quinta-feira, 29 de dezembro de 2022

O Rei Vampiro - Loucura, tragédia e morte num Culto de Familia


Atenção: O texto à seguir contém descrições gráficas e conteúdo perturbador, recomenda-se discrição.

Fresno é um nome comum em cidades do sul da Califórnia, já que o termo se refere a uma árvores muito comum na região, o freixo. As chamadas Cidades de Freixo, ou em inglês "Ash Tree Cities", são famosas por sua composição multiétnica; verdadeiro caldeirão cultural formado por diferentes povos, nacionalidades, línguas e costumes.

A maior das Ash Cities, a cidade de Fresno experimentou um acelerado crescimento na segunda metade do século XX, tornando-se um centro populacional na área. Ainda assim, ela ainda mantinha uma aura de cidade do interior que encantava os visitantes e atraia mais e mais pessoas.

Contudo, nas décadas seguintes algo mudou... Fresno perdeu sua aura de inocência e o crescimento desordenado do perímetro urbano, sem falar da densidade populacional trouxe crime e desordem ao que um dia foi considerada uma das melhores cidades da Costa Oeste.

Em 2004, Fresno ganharia a atenção da grande mídia por conta de um crime brutal que deixou o país inteiro em estado de choque.

Era 12 de março, um dia abafado no qual a neblina sufocante da poluição, o smog, estava mais forte que nunca. Policiais foram mandados até um endereço na West Hammond Avenue, bem no coração de Fresno. Vizinhos diziam que estava acontecendo uma acalorada discussão a respeito da custódia legal de crianças e os lados da querela pareciam prestes a partir para as vias de fato. Uma viatura foi despachada imediatamente e chegando ao endereço, que ficava em uma casa grande, porém em péssimo estado, encontraram Ruby Ortiz e Sofina Solorio. As duas estavam acompanhadas de outros membros da família, mas sem dúvida eram elas que pareciam se destacar, sobretudo por estarem muito exaltadas.
 
As mulheres disseram temer pela segurança de suas crianças, mantidas no interior da casa contra a vontade delas. Elas alegavam, quase em pânico, que o homem que residia naquele lugar, identificado como tio das crianças, se negava a devolvê-las. O nome do sujeito era Marcus Wesson, e elas temiam que ele pudesse machucá-las. 

Os policiais ouviram a parte delas e queriam escutar o que o sujeito tinha a dizer, por isso bateram a porta. Parecia ser apenas mais uma disputa sobre guarda de menores, algo muito comum na vizinhança onde casamentos e uniões estáveis duradouras eram algo incomum. Após bater insistentemente, os oficiais finalmente obtiveram resposta vindo de dentro - uma voz de barítono respondeu e logo em seguida um homem negro apareceu na fresta da porta. Ele tinha cabelos longos e grisalhos presos em dreadlocks que desciam até a cintura. Vestia uma roupa preta larga, botas tipo coturno e óculos escuros. O sujeito era grande, mas ao contrário das mulheres ele estava calmo e se mostrou cooperativo. Ele se apresentou como Marcus Wesson e disse ser o proprietário daquele casarão alquebrado. 


Depois de conversar com os policiais por cinco minutos ele acabou concordando em devolver as crianças, desde que pudesse se despedir delas primeiro. Os policiais acharam que o homem estava disposto a cooperar e embora os pais tenham se mostrado preocupados, disseram que ele tinha 10 minutos. Wesson agradeceu, fechou a porta e voltou para o interior.   

Vizinhos mais tarde contariam ter ouvido o som de choro e gritos no interior da casa, mas os policiais negaram ter escutado qualquer coisa suspeita. Sem um mandato de busca ou indício de que havia risco de segurança, eles não tinham a permissão para entrar na casa de Wesson.

Sendo assim, decidiram esperar.

O tempo se arrastava e as mulheres estavam cada vez mais impacientes. Uma delas resolveu bater para apressar as coisas mas um dos oficiais a afastou e ameaçou dar voz de prisão se ela interferisse novamente. Ruby parecia cada vez mais nervosa e após ofender um policial foi advertida de que poderia ser presa por desacato se mantivesse aquela atitude.

Quase meia hora se passou e finalmente um dos policiais compreendendo que aquilo já estava se arrastando por muito tempo ordenou que ela fosse aberta imediatamente. Ele não precisou esperar muito tempo já que Marcus Wesson surgiu com a mesma calma e serenidade de antes. A única diferença é que dessa vez ele estava coberto de sangue. 

A medida que se rendia sem apresentar qualquer reação e era algemado, dois outros policiais que haviam chegado como reforço correram para o interior da casa. Tinham as armas preparadas para qualquer eventualidade. A despeito do dia quente e ensolarado, o interior do prédio estava tão escuro que eles tiveram de usar lanternas para se guiar lá dentro. Estava tudo abarrotado de lixo, papel e caixas. As janelas cobertas por fita isolante deixavam entrar apenas uma nesga de luz. O fedor de comida estragada, urina e corpos mal lavados era quase insuportável. 

Ao cruzar a sala, os dois policiais buscavam algum sinal de violência. Entraram por um corredor comprido com tábuas mofadas no chão e paredes pintadas de preto que aumentavam ainda mais a sensação de claustrofobia. Ao acender as luzes elas piscaram em vermelho. Na sala seguinte não haviam móveis, mas outra coisa sinistra e que deixou os policiais embasbacados. Contra a parede escura estavam dispostos vários caixões com cruzes prateadas desenhadas nas tampas.     


Eles não se detiveram por muito tempo, a sensação de ameaça iminente era tamanha que os oficiais contaram mais tarde que se sentiam num filme de terror. Em uma sala contígua a esse aposento repleto de caixões os policiais sentiram o fedor de pólvora recentemente deflagrada e deram ordem para quem estivesse ali, se render imediatamente. Descartado na passagem havia uma pistola calibre 38, dentro da sala imperava o caos.

O sangue estava em toda parte: Nas paredes em respingos escuros projetados em alta velocidade até o teto. No chão, corria em profusão, formando poças, com rastros e pegadas salpicadas de vermelho. Seguindo os sinais inequívocos de um massacre, os policiais encontraram uma inevitável pilha de corpos. Cada um tinha um disparo à queima roupa na cabeça, a maioria através do olho esquerdo.

Diante de uma cena tão inconcebivelmente medonha, demorou algum tempo até a polícia determinar quantas eram as vítimas e mais alguns dias até que elas fossem identificadas positivamente. Eram elas por ordem de idade: Sebhrenah, 25, Elizabeth 17, Illabelle 8, Aviv 7, Johnathon 7, Ethen 4, Sedonia 2, Marshey 2 e Jeva, ainda por completar um ano de vida.
 
Ao tentar determinar os parentes mais próximos e comunicá-los da tragédia, o legista realizou testes de DNA em cada uma das vítimas. Quando os resultados vieram à tona, a verdadeira extensão da depravação obscena de Marcus Wesson foi finalmente revelada.

O horror estava apenas começando.

Marcus Wesson, ao que parece, sempre quis ser uma espécie de líder espiritual. Ele nasceu em 1946, o mais velho de 4 filhos, no que só poderia ser chamado de uma família disfuncional. Seu pai, Benjamin, era um alcoólatra abusivo que jamais teve um emprego estável.

Alega-se que o pai de Wesson o molestou sexualmente e a seus irmãos. No banco das testemunhas, a irmã de Wesson confirmou isso, mas afirmou que, quando o pai bebia, ele ficava muito mais inclinado a abraçá-los e beijá-los. As crianças sabiam que a melhor maneira de evitar afeto físico indesejado, quando seu pai Benjamin estava bêbado, era se esconder até ele ficar sóbrio. De fato, um amigo de infância de Wesson testemunhou que Benjamin uma vez ofereceu pagar a ele US$ 50 em troca de sexo oral.


O pai de Wesson acabaria fugindo com um primo, com quem estava tendo um caso homossexual. Esse caso incestuoso parece ter durado uma década antes que o pai de Wesson reaparecesse para assumir seus deveres paternos mais uma vez, como se nada tivesse acontecido. Talvez tenha sido aí que Wesson teve a ideia de que, de alguma forma, era normal manter relações sexuais dentro de sua própria família e que os pais tinham maneiras especiais de "amar" seus filhos.

Não se sabe o quanto a mãe de Wesson, Carrie, sabia sobre essa rotina de abuso e incesto que o marido cometia contra seus filhos. Ela era uma adventista do sétimo dia que liderava a família em estudos bíblicos diários e chicoteava as crianças com um fio elétrico quando se comportavam mal. Ela era dura, inflexível e raramente amorosa. De fato, sua função na família era de disciplinadora - e nada mais. 

Apesar de tudo isso, quando criança, Wesson era lembrado pelos parentes como uma criança gentil e que cantava no coral da igreja. Seu jogo favorito era "brincar de pregador", criando belos discursos religiosos, embora alguns fossem manchados pelo zelo fanático de sua mãe.

Wesson abandonou o ensino médio aos 17 anos e ingressou no exército, onde era médico ou motorista de ambulância (as fontes divergem). Supostamente ele esteva no Vietnã, embora os registros também não mencionem seu nome como veterano de guerra. Weston pode ter trabalhado em um campo médico como ajudante de enfermaria. Ele foi dispensado do Exército em 1968 e rapidamente se envolveu com uma mulher casada chamada Rosemary Maytorena. Quase uma década e meia mais velha, Rosemary já tinha vários filhos. Não demorou muito, porém, para que ela tivesse um filho com Wesson, a quem chamou de Adair. Wesson pode ter ficado feliz com o novo papel de papai orgulhoso, mas, em vez disso, ficou ainda mais feliz em passar tempo com a filha de oito anos de Rosemary, Elizabeth.

O interesse de Wesson por Elizabeth não demorou muito, tornou-se físico. Ele alegou que Deus havia lhe dito que Elizabeth deveria ser a sua esposa, e ele realizou uma "cerimônia de casamento" secreta com a criança. Ele então a tirou da escola com o pretexto de educá-la conforme ditames religiosos por ele professados. Quando Elizabeth tinha 12 anos, ele começou a agredi-la.

Aos 14 anos, Elizabeth ficou grávida do bebê de Wesson, e os dois se casaram assim que ela atingiu a idade legal para se casar. Wesson teria mais 10 filhos com ela antes dela atingir os 26 anos.


Wesson não parou de aumentar sua família. Ele acreditava que o matrimônio era a forma através da qual seu tabernáculo religioso cresceria. Ele viria a "casar" e ter filhos com três de suas sobrinhas: Ruby Ortiz, Rosa e Sofina, às vezes chamada de Sofia (sim as mulheres que estiveram na porta de sua casa no dia da tragédia, mas chegaremos a isso no devido tempo). Os tais casamentos fraudulentos com meninas de 10, 12 ou no máximo 14 anos continuaram com sobrinhas.

Parece impossível que essas mulheres estivessem de acordo com o relacionamento incestuoso que mantinham com Wesson. Entretanto é preciso entender que, como a maioria dos abusadores, ele aprendeu a cultivar um medo profundo nas suas vítimas, Mais que isso, ele realizava uma espécie de lavagem cerebral desde a infância das suas "noivas" para conseguir o que queria.

Wesson ficou fascinado e sentiu uma afinidade imediata pelo líder de culto David Koresh líder da Seita de Davidianos. Durante o cerco de 1993 ao complexo em Waco, Wesson ficou grudado na TV assistindo sem parar. Ele disse à família: “Este homem é como eu. Ele está fazendo filhos para o senhor”. E como Koresh, Wesson tinha um profundo ódio pelas leis. Ele até ordenou um pacto de suicídio: se algum dia alguém tentasse separar sua família, mães deveriam matar os filhos e depois a si mesmas. Ele realizava reuniões para discutir os detalhes desse plano.

É difícil expressar o quão profundamente Wesson controlava cada aspecto da vida de sua família. As mulheres e meninas eram especialmente subjugadas e mantidas sob seu domínio. Em determinado momento Wesson escreveu um conjunto de regras que deveriam ser seguidas à risca pela família, uma vez que eram "mandamentos enviados por Deus." As mulheres tinham de vestir saias longas e lenços na cabeça, andar atrás dele e permanecer em silêncio em público. Elas foram proibidas de conversar com qualquer pessoa, sob pena de espancamento. Até mesmo seus próprios irmãos e primos foram separados delas, para que não "desenvolvessem sentimentos sexuais" por outros homens.

As suas vidas eram preenchidas por trabalho interminável: eram responsáveis por cuidar dos filhos, limpar e cozinhar — mesmo quando não havia água encanada nem eletricidade. Esperava-se que eles também servissem Wesson lavando seus enormes dreadlocks, massageando seu corpo rotundo e até mesmo coçando suas axilas. Ao que parece ele tinha grande prazer em humilhar mulheres e ordenar a elas as tarefas mais absurdas.

Wesson era um abusador brutal, espancando as mulheres e crianças com fios elétricos, bastões de beisebol e os punhos como punição pelas menores transgressões. Um de seus filhos, Serafino, contou que foi espancado por 30 dias seguidos pelo crime de roubar uma colher de pasta de amendoim. Sofina lembrou que Wesson espancou seu bebê de um mês, Johnathon, até suas pernas sangrarem porque ele não parava de chorar.

Assim que as meninas de sua família - incluindo suas sobrinhas e filhas - atingiam a idade de 8 anos, Wesson iniciava o processo do que chamava "criar noivas". Ao que parece esse "treinamento" visava criar um elo de vergonha e terror com as meninas. Quando elas estavam suficientemente aterrorizadas ele iniciava a agressão sexual com o intuito de "ensiná-las a serem mulheres melhores".


Wesson nunca permitiu que seus filhos ou sobrinhas estudassem em escolas. Em vez disso, ele educava as crianças em casa, complementando os estudos do curso geral com horas de pregação de suas próprias crenças bizarras. No entanto, a verdade é que as crianças recebiam pouca ou nenhuma educação domiciliar. Às vezes, as meninas mais velhas brincavam de “professoras” para as crianças mais novas; o ensino parecia consistir em desenhar e colorir.

Quanto a Wesson, ele se recusou a trabalhar e, em vez disso, recebeu benefícios sociais. Embora considerado bastante inteligente e sem qualquer deficiência física que o impedisse de trabalhar, Wesson aderiu à crença de que o chefe da família não trabalhava, pois "cuidar da família" era sua obrigação. As crianças disseram que muitas vezes passavam fome. Havia apenas arroz para comer, o que as obrigava a vasculhar lixeiras em busca de comida. Enquanto isso, Wesson jantava fast food o suficiente para que, quando foi preso, pesasse quase 180 quilos e fosse tão gordo que precisava de três pares de algemas para ser preso.

A vida na Família era árdua e difícil. Eles mudavam de habitação quando eram descobertos e então seguiam para outro lugar abandonado onde pudessem ficar por algumas semanas ou meses. Em geral, as crianças cresciam sem o menor conforto, água limpa ou eletricidade era um luxo. A família chegou a viver em um campo de treinamento abandonado do exército e num velho rebocador desativado.

Claramente, a Família chamava a atenção, mas até onde se sabe nunca foram investigados por assistentes sociais preocupados com o ambiente em que as crianças viviam. Elas não frequentavam escola pública, onde um professor preocupado poderia notar os sinais de abuso, foram intencionalmente mantidas separadas do mundo exterior pelo pai. Wesson sabia que o mundo não aceitaria suas filosofias e ensinamentos bizarros. Somente após as mortes em 2004, o teste de DNA forneceria a prova de que ele era o pai de crianças que ele sabia que seriam levadas embora, se a verdade viesse à tona.

Para a maioria dos membros da família Wesson, aquele estilo de vida era tudo o que conheciam. Mas duas de suas sobrinhas, Ruby e Sofina, queriam escapar do grupo. Wesson acabou concordando que eles poderiam ir, mas apenas se deixassem seus filhos, Johnathon e Aviv, para trás. Desesperados para escapar, as duas concordaram. Contudo, conforme se ajustavam ao mundo exterior, elas começaram a entender o que o que ele fazia com o resto da família. Finalmente, em 12 de março de 2004, reuniram vários parentes para dar apoio e voltaram para a casa dos Wesson para resgatar seus filhos, ambos com 7 anos de idade. Foi quando a tragédia aconteceu.


O caso foi considerado o pior assassinato em massa da história de Fresno.

Antes mesmo do julgamento começar, Wesson ainda lutava pelo controle da Família. Ele atrasou sua acusação duas vezes insistindo que não queria um defensor público, mas queria contratar seus próprios advogados. Não estava claro se Wesson poderia pagar seus próprios advogados e, finalmente, foram designados defensores públicos. Em 3 de março de 2005, o julgamento de Wesson finalmente teve início com a mídia montando um verdadeiro circo ao redor do caso.

Ele foi acusado de nove assassinatos em primeiro grau e 14 acusações de abuso sexual e estupro. Os membros de sua família testemunharam - ao lado da acusação e da defesa - o júri soube dos horrores que Wesson infligiu à sua família. O julgamento também foi a oportunidade de entender a perversidade de suas doutrinas tresloucadas.

Wesson recebeu um estranho apelido quando o julgamento começou a revelar sua confusa crença. Ele passou a ser chamado de Rei Vampiro, isso porque realmente acreditava ser um morto vivo. Sua crença era que Jesus não apenas era um vampiro, mas que o havia escolhido e transformado para que ele vivesse para sempre e fosse seu herdeiro. 

Uma vez que Jesus bebeu sangue para se tornar imortal, ele deveria fazer o mesmo. Wesson realizava estranhos rituais nos quais cortava seus seguidores com um estilete e coletava o sangue deles num "cálice sagrado" para beber. Ele também consumia sangue que lhe era ofertado em outras celebrações. O uso de sangue como item religioso não é exatamente uma novidade, contudo, Wesson definiu alguns parâmetros perturbadores. Por exemplo: ele forçava os membros de sua seita a beber o sangue dele para criar um elo duradouro - dessa forma ele afirmava poder ver e ouvir tudo que eles viam. Outra forma de controlá-los pelo medo. Wesson também teria dito que mantendo uma gota do sangue de cada membro podia matá-los à distância usando seus poderes sobrenaturais.   


O Culto Vampiresco também explicava os caixões achados na casa. Eles foram encontrados pela Família quando invadiram uma funerária. Passaram a ser usados pelos membros da seita como camas. Segundo o Rei Vampiro, uma criança que dormisse num caixão começava a se transformar em vampiro, uma espécie de transformação sagrada. Os métodos de controle de Wesson envolviam fazer seus seguidores acreditarem que ele realmente tinha poderes místicos. Seus advogados tentaram provar que ele sofria de esquizofrenia, contudo os psiquiatras contratados disseram que ele não possuía a doença - ele simplesmente era perverso e usava a ignorância dos outros em benefício próprio. 

Durante o julgamento a defesa de Wesson alegou que ele não havia matado ninguém - que a responsabilidade seria de Sebhrena que havia puxado o gatilho da pistola matando as crianças e depois a si mesma. A evidência foi inconclusiva pois não havia impressões digitais na arma do crime. O ferimento de bala na cabeça da mulher embora consistente com um ferimento auto infligido também poderia ter sido causado por outra pessoa. 

Os testemunhos de Ruby e Sofina terminaram sendo essenciais para provar que Wesson tinha controle total sobre a família e que havia ordenado a eles matar caso a Família fosse separada. Se Sebhrenah matou as crianças e depois a si mesma, isso se encaixaria no padrão de controle exercido por Wesson. Ela portanto agiu como uma ferramenta da vontade do "Vampiro".

No final, não importava para o júri quem realmente havia puxado o gatilho. Marcus Wesson foi considerado culpado de todas as acusações e, em 27 de junho de 2005, foi condenado a 102 anos pelas acusações de estupro e abuso sexual. Pelo assassinato de filhos e netos, ela recebeu a pena de morte. Ele foi enviado para a prisão de San Quentin, o maior corredor da morte do país. Lá ele estaria na companhia de assassinos infames como Rodney Alcala, Charles Ng, Richard Davis e Scott Peterson. Em março de 2019, a Califórnia, aprovou uma moratória sobre as execuções no estado, poupando a vida de Wesson. 

Marcus Wesson ainda é considerado extremamente perigoso graças à sua capacidade de controle, propensão à violência e poder de persuasão. Um estudo psiquiátrico que analisou o Rei Vampiro demonstrou que ele mantém seus delírios intactos e que ainda acredita estar predestinado a retomar o controle de sua família quando ganhar a liberdade. Felizmente ele continua preso e provavelmente assim ficará para sempre uma vez que sua sentença não é elegível para liberdade condicional.

segunda-feira, 26 de dezembro de 2022

O Conteúdo do Caixão de Notre Dame - O Mistério dos Cavaleiros


Faz pouco mais de três anos, em 2019 que a bela e icônica Catedral de Notre Dame em Paris sofreu um devastador incêndio que destruir parcialmente seu achado e boa parte do prédio. A estrutura original da Catedral remonta ao século XIII e e uma das mais famosas igreja do mundo.

Em um esforço para contornar uma situação ruim, arqueólogos responsáveis pela preservação do prédio decidiram remover artefatos para preservá-los durante as obras de restauração e reconstrução. Com isso eles tiveram acesso a áreas até então restritas que estavam cobertas por destroços e sujeira. 

Uma dessas áreas ficava diretamente abaixo da icônica torre principal da Catedral que sofreu sérios danos após o incêndio. Em abril de 2022, os especialistas anunciaram a descoberta de dois bem preservados sarcófagos de chumbo enterrados cerca de 20 metros abaixo de uma laje de tijolos assentados no século XIX. A construção que fazia parte do sistema de aquecimento foi removida por ocasião da limpeza dos detritos e ganhou grande repercussão.

Nós falamos sobre essa descoberta. Para ler, é só dar um click aqui no link: https://mundotentacular.blogspot.com/2022/04/o-sarcofago-de-notre-dame-peca.html

Passados alguns meses, a pergunta que não quer calar é: O que estaria naqueles caixões misteriosos?

Usando uma câmera de equipamento de endoscopia, os historiadores conseguiram espiar no interior do sarcófago por um pequeno buraco. Eles descobriram que havia um esqueleto humano, mas não o abriram. Essa tarefa foi passada para o Instituto de Medicina Legal da Universidade de Toulose, especialistas na abertura de caixões, especialmente de chumbo. 

Somente essa semana eles anunciaram o que foi encontrado e uma das revelações é chocante - um dos esqueletos pertencia a um cavaleiro... com um crânio alongado!


Mas o que e tão estranho nesse crânio alongado?

"Ele tinha dentes extraordinários para sua idade. É muito raro encontrar dentes tão bons o que leva a crer que ele cuidava bem deles".

Segundo Eric Crubézy, professor de biologia antropológica da Universidade de Toulose, a abertura do sarcófago mostra como pequenas coisas podem ser interessantes.

Na tampa de um dos sarcófagos havia convenientemente uma placa com o nome de seu ocupante. Na placa de metal levemente corroída lia-se:

"Esse e o corpo de Sir Antoine de la Porte, Canon da Igreja de (palavra apagada), que morreu em 24 de dezembro de 1710 aos 83 anos de idade. Resquietcat ni pace."

Mesmo sem a placa, Crubézy poderia determinar rapidamente que Antoine de la Porte foi uma pessoa importante uma vez que seu lugar de descanso fica em um lugar de prestigio na maior catedral da França. Ambos caixões foram posicionados no transepto da igreja - a posição perpendicular do prédio em forma de cruz. Na Notre Dame ele separa a nave da área do coral, fazendo desse lugar uma espécie de coração do prédio. 


De acordo com a entrevista coletiva para a imprensa, Antoine de la Porte não foi apenas um Canon (título honorário conferido a um membro do clero por serviços valiosos prestados à igreja) – ele foi um "Canon que completou jubileu" ou seja que manteve o título por mais de 50 anos. Além disso, ele foi um rico apoiador das artes e patrocinador de renovações na Catedral que permitiram a ela chegar ao formato atual. Tudo isso explica o lugar de destaque onde seu corpo foi depositado.

Embora houvesse restos de cabelo e roupas no caixão, era o esqueleto e ossos que realmente deixaram os arqueólogos impressionados.

"Os ossos permitirão realizar um estudo do efeito da idade nas pessoas. Essa é uma rara oportunidade de entender como viviam indivíduos de seu sexo e classe social".

Como mencionado anteriormente, Crubézy ficou particularmente impressionado com a higiene dental praticada por de la Porte, de 83 anos, em 1710 – uma época onde o cuidado meticuloso dos dentes era incomum. Mais análises de seu esqueleto estão agendadas para 2023 sob o olhar atento de Dominique Garcia e membros do Instituto Nacional de Investigação Arqueológica Preventiva porque se tratam de restos humanos recuperados numa igreja e “não objetos arqueológicos” portanto “serão tratados com respeito do começo ao fim.” 

Quanto ao outro sarcófago, sua abertura revelou alguns detalhes igualmente curiosos.

 “Sabemos apenas que se trata de um homem entre os 25 e os 40 anos, que parece ter sido cavaleiro desde cedo e ao longo da vida.


“Le Chevalier” ou “o cavaleiro” como foi apelidado, estava em um sarcófago encontrado ao pé de uma parede de separação esculpida no transepto entre o coro e a nave onde a congregação se sentava para os serviços. O local simboliza a separação entre o clero e a congregação e uma proteção necessária à saúde - a congregação era formada por pessoas pobres e com doenças ... essa separação é uma das razões pelas quais Antoine de la Porte viveu uma vida longa e saudável. Embora não fosse um clérigo, Le Chevalier era uma pessoa importante - seu cadáver usava uma coroa de flores e foi embalsamado, o que era uma raridade na Idade Média. Isso o coloca na classe alta da França do século XIV e ajudou a preservar uma de suas características físicas mais marcantes – o crânio alongado.

"(Isso) pode ser causado por uma ligeira deformação ligada ao uso de toucado ou bandana durante sua juventude, algo observado em muitos restos mortais após o Concílio de Trento (1545-1563)."

Eric Crubézy diz que o crânio de Le Cavalier foi separado em duas partes durante o embalsamamento – a parte superior foi removida e havia espaço no sarcófago para o crânio mais longo. 

O crânio deliberadamente deformado não foi o resultado da coroa de flores, mas de algo que foi feito a Le Chevalier quando ele era recém-nascido – como os crânios alongados encontrados no Peru e partes da África. Isso era feito envolvendo a cabeça de um recém nascido que é macia, com um faixa de pano apertada por meses até que o formato da cabeça seja permanentemente deformada. 

Essa característica pode ter inspirado Le Chevalier a ser um cavaleiro notável, homenageado na morte com o embalsamamento e um lugar de destaque na Catedral de Notre-Dame? 


Crubézy não tem certeza – a única hipótese que ele apresentou foi que a causa da morte pode ter sido meningite crônica, causada por organismos como fungos ou Mycobacterium tuberculosis crescendo nas membranas e fluidos que envolvem o cérebro. 

As chamas que envolveram a Catedral de Notre-Dame em 2019 foram sem dúvida destrutivas, mas também esclarecedoras. À medida que as novas partes do edifício sobem, as profundezas abaixo fornecem novos detalhes sobre o que antes existia neste local. Notre-Dame ainda tem muitos segredos, mas finalmente alguns estão vindo à tona.

sábado, 24 de dezembro de 2022

Noite Feliz - Costumes e tradições natalinas realmente estranhas


Você já parou para pensar a respeito de tradições?

Em especial, tradições natalinas. Aquelas mesmas que nos comandam a distribuir presentes, acreditar que um bom velhinho nos vista distribuindo presentes, que é legal reunir a família, comer panetone, montar uma árvore de natal e presépio.

Tradições são importantes, elas ajudam a marcar datas e construir um significado da data em questão. Cada família tem a sua própria tradição no que diz respeito ao Natal. Aqui no Brasil, a tradição envolve um encontro dos parentes e confraternização. Por vezes, um amigo oculto, brincadeiras, descontração, etc...

Mas a data natalina pode ter diferentes significados e tradições dependendo em que parte do mundo você esteja. Nem todas as tradições parecem exatamente agradáveis, algumas são bem estranhas e outras atravessam a fronteira do absurdamente bizarro. Nem parecem coisas que as pessoas deveriam fazer no Natal, mas são.

Venha conosco, vamos conhecer alguns costumes realmente estranhos.

O Desfile do Crânio de Cavalo


Mari Lwyd é um pequeno vilarejo costeiro em uma das regiões mais isoladas do País de Gales, nas Ilhas Britânicas. Ele possui uma curiosa tradição natalina que é mantida pelos habitantes e remonta ao passado pagão. O costume acabou sendo assimilado pelos missionários religiosos que lá se estabeleceram para apresentar o cristianismo. Para que os ensinamentos fossem aceitos mais facilmente, alguns costumes continuaram sendo aceitos.

Assim surgiu o Desfile do Crânio de Cavalo.

Nele, um aldeão especialmente escolhido para a função de grande honra recebe a incumbência de portar um crânio de cavalo. O crânio fica guardado o ano todo na antiga igreja do século XIV, em um pequeno compartimento sob o altar. Na véspera do Natal, ele é removido e entregue ao escolhido. Este tem a responsabilidade de decorá-lo com tecidos brancos e prendê-lo a um estandarte de madeira que será por ele carregado.

Na noite do dia 24, o portador da estranha relíquia faz um chamamento na praça central. As portas da Igreja são fechadas pelo padre local em sinal de respeito às tradições antigas. As pessoas se colocam em uma fila, as luzes são apagadas restando apenas tochas carregadas pelos participantes do Desfile. Tradicionalmente, as pessoas saem desse ponto e caminham por uma antiga estrada na direção do mar, o trajeto é feito em absoluto silêncio, tendo o crânio na dianteira da comitiva. Ao chegar na praia, o grupo se dispõe em um círculo e o Crânio é passado de mão em mão entre os presentes. Finalmente, quando o crânio dá a terceira volta chegando às mãos do seu portador original, é o momento de retornar ao vilarejo.

No retorno, a porta da Igreja local estará aberta. O padre receberá o crânio de cavalo e o guardará em seu lugar, onde ele ficará trancado por mais um ano. Uma missa de natal é então celebrada e as festas comemoradas. O ritual de origem pagã visa proteger o vilarejo e conceder aos habitantes um ano de fartura.

Ninguém sabe ao certo como surgiu a tradição, mas acredita-se que o crânio remonte ao século XIII.

Demônios em Chamas


Essa tradição natalina ocorre na Guatemala todo ano.

Sete dias antes do Natal, um grupo de pessoas formando um comitê especialmente designado para a tarefa percorre as ruas das cidades recolhendo objetos que são entregues pelas pessoas. Esses objetos, em geral são feitos de madeira, papelão ou tecido representam os pecados cometidos ao longo do ano que passou e do qual se arrependem. Quanto maiores os pecados, mais material é oferecido.

Os objetos são recolhidos e colocados em carrinhos de coleta.

Todo esse material é levado para centros cívicos ou igrejas, onde voluntários se encarregam de moldar e juntar esses objetos na forma de medonhos demônios. As horríveis efígies, dotadas de asas, chifres e garras são montadas com enorme talento artístico e inegável senso para o bizarro. Dependendo da quantidade de material recolhido, esses bonecos podem atingir até impressionantes 10 metros de altura. Ou seja, bonecos demoníacos gigantes!

Na véspera de natal, ocorre uma festividade que marca o início das festas. Nela, gasolina é jogada sobre os bonecos que em seguida são incendiados. Enquanto a efígie demoníaca arde em chamas, acredita-se que com elas, os pecados e tentações acabam também se dissipando abrindo o caminho para um ano melhor.

Esconda as Vassouras


Na Noruega existe um costume muito antigo que ainda é praticado em boa parte do país.

Acredita-se que na véspera de Natal, todas as vassouras devem ser recolhidas e guardadas em armários ou porões. estes são então trancados para que ninguém entre e possa apanhar os objetos.

A razão disso é horripilante!

Diz a lenda que na véspera de Natal, feiticeiras tendem a se reunir com o propósito de fazer o mal e denegrir o significado das festas natalinas. Como suprema zombaria diante do nascimento do menino Jesus, as bruxas procuram por crianças para assassiná-las e retirar delas a gordura corporal, fervendo-as em grandes caldeirões e tachos de ferro. Em seguida, a gordura amarela é espalhada no cabo das vassouras, permitindo que elas possam voar pelo céu.

A tradição de esconder as vassouras surgiu por dois fatores: Primeiro, dificultar que bruxas tivessem acesso a vassouras que lhes serviriam como montaria e Segundo, por que ser visto com uma vassoura nessa noite podia significar que a pessoa era uma bruxa.

A antiga tradição pode parecer mera superstição, mas há registros de que no século XVI, mulheres que não esconderam vassouras na noite de Natal ou foram flagradas com elas nas mãos, acabaram sendo acusadas de feitiçaria e conluio com as trevas.

Portanto, melhor não arriscar e guardar a vassoura!

O Gato de Yule


A véspera de Natal é uma data alegre em todo mundo, mas é também a época em que o terrível Gato de Yule está à espreita.

O bicho é um monstro mítico do folclore da Islândia muito temido pelas crianças de lá. Diz a lenda que a criatura teria a forma de um enorme e feroz felino coberto de pelos brancos que lhe conferem camuflagem na neve. A fera está sempre à espreita com seus enormes olhos verdes à brilhar na escuridão. Seu alvo prioritário são crianças que ele fareja ao longo do ano e que nessa noite em especial planeja devorar.

Por esse motivo, é tradição que as crianças recebam uma roupa nova no Natal. Uma vez que a roupa é nova, o Gato não é capaz de farejar sua vítima e portanto desiste de atacar.

A curiosa tradição teria surgido graças a fazendeiros que usavam o mito para incentivar os trabalhadores a terminar a produção lã antes do Natal. Aqueles que participavam do trabalho nas empresas têxteis eram recompensados com roupas novas para seus filhos, mas aqueles que não trabalhavam não recebiam nada e podiam ser atacados pelo Gato de Yule.

A tradição continua existindo na Islândia e pelo sim, pelo não, as crianças de lá tendem a não reclamar de receber roupas como presente.

Teias de Aranha Natalinas


Se um dia você viajar para a Ucrânia na época natalina poderá ficar confuso com a decoração que mais parece ser de Halloween.

No país, as árvores e casas são decoradas com teias de aranha artificiais que podem ser vistas em todo canto. Quanto maior e mais destacada a teia melhor!

Há duas explicações para essa tradição. A primeira é uma lenda bastante antiga, a respeito de uma família pobre que permitiu que uma aranha tecesse a sua teia no telhado da casa onde viviam. Na véspera de Natal, quando a família se reunia a aranha ficou sensibilizada pelo fato deles não terem quase nada para comer. Ocorre que a aranha era mágica e na manhã seguinte, quando acordaram, descobriram que os fios de teia haviam se transformado em prata e a família ficou rica. As teias simbolizam prosperidade para o ano que se inicia.

Há, no entanto, uma versão mais sinistra.

As teias seriam uma forma de impedir que fantasmas e maus espíritos entrem nas casas na véspera de Natal. Tradicionalmente, é um período em que o mal ronda com mais força, tentando frustrar a reunião e a paz das famílias. Essas teias servem portanto para capturar influências negativas e as mantem aprisionadas. No Dia de Reis, as teias devem ser removidas em uma espécie de cerimônia na qual água benta é lançada sobre elas como forma de purificação. Uma parte importante desse ritual, é que antes de tocar nas teias é preciso pedir proteção aos santos para que os espíritos presos não se soltem e façam o mal. Por essa razão, para alguns, uma teia arrebentada é sinal de azar para o ano inteiro.

Biscoitos Malditos


Na África do Sul existe uma história tétrica, contada pelos pais para fazer seus filhos respeitarem as tradições.

É parte dos costumes nos países de língua inglesa, oferecer biscoitos caseiros para Papai Noel, quando ele vem deixar os presentes. Para que as crianças aprendam a não mexer nas coisas dos outros, conta-se a seguinte história medonha.

Certa vez, um menino chamado Danny não obedeceu às ordens de seus pais e desceu antes da hora para olhar os presentes e comer os biscoitos de Papai Noel. Enquanto abria os presentes e se fartava com os biscoitos, a avó de Danny ouviu um barulho e temendo se tratar de um ladrão, armou-se com uma frigideira de ferro. Ela se esgueirou por trás da árvore de natal e quando viu uma sombra, acertou-a na cabeça com toda força. Danny morreu imediatamente! Diz a lenda que a avó enlouqueceu e se lançou em um rio desaparecendo para sempre.

Já seria o suficiente para traumatizar qualquer criança, mas ainda tem mais!

Os fantasmas de Danny e da Avó visitam as casas e zelam pelos biscoitos e pelos presentes que não devem ser abertos antes da hora pelas crianças de bom senso. Aquelas que desafiam essa norma podem ter de enfrentar a fúria dos dois fantasmas que então levam as crianças embora para nunca mais voltar. 

E você aí achando que nada poderia ser pior que o Krampus...

quinta-feira, 22 de dezembro de 2022

O Grito da Banshee - o Mito sobre as Mensageiras de Morte


A Banshee é uma mensageira da morte fortemente enraizada no Folclore da Irlanda. Embora a aparência física desses espíritos possa variar muito, seu propósito é sempre o mesmo segundo as tradições. 

Originalmente essas criaturas eram chamadas de Been Sidhe, seres de origem feérica que geralmente se manifestavam no corpo de uma mulher com pele pálida, cabelos longos, muitas vezes ruivos e uma beleza delicada. Em algumas versões ela podia ser uma mulher mais velha: triste, amargurada e com longos cabelos grisalhos. A Banshee tinha olhos ferinos em busca de uma vítima em potencial.

Existem histórias em que a Banshee é um ser vivo de carne e osso. Ela pode falar, interagir e tocar os vivos, mas em outras versões ela é tratada como um espírito incorpóreo. Como tal, é um fantasma intocável e pode ficar invisível sempre que desejar, atravessar paredes e até voar.

De acordo com a cultura popular, o grito da Banshee, conhecido especificamente como "caoine" ou "keening", é um berro agudo e lamuriante de morte. Aquele que ouve esse som melancólico sente os dedos da morte mais próximos. Ainda segundo o folclore, aqueles que ouvem esse som pérfido experimentam tontura, frio extremo, confusão, paralisia e em alguns casos morrem de pavor. O terror deflagrado pelo grito desesperado era tamanho que algumas pessoas caiam fulminadas com o terror por ele provocado.


Os antigos clãs gaélicos acreditavam que o choro colérico de uma mulher, ou ainda, seus gritos histéricos podiam afetar tanto a mente quanto o corpo. Um ruído dessa natureza, direcionado a um homem podia mata-lo. 

De fato, os nobres irlandeses temiam tanto a lenda da Banshee que quando um novo líder ascendia ao poder, ordenava que viúvas e órfãs fossem banidas de sua presença. Há registros de mulheres sendo exiladas e até assassinadas pela suspeita de que pudessem ser os espíritos disfarçados.

Há uma forte suspeita de que a origem da Banshee esteja ligada à tradições que remetem ao século VIII. Em tempos de guerra e revolta, as mulheres vítimas de guerreiros, abusadas ou brutalizadas podiam se tornar Banshees. Uma lenda antiga menciona uma jovem violentada por um soldado que em meio ao seu desespero se lança num precipício. Ela então ressurge das águas como um fantasma disposta a extrair vingança de quem a feriu - uma Banshee.

É possível que a lenda tenha sido criada com o intuito de proteger mulheres vitimadas nesses tempos de grande perturbação. Um homem conhecedor da lenda poderia refrear sua violência temendo criar uma Banshee e assim se ver em perigo.


Outra lenda sobre a gênese da Banshee envolve o consumo de álcool em dias santos. Mulheres que ofereciam bebida ou trocavam favores sexuais por álcool podiam se tornar Banshees. Da mesma forma, mulheres que morriam após ingerir uma grande quantidade de álcool também podiam retornar como o espírito.

Outra origem possível liga a Banshee ao som da Coruja de Celeiro, uma ave de mau agouro que segundo a crença popular fica empoleirada próximo de quem está para morrer. O som da coruja era um presságio sombrio e simbolizava a proximidade da morte. Meramente imitar o som da coruja podia ser perigoso, mais ainda se o som fosse produzido por uma mulher. 

Ao redor do mundo não faltam relatos sobre entidades que se manifestam como mensageiros da morte. A Banshee segundo algumas histórias podia assumir a forma de um grande corvo ou então de uma coruja. Em outras versões ela podia entrar em nevoeiros ou tempestades e desaparecer dentro deles sumindo e reaparecendo em outros lugares. O som de asas batendo sem a presença visível de uma ave também podia ser indicativo da presença de uma Banshee.

Na Idade Média, lendas sobre a Banshee eram muito populares nas Ilhas Britânicas e parte da França entre os celtas. Certas versões da lenda colocam a Banshee como intermediaria, fazendo a negociação entre a vida e morte, decidindo se a pessoa deveria ou não partir para o outro lado.


Algumas videntes e profetizas alegavam manter contato com Banshees para saber em primeira mão informações sobre o estado de pessoas e a morte iminente delas.

Um caso bastante conhecido data de fevereiro de 1437 quando uma vidente irlandesa previu a morte de Jaime I da Escócia pelas mãos do Duque de Atholl. Ela alegou ter recebido o presságio dos lábios de uma banshee que se colocou ao pé da cama do monarca. Não muito tempo depois, o Rei sofreu um atentado no qual foi mortalmente ferido. Enquanto agonizava na cama, pessoas próximas disseram ver uma silhueta feminina ao seu lado e ouvir, pouco antes dele expirar, um grito lancinante. 

O Keening da Banshee varia de lugar para lugar, com cada região tendo uma característica própria. Em Leinster, o grito da Banshee era agudo podendo estilhaçado vidro e partir taças de cristal. Por sinal, muitas famílias mantinham copos de cristal perto das janelas como uma forma de detectar a presença da Banshee. Um copo rachado podia significar a morte próxima. Essa lenda possivelmente ajudou a reforçar o temor de vidros e espelhos rachados como fonte de azar.
 
Na região de Kerry, o som da Banshee não era considerado assustador, pelo contrário, parecia uma melodia tradicional. Em Tyrone, o grito era seco, como o som de árvores se dobrando com o vento. Quando o som se fazia ouvir, diziam as lendas, madeira apodrecia e se partia podendo causar acidentes. Finalmente na Ilha de Rathlin, os relatos davam conta de uma combinação de choro histérico e grito angustiante antes da morte de alguém importante como um nobre ou religioso de alta hierarquia.

Ao longo das gerações, a lenda se transformou, incorporando elementos de diferentes culturas. As famílias nobres irlandesas carregaram a tradição da Banshee para outros cantos fazendo com que ela chegasse ao continente europeu encontrando aceitação no sul da França, Espanha e tão longe quanto a Itália. Cada cultura, no entanto moldou a lenda de uma forma diferente incorporando trechos de seu próprio folclore.


Os Celtas diziam que a Banshee podia ser subornada para poupar um moribundo. Se ela recebesse um presente valioso podia desistir de promover a morte da pessoa. O presente mais comum era uma coroa de flores silvestres colhidas na véspera e deixada perto da cama da pessoa desenganada. Se a Banshee aceitasse a oferta ela partia de bom grado. Na Escócia, a entidade conhecida como Caoineag (ou “caointeach”) guarda enorme similaridade com a Banshee. No entanto, ela não grita, mas assusta sua vitima revelando sua face oculta sob um véu negro. 

A Banshee também é conhecida por soprar doenças ou consumir a respiração de pessoas desenganadas. Ela rouba a mortalha colocada sobre os cadáveres para fazer com ela um vestido. Segundo uma tradição medieval, se a mortalha de uma Banshee for roubada e jogada em água corrente, o espírito deixará de existir.

A maioria das lendas, no entanto enfatiza a relação da Banshee com gritos, cantos e sons lamurientos. Em certas tradições gaélicas era vedado a estranhos cantar ou mesmo falar perto de um moribundo Em geral as Banshees eram sempre identificadas como mulheres, contudo em certos recantos, homens também podiam carregar a suspeita de serem Banshees embora tal coisa fosse rara.

Como todas as lendas, a da Banshee gradualmente foi perdendo o sentido à medida que a razão se sobrepôs as superstições. Ainda assim, relatos sobre a existência e presença dessas criaturas são relativamente comuns.


No século XIX, Joseph Carmody um famoso novelista irlandês disse em seu leito de morte que podia ouvir o grito distante de uma Banshee. Ele pediu que a filha lhe trouxesse tampões de ouvido feitos de cera de abelha para que ele pudesse escapar de sua sina. Diz a lenda que Carmody melhorou depois disso, mas que em algum momento removeu os tampões e desesperado anunciou ter ouvido uma vez mais o som lamuriento. Algumas horas depois ele estava morto.

Mesmo nos dias atuais ainda há relatos de avistamentos da aparição. Um destes ocorreu em Junho de 2014, quando algo que parecia uma brincadeira evoluiu para uma aterrorizante experiência com o mito da Banshee.

Um homem internado em um hospital na cidade de Cork insistia ouvir o som de um grito, noite após noite. Ninguém mais conseguia ouvir, mas ele insistia que o som estava cada vez mais próximo. Finalmente, o irmão do sujeito decidiu investigar o que estava acontecendo. Ele alegou ter usado um crucifixo de prata que apontou a direção onde estava a Banshee. Após seguir a indicação ele se deparou com uma mulher velha, com cabelos grisalhos e compridos que abria e fechava a boca como se estivesse gritando, ainda que som algum fosse produzido. Ao tentar tocar a mulher, seu corpo se desfez em uma névoa cinzenta e gélida que se dissipou. Depois disso, alegadamente o irmão deixou de ouvir o grito e se recuperou.

O caso ganhou enorme repercussão nos jornais que o trataram como um legítimo episódio de Banshee na melhor tradição irlandesa. 

Apesar desse e de outros incidentes, a Banshee parece ter sido relegada ao passado, um ser do folclore. Contudo, as antigas lendas ainda são contadas e amplamente lembradas em toda Irlanda. 

domingo, 18 de dezembro de 2022

Fogo Misterioso - Casos reais de Combustão Humana Espontânea


Um assunto muito difundido e perseverante do mundo dos fenômenos paranormais trata da chamada "Combustão Humana Espontânea". O fenômeno ocorre quando um ser humano é consumido por um fogo que parece não ter causa discernível e que produz uma ignição contínua. Na maioria dos casos, há detalhes em comum, como corpos sendo carbonizados por temperaturas extremamente altas, deixando o ambiente ou mesmo roupas intocadas. Há ainda casos em que certas partes do corpo permaneceram ilesas enquanto todo o resto virou cinzas. Esses casos foram particularmente difundidos durante o século XIX, e aqui veremos uma seleção dos mais estranhos.

Começamos por um incidente de 16 de janeiro de 1811, envolvendo Ignatius Meyer um homem de 48 anos. Na ocasião ele se retirou para passar a noite em sua humilde casa no vilarejo de Woertelfeld, Alemanha. Na véspera, seu sobrinho e irmão não notaram nada de estranho ou incomum nele, e tudo era bastante mundano e rotineiro, mas na manhã seguinte podia-se ver fumaça saindo de seu quarto. Quando os dois abriram a porta, se depararam com uma espessa nuvem de fumaça nociva e puderam ver, mesmo na escuridão, que a cama estava ardendo. Depois de apagar o fogo com baldes de água, eles se depararam com a visão hedionda do cadáver de Meyers deitado sobre o lado esquerdo com os joelhos dobrados até a parte inferior do abdômen, uma posição bastante incomum.

Foi relatado que o rosto de Meyer havia sido "queimado até virar carvão", o cabelo foi consumido por inteiro e toda a cabeça estava coberta por uma "crosta brilhante". Estranhamente, esse incêndio horrível terminou no pescoço, exatamente até onde o cobertor chegava. O resto do corpo estava praticamente intacto, exceto a mão direita - totalmente queimada, enquanto o resto do braço permanecia normal. Também o dedão do pé direito, que estava saindo por um buraco na meia, se mostrava intocado. Embora o travesseiro tivesse sido chamuscado, não estava tão queimado quanto deveria, considerando que a cabeça sobre ele havia sido completamente carbonizada. O cobertor não mostrava quaisquer sinais de queimadura, embora estivesse sujo por "uma fuligem semelhante a alcatrão". Mais tarde, foi notado que as únicas partes do corpo que haviam sido queimadas eram aquelas que se projetavam do cobertor, com todo resto em perfeito estado. Da mesma forma, tudo o mais na sala foi intocado pelas chamas. Também não havia nada que pudesse ter iniciado o fogo e a lâmpada estava apagada. O misterioso incidente permaneceu sem qualquer explicação. 


Em março de 1814, houve o caso de uma francesa não identificada que foi encontrada morta em circunstâncias igualmente bizarras. Tudo começou quando os vizinhos da mulher perceberam o som de "algo fritando" vindo do quarto dela. Seguiu-se um forte cheiro de queimado. Quando as autoridades chegaram, encontraram o corpo deitado de costas, com o rosto totalmente enegrecido e queimado. O resto de seu corpo parecia ileso a princípio, mas havia um buraco em seu peito que parecia chamuscado nas bordas. Quando examinado, descobriu-se que o interior da cavidade torácica havia sido completamente queimada. As costelas estavam quebradiças e carbonizadas pelo calor que parecia ter ardido de dentro para fora. 

Os órgãos da mulher foram encontrados em estado semelhante, com uma aparência chamuscada e exibindo indícios de cinzas deixadas pela queima. Suas roupas e um livro que ela estava lendo estavam completamente intactos. Supõe-se que um incêndio tenha começado dentro do corpo da mulher e queimado suas entranhas e se projetando de dois pontos, no peito e na boca. Novamente, a causa ou razão para aquilo tudo permaneceu sem explicação razoável.

Em fevereiro de 1821, temos o caso de um homem conhecido apenas como "Vatin", na cidade de Beauvais, na França. Na noite de 21 de fevereiro, Vatin supostamente visitou um vizinho e voltou para casa por volta das 23h. Ele foi visto entrando em seu quarto e apagando a luz. Às 8h da manhã seguinte, um vizinho notou uma fumaça espessa saindo pelas frestas da porta e um forte fedor de carne queimada. Quando forçou a porta trancada por dentro encontrou os restos carbonizados de Vatin caídos no chão ainda queimando. O fogo foi apagado mediante uma "boa quantidade de água". O Dr. Tolson e o cirurgião Lelarge da Universidade local foram chamados para investigar, e eles encontraram uma cena chocante, da qual um relatório publicado na revista alemã Encyclopadie der Gesammten Staatsarzneikunde que descreve o ocorrido nos seguintes termos:

Comparado com o resto da sala, o cadáver de Vatin estava em péssimo estado. Seu rosto estava inchado e vermelho-escuro, como numa morte por sufocamento; seu braço esquerdo e a parte superior do tronco foram reduzidos a pedaços calcinados de osso, e as costas e os lados do pescoço foram destruídos até a vértebra. Seu braço direito estava apoiado sobre o estômago, mas a mão e parte do antebraço foram consumidos pelo fogo. Em seu torso, Tolson e Lelarge encontraram os pulmões, coração e fígado de Vatin, todos encolhidos, secos e sem sangue... todas as outras entranhas haviam sumido. A coxa esquerda de Vatin era apenas cinzas; sua coxa direita foi reduzida a osso. Além de uma vasilha com uma pequena quantidade de comida comprada na noite anterior, nada mais na sala havia sido consumido pelo fogo.


O que aconteceu com este homem e como seu corpo pode ter sido tão gravemente queimado sem danificar o restante da sala? Os médicos forenses, policiais e investigadores foram incapazes de determinar.

Nosso próximo caso ocorreu no Natal de 1829, quando vizinhos de Marie Jeanne Antoinette Bally, de Paris, França, sentiram o cheiro de fumaça saindo de seu quarto e foram ver se ela estava bem. Sentada em uma cadeira no canto da sala estava a visão chocante do cadáver num estado horrível. Enquanto a parte inferior das pernas, a cabeça, a frente do pescoço e a parte superior dos ombros estavam intactas; suas costas das nádegas até a nuca e seus flancos foram totalmente destruídos pelo fogo, incinerados até se tornar carvão. A cadeira também estava muito queimada e o chão estava coberto por uma espessa fuligem preta, mas tudo o mais na sala estava intacto, incluindo as cortinas de musselina a apenas meio metro dos restos.

Alguns anos depois, em 1832, ocorre a misteriosa morte de uma mulher chamada Anne Nelis, que vivia com o marido em Dublin, na Irlanda. Certa noite, os dois começaram uma discussão após beber além da conta e Anne subiu as escadas para ir para a cama. Na manhã seguinte, a empregada entrou no quarto e encontrou o cadáver da Sra. Nelis sentado em uma poltrona. Um relatório oficial do caso diz:

"A cadeira sobre a qual os restos mortais foram achados estava encostada na parede. O fogo havia se extinguido, mas ainda podia ser vista fumaça no aposento. A cabeça da Sra. Nelis continuava apoiada em sua mão direita. O rosto havia queimado por inteiro, com músculos se desprendendo e o crânio chamuscado à vista. Da pele, pouco restava. Contudo, seu cabelo e os papelotes usados para conservar o penteado estavam intactos. O encosto e o assento da cadeira não foram danificados, mas os braços da mesma foram carbonizados no lado interno mais próximo ao corpo da Sra. Nelis. Nada mais na sala foi danificado pelo fogo, embora houvesse um penetrante e pronunciado odor no ar que se manteve por dias. Alegou-se que ela havia levado uma vela para seu quarto naquela noite, então a principal teoria era que ela estava tão embriagada com álcool que o fogo a incendiou sem que ela percebesse. A gordura da mulher obesa agiu como uma espécie de pavio e consumiu o restante. Não havia uma explicação para partes do corpo e os objetos combustíveis não terem se incendiado, como seria de se esperar."

De 1852 temos o caso igualmente bizarro de John Anderson, de Nairn, na Escócia. Em 29 de julho daquele ano, Anderson foi visto conduzindo uma carroça de feno. Em algum momento, a carroça foi avistada na beira da estrada soltando fumaça. Quando uma testemunha se aproximou, Anderson foi visto emergindo da fumaça, dando uns poucos passos e tombando no chão. Chamas muito fortes o consumiam. Quando a testemunha se aproximou para tentar apagar o fogo encontrou Anderson "já sem vida, negro, desfigurado e ainda queimando". A testemunha pediu ajuda e o fogo foi apagado para revelar uma visão horrível. O rosto inteiro do homem havia sido incinerado a ponto de os olhos, nariz e orelhas terem derretido. Mas estranhamente a queimação não era tão poderosa no restante do corpo e parou a meio caminho entre joelhos e pés. As roupas estavam levemente chamuscadas, exceto a parte inferior da calça. Uma garrafa de bebida foi encontrada nas proximidades, mas estava pela metade e não foi possível determinar se o líquido causaria um incêndio forte o suficiente para queimar um homem adulto daquela forma e em tão pouco tempo. Além disso, estranhamente, o feno na carroça não estava danificado. 

No entanto, o inquérito oficial sustentou que o cachimbo que o homem fumava havia entrado em contato com o álcool na garrafa e provocado o incêndio. Um relato de que Anderson havia bebido muito naquele dia reforçou que isso havia causado o incêndio. A explicação não era satisfatória, mas foi oferecida como única razoável para o ocorrido. 


De 1869 temos um estranho incidente ocorrido em Aberdeen, na Escócia. Em 14 de março de 1869, o Dr. Alexander Ogston e seu pai, Dr. Francis Ogston, foram chamados às pressas para examinar a misteriosa morte de uma mulher de 60 anos conhecida apenas como "Sra. Warrack". Ao chegar no endereço, eles tiveram uma surpresa terrível. Ao entrarem na casa às 11 horas, foram imediatamente assaltados por um cheiro como "uma mistura de palha queimada e matéria animal carbonizada". Logo eles identificaram o que produzia aquele fedor aviltante. Deitada de lado em sua cama, a Sra. Warrack foi encontrada severamente queimada. O rosto havia desaparecido por completo, o tecido mole frontal de sua cabeça foi descritos como "severamente carbonizado e o crânio transformado numa casca enegrecida". Parte dos braços estavam "torrados" e deles se projetavam ossos expostos igualmente incinerados. Seu abdômen estava aberto e também tinha aparência de uma casca queimada, enquanto suas pernas embora atingidas, não queimaram por inteiro.

Quanto à condição da própria sala, um relatório diria:

"Comparado com a destruição presente no corpo da Sra. Warrack, o resto da sala parece em bom estado. O colchão sob o corpo e tudo imediatamente ao redor dele, foi levemente chamuscado. O cobertor que a cobria queimou de forma leve, ainda que tenha ficado impregnado pela fumaça e cinzas. A cabeceira da cama em madeira, apresentava marcas condizentes com chamas, mas nem de longe tão fortes quanto as que causaram a ruína facial. Um travesseiro com interior de palha seca queimou, mas não chegou a se incendiar por inteiro. Uma mesinha de mogno, a cerca de meio metro não apresentava danos. Havia uma garrafa com whisky a cerca de meio metro, mas o líquido não se incendiou".

Os médicos não conseguiram encontrar nenhuma fonte causadora de fogo próximo ao corpo. O filho da falecida insistiu que ela havia ido ao quarto por volta das 9 da manhã com boa saúde e sem problemas. Não estava bêbada, embora tenha bebido whisky na noite anterior. Qual a explicação para ela ter entrado em combustão tão repentinamente e sem qualquer vela ou lanterna próxima? Como as roupas de cama não queimaram? O especialista analisou a cena e se disse embasbacado pelo que viu: não havia nenhuma explicação para o que transcorreu naquele quarto. 


Pulando para a década de 1880, em 24 de dezembro de 1885, temos o caso do Sr. e Sra. Rooney, um tranquilo casal de meia idade que vivia num pequeno apartamento no centro de Londres. Um vizinho chamado John Larson foi alertado por um grito e fumaça espessa vindo da cozinha deles. Temendo por um incêndio ele foi investigar, mas o que encontrou o deixaria chocado. 

Uma reportagem na Gazeta Policial londrina descrevia a descoberta: 

"Ao entrar na cozinha, o corpo do Sr. Rooney foi encontrado estatelado no chão ao lado do forno. Havia um forte cheiro de fumaça e carne queimada dominando o aposento. Uma vela parcialmente queimada estava sobre a mesa e ao lado dela havia surgido um buraco no chão medindo aproximadamente 1,20 m. Esse buraco era dominado por um monte de cinzas que continha um crânio, ossos cervicais, algumas vértebras dorsais e parte de um ílio - tudo reduzido a cinzas. Na pira que consumiu o corpo da Sra. Rooney se projetavam dois pés humanos, ainda calçados e em perfeito estado. Boa parte do corpo de sessenta e dois quilos da mulher havia sido reduzido a apenas seis quilos de restos mortais. Nada mais na cozinha foi danificado pelo fogo, mas as paredes e móveis estavam cobertos por uma fuligem gordurosa".

O relatório médico concluiu que a Sra. Rooney havia sido consumida por um forte incêndio e que seu marido havia morrido por conta de asfixia após respirar a fumaça que exalava dela. Como se iniciou o fogo, como ele incinerou completamente a mulher e porque o resto da cozinha permanecia intocado permanecia como uma incógnita. A polícia considerou que poderia ter havido um crime. Larson chegou a ser investigado como possível responsável, mas não haviam provas ou indícios de que ele estivesse envolvido no incidente. O caso foi considerado como incêndio acidental, causado pelas vítimas, mas a explicação estava longe de ser razoável.

Em 18 de fevereiro de 1888, Alexander Morrison, de 65 anos, de Mildew, na Escócia, tomou alguns drinques e foi dormir em um estábulo. Isso não era tão incomum já que ele costumava dormir no estábulo sobretudo quando bebia além da conta. O estranho é o que aconteceria a seguir. Entre as 8 e as 9 horas da manhã, a esposa do proprietário do estábulo viu fumaça saindo de um buraco no telhado e, ao investigar, encontrou uma cena tão horrível que a polícia e um médico foram imediatamente notificados. Quando chegaram, encontraram Morrison morto, seu corpo "quase inteiramente transformado em cinzas". A destruição foi tão grande que era quase impossível reconhecê-lo - seus membros caídos e seus ossos expostos dificultavam o reconhecimento. Ainda assim, o feno ao seu redor não havia pegado fogo. 

O perito médico, o Dr. J. Mackenzie Booth, especularia que, como não havia sinais de luta ou sofrimento, o velho provavelmente morreu silenciosamente antes ou depois do início do incêndio, após o qual a gordura corporal tornou-se um pavio, com as chamas fazendo o resto do trabalho. No entanto, nenhuma fonte de chama foi encontrada e o próprio feno inflamável não foi queimado, tornando o caso inexplicável.


Nosso último caso ocorreu em 12 de maio de 1890 envolvendo um certo Dr. B.H. Hartwell, da cidade de Ayer, Massachusetts. Ele foi chamado por uma mulher aflita afirmando que sua mãe estava na floresta sendo queimada viva por alguma coisa invisível. O médico imediatamente correu para ver o que havia acontecido, mas quando chegou ao local, as coisas eram muito mais estranhas do que ele poderia supor. Ele diria:

"A mãe da mulher, uma senhora de 70 anos, estava em estado de conflagração total, deitada de bruços, mas com apenas o rosto, os braços, a parte superior do peito e o joelho esquerdo tocando o chão ... o resto do corpo foi levantado no ar pelos músculos que ficaram rígidos sob o ataque do fogo. A roupa tinha sido quase toda consumida. As chamas irradiavam dos ombros da mulher, em ambos os lados do abdome e de ambas as pernas, irradiando-se de doze a quinze polegadas do cadáver. Quando me aproximei do cadáver, houve um estalo audível e os ossos da perna direita quebraram; isso deixou o pé direito pendurado pelos tendões e músculos restantes, pois metade deles já havia sido destruídos."

Alguns moradores da área foram chamados para ajudar a extinguir as chamas antes que começassem um incêndio florestal. Quando o fogo finalmente foi apagado, o corpo não passava de uma massa carbonizada de gordura derretida, carne queimada e ossos enegrecidos. A única coisa que parecia ter escapado da fúria do fogo era o chapéu de palha da mulher, que estava perto dela em perfeitas condições, e as folhas apenas ligeiramente chamuscadas. Quando a filha foi questionada sobre o que havia acontecido, ela explicou que eles simplesmente estavam limpando tocos e raízes quando sem nenhuma razão aparente a mulher explodiu em chamas. Embora houvesse uma pequena fogueira para queimar os tocos a mulher estava a certa distância dela. 

O caso é notável por vários motivos. O primeiro é que a mulher era esguia e não bebia, dois fatores na época considerados presentes em casos de combustão humana espontânea. Além disso, este parece ser um dos únicos casos em que um profissional médico realmente testemunhou a combustão em ação. Hartwell nunca foi capaz de explicar como aquilo aconteceu e o consideraria um verdadeiro enigma médico.

Existe alguma explicação para tudo isso? O que aconteceu nesses casos amplamente documentados? Não há qualquer consenso para as causas da Combustão Humana Espontânea, com explicações variando do mundano e prático ao verdadeiramente bizarro. Embora o assunto tenha sido muito discutido e debatido ao longo das décadas, parece não haver um acordo sobre a matéria. O fato é que o corpo humano não é tão fácil de se destruir pela ação do fogo. Afinal, somos compostos principalmente de água, e até mesmo crematórios levam de 3 a 5 horas para incinerar completamente um cadáver.

Então, como podemos explicar casos bizarros como esses? Seja qual for o motivo, não há como negar que alguns desses casos estranhos ocorreram no século XIX e depois diminuíram gradualmente. As chamas do mistério permanecem ardendo até os dias atuais e ao que tudo indica asism permanecerão por muito tempo.

quarta-feira, 14 de dezembro de 2022

A Prisão sem Muros - O medonho Campo e cemitério assombrados de Old Kirkwood Greyfriars


Próximo da capital da Escócia, surgiram os primeiros campos de concentração documentados pelo homem. Um local de confinamento, tristeza, sofrimento e claro, morte. O terreno, conhecido como Old Kirkyard Blackfriar, foi usado consistentemente ao longo de mais de três séculos como prisão para pessoas "indesejadas" e gente de quem se queria livrar.

Hoje, esse lugar obscuro não é nada além de um descampado, repleto de mato crescendo selvagem e algumas árvores esparsas. Restou pouco além das lápides e o muro de um velho cemitério que recebeu inúmeras vítimas de um dos períodos mais brutais da história.

Além de ser um resquício histórico, o sítio também ganhou fama como um dos cemitérios mais assombrados da Escócia. Um lugar infame pela brusca atividade paranormal que deixou especialistas, estudiosos e curiosos ao longo dos anos igualmente chocados.

O campo de confinamento de Old Kirkyard Greyfriar foi fundado em 1650, mas há registros de que ele já servia como prisão bem antes. É possível que os romanos tenham sido os primeiros a usá-lo como local para reunir prisioneiros. Os britânicos deram sequência à essa tradição já que a área cercada por pântanos era ideal para desestimular fugas. Muito se falava sobre as piscinas de lama profunda, responsáveis por matar incontáveis pessoas. Havia ainda rumores sobre fantasmas, entidades malignas do passado e demônios que habitavam esse lugar ermo. A temida Catoblepas, uma besta mítica do folclore escocês, supostamente vivia no lugar e seu hálito cáustico era responsável por causar doença e morte. Contudo, os espectros mais temidos eram justamente os dos homens que haviam se afogado nas charnecas e que uma vez mortos haviam se tornado rancorosos dos vivos, dispostos a puxar para baixo todos aqueles que seus dedos cadavéricos pudessem agarrar.

Além de ser um campo de confinamento, os prisioneiros eram tratados com violência. Os guardas eram escolhidos a dedo para a função, com os mais sádicos recebendo benefícios especiais por sua atuação. Todos aqueles que eram mandados para a prisão sabiam que escapar era virtualmente impossível e que a morte ali era quase certa. Não havia necessidade de muros, já que não havia para onde escapar.


Por volta de 1670, a Grã-Bretanha estava envolvida em muitas disputas religiosas que não raramente descambavam para a violência. Na Escócia um movimento protestante chamado de Covenentors ganhava adeptos. O grupo acreditava que os Reis não eram os senhores de direito, já que Jesus era o único Rei ungido por Deus. As ideias do grupo eram perigosas tanto do ponto de vista religioso, quanto político. Os escoceses além de exigir liberdade religiosa, almejavam escolher seus líderes, algo que irritou seus conquistadores, os ingleses.

O Parlamento britânico que na época era de maioria Católica não gostou nada dos ideais defendidos pelos Covenentors. Ele planejou coibir o movimento e esmagá-lo de uma vez por todas. Os seguidores foram perseguidos e muitos deles foram capturados para que fossem julgados por ideias contrárias a monarquia e ao clero, duas instituições contra as quais se rebelar resultava em duras penas.

Entra em cena então um impiedoso juiz chamado George Mackenzie que detestava os Covenentors com uma paixão que beirava a obsessão. Para ele, eliminar aquele bando era uma espécie de missão de vida à qual se dedicou de corpo e alma ao longo de sua vida.

Mackenzie julgou, sentenciou e puniu mais de 1400 réus acusados de fazer parte da crença. Suas decisões não eram baseadas somente na "letra fria do direito", mas em suas convicções morais. Ele achava que removendo os Covenentors estava prestando um serviço quase divino.


Apelidado de Bloody Mackenzie (Mackenzie Sangrento), o Juiz costumava enviar aqueles que sentenciava à prisão em Old Kirkyard Greyfriar onde encontravam condições tão desesperadoras que a maioria deles sucumbia nas primeiras semanas de internação.

No primeiro mês, os prisioneiros transferidos dormiam ao relento, supostamente para se acostumar as condições insalubres proporcionadas pelo pântano e sua população infindável de mosquitos. Só depois eles conquistaram o direito de se recolher nos alojamentos, que eram pouco mais que modestos barracões de madeira que não ofereciam proteção ao frio cortante. Contudo, a fome era o pior: os prisioneiros sobreviviam com uma ração diária de 120 gramas de pão seco. 

Há poucos documentos sobre o campo, os registros oficiais sobre sua rotina não sobreviveram ao tempo. Contudo, na época Old Kirkyard Greyfriar era visto como um verdadeiro Inferno na Terra. 

O vasto cemitério que ficava próximo do campo também era testemunha do horror na Prisão sem Muros. Em tempos mais recentes, arqueólogos atestaram que o cemitério possui mais de 700 sepulturas. Isso sem contar as covas comunais usadas quando havia alguma epidemia. Supõe-se ainda que muitos corpos tenham sido simplesmente atirados nas areias movediça do entorno.

O cadáver mais ilustre a ser sepultado no Cemitério foi justamente o do Juiz George Mackenzie, que faleceu vítima de uma doença misteriosa. Diz a lenda que o velho juiz, deixou como último pedido em vida que fosse enterrado no Cemitério de Greyfriar, supostamente "para continuar tomando conta das coisas por lá".


Verdade ou mentira, o gigantesco mausoléu de pedra-gres que se sobressai até hoje no terreno é prova que ele teve seu pedido atendido. O nome "MACKENZIE" foi talhado na pedra, ladeado com ossos cruzados. Foi mais ou menos nessa época que os rumores sobre assombrações no cemitério se intensificaram. Guardas e prisioneiros falavam sobre estranhas ocorrências no local, com gritos ouvidos no meio da madrugada, áreas frias sendo sentidas e estranhas luzes sendo vistas. Havia ainda os rumores sobre fantasmas incorpóreos que pareciam vagar pelas sepulturas chorando ou murmurando como se estivessem aterrorizados. Para alguns era a triste constatação que nem mesmo a morte terminava com a miséria dos prisioneiros em Greyfriar.

No entanto, eram as histórias sobre o Juiz, o velho Mackenzie Sangrento, as mais aterrorizantes. Diziam que o fantasma do velho podia ser visto, usando o traje oficial de juiz, com direito a peruca empoada espreitando, geralmente com uma corda atada em forca na mão. Havia a crença de que ele surgia noite após noite, como se estivesse fazendo uma ronda silenciosa nas imediações do campo - costume que tinha enquanto vivo. Muitas pessoas relataram ver o Juiz e alguns até confirmaram terem conversado com seu fantasma.

Certa vez, um prisioneiro tentou escapar e teria até conseguido se afastar do campo e penetrar no pântano. Dias depois, segundo os boatos, seu cadáver reapareceu no Cemitério Greyfriar, justamente aos pés do grande mausoléu do Juiz. Seu rosto estava transfigurado em uma máscara de pavor: a boca escancarada num grito mudo e os olhos arregalados de terror. Em volta de seu pescoço pendia uma corda atada em nó corrediço - a Marca da Forca.

Eventualmente Old Kirkyard Greyfriars encerrou suas atividades em 1830, após um grande incêndio que destruiu os barracões e que fez mais de 50 vítimas. As instalações ainda experimentaram um curto ressurgimento em 1860, mas foram desativadas pouco depois fazendo com que tudo caísse num progressivo estado de abandono.


Em 1989, o local foi escavado pela primeira vez por arqueólogos da universidade de Edimburgo em busca de informações sobre o Campo de Confinamento, considerado um dos primeiros Campos de Concentração da Europa. Na ocasião, os especialistas relataram estranhas ocorrências no cemitério, área que foi foco do trabalho de escavação. Pessoas envolvidas nos trabalhos contaram que a atividade paranormal ali era tão frequente que não havia nenhum membro da equipe capaz de manter seu ceticismo por muito tempo. Vários membros da equipe pediram afastamento depois de testemunhar "coisas inacreditáveis" no interior do cemitério - de objetos voando, a gritos e murmúrios, passando por áreas frias e até violenta atividade de poltergeist.

Marcus Avery Newland, conceituado parapsicólogo da Universidade de Glasgow esteve em Greyfriar repetidas vezes e conduziu estudos nas ruínas do campo e do cemitério. Ele constatou que a atividade no local é tão forte durante o dia quanto à noite, com fenômenos ocorrendo constantemente. De fato ele conceituou o local como o Epicentro de Atividade Paranormal na Escócia, um dos mais poderosos na sua opinião. 

"É como um vazamento que não pode ser contido" disse ele em uma entrevista "o cemitério é uma ferida aberta que concentra tristeza, desespero e desolação que ainda pode ser sentido no próprio ar. Tudo isso deixou uma marca no ambiente. Não é por acaso que tantas pessoas se sentem mal ao visitar esse lugar".


Em 1998, os trabalhos no cemitério se encerraram e um muro foi erguido ao redor dele para proteger o patrimônio histórico. O muro visava também proteger o local contra a depredação de curiosos que vinham visitá-lo e levavam "lembranças". O Mausoléu de Mackenzie foi um dos mais dilapidados, sendo alvo de vândalos que deixaram marcas e xingamentos nas suas paredes. Pouco antes dessa medida as portas do mausoléu foram arrombadas e a sepultura interna violada. Os ossos do Juiz foram espalhados e pisoteados por algum visitante especialmente furioso. Mais tarde eles foram recolhidos e levados para outro jazigo nas cercanias de Edimburgo.

A atividade poltergeist, contudo, não se encerrou por aí. 

Após incidentes categorizados como "acidentais" nas cercanias, a visitação ao terreno foi oficialmente desaconselhada pelas autoridades locais. O cemitério no entanto foi "engolido" pelo crescimento de Edimburgo e se tornou parte da cidade. Há uma placa na entrada do terreno onde se lê que "pessoas sensíveis devem evitar a entrada no cemitério".

Old Kirkyard Greyfriar é considerado um dos lugares mais assombrados da Escócia.