domingo, 31 de dezembro de 2017

O Mistério do Baykimo - O cargueiro fantasma que cruza os mares do Alasca



Há algo profundamente aterrorizante nas histórias a respeito de navios abandonados e deixados à deriva.

Talvez seja a sensação de estranheza por se tratar de uma embarcação gigantesca navegando sem destino, sem tripulação e sem viva alma em seu interior. Quem sabe sejam as circunstâncias em que tais embarcações são abandonadas, muitas vezes às pressas e sob a ameaça de alguma situação inesperada. É possível, no entanto, que seja algo totalmente diferente, que nosso fascínio por navios fantasma seja motivado pela crença de que nada jamais está totalmente deserto e que presenças, não necessariamente humanas, não obrigatoriamente vivas, podem habitar os recônditos mais  desolados.

Tomemos por exemplo, a lenda de uma dessas embarcações assombradas, um dos navios fantasma mais antigos e notórios, cujo nome se tornou sinônimo de estranheza e apreensão para homens que ganham a vida cruzando os mares.

Estamos falando, é claro, do famoso S.S. Baychimo.

O Baychimo (pronuncia-se "BEI-quimo") foi um cargueiro à vapor lançado ao mar em 1914. Seu nome original era Ångermanelfven e ele foi construído pelo estaleiro sueco Lindholmens de Gotemburgo.


O navio foi comprado pela Baltische Reederei de Hamburgo, e ele foi usado em seus primeiros anos de serviço em rotas comerciais entre o norte da Alemanha e a Suécia. O cargueiro de 230-pés (aproximadamente 70 metros), movido por um potente motor de queima de carvão podia atingir a velocidade de 12 milhas por hora. Era um navio possante e de peso considerável, atingindo 1322 toneladas.

Em suas primeiras viagens ele levava mercadorias, na maioria das vezes sacas de grãos e peles, mas em pelo menos uma ocasião carregou animais para o zoológico de Gotemburgo. Nessa viagem ocorreria um trágico acidente que custou a vida de quatro zebras, dois hipopótamos, uma girafa e um número não determinado de antílopes. Os animais foram esmagados por um enorme container que se soltou no compartimento de carga. Muitas das pobres criaturas ficaram feridas pelo imenso caixote de metal que rolava de um lado para o outro e a solução dada pelos marinheiros foi alvejar os animais com tiros de misericórdia. Dizem que depois de sacrificar vários animais, e de ouvir o lamento das feras aterrorizadas, o primeiro oficial subiu até sua cabine e utilizou a mesma arma com qual matou as bestas para dar cabo de sua vida.

Durante a Grande Guerra, o cargueiro foi comissariado pela Marinha de Guerra Germânica e usado para fins militares. Ele foi empregado para a remoção de feridos e transporte de tropas no Mar do Norte. Em uma ocasião escapou por milagre de ser torpedeado por um submarino da própria Alemanha que o confundiu com um mercante britânico. Um torpedo atingiu o costado, mas por sorte ele não chegou a detonar. Em meio ao pânico, homens se jogaram ao mar e morreram afogados nas águas gélidas.


Mais dramática foi a situação na enfermaria improvisada no porão do cargueiro. Um enfermeiro temendo um naufrágio decidiu oferecer doses de veneno para os feridos que eram transportados no compartimento de carga. Muitos homens morreram antes da confusão ser solucionada. O próprio enfermeiro também morreu, ingerindo uma dose fatal de veneno quando descobriu seu engano.

Após a guerra, pelos termos dos Tratados de Rendição, a Alemanha foi obrigada a prestar reparações pelo afundamento de navios aliados ou neutros. O Ångermanelfven foi transferido para a companhia britânica Hudson Bay no ano de 1921.

Ele recebeu então um novo nome Baychimo.

O Baychimo foi rebocado até sua nova casa, o Porto de Ardrossan na Escócia. Lá passou por reparos e foi equipado com equipamento de quebra gelo. Uma de suas novas funções seria realizar o transporte de peles. Todo verão ele faria a rota até a Costa do Canadá levando também tabaco, açúcar, chá e armas. A passagem do Baychimo era muito aguardada pelas tribos esquimós que habitavam o território setentrional do Canadá, já que ele era um dos únicos navios a fazer essa perigosa viagem que o levava através da passagem norte, tendo como destino, o isolado território do Alasca.


Em 1924 o navio circunavegou o globo e continuou carregando suprimentos e material até que em 1931 se viu encalhado em um banco de gelo no Alasca. O Baychimo ficou totalmente preso e nem mesmo cargas de dinamite conseguiram libertá-lo da geleira que o deteve. Os tripulantes foram obrigados a desembarcar e realizar uma árdua viagem por terra até a cidade de Barrow que ficava a alguns quilômetros de distância através do terreno congelado.

Os homens tencionavam ficar alguns dias em Barrow e esperar que lhes trouxessem mais explosivos ou que o gelo eventualmente derretesse para que eles pudessem seguir viagem. Tentativas de libertar o navio foram feitas, mas o Baychimo ficou preso uma vez mais. O Capitão enviou então uma mensagem ao escritório da Companhia avisando que não havia condições de seguir viagem, ao menos até o fim da estação, quando ocorreria o derretimento.

De acordo com historiadores, alguns homens foram evacuados de avião, enquanto os demais marinheiros construíram cabanas improvisadas a cerca de 2 quilômetros de distância do navio, lá aguardariam o degelo. Mas para azar deles, a temperatura naquele ano caiu drasticamente, resultando em um inverno extremamente severo, mesmo para os padrões do Alasca, com temperaturas que chegaram a cinquenta graus negativos. Os marinheiros chegaram ao seu limite quando uma tempestade de gelo destruiu parte do abrigo e os obrigou a se refugiar em Barrow.


Alguns dias depois, o Imediato responsável pelo Baychimo foi até o local onde ele estava encalhado e descobriu que o navio simplesmente havia desaparecido!

Sua primeira suposição foi que ele havia sido danificado pela tempestade e teria afundado. O imediato chegou a comunicar a perda do navio ao escritório da empresa, mas algumas semanas mais tarde ocorreu uma reviravolta: O Baychimo foi avistado por um grupo de esquimós caçadores de focas, cerca de 72 quilômetros além do ponto em que ele havia ficado preso originalmente.

A notícia fez com que a empresa corresse contra o tempo e enviasse uma expedição pelo gelo atrás do navio. A valiosa carga ainda estava à bordo e precisava ser desembarcada o quanto antes. Nativos de uma tribo de esquimós foram contratados para levar uma equipe até o navio. Liderada pelo Capitão Sydney Cornwell, a expedição encontrou o navio avariado com danos estruturais que comprometiam sua navegação. A equipe então descarregou a carga e tudo que havia de valor à bordo. Decidiram abandonar o Baychimo para que eventualmente afundasse nas águas geladas.


Um fato curioso é que muitos esquimós que acompanharam a expedição se negaram a entrar no navio para auxiliar o desembarque da sua carga. Acreditavam que a embarcação havia se soltado do gelo graças à espíritos e deuses do norte que revindicavam para si a posse do navio. Não havia como explicar como o cargueiro havia se soltado e para os supersticiosos, a única explicação repousava em algum fator sobrenatural. Para piorar, quando um cabo se soltou e quase causou um acidente fatal, parte dos inuit decidiram partir. Temendo o risco de serem abandonados pelos guias, o Capitão se contentou em partir com a carga que já havia sido desembarcada.   

Os homens acreditavam que as fotografias tiradas na ocasião seriam o último registro do Baychimo. Ninguém realmente esperava que ele fosse visto novamente por olhos humanos.

Mas não foi bem isso que aconteceu...

O Baychimo se provou muito mais resistente do que se poderia imaginar. Vários meses depois uma embarcação de grande porte, com descrição idêntica ao cargueiro foi avistado 250 milhas a oeste da sua última posição. Ele estava navegando após o degelo ter ocorrido naturalmente. Esquimós o viram ao longe e comunicaram o ocorrido quando chegaram em um vilarejo nos limites da civilização. A maioria das pessoas não acreditou na história.


Um ano mais tarde, Leslie Melvin, um respeitado comerciante local, estava viajando com seu trenó puxado por cães nas proximidades de Nome quando viu uma embarcação flutuando próxima da costa. Ele imaginou que a tripulação pudesse ter desembarcado para buscar suprimentos. Melvin descreveu o navio em detalhes e mais estranho, jurava ter visto movimento de tripulantes no interior do cargueiro. Nas suas palavras, estes marinheiros pareciam ocupados cuidando de suas tarefas de bordo. Ele chegou a acenar para os homens, mas estes não devolveram a cortesia, pareciam não perceber sua presença. Achando que não havia nada de mais, ele prosseguiu em sua viagem sem tentar uma aproximação. Em Nome, a narrativa levantou dúvidas, sobretudo quando ele descreveu alguns detalhes muito particulares do cargueiro.

Alguns meses mais tarde, outro mercador chegou a Nome com notícias a respeito de uma embarcação próxima a Costa. O navio havia se deslocado mais 30 milhas e estaria à deriva.

Passaram-se oito anos sem qualquer avistamento e a essa altura poucas pessoas se recordavam do Baychimo. Mas em 1932, um grupo de mercadores avistou uma embarcação próxima de Wainwright, Alasca. Eles tentaram se aproximar, mas o gelo estava perigosamente fino e foi impossível chegar até ele. O grupo reportou a presença de luzes misteriosas sobre o navio, como se ele estivesse sendo banhado por um caleidoscópio de cores roxeadas e verdes que vinha de lugar nenhum. 

Um ano mais tarde, histórias curiosas começaram a ser contadas por esquimós que viviam em uma região extremamente isolada no norte do Alasca. Falavam a respeito de um enorme navio de aço que singrava os mares congelados. Para onde ele ia, um som misterioso era ouvido, uma espécie de lamento de mau agouro. Diziam que se tratava de um navio fantasma, conduzido por espíritos que se revezavam no tombadilho e que podiam ser percebidos mesmo à longa distância.


Um grupo de caçadores inuit contou em 1934 ter avistado um navio preso em um enorme banco de gelo. Provavelmente ele havia sido lançado contra uma ilhota por alguma tempestade bravia. O mais curioso é que a tribo mais próxima de esquimós, passou a considerar a embarcação amaldiçoada. Viam nela uma espécie de armadilha deixada por espíritos malignos para tentar os homens a se aproximarem, e se estes o fizessem não haveria retorno. Os caçadores fizeram preparativos para ir até o navio, sabendo que parte da carga havia ficado à bordo, mas foram impedidos pelos nativos que os expulsaram violentamente de seu território. Mencionaram que rituais e cerimônias eram praticadas pelos xamãs tribais para apaziguar os espíritos e afastar o navio maldito. Esses rituais parecem ter funcionado, pois quando um grupo de resgate visitou o local meses depois não encontrou nada. A tribo de esquimós parecia aliviada. Eles contaram que uma tempestade providencial foi enviada e a embarcação se desprendeu e partiu.

Muitos outros avistamentos foram feitos ao longo dos anos que se seguiram.  

Um grupo de esquimós chegou a relatar ter usado o Baychimo como refúgio durante uma forte tempestade de gelo que os atingiu. Na ocasião, eles produziram como prova de sua estadia uma série de objetos que foram removidos do interior da embarcação. Essas provas entretanto foram amplamente contestadas assim como toda a narrativa.

Em 1962, o Baychimo teria sido visto no norte uma vez mais. Navegava banhado na luz arroxeada e esmeralda vinda de lugar nenhum e testemunhas afirmaram ouvir um estranho lamento que o acompanhava. Estava duramente avariado e arranhado, o gelo o cobria quase inteiramente e as testemunhas ficaram impressionadas como ele não afundava. Fotos foram feitas, mas a péssima qualidade do material impediu qualquer identificação positiva. 

Sete anos mais tarde, ele foi visto uma última vez, capturado em um banco de gelo na costa do Mar de Chukchi, uma região quase inacessível, repleta de icebergs traiçoeiros e pedaços de gelo negro responsáveis por muitos naufrágios. Parecia pouco plausível que a velha embarcação tivesse feito seu caminho através desse trecho especialmente perigoso, quanto mais, sem uma tripulação para tirá-lo da rota de um choque. Mesmo assim, fotografias oferecidas como prova, atestavam que o navio, visto à distância era bastante similar ao Baychimo que já estava sumido há 38 anos.  

Como não poderia deixar de ser, o Baychimo se tornou uma espécie de lenda. De tempos em tempos testemunhas alegavam ver o cargueiro, muitas vezes mencionavam as estranhas luzes que o acompanhavam e um som misterioso de animais e pessoas se lamentando. Talvez as feras abatidas ou os feridos de guerra ainda tripulassem seu esqueleto de aço castigado pelo gelo e por incontáveis tempestades. 


Entre os povos inuit, ele se tornou sinônimo de mau agouro, evitado à todo custo como uma presença maligna mandada do outro lado. Quem o via acreditava estar marcado pela má sorte. Mas esse sentimento não era compartilhado por todos. Em 2006, o governo do Alasca lançou um projeto para localizar o Baychimo e resgatá-lo do gelo. Os especialistas concordavam que era virtualmente impossível que ele ainda estivesse na superfície, portanto, se concentraram em vasculhar as profundezas em busca de qualquer sinal do navio fantasma.

Sonares, sensores e equipamento moderno foi empregado nas buscas, mas nada foi encontrado.

Será possível que o cargueiro centenário ainda esteja flutuando pelo norte do Alasca sem destino? O que seriam as estranhas descrições de luzes e sons que acompanham sua jornada à esmo? Será que um dia o destino final do Baychimo será conhecido?

Só podemos aguardar, pois de acordo com um ditado esquimó, "o Gelo tem todo tempo do mundo e pode esperar quanto quiser".  

quinta-feira, 28 de dezembro de 2017

Meta Extra #1: No Coração das Trevas - Aventura de Chamado de Cthulhu


Olá pessoal,

Financiamento Coletivo já completo!!! Parabéns para todos!

E agora vem as metas extras e é correr para o abraço! Chegando aos R$ 43,500 atingimos a primeira meta, a da aventura "No Coração das Trevas" escrita por este que vos escreve.

Pensei em uma coisa que pode ser bacana: fazer uma pequena preview do que aguarda em cada nível de meta estendida e revelar um pouco a respeito do material a ser alcançado.

Como esse primeiro envolve uma aventura minha, então nada mais justo que eu começar falando a respeito dela.

"No Coração das Trevas" foi escrita em meados de 2010, como aventura para o Torneio Tentacular daquele ano. O Torneio era um evento anual que acontecia durante o EIRPG e depois na RPGCon grandes convenções de RPG em São Paulo. Nele os participantes formavam mesas individuais onde jogavam a mesma aventura e os jogadores que mais se destacavam, eram levados para uma mesa final onde aquele dentre eles que fez o melhor roleplaying, recebiam uma premiação - geralmente livros ou material de RPG.

Coração das Trevas foi concebido para ser um cenário one-shot, ideal para aventuras com começo, meio e fim. A ideia é que a aventura tivesse uma boa parcela de investigação em sua parte inicial e que o final fosse desafiador no sentido de ter um grau de dificuldade elevado na forma de combate e diversos riscos. Uma vez que se trata de uma aventura para Torneio, era essencial que ela fosse linear. Esse estilo de construção ajuda a fazer de Coração das Trevas um bom cenário para quem está começando sua carreira como Guardião.


Dada a premissa do cenário, ela também funciona bem para jogadores iniciantes ou mesmo quem nunca jogou RPG. É fácil captar a motivação dos personagens, os objetivos que eles perseguem e quais serão as suas recompensas. No entanto, não se trata de uma aventura convencional do ponto de vista Lovecraftiano. No Coração das Trevas é uma aventura sobre o submundo do crime nos anos 1920. 

Os personagens de "No Coração das Trevas" não são professores, arqueólogos, médicos ou diletantes com tempo livre e interesse em estudar o ocultismo. Eles são motoristas de fuga, ladrões de banco escondidos, assassinos de dedo leve e pessoas de moral dúbia que você não gostaria de conhecer. Personagens durões típicos da literatura policial e do período que ficou conhecido como a Lei Seca (a proibição federal ao comércio e distribuição de bebidas alcoólicas em alguns estados norte-americanos). Uma época em que o crime organizado se expandiu e se converteu em uma ameaça à lei e ordem. Os jogadores podem criar seus próprios investigadores, mas se quiserem, poderão usar os personagens prontos especialmente projetados para essa aventura.  

Embora o cenário comece como uma típica história de bandidos, aos poucos o foco vai mudando para algo mais aterrorizante e surreal. Gradualmente, os criminosos, disputa de território e até mesmo as furiosas metralhadoras Thompson vão cedendo lugar a coisas muito mais tenebrosas que pertencem ao passado de Arkham, uma cidade assombrada pela sua tumultuada história colonial.

Arkham é a cidade lovecraftiana por excelência.


H.P. Lovecraft idealizou essa pacata cidadezinha da Nova Inglaterra como palco para suas histórias mais famosas. Vizinha de Salem, o centro nervoso da infame Caça às Bruxas que varreu a Nova Inglaterra, Arkham é muito antiga, remontando aos tempos da colônia. Repleta de segredos e superstições em contraste com a modernidade e o esclarecimento trazidos pela Universidade Miskatonic, um centro de educação superior também instalado na cidade. Em Arkham, acontecem coisas aterrorizantes: horrores são conjurados, feitiçaria é proferida e tomos ancestrais são consultados.  A cidade é um depositário de mistérios insondáveis, de terrores inomináveis e de medos imortais. E como não poderia deixar de ser, Arkham figura como um local de destaque em muitas aventuras do RPG Chamado de Cthulhu. 

A ideia original de "No Coração das Trevas" veio de uma aventura curta chamada Little People, escrita pelo genial e saudoso Keith Herbert - autor falecido prematuramente em 2009. A aventura de Herbert misturava o crime organizado com os Mythos, tendo resultados imprevisíveis. A execução e a conclusão de Coração é diferente, mas a premissa é semelhante. Aqui, no entanto, os jogadores terão de enfrentar ameaças bem mais aterrorizantes e vilões realmente detestáveis.

Algumas cenas foram adaptadas, bem como certos personagens que fazem parte do roteiro original. De resto, a aventura é bem mais extensa e provavelmente terá resultados sanguinolentos. O destino dos jogadores dependerá não apenas de sua capacidade de confrontar os horrores, mas de negociar e tolerar situações limítrofes.

Conforme dito, teremos cinco personagens prontos acompanhando a história. Estes também se encaixam perfeitamente em Missed Dues e em Blackwater Creek, aventuras que acompanham o Escudo do Mestre de Chamado de Cthulhu (e que também integram o Financiamento Coeltivo como Metas extras). Desse modo, os três cenários podem compor uma campanha curta se passando no submundo do crime organizado com gangsters envolvidos com o horror cósmico.


Algumas dicas para essa aventura:

- Músicas do período da Lei Seca se encaixam perfeitamente no clima. Os anos 20 ficaram conhecidos como a Era do Jazz e não foi por acaso. Use e abuse de temas musicais do período com artistas como Chub Cheker, Moonshiner, Jeremy Sherman e outros. A Trilha sonora de Board Walk Empire também é show e pode ser obtida no you-tube ou no Spotify facilmente.

- Pode ser muito interessante reunir seus jogadores antes da sessão para assistir algum filme de gangsters do período. Eu indicaria o clássico "Era uma Vez na América" (Once upon  Time in America) e "Ajuste Final" (Miller's Crossing) como as referências mais diretas a essa aventura. Alternativamente "Os Intocáveis" (The Untouchables), Estrada para a Pedição (Road to Perdition) e "Uma Rajada de Balas" (Bonnie and Clyde). A série Board Walk Empire também é uma referência perfeita para o período e o clima desse cenário. Ah sim, filmes como "A Bruxa" (The Witch) e "As Bruxas de Salem" (The Witches of Salem) podem ser bem interessantes também.

- Busque imagens de gangsters para os jogadores (se eles criarem seus próprios personagens) e para os personagens coadjuvantes. Da mesma maneira, imagens de armas, roupas, automóveis ou fotos em preto e branco do período, ajudam bastante. Referências visuais sempre são bem vindas, sobretudo em aventuras com um grande elenco de personagens secundários como é o caso.

-  Leia "Sonhos na Casa da Bruxa" de H.P. Lovecraft, uma referência direta a esse conto. "Pickman´s Model" e "Horror em Red Hook"  também são contos de Lovecraft que podem ajudar a compor a paisagem urbana do período.

- A aventura acompanha alguns termos em italiano e gaélico (uma vez que envolve italianos e irlandeses). Esses são ótimos recursos para dar um toque de autenticidade à história. O mafioso italiano xingando algo como "Va fanculo! Figlio di una cagna!" parece bem mais real do que um dizendo "Droga! Mas que filho da mãe!". Da mesma maneira um irlandês brindando com "Slante!" soa bem mais bacana do que um simples "Saúde!".

A aventura trará além das fichas uma série de Recursos para o Guardião. É óbvio, eles serão mais bem trabalhados do que esses. Com uma arte mais caprichada e acabamento mais bacana:



Mas para o Coração das Trevas começar a bater, precisamos chegar até os R$ 43,500.

quarta-feira, 27 de dezembro de 2017

Entrevista com Mike Mason autor da sétima edição de Chamado de Cthulhu


Bem, não é segredo para mais ninguém!

Chamado de Cthulhu está à caminho e o Financiamento Coletivo já está rolando.

É claro, o Mundo Tentacular estará presente durante todo Financiamento, publicando ao longo das próximas semanas artigos a respeito do jogo. Esse é apenas o primeiro deles! Mas para marcar o início da série, resolvemos fazer algo diferente. Procurar os autores da Sétima Edição de Call of Cthulhu e deixar que eles falassem a respeito de sua criação. 

Portanto, aqui está uma pequena entrevista feita com Mike Mason, que, ao lado de Paul Fricker, foi responsável pela modernização do sistema e pela sua encarnação mais recente.

Além de ser o co-autor do Livro do Guardião de Chamado de Cthulhu, Mike editou e publicou o fanzine "The Whisperer", devotado a Call of Cthulhu. Ele também presidiou o projeto Kult of Keepers que congrega um grupo de escritores de cenários para Call of Cthulhu, responsável por organizar Torneios Nacionais na Grã-Bretanha. Mike, não é um novato nos "procedimentos arcanos" das companhias de jogos, ele já trabalhou para a Games Workshop e Black Industries como gerente de linha para o RPG Warhammer 40,000 Dark Heresy, vencedor do Prêmio Ennie, antes deste ser vendido para a Fantasy Flight Games.

Nativo da Grã-Bretanha, Mike atualmente vive no pequeno vilarejo de Gotham, próximo de Nottingham, onde as lendas mencionam homens loucos, reis e doidos varridos.

Os trabalhos de Mason incluem:

Para a Chaosium: o Vencedor do Prêmio Ennie Call of Cthulhu Quick-Start Rules, o Call of Cthulhu Rulebook (7th edition), The Investigator's Handbook, Pulp Cthulhu, o Capítulo "Simulacrum Unbound" da nova campanha "Horror on the Orient Express", além dos Baralhos de Fobias, Armamentos, de Curiosidades e Eventos. Mike ajudou a desenvolver vários livros de Call of Cthulhu desde 2013, incluindo Alone Against The Flames, Nameless Horrors, Doors to Darkness, e muitos outros.

Para outras editoras ele foi responsável pelo Livro Básico de Dark Heresy, os suplementos The Inquisitor's Handbook, Disciples of the Dark Gods, Purge the Unclean, o Dark Heresy Game Master's Pack e finalmente o Character Folio. Também esteve à frente dos fanzines The Whisperer e da revista Valkyrie.

Ele foi muito gentil em responder as seguintes perguntas feitas:

1 - Antes de tudo, muito obrigado pela gentileza de conceder essa entrevista ao Mundo Tentacular.

Ótimo. Estou feliz por estar aqui!

2 - Call of Cthulhu é um jogo clássico, um verdadeiro ícone para o RPG. Como foi a sua experiência em escrever para um jogo tão importante? Quais foram os maiores desafios e dificuldades? Qual foi sua maior realização? 

A 7ª edição de Call of Cthulhu tomou forma ao longo de mais de trinta anos de jogo. Essencialmente, o jogo foi escrito, com as regras sendo trabalhadas para facilitar as sessões, a racionalização e o desenvolvimento da experiência do jogo. Introduzimos novas opções e corrigimos certas mecânicas para maior clareza. A chave para o nosso trabalho foi garantir que a mecânica do jogo permanecesse completamente compatível com a ampla gama de suplementos, cenários e campanhas de Call of Cthulhu lançados ao longo de mais de 35 anos.

Novas regras de perseguição permitem que os jogadores criem cenas tensas e emocionantes como a do conto de Lovecraft "The Shadow Over Innsmouth". A nova mecânica de Push (não sei qual será a tradução usada) oferece uma opção para que os jogadores superem as falhas em seus testes de habilidades, ao custo de aumentar a tensão e, potencialmente, os problemas ocasionados pelo seu fracasso. As regras de combate também foram simplificadas, com a inclusão de opções que permitem manobras fáceis de usar, enquanto novas orientações são dadas para interpretar os efeitos da insanidade nos personagem - com regras que prevem Alucinações e Crise de Insanidade. Ao longo do Livro de Regras, existem vários exemplos de "como proceder", além de sugestões tornando esta nova edição ideal para os recém-chegados aos RPGs, bem como aos jogadores experientes.

Os principais desafios foram assegurar a compatibilidade com as versões anteriores e seus suplementos, e também garantir que o RPG continuasse o mesmo em termos de experiência de jogo. A maior realização foi alcançar esses dois desafios. O feedback dos jogadores tem sido sonoramente positivo, eles afirmam que seu jogo favorito foi bem tratado e parece estar melhor que nunca. Todos adoram a nova mecânica de "Push" e acham que a opção de "Gastar pontos de Sorte" funciona muito bem.

Além disso, as pessoas adoram a nova aparência do livro - totalmente colorido e com uma arte lindíssima - o livro jamais pareceu tão bonito. 




3 - Nós temos agora a sétima edição de Chamado de Cthulhu. O que muda em relação às edições anteriores? Quais são as novas características e atrativos dessa edição? 

Todas as mudanças adicionadas ao livro estão lá por uma razão - para garantir que o jogo flua melhor. Ao mesmo tempo, tentamos manter o foco na história - o que, para Chamado de Cthulhu, representa a essência do jogo.

As características dos personagens são multiplicadas e transformadas em porcentagens que permitem visualizar os testes mais facilmente. Transformar esses números em porcentagens, fazia sentido, portanto, todas as características e habilidades na ficha do jogador são expressas dessa maneira - em porcentagens.

Nós adicionamos níveis de sucesso, portanto, o Guardião pode categorizar a dificuldade dos testes exigidos em graduações Comuns, Difíceis ou Extremas, o que equivale a chances de porcentagem total, metade do valor total ou um quinto do valor total. Nós também sentimos que a Tabela de Resistência era desnecessária, então a substituímos por testes em oposição e diferentes níveis de sucesso, o que torna o jogo mais rápido e fácil de jogar, além de oferecer ao Guardião mais ferramentas.

Um dos problemas nas regras antigas eram as cenas em que "todos envolvidos num combate erravam constantemente" - e onde, rodada após rodada, nada acontecia. A mudança para rolamentos de combate opostos torna o combate mais realista, com algo acontecendo toda rodada. Introduzimos uma regra - as Manobras de Combate - para que outras ações sejam realizadas durante o combate (não apenas tentar atingir coisas) - ela permite que os jogadores busquem estabelecer uma vantagem ou colocar seu oponente em desvantagem, o que substitui as antigas e confusas regras de agarrar. 

Perseguições acontecem frequentemente nas histórias de Lovecraft, mais até do que o combate, então queríamos ter um bom conjunto de regras de fuga - basta pensar na cena de perseguição de Shadow Over Innsmouth. É muito mais provável que um personagem de uma história de Lovecraft tente escapar ao invés de lutar. Então, agora temos regras para perseguições a pé e de carro.

Já mencionei a Regra de Push - ela permite uma segunda tentativa de rolamento de habilidades se o investigador puder justificar um segundo teste e se ele estiver disposto a assumir um risco adicional para atingir seu objetivo. Se o teste falhar uma segunda vez, as conseqüências podem ser piores do que apenas fracassar em um teste normal. Isso não só ajuda a fluir melhor o jogo, mas também cria tensão e horror, e se encaixa muito bem na proposta do jogo.

Eu tive o prazer de conhecer o Mike na GenCon 2013 em Indianápolis.

4 - Na sua opinião, qual o diferencial de Chamado de Cthulhu? O que atrai tantos fãs? 

O jogo é sobre contar histórias e envolver os jogadores em mistérios.

Todos adoram um bom mistério e Chamado de Cthulhu é ótimo para oferecer esse tipo de experiência. Não é um jogo sobre heróis fantásticos cujo objetivo é conseguir tesouros e se tornar mais e mais poderosos - é um jogo sobre pessoas normais envolvidas em eventos dramáticos e desafios, isso o torna mais acessível.

Além disso, funciona de maneira oposta à maioria dos jogos de RPG - ao invés de acumular poder e tornar-se mais fortes com o tempo, os investigadores vão perdendo poder, e a morte ou a loucura são as recompensas mais prováveis para suas ações. Ainda assim, o jogo é essencialmente heróico, já que nele, pessoas comuns alcançam grandes façanhas, mediante grandes sacrifícios. Isso dá mais significado e concede uma recompensa maior do que explorar uma masmorra ou coletar moedas de ouro, o que, depois de um tempo, se torna um pouco repetitivo.

Chamado de Cthulhu é um ótimo jogo para introduzir o RPG para novos jogadores. A ambientação é fácil de se compreender (trata-se do mundo moderno ou da década de 1920) e todos sabem o que é um bibliotecário, o que faz um detetive particular ou como age um professor. É muito acessível! Além disso, é um excelente "limpador de paladar", que funciona bem para aventuras one-shot, mas que também oferece campanhas imersivas e profundas.

5 - Qual o seu conselho para aqueles que ainda vão conhecer o jogo e explorar pela primeira vez o Universo do Mythos de Cthulhu? 

Leia tudo que puder a respeito dos gêneros Weird e Ficção de Horror, estas histórias servirão como inspiração para seus jogos. Jogue os cenários introdutórios contidos no Livro do Guardião e no Escudo do Jogador (ele se refere às aventuras Missed Dues e Blackwater Creek - ambas Metas Extras do Financiamento), considere ainda os cenários do suplemento Doors to Darkness (também uma meta do Financiamento), que foram escritos tendo novos jogadores em mente.

À medida que você se tornar mais confiante e experiente com o jogo, há excelentes campanhas e suplementos para aproveitar. Em breve, você também estará escrevendo e projetando seus próprios cenários para seus amigos!

6 - Atualmente existem vários jogos e ambientações com a temática Lovecraftiana, alguns deles inclusive estão presentes no Brasil. Por que vale a pena adquirir Chamado de Cthulhu? 


Chamado de Cthulhu foi o primeiro jogo lovecraftiano e é considerado por muitos o melhor RPG de mistério e horror. É também um dos jogos mais antigo ainda publicados, tendo portanto muitos suplementos, cenários e campanhas disponíveis. É um jogo tão popular que existe uma imensa comunidade na internet onde suporte, idéias e conselhos podem ser encontrados facilmente. Existem vídeos com aventuras, podcasts e todo tipo de ajuda à disposição.

Também é um cenário muio completo - as regras vem sendo testadas e refinadas há mais de 35 anos, e a nova edição leva isso em consideração - nela o Guardião poderá executar quase qualquer estilo de jogo que desejar - do horror sombrio e aterrorizante, até a ação pulp e aventuresca.


Além disso, você pode jogar em qualquer ambientação que lhe atrair - 1920, a Idade Moderna, a Idade das Trevas, o Período Romano, a Era Vitoriana, o Oeste Selvagem, e assim por diante. As regras são fáceis de aprender e usar. O jogo, além disso, é famoso por produzir algumas das melhores experiências de RPG.

7 - Cthulhu está entre nós há tanto tempo e nesse período muita coisa foi publicada, mas o que você ainda gostaria de ver na ambientação?

Nós temos muitos livros novos em desenvolvimento e estamos adaptando alguns livros clássicos também. Nós temos uma versão de Masks of Nyarlathotep (talvez  a campanha mais famosa de Chamado de Cthulhu) sendo revisada e pronta para sair ano que vem, e acabamos de completar um livro a respeito do Velho Oeste (o suplemento Down Darker Trails que traz regras para enfrentar os Mythos na froteira selvagem).

Em breve traremos novas edições de Dreamlands (uma ambientação que se refere a mística Terra dos Sonhos de H.P. Lovecraft) e Gaslight (que se passa na Era Victoriana, em geral na Capital do Império Britânico, Londres), temos ainda planos para uma nova campanha de Pulp Cthulhu (ambientação voltada para aventura e ação vertiginosa no estilo Indiana Jones).

Existem muitos ótimos livros apenas aguardando serem escritos. Eu preciso arranjar tempo para começar a trabalhar com uma série se passando na Região Lovecraftiana - Arkham, Dunwich, Innsmouth - isso permitirá construir uma nova e épica campanha centrada na Universidade Miskatonic.

A seguir traremos uma entrevista com Paul Fricker, co-autor da sétima edição.

domingo, 24 de dezembro de 2017

OS ANTIGOS DESPERTAM - Início do Financiamento de Chamado de Cthulhu


A coisa mais misericordiosa do mundo, acredito, é a incapacidade da mente humana de correlacionar todo o seu conteúdo. Vivemos em uma ilha tranquila de ignorância em meio aos mares escuros do infinito, e não nos foi destinado que devêssemos viajar muito longe. As ciências, cada uma desenvolvendo-se em sua própria direção, nos prejudicaram pouco até então; mas algum dia a reunião do conhecimento dissociado abrirá visões tão aterrorizantes da realidade, e de nossa terrível posição dentro dela, que ou iremos ficar loucos com a revelação ou fugiremos da luz para a paz e a segurança de uma nova era das trevas.

– H.P. Lovecraft, O Chamado de Cthulhu

E as notícias não param!!!!!

Investigadores e Cultistas,

O FINANCIAMENTO DE CHAMADO DE CTHULHU através da New Order está oficialmente aberto!

Já está no ar na página do Catarse - que pode ser acessada pelo link abaixo, o Financiamento de um dos maiores RPG de todos os tempos, e possivelmente o maior RPG de horror já publicado está ativo.

Corre lá!!!!

https://www.catarse.me/chamado_de_cthulhu

O Destino conspirou para que a véspera de Natal fosse a data escolhida para que R'Lyeh rompesse a superfície e para que o Grande Cthulhu despertasse de seu sono milenar. E ele chegou fazendo barulho, trazendo o apocalipse na forma de Loucura, destruição e esquecimento!

Essa é sua chance de trazer para o Brasil Chamado de Cthulhu em sua sétima e mais recente edição.

Um livro magnífico: capa dura, totalmente colorido, arte de primeira e com tudo o que você precisa para criar mistérios, lançar investigadores em missões perigosas e literalmente fazer com que o Caos e a Insanidade visitem a sua mesa de jogo.

Pessoal, eu sei que sou suspeito para falar. Esse é afinal o meu jogo favorito e é um sonho presenciar a Sétima edição chegando ao Brasil.

Esse é O Sistema de RPG se você pretende narrar aventuras de Horror. Chamado de Cthulhu é um dos sistemas mais conhecidos e jogados no mundo, contando com uma verdadeira legião de fãs e seguidores em todos os cantos.

Baseado na Imortal obra de H.P. Lovecraft, um dos mais conhecidos e elogiados autores de Horror do século XX, ele pode servir como acesso para novos jogadores e como uma novidade para veteranos em busca de um jogo simples, rápido e empolgante!

Mas estou falando demais!!!

Nas próximas semanas teremos muito o que falar desse jogo!

Por enquanto, prepare-se, pois Cthulhu está à caminho!

Você vai responder ao chamado?


Revista NEW ORDER WARRIORS (NOW) - Financiamento da Revista e Edição Gratuita dedicada a Chamado de Cthulhu


E o destino conspirou para que tudo acontecesse na véspera do Natal.

É com enorme satisfação que o Mundo Tentacular tem a honra de trazer a notícia do lançamento da Revista New Order Warriors #3 (NOW) e do início de seu Financiamento Coletivo.

Essa terceira edição será inteiramente dedicada ao Chamado de Cthulhu sétima edição, sistema que está desembarcando no Brasil através de Financiamento Coletivo pela Editora New Order. Aliás fiquem atentos, esse Natal reserva várias surpresas!

Ao longo das páginas da NOW #3, o leitor encontrará várias informações profanas e uma infinidade de material blasfemo dedicado ao Chamado de Cthulhu.

E não é só isso, essa edição serve de mostra para o que está por vir!

A NOW será uma revista digital mensal, com material exclusivo dedicado ao vasto catálogo de jogos publicados pela Editora NEW ORDER.

Mensalmente o assinante terá acesso a material de primeira grandeza: aventuras exclusivas, artigos, material pronto para ser usado na sua mesa de jogo, contos, novidades, dicas e muito mais. Para os fãs de Numenera, 13a Era, The Strange, Lenda dos Cinco Anéis, 7o Mar, Belregard, Ygdrasil, Dungeon Crawl Classic, KURO, Shadowrun e é claro, Chamado de Cthulhu, a revista será um complemento essencial. 

A revista sairá em formato digital, PDF e o assinante receberá uma edição sempre na última semana de cada mês. Cada edição terá entre 48 e 62 páginas.

O Financiamento Coletivo da NOW já está aberto e pode ser acessado através desse link que leva ao Catarse. Lá você também poderá baixar as três primeiras edições gratuitamente.


Baixando as edições poderá conhecer a proposta e ter uma ideia geral do que você encontrará mensalmente se decidir se tornar assinante.

Vão lá e vejam por conta própria!

E para quem está ansioso aqui vai um aviso!

AS NOVIDADES NÃO PARAM POR AQUI!!!!

Fiquem conosco!!!!!

Esse vai ser um Natal Tentaculoso!

sexta-feira, 22 de dezembro de 2017

Novo X Clichê X Clássico - Lidando com o fator "Eu já sabia" em cenários de Horror


"A noite está escura e chuvosa. Enquanto vocês seguem pela estrada deserta cortando a floresta, é impossível afastar uma sensação inquietante. Todo momento, vocês sentem como se estivessem sendo observados e alguma coisa espreita na escuridão. As árvores lançam sombras escuras e seus galhos parecem braços compridos agarrando os céus. Raios iluminam o firmamento e o som de trovões pode ser ouvido à distância. De repente: Um grito gélido de horror irrompe na noite, ele vem da velha casa abandonada no alto da colina..."

Ok, a cena descrita é bacana, mas sejamos francos, ela faz parte de 90% das estórias de horror. Trata-se de um clássico. Infelizmente ela também acaba sendo um enorme clichê.

O Horror faz parte de um gênero, e todos os elementos que constituem um gênero são bem definidos.

Histórias de terror possuem elementos comuns que emergem em quase todas as estórias: escuridão, sangue, lua cheia, gente suspeita agindo de maneira suspeita, vilões cruéis, segredos de família, tempestades, gritos na madrugada, gatos pretos, monstros espreitando, sensação de estar sendo observado...

É fato que certas situações consideradas clássicas no gênero horror acabaram se tornando incrivelmente previsíveis. E quando o clichê invade as fronteiras do horror, a sensação de inquietação, de dúvida e medo acabam se diluindo. Com efeito, a carga dramática e o choque, perde o efeito desejado.

Aqueles que assistem a cena (ou no caso de jogos de RPG) ouvem a narrativa sabendo previamente o que está prestes a acontecer. E quando a "surpresa" deveria ocorrer, eles poderiam até levantar aquela irritante plaquinha dizendo: "Eu já sabia!"

Infelizmente acabamos condicionados pela repetição exaustiva de certos elementos, quase dogmas do gênero horror:

Casas velhas e isoladas? Pode ter certeza que o lugar é assombrado;
Criança sinistra carregando uma boneca? Sem dúvida a boneca foi possuída por um espírito maligno e controla a criança;
Milionário desejando um livro proibido? O sujeito é um cultista ambicioso almejando a imortalidade e assim que tiver o livro vai tentar se livrar dos infelizes que suaram para conseguir o tomo.
O esgoto da cidade se estende por milhas e milhas? Pode crer que ele serve de covil para uma criatura assustadora. 

Como lidar com isso? Como separar elementos clássicos do horror, preservando a atmosfera sem cair na mesmice? Como evitar que os jogadores em sua mesa de jogo digam: "Eu sabia que isso ia acontecer".

Bem aqui estão algumas idéias que talvez possam ajudar:

1 - Ouse quebrar as velhas convenções


Uma das piores coisas em uma narrativa de horror é a previsibilidade.

Alguém abre a porta de um armário e um gato preto salta do nada para dar um "susto". Ora, podemos fazer melhor do que isso.

Alfred Hitchcock, um dos mestres do suspense, dizia que tudo que ele precisava para criar mistério era de uma porta fechada. O que está ali atrás? O que nos aguarda no final da jornada? O que vamos fazer ao chegar lá? Será que alguém está escondido ali? Fatores aleatórios geram inquietação e incerteza.

É como rolar um dado, você nunca sabe que número vai aparecer. Trazer esse elemento imprevisível para sua mesa de jogo é essencial para anular as certezas e criar receio nos jogadores.

Tome o seguinte exemplo: casas mal assombradas são sempre horríveis construções escuras, empoeiradas e assustadoras. Que tal construir uma casa assombrada que seja clara, limpa e convidativa passando uma aura de segurança e tranquilidade. Faça com que o ambiente pareça perfeitamente seguro e então quando o grupo estiver confortavelmente instalado, tranque portas e janelas, deixe o sangue escorrer pelas paredes, atice as lareiras e os faça gritar.

Outro exemplo? Monstros clássicos. Todos sabem as velhas receitas para derrotar as criaturas clássicas do horror. Para matar um lobisomem tudo que se precisa são balas de prata. Para derrotar um vampiro uma estaca no peito. O monstro de Frankenstein tem medo de fogo. A bala atravessando o cérebro é mortal para o zumbi.

Nade contra a corrente das velhas convenções. Que tal poupar os vampiros de queimarem durante o dia e considerar que eles meramente ficam menos poderosos na luz do sol? Ao invés de descrever um zumbi como um morto-vivo lento e desajeitado, por que não fazer dele um corredor implacável? Crie múmias que não sejam egípcias e que não durmam em sarcófagos. Faça um licantropo se transformar em pantera ao invés de lobo. O sinistro Barão que vive no castelo é apenas excêntrico mas inofensivo, já o sacerdote da vila um verdadeiro anjo de candura é secretamente um demônio disfarçado. Libere fantasmas e aparições para surgir no meio do dia quando menos se espera.

O clichê lovecraftiano também pode (e deve) ser quebrado. Nem todo cultista é um degenerado desvairado que não tem nada à perder. Alguns ghouls são mais do que monstros canibais famintos que vivem em cemitérios. Um grupo de cultistas pode ter sido enganado para acreditar que o retorno de uma entidade cósmica é algo desejável e que vai trazer uma nova era para a humanidade. Nem todo feiticeiro precisa ser um sádico antiquado que adora torturar seus prisioneiros no porão de sua mansão. Alguns podem ser bem carismáticos, conhecer tecnologia e usá-la a seu favor.

Antigamente nos filmes de cowboys em preto e branco, para facilitar o reconhecimento dos personagens os heróis sempre usavam chapéu branco e os vilões chapéu preto. Na vida real isso não acontece, porque deveria em sua mesa de jogo?


2 - Subverta o Conhecido


O terror sofre com um apego muito grande aos elementos clássicos.

Todos amamos os clássicos, mas precisamos admitir que em algum momento eles se tornaram batidos e acabam caindo na mesmice.

Personagens como os vampiros, lobisomens e zumbis já foram explorados quase à exaustão. Por vezes, surgem algumas inovações que subvertem um aspecto dos personagens (nem sempre para melhor, vide vampiros que brilham na luz do sol, ARGH!) mas em geral o contexto admite poucas variações.

Que tal pesquisar um pouco e encontrar por conta própria aspectos que possam diferenciar esses personagens clássicos. O mito dos vampiro é bastante abrangente, tome por exemplo o Vuvolach ou o Vrycolaka, eles continuam sendo vampiros, mas tem uma proposta diferente e à primeira vista nem todos os jogadores vão conseguir reconhecê-los como tal. Quer fantasmas bizarros? Pesquise o folclore da Tailândia e você vai se surpreender. Que tal fazer os personagens deixarem as cidades clássicas do horror Londres, Nova York e Arkham, e lançá-los em Berlim, Roma ou Rio de Janeiro.

É claro, o mesmo vale para o Mythos. Um dos grandes "problemas" de ambientações lovecraftianas é que elas são muito interessantes e não vai demorar para que seus jogadores abram os livros e descubram o que as criaturas fazem ou deixam de fazer. O primeiro sinal é quando os jogadores no decorrer de uma investigação começam a conjecturar o que está causando o mistério, citando os nomes de várias criaturas e entidades. Mesmo que isso esteja acontecendo em OFF, já é um indício de que o Guardião precisa se adaptar e oferecer algo diferente.

Se o grupo conhece o suficiente de um monstro para saber seus pontos fracos, está na hora desse monstro passar por um Extreme Makeover.

Jogadores tarimbados sabem por exemplo que os Vampiros Estelares são monstros invisíveis e que se alimentam de sangue humano e quando o fazem aparecem por alguns instantes. Sabendo disso, eles podem concluir que o culpado pelas mortes em uma abadia é uma dessas criaturas a partir dos cadáveres exangues encontrados na cena do crime. Para preparar uma armadilha, basta deixar uma ovelha ou cordeiro amarrados e aguardar o ataque. 

Mas e se o Vampiro Estelar não quiser se alimentar de sangue? E se a substância necessária para sua sobrevivência for líquido espinhal? E se ao invés de invisível ele for etéreo? Ao invés de silencioso ele produz um ruído de zumbido? E se ao invés de vir do espaço ele tiver vindo de uma dimensão paralela em decorrência de um rasgo na realidade? Comece a perguntar uma série de "E se?" e quando você menos perceber, o monstro terá se tornado algo diferente.

Uma criatura que eu raramente uso atualmente é a Cor que caiu do Espaço. Não por ser um adversário sem graça (muito pelo contrário!), mas porque ela já foi usada adnauseum e todos que leram o conto de mesmo nome saberão detalhes antes mesmo dela aparecer. No entanto, se você considerar que ela não é uma cor mas uma onda sonora, que ela não gera radiação e sim eletricidade estática e que ela não drena a vida num ambiente, mas simplesmente pulveriza ossos com ondas sonoras, então o grupo ficará se perguntando "o que diabos é essa coisa"?  

Com efeito, ao invés de usar uma colônia de Abissais em Innsmouth, que tal subverter as coisas e criar uma raça de humanos com traços de escorpião vivendo no meio do Deserto de Mojave?  Ao invés de usar Dunwich como palco para uma aventura envolvendo bruxas, instale o cabal de feiticeiras em plena Miami. No lugar de Cthulhu como um grande cefalópode que tal supor que ele pode se manifestar como uma gigantesca baleia? Todos sabemos que os ghouls são monstros canibais repulsivos que vivem em esgotos e porões. Mas e se por acaso um determinado grupo tiver desenvolvido uma maneira de preservar uma aparência jovem e atraente através de rituais? E se eles escolherem viver em plena Hollywood? 

3 - Explore as certezas e as transforme em dúvidas


Uma das formas mais interessantes de tirar os jogadores de sua zona de conforto é confrontar as suas certezas e convicções. 

O conhecimento de um determinado Clichê permite que os jogadores se tornem mais confiantes e pensem que tudo está sob controle. Eles acham que tem uma vantagem, um trunfo, o tal ás na manga que pode ser sacado à qualquer momento. Esse é outro fator que envenena os cenários de terror.

Uma história de Horror envolve algo SOBREnatural, ou seja, algo que se sobrepõe ao natural, ao convencional, ao conhecido e aceito. Se o grupo tiver CERTEZA de alguma coisa em uma aventura nesse estilo, está na hora de subverter as coisas e puxar o tapete sob os pés deles.

Digamos que o grupo encontra um pergaminho mágico e acredita que nele está o ritual para aprisionar um demônio assassino, deixe-os acreditar nisso. Sim, o ritual manda o demônio de volta para o Inferno, mas arrasta todos que estão em volta com ele para dentro da passagem. Outra opção válida? No último momento o grupo descobre que para ativar o ritual é necessário um sacrifício humano. Quem será o voluntário? 

Armadilhas e reviravoltas também são muitíssimo bem vindas em cenário de horror. Vamos assumir que o grupo tem um contato na polícia, alguém que já ajudou em várias investigações e participou de outras aventuras como um recurso valioso. Esse NPC é um sujeito de confiança, alguém acima do bem e do mal, alguém que o grupo adora chamar de amigo. MAS, o que dizer quando sua amada esposa está à beira da morte? E o cara aceita fazer uma barganha com um cultista que promete salvar sua mulher, se ele aceitar informar os passos dos investigadores e armar para eles uma armadilha mortal.

Mais um exemplo? Os investigadores conseguem uma poção mística que permite a eles restaurar sua saúde. O grupo tem certeza de que aquilo pode salvar vidas. Mas e se a poção embora restaure a saúde cause também um efeito colateral desconhecido? Quem sabe o indivíduo desenvolva necessidades peculiares ou quem sabe a ingestão da substância ocasione uma mudança física ou psicológica acentuada.

O ideal é que a Certeza seja gradualmente pulverizada e transformada em dúvida. Se em um dado momento os jogadores olharem para você - Narrador, e disserem estarrecidos: "O que está acontecendo? Por que não está funcionando como o previsto?", você está no caminho certo.

4 - Semeie a paranoia


Nada deixa os jogadores mais nervosos do que uma situação como essa:

"Os investigadores conseguem com muito esforço eliminar uma criatura medonha cheia de tentáculos que habitava o porão da mansão abandonada. Os tentáculos ainda se debatem, mas a coisa parou de emitir aquele guincho infernal e estalar as mandíbulas cheias de dentes afiados.

"Até que enfim, morreu!" diz um dos jogadores em um misto de alívio ao consultar a ficha onde diz que ele só tem 4 pontos de vida restantes.

O mestre lança um sorriso malvado: "Tem certeza?". E ele rola alguns dados atrás do escudo sem explicar o motivo ou explicar o que está tramando".

Paranoia é algo muito bem vindo nas narrativas de horror. A incerteza a respeito de um plano, a dúvida sobre a eficiência de uma arma, a suspeita de que um monstro escapou, a sensação de que o horror não foi extirpado permanentemente... e se tudo isso voltar?

A paranoia torna o simples ato de atravessar uma rua uma jornada. As infinitas possibilidades do que pode acontecer entre o ponto A e o ponto B, fazem com que os investigadores comecem a se perguntar, será que realmente devemos fazer isso? Será que não há outra maneira? Será que não seria perigoso demais? Será que devemos agir assim ou enxergar de outro ângulo?

Uma situação de paranoia funciona muito bem com novos aliados, sobretudo aquele NPC que se une ao grupo para uma missão e sobre o qual ninguém sabe nada. Como confiar em um sujeito desses? Será que ele não é um traidor? Será que ele não planeja nos vender ao inimigo?

A paranoia também funciona lindamente para colocar em xeque a confiança entre os jogadores, o que pode descambar para conflitos interessantes (e potencialmente letais). Aqui estão alguns truques que ajudam a plantar a paranoia dentro de um grupo de jogadores:

- Chame um jogador no canto e fale algo em segredo, não precisa ser nada necessariamente importante para a trama, mas é o bastante para fazer com que os demais jogadores se perguntem porque ele sabe de algo e não quer compartilhar.


- Passe para outro jogador uma informação por baixo da mesa escrita em um pedaço de papel. Diga a ele que apenas ele sabe aquilo.

- Peça para um jogador testar uma habilidade e não explique a razão, deixe que os demais ponderem sobre o que está acontecendo. Chame o jogador no canto e fale uma bobagem qualquer, alimente a curiosidade dos demais através de rolamentos falsos.


- Faça com que um dos jogadores experimente sonhos/pesadelos que funcionam como premonição para o que vai acontecer na trama. Chame o jogador no canto e diga que ele sonhou com um de seus companheiros cometendo um ato de traição, o matando ou fazendo alguma coisa muito errada.

- Um dos personagens acorda no meio da madrugada e descobre que um de seus aliados não está presente. Para onde ele foi? Faça um deles falar durante o sono, dizendo coisas estranhas e desconexas. Da mesma maneira, durante uma viagem, faça com que eles se perguntem porque o personagem de fulano está sempre atrás?

-  Durante um combate, faça um monstro avançar contra um dos jogadores e no último momento mudar seu alvo e escolher um colega. Não explique porque isso aconteceu, deixe que eles imaginem um motivo. Na primeira vez que fizer isso vai parecer estranho, na segunda vai levantar suspeitas, na terceira, pode ter certeza, o grupo vai começar a se acusar mutuamente.

5 - Mantenha a sensação do clássico, mas tente inovar


Dito tudo isso, fica a questão: "Então o interessante, como mestre em cenários de horror é me afastar dos clássicos?"

Não necessariamente.

Os clássicos tem uma excelente razão para serem chamados assim. Clássicos criam uma identificação imediata com o jogo, fazem com que os jogadores comprem a ideia e "entrem no espírito" da ambientação mais facilmente. Ninguém precisa de muitas dicas para interpretar um caçador de bruxas numa aventura onde o inimigo central serão feiticeiros, demônios e cultuadores das trevas. Todos já viram filmes ou leram romances suficiente para saber como se comportar. O mesmo acontece em uma campanha de Apocalipse Zumbi. Nela os jogadores saberão como interpretar seus sobreviventes quase que por intuição, adotando maneirismos e comportamento de chapinhados de filmes, romances, séries, etc...

Clássicos também são bem vindos quando a campanha/sessão do mestre se propõe a ser um tipo de homenagem. 

Um mestre adotando o estilo lovecraftiano clássico descreve as cenas minuciosamente, faz comparações, busca nos sentidos físicos (sobretudo visão, olfato e audição) e recorre a cenas de alto impacto, repletas de morte e loucura para conjurar os acontecimentos. Funciona muito bem e não tem nada de errado descrever uma cena nos moldes do parágrafo no alto desse artigo. Com certeza, a maioria dos jogadores vai adorar.

Contudo, em alguns momentos vale a pena deixar a tão falada zona de conforto e ousar em nome da criatividade. Eu sempre gostei dos clássicos e quem já jogou comigo sabe que eu sou fã de carteirinha de casas lúgubres, mortos vivos vagando em noites de lua cheia, cenas sanguinolentas tiradas de filme e outras referências que remetem aos clássicos. Mas faz sentido, por vezes, arriscar em nome do frescor e novidade. Autores como King e Barker sempre se disseram fãs de Lovecraft, mas é inegável que eles ousaram criar um ambiente diverso para suas histórias. Mesmo Lovecraft que tanto admirava Poe, fugia ao estilo consagrado deste.

O ideal, na minha opinião, é usar os clássicos, mas jamais ao ponto de tornar toda sua narrativa referencial. Sempre que possível vale inserir alguma coisa que foge ao lugar comum, evitando repetir fórmulas.

Se você conseguir atingir esse equilíbrio entre Clássico, Novidade e Clichê, pode ter certeza, suas aventuras serão incríveis! 

quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

Consumido pelas Chamas - Caso de Combustão Humana Espontânea em Londres



17/12/2017

Era uma manhã como qualquer outro em Orchard Place uma pacífica vizinhança no Norte de Londres.

Pessoas passeavam calmamente, pais levavam suas crianças para a escola, trabalhadores seguiam para seus empregos e automóveis trafegavam. De repente, a tranquilidade foi quebrada por gritos e reações de surpresa das pessoas. Um homem passa correndo em desespero, seu corpo envolvido por chamas está sendo consumido por uma labareda feroz de cor alaranjada. O cheiro de carne e cabelos queimados se espalha pela rua. Algumas pessoas fogem, enquanto outras tentam prestar ajuda batendo no corpo dele com casacos. Mas as chamas não se apagam, pelo contrário, elas parecem cada vez mais intensas, como se o homem estivesse coberto de gasolina.

Ele então para de se mover e cai no chão. As pessoas ao redor se perguntam o que teria acontecido: Seria ele um terrorista? Alguém que estava protestando e decidiu cometer suicídio imolando a si mesmo? Ou a vítima de um horrível assassinato?

Ninguém sabe! 


O homem de 70 anos foi identificado como John Nolan um ex-operário de construção nascido na Irlanda e que morava na vizinhança desde os anos 60. Nolan era bastante conhecido na região, costumava passar diariamente pela rua onde tudo transcorreu. As pessoas que tentaram prestar os primeiros socorros disseram que ele parecia confuso e aterrorizado, como se não entendesse o que havia acabado de acontecer. Ele não foi capaz de dizer nada; quando o incêndio enfim foi apagado, o homem já havia perdido a consciência.

Uma ambulância foi chamada imediatamente e Nolan recebeu os primeiros socorros à caminho do Hospital de Broomfield. Infelizmente ele morreu no dia seguinte. Sessenta e cinco por cento de seu corpo apresentava queimaduras severas de terceiro grau.

Especialistas da Brigada de Incêndio de Londres chamados para examinar a cena foram incapazes de explicar o que teria acontecido com Nolan. Eles não encontraram qualquer sinal de combustível ou componente químico capaz de causar o incêndio que consumiu o sujeito. 


Nenhuma propriedade foi danificada e mais ninguém foi ferido pelo fogo. Ao que tudo indica, Nolan foi a única vítima, a despeito do fato de outros terem se aproximado para debelar as chamas.

Detetives estão apelando para testemunhas para que estas se apresentem para tentar explicar como o incêndio começou. Ninguém até o momento foi capaz de dizer como tudo teve início e sob quais circunstâncias. 

Testemunhas foram unânimes em afirmar que tudo aconteceu muito rápido: "Em um instante, tudo estava normal e no seguinte o inferno começou", contou Doroth Keenan que se apresentou para prestar depoimento. "Foi algo muito estranho, ouvi os gritos e vi o homem correndo, agitando os braços. Ele estava desesperado e tentava apagar as chamas! Nunca vou esquecer isso!", completou.

Lloyd Perkins, um motorista de ônibus foi um dos primeiros a socorrer a vítima. Ele parou o veículo que estava conduzindo e desceu com um extintor de incêndio. "O calor era incrível! Eu me aproximei dele, mas o extintor não conseguia diminuir as chamas", relatou em seu testemunho oficial.


Outras pessoas também se apresentaram, sempre com a mesma história, mas ninguém foi capaz de explicar o que ocasionou a combustão.

O representante da Polícia Metropolitana Damien Ait-Amer, responsável pela investigação do caso disse: "Nós recebemos a ajuda de várias testemunhas que viram o Sr. Nolan em chamas, mas ninguém foi capaz de estabelecer o momento em que tudo começou". O detetive salientou que a polícia ainda não tem uma explicação satisfatória para o ocorrido e até o momento não pode oferecer qualquer solução para o incidente. "Não estamos tratando o que houve como um crime, não parece haver nenhum indício de que o fogo tenha sido causado por terceiros". 

As câmeras de vigilância da rua infelizmente não são capazes de captar o momento em que as chamas se iniciam. Nolan é visto em uma das filmagens, mas quando ele sai momentaneamente do ângulo da filmagem, ressurge já pegando fogo. É importante salientar que as imagens não mostram mais ninguém próximo a ele. 

Os peritos também se mostraram surpresos com o fato de não ter sido encontrado qualquer resquício de combustível volátil ou componente químico capaz de provocar o incêndio. Em casos de imolação, quando uma pessoa ateia fogo em seu próprio corpo, há sinais claros do uso de algum catalizador, seja álcool ou gasolina; no caso de John Nolan nada foi descoberto.

A vítima não era casada, morava em uma casa com sua irmã Mary e três sobrinhos. Ele costumava passear pela área que conduz ao campo de treinamento do time de futebol Tottenhan Hotspurs. Segundo a irmã, Nolan havia acabado de tomar o café da manhã e estava se dirigindo para o local conforme havia avisado minutos antes. Ele parecia bem disposto e não manifestou qualquer sinal de que planejava cometer suicídio, ainda mais de maneira tão dramática.


O exame post-morten revelou que as queimaduras são consistentes com um fogo muito severo, capaz de derreter sua pele e provocar danos maciços, no entanto, meramente chamuscando roupas e calçados. A morte decorreu obviamente das queimaduras produzidas, Nolan ficou em choque durante todo o tempo em que esteve sob cuidados médicos e não foi capaz de fornecer qualquer explicação sobre o incidente que está sendo tratado até o momento como inexplicável.

Em face da ausência de uma explicação lógica, muitas pessoas estão assumindo que esse é um caso de Combustão Humana Espontânea, um fenômeno estudado à luz da parapsicologia.

Existem aproximadamente 200 casos documentados ao longo da história de vítimas que simplesmente foram consumidas por um incêndio repentino. Nesses casos, o foco do incêndio parece ter sido o próprio corpo do indivíduo que queima de dentro para fora rapidamente. A maioria dos casos envolve indivíduos de idade avançada, ou sob efeito de álcool, o que explica por que na maioria dos casos as pessoas não conseguem escapar das chamas ou apagá-las.
   
O caso mais recente ocorreu em 2015, quando testemunhas viram o corpo de uma mulher de 45 anos em Flensburg, na Alemanha se incendiar sem qualquer explicação. Miraculosamente ela conseguiu sobreviver uma vez que foi levada às pressas para um hospital onde recebeu socorro imediato. Memso assim, ela sofreu queimaduras graves.


Michael Faherty, um senhor de 76 anos de Galway, Irlanda não teve a mesma sorte. Em dezembro de 2010 ele se tornou a primeira pessoa após um período de 25 anos a ser vítima de combustão espontânea. Os restos foram examinados por legistas que não foram capazes de determinar como as chamas se iniciaram. Assim como no caso de John Nolan, não foi encontrado sinal de qualquer substância responsável pelo incêndio. A investigação oficial permanece aberta uma vez que os detetives não conseguiram provar ter havido um crime.

Nos anos 80, um homem de 73 anos, chamado Henry Thomas, morador do sul de Gales entrou em combustão espontânea em sua própria casa em Ebbw Vale. O fogo que o incendiou incinerou seu corpo, bem como o assento em que ele estava sentado. Entretanto, o tapete e o restante da casa permaneceram intactos. Apenas o crânio e uma pequena porção da perna abaixo, abaixo do joelho escaparam à fúria do incêndio.

 Os óculos estavam sobre o braço da poltrona e os chinelos que ele estava usando permaneceram no local entre os restos de seus pés. A cena não foi perturbada e Thomas estava sozinho em casa, tanto que a porta estava fechada pelo lado de dentro.

Outro caso curioso envolveu Mary Reeser, de St. Petersburg, Flórida. O caso ocorreu em 1951 e tudo que restou da mulher foi um crânio enegrecido e parte do pé. O locatário da casa derrubou a porta para tentar prestar socorro, quando ouviu gritos e pedidos de socorro, mas ele chegou tarde demais. O sofá onde ela estava foi apenas levemente queimado.

O caso mais antigo de combustão humana espontânea registrado ocorreu na Dinamarca em 1663 e foi descrito pelo médico anatomista Thomas Bartholin. Em seu registro ele afirma que uma mulher de Paris "pegou fogo espontaneamente e foi reduzida a cinzas e fumaça" enquanto dormia, ainda que o colchão e a coberta que ela usava não tenham sido danificados. Outros casos ocorridos no passado foram interpretados como manifestações sobrenaturais envolvendo chamas infernais, mau olhado e maldições. 


Cientistas tentam decifrar esse enigma há séculos, mas uma vez que os casos são tão raros e inesperados não há muitas chances de estudar o fenômeno. Uma das teorias mais populares é que o corpo produz uma centelha que acende o tecido adiposo provocando sua queima acelerada. O próprio corpo fornece o combustível para o incêndio na forma de gordura corporal. O fenômeno seria tão incomum em face de uma pre-disposição química raríssima de um pequeno número de pessoas. Uma vez que a maioria dos casos envolve habitantes do Reino Unido e Europa Ocidental, acredita-se que o gene causador possa estar presente apenas em indivíduos com um determinado perfil genético.

Enquanto os especialistas não encontra uma explicação, o caso continua sendo tratado como um mistério. E possivelmente, assim permanecerá...