Em 8 de outubro de 1880, um grupo de cinco homens partiu em um pequeno veleiro de Bermagui, em Nova Gales do Sul, Austrália para uma viagem pela costa. A bordo estava um geólogo do Departamento de Minas de Nova Gales do Sul chamado Lamont Young, seu assistente Maximillian Schneider, o proprietário do barco Thomas Towers e dois amigos de Towers, William Lloyd e Daniel Casey.
O objetivo da excursão era seguir ao longo do litoral norte de Bermagui, uma área isolada e pouco povoada e fazer um levantamento de minas de ouro que supostamente existiriam lá. Era uma viagem comum, como outras tantas realizadas pelo mesmo grupo no ano anterior. Contudo, esta foi uma expedição da qual nenhum dos homens retornaria, deixando um mistério desconcertante que nunca foi resolvido e que perdura até os dias atuais.
Três dias após a partida, em 11 de outubro, o veleiro foi visto parado na água com apenas uma pessoa nele. A testemunha acenou e tentou entrar em contato com a figura solitária no tombadilho, mas ela aparentemente a ignorou. Esta foi a última vez que alguém viu oficialmente um membro da tripulação. Na tarde seguinte, por volta das 16h30, um fazendeiro local chamado William Johnston cavalgava ao longo da costa de Mutton Fish Point, a cerca de 15 quilômetros de Bermagui, quando notou algo estranho na praia. Ele não conseguia distinguir bem o que era, mas podia ver que havia algo grande que refletia a luz do sol. Curioso, ele desceu do cavalo e saiu para investigar do que se tratava. Ao se aproximar, pôde ver que o objeto era um bote branco de madeira sem os remos. Mais adiante, preso nas rochas além da arrebentação com as velas amarradas encontrava-se o veleiro.
Imaginando que alguém poderia precisar de ajuda ele foi até o barco para uma inspeção. A revista mostrou que não restava ninguém à bordo, então Johnston decidiu cavalgar para tentar encontrar alguém e relatar sobre essa estranha descoberta. Johnston foi até a casa de outro fazendeiro chamado Albert Read, com quem ele voltaria ao barco abandonado para dar uma olhada. Eles encontraram a bordo cinco sacolas cheias de roupas, uma bússola de bolso, vários sacos de batatas, um cachimbo e papéis com o timbre do Departamento de Minas e o nome Lamont Young. Decidiram avisar o diretor dos campos de ouro Henry Keightley, patrão de Young, que chegou ao local acompanhado do policial John Berry. O grupo descobriu que alguém havia feito buracos no casco do barco por dentro e que a popa estava cheia de pedras pesadas, parecendo indicar que a embarcação havia sido danificada intencionalmente. A âncora e as cordas da popa estavam ausentes, mas como tudo no barco estava seco, ele obviamente não havia inundado o bastante para afundar. A popa também estava estranhamente cheia de travesseiros, cobertores e roupas por razões desconhecidas, e uma boa quantidade de vômito foi encontrada no tombadilho. Uma bala deflagrada foi encontrada na parte de baixo e também uma misteriosa garrafa azul com um líquido, que acabou sendo identificado como óleo copaíba usado como bálsamo. Perto da praia, foram encontrados os restos de uma fogueira e de uma refeição, bem como um pouco de comida e três botões de camisa, mas além disso e do que foi encontrado no barco, não havia mais nenhuma pista.
O veleiro desaparecido era similar ao da foto com dois mastros. |
Logo se soube que se tratava do barco pertencente ao Capitão Towers e que ele havia sido alugado por Young. Soube-se também que ele transportava cinco homens, mas o que aconteceu com eles era um mistério. Ninguém tinha a menor ideia de seu paradeiro. Não havia sinal evidente de luta, nenhum sangue encontrado à bordo, e tudo era bastante desconcertante. Várias buscas foram realizadas e uma recompensa generosa foi oferecida por informações que levassem a descoberta dos homens, mas não houve quaisquer evidências do que havia acontecido com desaparecidos.
Nesse ínterim, a história foi se tornando cada vez maior, despertando curiosidade geral. Ela foi transmitida através de todo Império Britânico, e a baía onde o barco foi encontrado ganhou o apelido adequado de Mystery Bay (Baía do Mistério), nome que mantém até hoje.
Muitas teorias circularam na época, hipóteses levantadas por moradores das cercanias. Uma delas era que os homens haviam abandonado o barco na costa devido a alguma ameaça premente. Entretanto, não se registrou tempestade ou vendaval naqueles dias. De fato, eram condições ideais para navegação no litoral. Além disso, se esse fosse o caso, parecia improvável que a embarcação pudesse ter flutuado sem tripulação pelas muitas rochas da área onde terminou sendo encontrada quase intacta. Alguém teria de ter navegado por aquela área insalubre. Além disso, o bote na praia demonstrava que a tripulação havia desembarcado, mas não explicava para onde teriam ido em seguida.
Outra ideia é que eles teriam sido vítimas de pirataria, mas não havia evidências claras que apontassem para tal coisa. A falta de sinais de luta ou violência depunham contra essa teoria, já que os prospectores costumavam carregar armas de fogo para se proteger de criminosos interessados em suas descobertas de metais preciosos. Um revólver calibre 41, que mais tarde foi identificado como pertencente a Maximillian Schneider havia sido deixado em uma gaveta, mas outras armas haviam sumido. A teoria de pirataria encontrava um grande obstáculo já que os ladrões teriam levado objetos de valor como relógios, documentos e uma corrente de ouro que foram abandonadas na cabine. Além disso, as autoridades locais garantiram que uma operação contra pirataria ocorrida apenas duas semanas antes do desaparecimento havia debandado os criminosos locais.
Lamont Young era um jovem e promissor geólogo australiano |
Alguns cogitaram que o grupo poderia ter descoberto algum veio de ouro e que em algum momento se desentendeu à respeito de informar ou não a descoberta. Prospecção era um negócio arriscado que exigia sigilo dos envolvidos. Se um deles tivesse tentado esconder tal descoberta, isso poderia justificar assassinato. Contudo a medida que o caso ganhou repercussão, cartazes com o nome e o rosto dos desaparecidos foram divulgados em toda Austrália e ninguém viu qualquer um dos envolvidos.
Na ausência de qualquer evidência, algumas alegações e suposições bizarras começaram a pipocar.
Alguns moradores locais afirmavam que na véspera do desaparecimento estranhas luzes foram vistas nos céus, bem como um clarão monumental que iluminou a madrugada do dia 10 com uma luz descrita como "um clarão branco que vinha do céu". Algumas testemunhas também mencionaram um estranho ruído de explosão se originando no céu sem que ninguém fosse capaz de explicar do que se tratava.
Outra teoria estranha é que a embarcação poderia ter sido vítima do ataque de um Bunyip, uma criatura do folclore australiano. O Bunyip (cujo nome em dialeto aborígene significa "demônio" ou "espírito maligno") é um monstro do tamanho de um boi que habita pântanos, charcos e o vasto billabong australiano. Sendo uma criatura aquática, o Bunyip tende a atacar embarcações que invadem o seu território, afundando e matando as pessoas que tem o azar de cruzar o seu caminho. Segunda a crença, a criatura se alimenta de carne humana e constitui um enorme perigo.
Para aqueles que mencionam o fato de não haver sinais de violência à bordo, os defensores dessa bizarra teoria afirmavam que o Bunyip possuía vários poderes sobrenaturais, sendo o mais conhecido um grito medonho que afeta as vítimas, paralisando-as e impedindo que elas se movam. Com isso, a criatura se aproxima para recolher as vítimas sem que elas tenham chance de reação.
O Bunyip em uma representação atual. |
Lendas sobre o Bunyip são muito antigas e remontam aos primeiros colonos que chegaram à Austrália e que tiveram contato com aborígenes. A região específica de Nova Gales do Sul é uma das mais ricas em histórias sobre a misteriosa criatura e a Costa de Safira um dos supostos habitats desses seres. Os aborígenes possuem várias histórias desconcertantes sobre o encontro com as criaturas. Segundo eles, os Bunyips são difíceis de serem vistos uma vez que costumam se esconder sob a água ou em cavernas submarinas.
A mídia fez uma cobertura sensacionalista do caso e passou a inventar histórias cada vez mais bizarras para tentar explicar o que teria acontecido. Houve um artigo de notícias que apareceu em uma edição de agosto de 1888 do Bega Gazette, com o seguinte conteúdo:
"Embora as autoridades policiais tenham mantido o assunto em segredo, aborígenes e colonos da região mencionaram que os desaparecidos na Costa de Bermagui, teriam sido atacados por um ou mais Bunyip. Sons apavorantes de uma criatura desconhecida foram ouvidos na madrugada do dia 9, véspera dos desaparecimentos. O ruído foi descrito como um som agudo e estranho varando a madrugada. O som de tiros e de gritos também teriam sido ouvidos por aborígenes. Autoridades encontraram misteriosos rastros, supostamente deixados pela elusiva criatura na praia próximo de um acampamento improvisado usado pelos desaparecidos. A polícia de Nova Gales do sul contratou guias aborígenes para auxiliar na busca pelas vítimas, mas até o momento nem mesmo os experientes mateiros tiveram sucesso em achar seu covil. A procura continua".
Outra notícia falsa publicada foi uma reportagem do jornal Melbourne Argus que afirmava que uma jaqueta manchada de sangue pertencente a Young havia sido encontrada na praia. A pista seria o primeiro indício de violência relacionado ao caso, mas tudo não passou de simples boato.
Outra pista estranha surgiu alguns meses depois, quando um homem chamado William Tait afirmou ter sido visitado pelo fantasma de Young, que lhe contou ter sido assassinado e que seu corpo foi lançado na água. O fantasma teria dado a localização precisa de seus restos; perto de um toco preto 50 metros acima da marca d'água em meio a pedras. A polícia, desesperada para que alguma coisa acontecesse, deu de ombros e verificou de qualquer maneira, mas não encontrou nenhum toco, nenhuma pedra e nenhum corpo. O tal fantasma supostamente foi visto por pelo menos mais meia dúzia de pessoas que reconheceram por fotos se tratar de Lamont Young.
O litoral da Costa de Safira possui várias praias rochosas em sua extensão. |
Infelizmente, o paradeiro da tripulação desaparecida em Mystery Bay jamais foi determinado.
Há aqueles que acreditam em um trágico acidente, em crime, abdução alienígena e no envolvimento de uma criatura bizarra, mas nada capaz de apontar para qualquer direção foi levantado. O caso persiste como um dos maiores mistérios da história da Austrália, tendo ganhado fama ao longo dos anos com o título de "Mistério Bermagui", sendo debatido e investigado por detetives amadores até hoje.
O que aconteceu com os cinco homens desaparecidos e o que todos esses rumores bizarros significam? Poderia haver algo sobrenatural ou inesperado nesse incidente? Ninguém realmente sabe, e ele continua sendo um caso incrivelmente misterioso que muito provavelmente jamais encontrará uma solução satisfatória.
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