respeito, reinando soberano na prateleira. Para se ter uma ideia, temos dois marcadores de página, e chego a pensar que três até viriam bem à calhar, pois o livro é imenso.
Visualmente SPCM é um deslumbre com diagramação arrojada, textos e boxes distribuídos pelas páginas de papel couché brilhante, fartamente guarnecidas com ilustrações incríveis. Algumas ocupam página inteira, outras duas páginas, com imensos painéis no qual despontam monstruosidades em toda sua glória alienígena. Os monstros do Mythos raramente foram tão estranhos, bizarros e fascinantes. Parabéns a equipe artística que se superou na difícil tarefa de dar forma ao horror destilado pelas estrelas. Que arte senhoras e senhores, que arte!
Cultistas e feiticeiros do Mythos serão seus inimigos |
Mas que seria da forma sem substância?
O livro abre com uma longa explanação dos conceitos básicos para os Mestres entenderem e absorverem em suas campanhas. A primeira parte do capítulo, como esperado, faz um excelente trabalho definindo o que é o Mythos para aqueles que não estão familiarizados com ele. Didático é bem verdade, mas muitíssimo necessário para os recém chegados. A segunda parte da introdução mergulha mais fundo, com ótimas dicas e conselhos específicos sobre como transformar aventuras medievais fantásticas em pesadelos contaminados pela mácula do Horror Cósmico. No geral, você obtém exemplos sólidos de como misturar o gênero lovecraftiano em campanhas existentes ou novas. Um conselho para o sábio: não pule este capítulo achando que já sabe o bastante sobre a ambientação e que não precisa dessas dicas, há informações muito boas a serem absorvidas que permitem entender qual o tom a ser impresso no jogo.
Antes de abordar os pormenores é interessante entender que SPCM pode ser usado de duas maneiras diferentes:
Primeiro, o livro fornece vários elementos dos Mythos que podem ser encaixados em uma campanha clássica já em curso e que não tem necessariamente uma ligação direta com o Horror Cósmico. Digamos que o mestre quer tentar algo diferente, e assim, quando o grupo está explorando um recanto isolado da Costa da Espada se depara com um vilarejo invadido dos Fungos de Yuggoth ou a incursão de um Mastin de Tindalos. Outra opção? Em uma expedição aos recônditos do Vale do Vento Frio, os heróis descobrem um novo e terrível Deus na forma de Itaqua e seus abomináveis cultistas. Ou ainda, encontram um tomo de magia ou artefato esquecido, que permite acessar enormes poderes desconhecidos, mas ao custo da razão e sanidade. SPCM usado dessa forma é uma caixa de ferramentas com todo tipo de dados, informações e sugestões de como fazer o grupo de aventureiros enfrentar o que há de pior no universo. Se o DM quiser lançar os heróis contra um desafio apavorante, o livro fornece tudo de que irá precisar e muito mais.
Os Horrores estão em todo canto, inclusive nos mares |
Mas é na segunda opção que todo o potencial desse livro se torna evidente. Usá-lo como suplemento para introduzir esse ou aquele monstro é legal, mas a proposta mais ambiciosa é construir toda uma Campanha baseada nas Criaturas, Deuses e Abominações do Mythos. Apresentar aos jogadores uma série de aventuras nas quais eles descobrem aos poucos como um mundo de fantasia clássico pode ser invadido, contaminado e por fim, transformado por forças alienígenas tóxicas. O livro se esmera ao oferecer opções de como emular isso, como fazer com que os mundos clássicos sejam invadidos pela corrupção do Mythos que destrói tudo aquilo que toca. Com base nisso, imagine as campanhas que podem ser criadas. Que tal uma luta desesperada para impedir que os Sahuagin e Kuo-Toa, unidos aos Abissais, tragam Cthulhu de volta? Que tal uma campanha de exploração na qual o grupo descobre uma Ruína ancestral (masmorra?) repleta de Shoggoths, escondida no topo de montanhas enlouquecedoras? Ou ainda, que tal uma luta contra o relógio para deter Nyarlathotep que planeja derrotar os deuses e transformá-los todos em suas máscaras? Uma campanha de D&D clássico misturado ao Mythos tem tudo para ser algo memorável.
Seja qual for o uso que o DM quiser dar a esse material, ele encontrará uma fartura de conselhos, dicas e sugestões que lhe permitem colocar em ação o que bem entender.
Quanto a características exclusivas a serem usadas numa ambientação inspirada (ou seria maculada?) pelos Mythos de Cthulhu, temos uma fartura de elementos a começar por quatro raças adicionais para os jogadores escolherem, além das clássicas. Essas novas raças foram extraídas diretamente da obra de Lovecraft e são: Gato da Terra dos Sonhos, Carniçais, Gnorri e Zoogs. Cada uma dessas raças é apresentada com uma riqueza vívida de informações de sua história, aparência física, sociedade, crenças, expectativa de vida, etc. É um material bastante similar ao que encontramos no Livro do Jogador de D&D, voltado para as raças clássicas. Admito que eu estava um pouco preocupado com algumas dessas raças sendo abertas a jogadores, mas depois de ler cada uma, elas pareceram bastante interessantes, com algumas surpresas se sobressaindo, como as curiosas capacidades do Gato e o repertório de bizarrice antropofágicas dos Carniçais. De longe, essas foram as raças que mais me agradaram e mal posso esperar para montar um personagem felino. O Gnorri é uma espécie de tritão com três braços e o Zoog é um marsupial maldoso com o desagradável hábito de devorar outras criaturas conscientes. São interessantes também, mas ao meu ver ficam um patamar abaixo. Além dessas raças, há duas novas sub-raças humanas, o Povo de Leng e os abomináveis Tcho-tcho, ambas tendendo ao mal e caos, graças às suas culturas perversas e homicidas. Francamente me parecem mais indicadas para vilões ou inimigos, mas nunca se sabe.
As Raças jogáveis apresentadas no Sandy Petersen's Cthulhu Mythos |
Além das novas raças, temos adaptações particulares para as 11 classes básicas, oferecendo oportunidade para os jogadores incorporar elementos específicos da ambientação às suas habilidades. A maioria destas novas habilidades diz respeito a como enfrentar, caçar e derrotar criaturas do Mythos, mas alguns envolvem também negociar e obter poderes através desses seres. As opções são bastante válidas, mas obviamente não são obrigatórias. Nada impede que o jogador opte pelos pacotes presentes no Livro Básico ou nos vários suplementos.
Outra inovação é uma habilidade baseada em Sabedoria, chamada Yog-Sothothery, que é essencialmente a velha habilidade clássica de Chamado de Cthulhu: Cthulhu Mythos com um nome a meu ver, mais adequado. Esta habilidade mede o conhecimento do Mythos do personagem, o que ele entende da mitologia e o grau de compreensão ele tem de fenômenos associados a eles. É claro, fiel à noção de que "conhecimento do Mythos é algo perigoso para a razão", quanto mais se sabe à respeito do Mythos mais difíceis se tornam os Testes para superar o medo. Finalmente encontramos uma lista de novos antecedentes relacionados ao Mythos e de Talentos voltados, sobretudo, para as novas classes.
Uma vez que estamos falando de um jogo inspirado no Horror Cósmico, Loucura e Pavor não poderiam deixar de ter um papel crucial. Se você já jogou qualquer versão de Chamado de Cthulhu ou outros jogos lovecraftianos, a perda de sanidade é algo sempre presente. A mecânica de SPCM se vale de uma regra simples, mas eficiente utilizando o conceito de Escala de Pavor dividida em 7 níveis. Quando os personagens se veem confrontados por uma cena aterrorizante, uma revelação bombástica ou pelo contato direto com os Deuses Ancestrais, é necessário fazer um Teste de Pavor (que envolve o atributo Sabedoria). Em caso de falha no teste, o personagem adquire um ou mais Níveis de Pavor (dependendo da severidade do que viram). A medida que a Escala de Pavor vai aumentando, os personagens começam a manifestar desvantagens relacionadas ao medo que estão sentindo.
Monstruosidades de todo tipo, para todo nível de desafio |
Insanidade é outro elemento importante nas aventuras de SPCM. A exposição aos horrores cada vez mais terríveis e o avanço na Escala do Pavor leva os personagens às raias da loucura. Quando um personagem desenvolve uma insanidade, ela se mantém com ele até ser superada por magia ou com tratamento à longo prazo. Cada Insanidade possui um grau de dificuldade para resistir, e sempre que o personagem for exposto a algum elemento que envolva aquela insanidade, ele precisa fazer o mesmo teste. Um sucesso significa que ele consegue suprimir temporariamente os efeitos, mas uma falha faz com que os efeitos se façam sentir com toda sua potência. Há uma lista extensa de Insanidades que podem ser definidas aleatoriamente ou escolhidas pelo DM, sendo as fobias as mais comuns.
As regras determinam que são três Níveis de Insanidade que definem o quão insano seu personagem é ou está se tornando. No primeiro nível o personagem enfrenta algumas limitações e imprevistos, no segundo as coisas se tornam mais sérias e ele pode perder o controle temporariamente, enquanto no terceiro nível, a loucura se apoderou dele e não há nada que possa ser feito para restaurar sua razão.
Eu fiquei satisfeito com essa mecânica, é simples e funcional. Não trás grandes novidades, mas também é fácil de usar na mesa e permite modulação e ótimas oportunidades de interpretação. Também fiquei satisfeito com o fato de que "criaturas", mesmo as do Mythos, não causam terror nos personagens, e sim as ações delas. Seria irreal que os personagens que vivem em mundos de Fantasia ficassem apavorados ao ver um Mi-Go, mas não um Mind Flayer. Pelas regras, não há Testes de Pavor por simplesmente ver uma criatura, entretanto certas circunstâncias podem obrigar os heróis a lidar com o medo. Por exemplo, os heróis não estarão sujeitos a um Teste de Pavor caso se deparem com três Carniçais em um cemitério à noite. Entretanto, se eles encontrarem os mesmos três Carniçais desenterrando e devorando ruidosamente o cadáver de um amigo, aí sim, o Teste é justificável. Eu gostei desse detalhe nas regras. Já no que diz respeito aos Deuses e Entidades do Mythos, esses sim podem obrigar os jogadores a fazer um Teste de Pavor apenas por encontrá-los frente à frente.
Dragões serão um de seus menores problemas dessa vez. |
Outro elemento interessante introduzido na ambientação diz respeito ao Aklo, a linguagem oculta utilizada pelas criaturas do Mythos. Grosso modo, o Aklo é uma espécie de idioma comum destas abominações e que pode ser utilizado para compreender tanto sua linguagem gutural, quanto suas runas arcanas e símbolos mágicos. Aprender Aklo não é tarefa simples, já que a língua não foi criada para ser usada por mortais. A linguagem sombria possui várias interpretações e nem sempre um personagem conseguirá entender o que está sendo dito ou o que está escrito num entalhe ou pergaminho ancestral. Isso permite ao DM manter um certo controle sobre os segredos da ambientação.
Finalmente, temos uma explanação à respeito da Terra dos Sonhos e como ela se relaciona com o jogo. Em termos de cosmologia de D&D, a Terra dos Sonhos é muito similar a um dos mundos planares acessada através de magias e rituais que abrem passagens e portais. Os personagens podem aprender a entrar na Terra dos Sonhos enquanto dormem. Lá eles vivem aventuras com um teor surreal ressaltado, em que nem tudo é o que parece e onde nem tudo funciona como deveria. Achei bem interessante a proposta e fico imaginando que um suplemento ou aventura explorando a Terra dos Sonhos mais à fundo, será questão de tempo.
Os capítulos seguintes detalham elementos próprios da ambientação, incluindo itens e textos do Mythos. Primeiro temos uma coleção de itens mundanos que podem ser adquiridos pelos personagens em suas explorações. A seguir, os itens mágicos do Mythos e aqueles que foram criados com Tecnologia Alienígena que são tratados como objetos encantados para fins de regras. A maioria desses objetos são itens maravilhosos e artefatos com disponibilidade variando entre incomum até lendário. É interessante acompanhar a forma como vários objetos clássicos das histórias lovecraftianas foram adaptados para a mecânica e estilo de D&D. Com isso, os jogadores poderão ter em suas mãos desde Projetores de Nevoeiro dos Mi-go até Armas de raios da Grande Raça, isso se não conseguirem colocara s mãos em artigos ainda mais poderosos como a Chave de Prata ou o Trapezoedro Brilhante.
Cultos se espalham pelo mundo de D&D, a Cabra Negra não poderia faltar |
Além dos tesouros mágicos, o universo do Mythos oferece os tradicionais tomos e livros com conhecimento profano. Os textos concedem além de magias e rituais poderosos, segredos do Mythos que se traduzem em pontos de Yog-Sothotery, o equivalente do jogo ao Cthulhu Mythos. Obter esse conhecimento aterrorizante, obviamente não é uma tarefa simples, pois, meramente se expor a esses textos malignos faz com que o personagem precise realizar Testes de Pavor. Muitos dos livros são títulos extraídos das clássicas histórias de Lovecraft e de seu Círculo de amigos, portanto espere encontrar o Necronomicon, o Vermis Mysteriis, o Black Book e todos os outros títulos fascinantes e perigosos. O capítulo dedicado a esses livros oferece uma descrição dos tomos , as magias e as estatísticas que definem a potência contida na obra em questão. Longe de ser um "tesouro", os livros estão mais para uma maldição que pode ter um alto preço para os personagens que quiserem ler seu conteúdo.
A seguir, temos uma vasta lista de novas magias que estão ligadas ao universo dos Mythos Ancestrais. Ao contrário das magias tradicionais, SPCM oferece um sistema de magias específico quando se trata de Magias ligadas aos Mythos. Esta modalidade de magia depende do uso de Fórmulas altamente especializadas que geralmente estão além da compreensão mortal. Os feitiços são encontrados em livros proibidos ou aprendidas com mentores sinistros. O que é surpreendente e assustador nas magias de Fórmula é que qualquer personagem pode tentar aprendê-las, bastando para isso ter acesso a elas e estudar seus princípios básicos. Os rituais não fazem parte de uma Lista de Feitiços, como ocorre com as magias de classe tradicionalmente. Qualquer classe ou raça pode ter acesso a elas, mas é claro, existe um preço a ser pago. Na verdade, esse preço, é duplo - os personagens farão testes de habilidade dependendo da Fórmula empregada. Se tiverem sucesso o personagem conseguirá executar a magia à contento, se não, a conjuração causará algum tipo de reação que resultará em danos físicos e/ou mentais. O segundo problema é que há efeitos realmente daninhos para quem utiliza magias do Mythos sem o devido cuidado. Os jogadores podem aprender as magias que desejarem, mas elas poderão trazer mais riscos do que benefícios. Os jogadores que já estão familiarizados com os feitiços clássicos descritos em Chamado de Cthulhu encontrarão a adaptação de vários deles para a mecânica de D&D. Um trabalho realmente notável dos game designers.
Mais adiante temos um capítulo dedicado a fornecer explicações detalhadas sobre a Natureza dos Deuses Exteriores e dos Grandes Antigos e como eles estão relacionados com a cosmologia clássica. O material é excelente tanto para novatos quanto para quem conhece as nuances dos Mythos. SPCM define os deuses e entidades superiores do Mythos como Influências Ancestrais e não como simples monstros a serem encontrados e enfrentados. Mas é claro, estamos falando de D&D, portanto, os personagens poderão e eventualmente, até deverão, enfrentar esses seres, com chances de vencê-los. Contudo, condições específicas precisam ser cumpridas para que estes colossos cósmicos sejam derrotados.
E claro, o sr. C não poderia ficar de fora. |
Os blocos de estatísticas listam detalhes pertinentes sobre as entidades como fonte primária, arma favorita, símbolo, templos, adoradores e servidores, seguido por estatísticas semelhantes às que aparecem no Livro dos Monstros. Um dos princípios básicos sobre o Horror Cósmico é mantido em SPCM; a filosofia de que esses seres terríveis podem ser detidos (geralmente com grande custo), mas não destruídos e que provavelmente eles se levantarão novamente graças aos cultos que oferecem sacrifício e devoção.
Os Cultos aliás serão os inimigos principais de SPCM e é provável que os heróis enfrentarão mais cultistas ao longo de sua carreira do que qualquer outro monstro. Os Grandes Cultos (chamados de Big 8) com seus seguidores, adoradores fanáticos, servos fiéis e líderes sanguinários, são uma das partes mais importantes da ambientação. O livro explica como diferentes raças e criaturas, povos e civilizações servem a essas entidades e como é sua relação com eles. O capítulo apresenta a estrutura organizacional e práticas dos cultos, bem como quem ou o que normalmente compõe a fileira de seus membros. O capítulo vai além, incluindo cultos menores e Grandes Antigos obscuros que recebem uma atenção especial. Temos ainda uma visão detalhada das culturas dos Tcho-Tcho e dos Abissais que estão entre os grandes oponentes da ambientação.
Novamente, se você conhece Chamado de Cthulhu ou é um fã de longa data dos Mythos, encontrará muitos monstros clássicos e alguns novos horrores fresquinhos. Os monstros são um dos maiores atrativos do livro e é claro, qualquer mestre irá dedicar um bom tempo se familiarizando com essas criaturas e imaginando onde poderá usá-las. O livro traz uma coleção realmente impressionante de monstruosidades tentaculares e abominações nojentas, com vários níveis de dificuldade. Se o material for usado em Campanhas convencionais, ele oferecerá um sortimento considerável de novas criaturas para desafiar os jogadores já cansados do Manual de Monstros. Que tal encontrar um Byakhee, lutar com um Gug ou quem sabe testar suas habilidades contra um Shoggoth?
Eu gostei muito das caixas de texto "O que você vê" que dá uma descrição física detalhada e assustadora das criaturas e como elas podem ser descritas pelo DM. Sem dúvida, os monstros, suas descrições criteriosas e ilustrações medonhas são um dos pontos altos de SPCM. Algumas das criaturas receberam uma roupagem diferenciada e se tornaram ainda mais aterrorizantes. As ilustrações, incrivelmente evocativas, são belíssimas, ainda que muitas delas tenham sido reaproveitadas do manual de instruções de Cthulhu Wars e outras publicações da Petersen Games. Um detalhe menor que me incomodou um pouco é que algumas ilustrações embora incríveis, claramente se referem a ambientações de terror modernas, mostrando indivíduos com trajes contemporâneos ao invés das roupas que esperamos encontrar em um mundo de fantasia medieval. Contudo, esse é um detalhe menor que não chega a ser uma falha, sobretudo porque a arte continua sendo estupenda.
Um mundo assolado pelos Mythos é a oportunidade perfeita para heróis de verdade |
Para resumir, suponho que os leitores irão se surpreender com esse livro, assim como eu me surpreendi positivamente. Francamente, não esperava gostar tanto e se eu tinha alguma reticência à respeito de misturar D&D e Cthulhu, estas desapareceram.
São muitos os méritos presentes em Sandy Petersen´s Cthulhu Mythos: uma ambientação detalhada, excelente conteúdo e organização invejável. Aqueles que desejam ter um primeiro contato com os Mythos de Cthulhu não ficarão decepcionados e os fãs de longa data sem dúvida vão delirar com a possibilidade de fundir seu D&D clássico com o melhor do Horror Cósmico. A forma como os autores conseguiram relacionar o Mythos com a mecânica de D&D é primorosa. Por vezes, quando uma ambientação é adaptada para um sistema já existente, esta acaba soando forçada, quase como se fosse preciso aparar arestas para assim garantir o funcionamento. Em SPCM a adaptação encaixou perfeitamente, com sistema e ambientação convivendo de maneira harmoniosa.
Se você está procurando por algo diferente para sua mesa de D&D, se quer desafiar seus jogadores com monstros detestáveis e se planeja incluir niilismo, isolamento e corrupção na sua campanha, esse livro precisa estar em sua mesa de jogo e ele será um ótimo acréscimo ao seu arsenal de Narrador.
Peguei no Amazon versão nacional pela Galápagos e gostei muito ! Um acréscimo muito bem vindo para D&D5th ! Recomendo mesmo para quem não joga ou usa D&D5th.
ResponderExcluir