Dando continuidade ao artigo sobre as Guerras Medievais.
FERIMENTOS HORRÍVEIS E SANGRENTOS
Com tudo que já se falou a respeito de armas e suas limitações, chega a hora de falar sobre os ferimentos que essas armas produziam e do efeito duradouro que elas deixavam nas pessoas.
As armas conforme dito, não eram feitas para parecerem bonitas, elas eram produzidas com o intuito único de cortar através do corpo. Armaduras ajudavam, mas bem menos do que se pensa. Uma cota de malha poderia desviar a lâmina de uma espada ou adaga, mas era pouco útil contra um machado. Mesmo as armaduras mais notáveis, forjadas com inegável genialidade para maximizar a proteção, não eram à prova de danos. Um ataque devastador de maça ou martelo poderia amassar uma armadura de placas como uma lata.
Registros feitos por cirurgiões de campo de batalha medievais sinalizam que mais de 40% dos danos sofridos por soldados vestindo armaduras incluíam ossos fraturados, à despeito da couraça de metal que os envolviam. Uma armadura também podia se despedaçar mediante um duro castigo, deixando passar e produzindo feridas na carne de quem as vestia.
Armas medievais não produziam cortes limpos, elas muita vezes laceravam, despedaçavam e rasgavam ao invés de simplesmente cortar. Os ferimentos eram particularmente difíceis de serem costurados e tratados, tanto mais com a pouca habilidade dos médicos de campo.
Muitas mortes eram resultantes da perda de sangue e do choque decorrente dela. Diferente do que vemos em filmes, o corpo humano perde uma quantidade absurda de sangue de maneira rápida se a ferida não for estancada. Um homem adulto possui algo entre 4,5 e 5,5 litros de sangue no corpo, mas perder cerca de 1 litro já pode levar ao choque e inconsciência. Um ferimento maior, digamos causado pela perfuração de uma lança ou a lâmina de um machado, pode fazer o sangue se esvair rapidamente levando à morte. O maior agravante é que muitos homens tomados por um surto de adrenalina podiam sequer sentir um golpe severo, até que a visão escurecesse e eles percebessem que estavam cobertos de sangue. Durante toda confusão e agitação de uma batalha, o coração bate mais rápido fazendo com que o sangue termine escoando mais rápido pela ferida aberta.
Mas o sangue não era a única preocupação de um combatente ferido. Os danos internos podiam ser ainda mais dramáticos do que os cortes visíveis. Um golpe de maça que nem rompia a pele podia causar hemorragia interna, partir costelas ou ferir algum órgão. Não havia nada a fazer, nada a costurar ou limpar, apenas uma dor lancinante e invisível irradiando de dentro para fora.
Durante as batalhas, soldados aprendiam onde golpear para produzir o maior dano possível, e eles não perdiam uma oportunidade de desferir tais golpes. A cabeça, o pescoço e a nuca eram áreas muito visadas e se você se pergunta se decepamento era algo possível, saiba que era mais frequente do que se imagina. Dado o grande número de ataques voltados para essas áreas sensíveis, não era incomum que cabeças rolassem dos ombros. Um golpe na cabeça também podia atordoar e confundir a vítima, deixando-a incapaz de reagir e propensa a sofrer outros ataques. Danos de concussão eram bem mais frequentes do que se pensa.
Contudo, os danos massivos não eram os únicos a ocorrer numa batalha - uma miríade de outros ferimentos podiam ocorrer (e de fato, ocorriam). Dentes frequentemente eram quebrados e voavam da boca dos soldados quando seus elmos eram golpeados. Perder dentes dessa forma era tão comum que no final da batalha, alguns soldados buscavam por dentes que pudessem substituir os que eles próprios haviam perdido. Olhos também eram muito visados em ataques e homens com globos oculares perfurados não eram uma rara ocorrência. Ademais, havia o risco de fragmentos de armas se partirem e farpas se alojarem fundo na carne dos combatentes.
Pequenos ferimentos, que hoje em dia são tratados com iodo e pontos, muitas vezes eram fechados com agulhas, grampos ou suturados com linha grosseira. Pior ainda, os ferimentos raramente eram limpos e acabavam abrindo a porta para os mais temidos dos inimigos invisíveis: as infecções.
Não é preciso dizer como o mundo medieval era pouco afeito à limpeza. De fato, a importância de limpar ferimentos só foi compreendida muitos séculos mais tarde. Arquivos de monastérios atestam que a cada soldado morto no campo de batalha, outros três morriam de infecções posteriores ao ferimento sofrido. Mesmo homens que pareciam bem, acabavam ficando doentes e morrendo dias ou semanas depois. Isso nos leva a falar de...
TRATAMENTO E SOCORRO
No Mundo Medieval, o mais próximo de um hospital de campanha eram as tendas de atendimento aos feridos. Essas tendas eram distribuídas a alguns quilômetros do campo de batalha, de modo que os feridos precisavam ser carregados até elas ou então se arrastar para ter alguma chance de socorro.
Não é exagero dizer que atender um companheiro ferido em meio a batalha era tarefa praticamente impossível. Quando inimigos estavam à vista e armas eram brandidas ao redor, ninguém, absolutamente NINGUÉM, se descuidava de sua própria proteção para cuidar de alguém que tivesse sido atingido e que poderia já estar morto. A maioria dos feridos precisava se afastar da batalha e se afastar da linha de frente para ter a chance de receber a atenção de um companheiro.
A medida mais comum dos soldados para socorrer um colega ferido era amarrar cintos, tiras de couro ou panos sobre os ferimentos aparentes. Isso visava estancar o sangramento e conceder uma chance para chegar até alguém que pudesse fazer o atendimento. Note que não estamos nos referindo especificamente a médicos. No Mundo Medieval, médicos eram raros e se dedicavam a tratar dos ferimentos de nobres que pagavam por suas habilidades. Um soldado ferido que não tivesse título ou prestígio, ou pelo menos amigos, dependia da boa vontade de algum estranho que se importasse minimamente com ele. E isso, na maioria das vezes, era algo raro.
Ainda assim, soldados veteranos aprendiam o básico sobre anatomia e podiam desempenhar algo semelhante a primeiros socorros para auxiliar um ferido. Alguns, em especial aqueles que haviam sobrevivido, eles próprios, a ferimentos tinham uma vaga ideia do que fazer, mas raramente tinham o necessário para atuar como um enfermeiro, quem dirá um médico e menos ainda um cirurgião. Flechas eram arrancadas inteiras sem muito cuidado, pontas de lança podiam ser extraídas de feridas sangrentas com os dedos e ossos podiam ser colocados no lugar sem grandes cuidados. Uma medida muito popular era cauterizar feridas com a ponta da adaga aquecida no fogo, algo doloroso e nem sempre efetivo. É preciso mencionar que a boa vontade de um samaritano podia piorar a situação do ferido, isso quando não acelerava a morte.
A situação nas tendas de feridos não era muito melhor. Os feridos eram colocados nessas tendas para que, com sorte, recebessem ajuda de algum monge que entendesse minimamente o que estava fazendo. Nem todos tinham esse conhecimento, mas alguns faziam o possível para aliviar as aflições dos feridos. Instrumentos médicos medievais eram rudimentares (para dizer o mínimo) e não passavam por qualquer procedimento de limpeza ou esterilização. Sangue e sujeira eram limpas no avental ou raspadas com pedaços de pano, se você tivesse sorte.
A taxa de sucesso em tratamento médico nessa época era de cerca de 30%. com os procedimentos mais comuns sendo uma combinação de cauterização, costura e amputação. Esta última era realizada muitas vezes preventivamente uma vez que a infecção mortal era quase uma certeza na maioria dos casos. Dessa forma, quando um ferido chegava a uma tenda médica com o braço ou perna feridos, o tratamento podia ser arrancar o membro o mais rápido possível, para assim evitar a temida gangrena.
Tendas Médicas eram ambientes insalubres onde homens sem treinamento formal ou com pouco conhecimento da anatomia, tentavam remendar ferimentos devastadores que mesmo a medicina atual teria dificuldade em sanar. Imagine o desespero de homens com membros sendo serrados, o terror de soldados se afogando no próprio sangue e homens sendo preparados para cirurgias rudimentares. A carne lacerada era remendada de maneira desesperada. Uma ferida podia ser coberta com emplastos de barro, argila ou fezes de pombo, as feridas eram costuradas com linha de crina de cavalo ou lancetadas com agulhas em brasas. Nem é preciso dizer que não existiam anestésicos eficientes e que a dor era quase palpável nesse ambiente caótico. Com sorte um ferido desmaiava e não testemunhava o horror do tratamento a que era submetido.
NEM TODO DANO É FÍSICO
Após sobreviver ao horror e violência de um combate medieval, os combatentes podiam descobrir que nem todos os danos eram físicos. Muitos deles até podiam sair da experiência relativamente incólumes, mas com a mente fraturada para sempre.
Mesmo durante o calor da batalha, um soldado podia ter um episódio traumático. Muitos podiam ficar catatônicos, entorpecidos ou tomados de um terror tão grande que os impedia de agir. Nesse contexto, muitos apenas tentavam fugir, largando armas e escudos. Aqueles que ficavam descreviam incidentes perturbadores: como se as suas mentes começassem a pregar peças.
O Campo de Batalha Medieval não testava apenas a força e resiliência física, ele era uma prova para a resistência emocional e mental dos envolvidos. Coisas estranhas podiam acontecer durante uma batalha, coisas para as quais nenhum treinamento podia prepará-los. Não era covardia ou uma falha em sua bravura, estava mais para uma confusão profunda que nublava a mente do combatente. A psicologia atual entende esse fator e tenta lidar com ele para diminuir os terrores do campo de batalha, mas se hoje não é algo fácil, imagine na época medieval.
"Onde estou"?, " O que está acontecendo"? e "Quem são essas pessoas"? eram perguntas que dominavam a mente dos soldados sofrendo de trauma emocional severo. Nessas condições eles não eram capazes sequer de se mover, de se defender ou responder a ordens. O senso de direção também era afetado e eles não conseguiam entender para onde deveriam ir. Isso fazia com que homens se perdessem e chegassem ao ponto de atacar as próprias posições. A perda do senso de direção era um efeito tão comum nas batalhas medievais que unidades inteiras podiam acabar lutando entre si. Isso explica porque muitas batalhas terminavam com os envolvidos batendo em retirada antes mesmo de se encontrarem.
Muitos soldados afetados pelo trauma não conseguiam diferenciam aliados e inimigos, todos eram como vultos se movendo ameaçadoramente. Embora os exércitos se identificassem através de cores ou símbolos, as condições dos campos de batalha logo os cobriam de poeira, lama e sangue dificultando o reconhecimento. Em meio ao pânico golpes erráticos eram desferidos contra amigos e companheiros. Na célebre Batalha de Towtown na Inglaterra, algo em torno de 10% das vítimas foram mortas pelos próprios aliados.
Um dos traumas mais frequentes registrados em batalhas é causado pela visão de sangue. Um soldado podia se ver coberto de sangue da cabeça aos pés instantes depois de começar uma batalha (seu próprio sangue, o de aliados, de amigos ou de inimigos). A mente por vezes não consegue suportar esse tipo de incidente e se fecha para não registrar tal coisa. Em outros casos o indivíduo precisa descobrir se o sangue é seu e se está ferido, o que o expõe a ataques. Muitos combatentes descrevem a sensação surreal de estar coberto de sangue e não sentir qualquer ferimento.
Nem todo soldado é talhado para o combate. A mente por vezes não é capaz de registrar todas as variáveis presentes em uma luta dessa magnitude e acaba recorrendo a memória muscular e instinto. O soldado recorre ao treinamento e rotina de luta para sobreviver - seus corpos lutam, enquanto suas mentes se desligam. A visão se estreita para um túnel, os sons se tornam abafados, os sentidos embotados por percepções confusas. A forma dos inimigos se torna indistinta e difícil de reconhecer, eles são apenas sombras ou obstáculos. A "mente de batalha" é uma condição descrita pelos combatentes que envolve o distanciamento do que está acontecendo - eles sentem como se vissem tudo de fora, como se fossem outras pessoas lutando e não eles.
Os soldados que sobrevivem à uma batalha muitas vezes não conseguem lembrar exatamente o que aconteceu. Há lapsos em sua memória e eles não sabem dizer quantos foram mortos ou quantos morreram por sua ação direta ou indireta. O tempo se alonga ou se comprime, eles não são capazes de dizer a quanto tempo estão lutando. Estudos atuais indicam que o cérebro humano não é capaz de suportar o stress contínuo de um combate face a face por muito tempo. Os estímulos visuais e a carga emocional contida nessas lutas é grande demais e acaba sobrecarregando o combatente. Medo, raiva e confusão são as emoções primais que sobrevivem em meio a carnificina e elas se sobrepõem a estratégia e tática.
Diante de tudo que eles testemunham, a reação natural para muitos é fugir. Estudos afirmam que muitos soldados medievais simplesmente desistiam do combate depois de alguns minutos e tentavam escapar. Por mais que a história glorifique os combatentes audazes e os heróis que lutam até o fim, tal coisa era extremamente rara no mundo real. Ao atingir seu limite, muitos simplesmente tentavam correr, sobretudo os soldados rasos, camponeses e indivíduos alistados para combater em guerras que não eram suas. Em batalhas em larga escala, cerca de 40% dos envolvidos fugiam depois de alguns minutos de enfrentamento.
O FIM DA BATALHA
Pode parecer surpreendente, mas muitas batalhas terminavam antes do esperado porque os soldados abandonavam o campo às pressas. Muitas retiradas eram motivadas pela ação de um ou mais grupos que fugiam em meio ao caos, fazendo com que outros tantos se juntassem a essa corrida desabalada.
A história registra até mesmo casos em que uma batalha que estava controlada e parecia vencida por um lado, acaba virando para o outro após uma retirada inesperada. Isso acontecia por conta de um comportamento de grupo no qual os indivíduos tendem a imitar o que a maioria ao seu redor estão fazendo. O efeito era tão danoso que estrategistas medievais mantinham homens na retaguarda incumbidos de eliminar desertores e fugitivos. Qualquer um que começasse a fugir podia ser derrubado por esses homens cuja função era evitar a reação em cadeia.
Outro fato curioso é que batalhas medievais começavam e terminavam de forma extremamente rápida. Os soldados, após o primeiro contato e a escaramuça resultante se mantinham em uma espécie de dança de contato por alguns minutos e então se separavam naturalmente deixando mortos e feridos no lugar que antes ocupavam. Batalhas longas e desgastantes eram a exceção na maioria dos casos.
Ao avistar o resultado de um avanço era comum aos atacantes enviar uma segunda vanguarda para sustentar a investida. Outra possibilidade é que os defensores perseguissem quem tivesse feito a ataque, eles próprios se convertendo nos atacantes. A batalha seguia dessa maneira em ondas indo e vindo pelo campo fustigado, coberto de corpos - mortos e feridos - sangue, destroços e lama. Soldados descreviam a experiência do combate como nadar num mar revolto no qual eram atirados de um lado para o outro, com o risco frequente de afogamento.
Quando uma batalha se encerrava, o som aos poucos ia diminuindo, sendo substituído pelo gemido dos feridos e gritos de dor lancinante. Os sobreviventes retornavam para suas posições ou debandavam após o resultado do confronto encerrando os enfrentamentos. Acordos diplomáticos assinados ainda na era medieval permitiam que monges e membros de ordens religiosas fossem os primeiros a entrar no campo de batalha afim de socorrer os feridos e verificar quem ainda poderia ser ajudado.
Em seguida, o lado vencedor tinha o direito de revistar o lugar, enviando alguns voluntários para buscar por sobreviventes e espólios. Os companheiros feridos podiam ser recolhidos, mas os inimigos encontrados eram submetidos a Misericórdia, que provavelmente não é o que você está pensando. Em uma época em que não haviam leis e regras sobre o que fazer com prisioneiros de guerra, o tratamento dado aos inimigos feridos podia variar enormemente. A Misericórdia era um método aperfeiçoado pelos exércitos medievais de eliminar os inimigos feridos de maneira rápida e aparentemente indolor. Para isso, uma lâmina semelhante a um espeto era enfiada sob a axila esquerda até perfurar o coração do ferido, matando-o imediatamente. No que tange à Idade Média, esse tratamento era considerado humano já que abreviava o sofrimento de feridos que dificilmente receberiam auxílio.
Mas nem todos os exércitos adotavam a "misericórdia" e muitas vezes os prisioneiros estavam fadados a sofrer todo tipo de indignidade nas mãos de seus vingativos feitores. Há relatos de enforcamentos em massa, decapitação e até crucificação. Por vezes os prisioneiros podiam ser libertados, mas não antes de sofrer com alguma vingança. As tropas francesas costumavam arrancar os dedos dos arqueiros ingleses capturados usando para tanto alicates em brasa, enquanto os Venezianos se notabilizaram por vazar os olhos de seus prisioneiros para que eles jamais pudessem lutar novamente. Por essa razão, os feridos que ainda conseguiam se mover tentavam à todo custo se esconder ou pelo menos parecer mortos. Há relatos de um soldado do século XIII que se escondeu no estômago de um cavalo morto por três dias para escapar dos vencedores.
Uma notável exceção a essas regras quanto a prisioneiros dizia respeito a nobres. Poucas coisas podiam ser mais lucrativas a um exército do que capturar um nobre inimigo de alta estirpe. Isso acontecia porque na Era Medieval vigorava um sistema de resgate no qual o filho de um Barão, Conde ou mesmo um Herdeiro poderia ser devolvido mediante uma compensação. E estes resgates eram realmente vultuosos, tendo dado origem ao termo "Resgate Real". O resgate de um nobre podia gerar dinheiro o bastante para pagar os custos de uma campanha e reequipar uma tropa. Não por acaso, nobres que iam para a batalha carregavam cartas que os identificavam como indivíduos importantes que valiam mais vivos do que mortos.
Quando finalmente os campos silenciavam por completo, era a vez dos corvos e moscas dividirem os restos mortais com outro tipo de carniceiro: Saqueadores. Na Idade Média vasculhar campos de batalha era uma ocupação razoavelmente rentável que atraía homens, mulheres e crianças. Os saqueadores se concentravam em recolher armas, armaduras e qualquer pedaço de equipamento que ainda pudesse ser aproveitado. Além desses troféus óbvios, havia um mercado ávido por outras mercadorias que iam de botas, até uniformes, passando por dentes e até ossos. A economia medieval girava em torno da guerra e nenhum aspecto dela podia ser menosprezado. Verdadeiros bazares itinerantes surgiam no rescaldo de um combate com guerreiros e soldados comprando armas para se reequipar para os próximos embates. Barraquinhas de venda ou carrinhos de madeira expunham as peças que podiam ser adquiridas por algumas moedas.
Os cadáveres e restos dos combates em geral eram enterrados em valas comuns. As mesmas ordens monásticas que recuperavam feridos recebiam doações de ambos os lados para providenciar os ritos fúnebres e o sepultamento dos cadáveres. A preocupação com o destino dos cadáveres era pouco importante, de modo que covas comuns eram a escolha predileta para limpar os campos. Arqueólogos modernos encontram frequentemente valas comuns próximas de onde ocorreram batalhas importantes, estes comumente contém os restos mortais de homens que lutaram em lados opostos.
E PARA QUEM SAIU VIVO
O fim de uma Batalha Campal era um momento de retornar para os seus. Muitos soldados com pequenos ferimentos podiam se dar ao luxo de planejar seu futuro; contemplar a possibilidade de um próximo combate ou com sorte aposentadoria.
Nos filmes vemos celebração e camaradagem, gritos de vitória e hurras, mas raramente esse era o caso.
Terminada a luta, muitos precisavam de horas ou mesmo dias para assimilar tudo pelo que passaram. Os homens geralmente necessitam de tempo para superar traumas e violência irracional e isso era verdade mesmo para os soldados medievais mais endurecidos. O esgotamento nervoso e físico era brutal. Era muito comum que os sobreviventes bebessem, e bebessem MUITO como uma forma de aplacar o horror ao qual foram expostos. A bebida forte nublava os sentidos e diminuía a sensação de alerta que tomava conta dos soldados no pós-guerra. Dormir não era algo fácil nos dias seguintes por isso o consumo de álcool ocorria até o estupor chegar. Um cronista medieval escreveu que após uma batalha os homens beberam por três dias seguidos, como se quisessem afogar em copos de cerveja o horror que testemunharam.
Não estar morto era motivo de felicidade. Eles haviam participado da mais letal Dança das Cadeiras e quando a música parou conseguiram um lugar entre os vivos. Alguns pensavam nos que não tiveram tanta sorte e era comum que se fizesse uma coleta para ajudar as famílias dos que haviam perecido. Também havia espaço para agradecer a Deus pela dádiva, a oportunidade de estar vivo. Após as batalhas missas eram oferecidas e mesmo soldados não muito afeitos a religião se viam na obrigação de agradecer a uma força superior que talvez os protegeu.
Nos campos agora desertos e quietos, capacetes e elmos eram colocados na ponta de lanças partidas marcando onde os mortos foram empilhados. Logo a natureza iria retomar para si o lugar, cobrir tudo com vegetação e o local onde tantos lutaram e morreram seria esquecido.
E assim ocorriam guerras medievais e assim foi por muitos séculos nos atribulados séculos da Era das Trevas. A modernidade e progresso logo trariam outras formas de lutar, outras maneiras de matar e morrer. As lutas se tornariam menos face a face e a possibilidade de derrotar os inimigos de longe, dominariam a arte da guerra nos tempos vindouros.
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