domingo, 8 de julho de 2018

Demônio no Campanário - Os crimes e a maldição de Theo Durrant


Embora William Henry Theodore Durrant fosse chamado de Theo pelos seus amigos, o sujeito bem apessoado e simpático, que era ajudante da Escola dominical acabou ficando conhecido por um apelido bem menos agradável: "O Demônio do Campanário".

Theo Durrant trabalhava para a Igreja Batista Emmanuel na cidade de San Francisco. Era um sujeito de fala mansa, bem vestido e educado. Costumava parar tudo o que estava fazendo para dar atenção às senhoras que apareciam na porta da Igreja. Em mais de uma ocasião havia corrido para socorrer velhinhas que atravessavam a rua. Ele também ajudava a organizar doações para obras assistenciais e arrecadava o que podia em nome da caridade. As boas moças o viam como um bom partido, um sujeito sempre interessado em ajudar seu semelhante.

Em 13 de abril de 1895, membros da Igreja estavam preparando o serviço religioso que aconteceria no domingo de Páscoa quando alguém abriu um armário na biblioteca da Igreja. Um cheiro medonho escapou do interior e os paroquianos acharam que podia haver algum animal preso ali dentro. Não tinham nem ideia que acabavam de encontrar o cadáver mutilado de uma jovem mulher. Ela havia sido estrangulada até a morte e então esfaqueada repetidas vezes. Os ferimentos de faca eram tantos e tão profundos que à princípio não era possível sequer reconhecê-la. Os cortes se concentravam no rosto, no peito e nos genitais, feridas profundas que evidenciavam uma fúria animalesca. Os pulsos por fim haviam sido cortados - como uma maneira de garantir a sua morte. Os cortes haviam sido feitos com tanta violência que as mãos quase foram decepadas; pendiam por nervos e pedaços de pele lacerada.

Um pano, que pertencia a sua anágua havia sido colocado na sua boca. Em meio ao ataque feroz sofrido, ela acabou engolindo a peça e sufocou quando esta desceu pela sua garganta. Exames posteriores apontaram para uma horrível brutalidade usada para dominá-la: socos e provavelmente pontapés. Ela teria sido estuprada, mas dadas as condições de seus genitais, não havia como dizer ao certo.


Ao ver o corpo, duas mulheres desmaiaram e tiveram de ser ajudadas. O sangue acumulado no interior do pequeno compartimento escorreu em profusão, manchando o piso de madeira da biblioteca. Imediatamente a polícia foi chamada.

De início, os investigadores acreditaram que o corpo pertencia a Blanche Lamont, uma moça de 20 anos que estava sumida fazia dez dias, e que havia sido vista pela última vez na Igreja na companhia de um rapaz que trabalhava por lá, Theo Durrant. Entretanto, o corpo era de outra moça, Minnie Williams de 21 anos, também membro da congregação e antigo par romântico de Durrant. Dias antes de desaparecer, ela foi vista discutindo com o rapaz. Uma testemunha que teria assistido a discussão disse que estranhou a maneira como Durrant estava se comportando, normalmente um rapaz sempre simpático e solícito, ele estava claramente alterado: "Não parecia o cavalheiro que todos sabíamos que ele era", concluiu em retrospecto.

Depois da descoberta do cadáver de Minnie Williams, uma busca cuidadosa foi realizada na Igreja e finalmente o corpo de Blanche Lamont foi encontrado no alto da Torre do Campanário. 

Enquanto o corpo de Williams foi achado mutilado e vestido, Lamont estava completamente nua e aparentava até um ar de serenidade. As mãos haviam sido cuidadosamente posicionadas sobre o peito, como se ela estivesse apenas dormindo. Ela tinha sido estrangulada com as mãos e havia sinais claros de estupro.

Theo Durrant havia cortejado as duas moças recentemente, segundo alguns, ao mesmo tempo. Amigos contaram que ele havia pedido Minnie em namoro, mas que ela o dispensou. Aparentemente Minnie ficou assustada quando Theo se tornou muito audacioso e fez avanços de natureza sexual que a deixaram escandalizada. Poucos dias depois, ele conheceu Blanche e aparentemente esqueceu Minnie. Theo propôs casamento com Blanche poucas semanas depois deles começarem a namorar. Ela teria achado que ele estava brincando - Theo era conhecido por ter um senso de humor estranho. Blanche disse que não poderia aceitar o pedido e que achava melhor os dois se afastarem. Para amigas ela confidenciou que Theo agia de maneira estranha que a deixava pouco confortável. Em uma ocasião ele teria feito avanços pouco condizentes com o comportamento de um cavalheiro.

Logo que os corpos apareceram e a conexão com ele foi feita, Theo Durrant se tornou o principal suspeito dos assassinatos, e a polícia o procurou. O rapaz havia sumido e passou a ser procurado.

Poucos dias depois, uma tia de Blanche Lamont recebeu um pacote pelo correio contendo duas alianças. O pacote tinha o nome de George King, o diretor do coral da Igreja, que também havia cortejado a garota um ano antes. A polícia fez perguntas a respeito e King parecia confuso. As alianças foram levadas até casas de penhores, e um vendedor as reconheceu, a seguir reconheceu o desenho de Durrant como o homem que as comprou alguns dias antes. Theo estava tentando incriminar um inocente para escapar limpo.


Os cartazes com o rosto de Theo Durrant, já apelidado pelos jornais de "O Demônio do Campanário" começaram a ser espalhados pelo estado e pelas cidades vizinhas. Finalmente ele acabou sendo reconhecido e preso em uma pensão onde estava morando desde então.

O julgamento de Theo Durrant foi extraordinariamente rápido. Durante todo o processo ele jurou inocência e disse estar sendo vítima d eum tipo de conspiração absurda. Entretanto, as muitas testemunhas que surgiram alegando tê-lo visto na companhia das duas moças pouco antes de suas mortes e o acesso dele ao local onde elas foram encontradas ajudaram no veredito.

Além disso, durante o julgamento, jornalistas começaram a buscar informações sobre a vida pregressa do acusado. O que descobriram foi muito mais chocante do que eles poderiam imaginar.

Os jornais passaram a comparar Durrant com uma versão real do Dr. Jeckyl e Mr. Hyde, personagens do romance "O Médico e o Monstro". Descobriram que o ajudante da Igreja tinha um lado obscuro até então desconhecido e que ele era perfeitamente capaz de ocultar. 

"É como se ele fosse duas pessoas ao mesmo tempo", disse um promotor, depois de ler as matérias sensacionalistas nos principais jornais da época. Durante o dia, Theo era adorado por todos, um cidadão perfeito, educado e bem quisto. Para todos os efeitos ninguém imaginava que ele poderia ferir uma mosca. Mas quando assumia sua outra personalidade, ele se tornava um verdadeiro monstro, comparado pelos jornalistas a uma versão norte-americana de Jack, o Estripador.


Para começar, Theo Durrant era um frequentador assíduo de vários bordéis da Commercial Street, uma das áreas mais decadentes de San Francisco. A fotografia dele foi reconhecida por prostitutas, vagabundos e cafetões da área. Ele se identificava para essas pessoas sob nomes falsos e apelidos, inventava histórias e se dizia um estrangeiro, um marinheiro vindo da Inglaterra ou da França. Ele aprendeu a falar algumas frases e disfarçava um sotaque carregado. Muitas vezes também vestia roupas diferentes das que usava no trabalho, penteava os cabelos de maneira diferente e segundo alguns até usava um bigode falso.

O cuidado de Durrant para manter separadas as suas duas identidades beirava a paranoia. Ele tinha um pequeno quarto alugado sob um bordel e lá passava alguns finais de semana disfarçado, imerso em decadência, sexo e perversões.

Várias mulheres que o reconheceram contaram que Theo Durrant costumava usar alcunhas. Ele também tinha gostos... peculiares.

De acordo com algumas mulheres ele gostava de controle e violência. Costumava instruir as moças a gritar e implorar por socorro, gostava de amarrá-las e machucá-las. Dizia no entanto que estava apenas brincando e acabava pagando um pouco mais como desculpas por "perder a linha". Cera vez ele teria ido longe demais em suas "brincadeiras", amarrando uma moça e quebrando seu braço. Theo pediu desculpas e segundo o cafetão da prostituta enviou a ela flores e bombons como pedido de desculpas. Ele também pagou ao cafetão uma compensação.

Depois desse incidente, Theo ficou afastado por alguns meses do seu esconderijo. Mas isso não significa que ele encerrou a sua busca por prazeres violentos. Nesse período ele esteve ativo em Chinatown, o Bairro chinês de San Francisco, frequentando bordéis ainda mais decadentes, satisfazendo suas perversões com moças chinesas que não entendiam inglês e que estavam acostumadas com a brutalidade de sua clientela.


Muito se comentou a respeito dos desejos ainda mais estranhos do acusado em suas visitas ao lado mais obscuro de Chinatown. Algumas vezes ele ia até as vendas do bairro chinês onde comprava gaiolas com pombos brancos, galinhas e coelhos vivos. Segundo testemunhas, Durrant gostava de arrancar a cabeça dos animais com mordidas enquanto fazia sexo. A seguir apertava seus corpos deixando o sangue viscoso escorrer sobre seu corpo e o de suas parceiras. Em pelo menos uma ocasião ele chocou uma das jovens prostitutas chinesas despedaçando um pombo e arrancando seus órgãos internos em um frenesi de sangue e loucura. A seguir ele não apenas comeu o coração do animal, como obrigou a mulher aterrorizada a fazer o mesmo.

Na mesma época em que Durrant frequentou as ruas sórdidas de Chinatown várias moças chinesas que trabalhavam nos prostíbulos locais começaram a desaparecer. Por algum tempo cogitou-se que o sumiço delas estivesse ligado a Durrant, sobretudo depois da chocante descoberta dos restos de três  mulheres encontradas em um abatedouro de porcos nas proximidades. A polícia investigou o caso, mas uma vez que as vítimas eram anônimas e orientais, não houve muito interesse em descobrir o que havia acontecido. Além disso, uma investigação quebrava a ordem estabelecida entre policiais desonestos e as pessoas que conduziam o lucrativo negócio de exploração de mulheres. 

Nunca se soube quem foi o responsável pelas mortes daquelas três mulheres, suas identidades jamais foram descobertas. O assassino provavelmente usou o abatedouro para convenientemente descartar os corpos, dando-os para os porcos famintos que lá eram criados. Os animais consumiram quase tudo, deixando muito pouco para um reconhecimento.

Algumas pessoas acusaram Durrant a respeito desses crimes medonhos, mas uma vez que não havia provas contundentes, a promotoria achou melhor abandonar essa linha de ação. O caso principal já estava bem encaminhado no que dizia respeito ao duplo homicídio de Williams e Lamont.

Mas nem todas as pessoas estavam dispostas a acreditar naquelas histórias sórdidas de perversão e sadismo. Alguns dos amigos próximos e conhecidos de Theo Durrant iam diariamente a Corte de Justiça prestar a ele solidariedade. Em um momento que beirava o absurdo, um grupo de órfãos interrompeu o julgamento implorando para que as acusações fossem retiradas já que era impossível ele ser o culpado daqueles ator medonhos. De fato, mesmo quando a situação do acusado parecia pior, ele ainda inspirava simpatia: os jornais noticiaram que pelo menos três moças da congregação batista compareciam todos os dias ao julgamento, sendo que uma delas oferecia a Durrant um buquê de flores. Em algumas ocasiões ele usou um botão na lapela de seu terno. No último dia, antes de ser condenado, ele se aproximou da moça e se ajoelhando em pleno tribunal a pediu em casamento.

Apesar de tudo, as provas serviram para convencer o juri, que deliberou por apenas cinco minutos e decidiram pela pena de morte.


Em 7 de janeiro de 1898, Theodore Durrant foi levado até o pátio da prisão de San Quentin onde um patíbulo havia sido construído. Um pequeno grupo de convidados e a família de Durrant, sua mãe e pai inclusive, esperavam ali.

"Eu sou inocente", disse o condenado como últimas palavras, "Eu perdoo as pessoas que me condenaram, não vou deixar que o erro deles obscureça o bom nome da Califórnia". Em seguida, uma corda foi colocada em volta de seu pescoço e ele saltou no alçapão morrendo imediatamente.

A estranheza não pararia por aí. A mãe e pai de Durrant que juravam que o filho era inocente, quando testemunharam a execução tiveram reações emocionais bizarras. O pai começou a gargalhar e gritar que o filho estava com Deus e não podia mais ser atingido pelas leis falhas do homem. Enquanto isso, a mãe que ficara quieta o tempo todo, aparentemente em choque, quebrou seu transe quando ele foi removido da corda. Ela se atirou sobre o corpo sem vida beijando seu rosto e lábios d euma maneira que as testemunhas que viram a cena julgaram inapropriado.

Algumas pessoas afirmavam que a família tinha um comportamento estranho e que a loucura corria em suas veias.

Após a execução, os pais e amigos próximos receberam o corpo de Durrant e o levaram para casa. Eles tiveram dificuldades em encontrar um crematório que aceitasse reduzir à cinzas o corpo do homem considerado como um demônio. Demorou seis dias até que eles encontrassem uma funerária disposta a fazê-lo. Repórteres e curiosos se debruçavam para espiar pela janela da casa para observar a macabra família. Nesse meio tempo viram a mãe conversar com o cadáver como seele estivesse vivo. O pescoço quebrado em um ângulo bizarro...

Um crematório de Pasadena finalmente levou o corpo de Theodore, que já começava a se deteriorar. "O homem era extraordinariamente grande e forte" disse um funcionário do crematório, "ele levou um bom tempo até queimar por inteiro".


Acrescentando mais um detalhe sinistro à história, a Senhora Durrant supostamente levou a urna com as cinzas do filho até a Igreja Batista Emmanuel e pediu permissão para colocá-las no púlpito. Quando o sacerdote negou o pedido ela foi até o jardim aos pés do campanário e lá despejou as cinzas.

Se alguma pessoa procurar o Campanário e a Igreja Emmanuel hoje em dia, não irá encontrá-los. Após a descoberta dos corpos de Blanche e Minnie, os vizinhos que residiam na Rua Bartlet, onde ficava a congregação, pediram que a prefeitura removesse a igreja, considerado como um lugar de más lembranças e tragédias. Mas as autoridades acharam que não havia razões para isso.

Nos anos que se seguiram, a Igreja Emmanuel continuou a ser o centro de acontecimentos estranhos que chamavam a atenção de curiosos e supersticiosos.

Muitas pessoas acreditavam que o fantasma das duas moças assassinadas nas dependências da Igreja continuavam presentes, assombrando a sacristia e principalmente o campanário. Várias pessoas alegavam ter visto o fantasma de Blanche Lamont no topo do campanário, quando os sinos batiam as 23 horas, quando supostamente ela teria sido morta. O corpo nu e espectral então voava do alto da torre e desaparecia antes de cair no chão. Já o fantasma de Minnie Williams, massacrado pelo ataque furioso, havia sido visto no interior da igreja, próximo do púlpito e na biblioteca onde ele foi achado. De modo sinistro, o teto do aposento logo abaixo da biblioteca teimava em ficar avermelhado, como se o sangue da mulher tivesse se impregnado, aparecendo de tempos em tempos e obrigando o zelador a pintar. Também diziam que sangue escorria das paredes e que estranhas manchas de cor escarlate teimavam em surgir e sumir com alarmante frequência.

Enquanto isso, em Chinatown, boatos a respeito de assombrações pertencentes a jovens mulheres chinesas começaram a ser compartilhados. Diziam que os fantasmas pertenciam às prostitutas massacradas por um misterioso assassino que as lançaram aos porcos e que jamais foi reconhecido pelos seus atos. Rumores de que o matador seria um homem branco, muito bem apessoado e com estranhos gostos continuaram circulando. Vale recordar que após a prisão e execução de Theo Durrant não se ouviu mais falar de desaparecimentos sequenciais de jovens prostitutas na área de Chinatown.


Para muitas pessoas, essas histórias não passavam de superstições, mas outras tantas, levavam em consideração os rumores, sobretudo com o que veio a acontecer em seguida.

Em 1903, um pastor que vivia na casa paroquial da Igreja Emmanuel cometeu suicídio, cortando os próprios pulsos. Algumas pessoas se recordaram que o Demônio do Campanário havia feito o mesmo com uma de suas vítimas o que chamou muita atenção. Alguns afirmavam que o clérigo tomou a própria vida depois de ver um espectro masculino, com as feições de Durrant vagando repetidas vezes pela Igreja. Ninguém acreditou...

O pastor seguinte que assumiu a Igreja se envolveu em um escândalo de natureza sexual. Os detalhes jamais foram revelados, mas supostamente o caso tinha ligação com prostitutas e sadismo.  O homem, devidamente afastado de suas funções, teria trazido mulheres para o campanário da Igreja para que conhecessem o local onde o Demônio fez as suas vítimas.

Em 1910, outro sacerdote responsável pela Igreja Emmanuel participou de um crime que vitimou Charles de Young, fundador do Jornal Chronicle de San Francisco. O crime escandalizou a cidade e repercutiu negativamente em toda vizinhança.

Pessoas acreditavam que a Igreja tinha uma aura negativa e que reverberava com os antigos horrores cometidos ali dentro, influenciando e corrompendo quem vivia nos arredores. Depois de tantas tragédias e ocorrências desagradáveis, a Igreja foi fechada e as portas lacradas com tábuas. Em 1914 um incêndio consumiu todo o prédio principal. As suspeitas recaíram sobre vizinhos que desejavam desde o início do século se livrar da sinistra presença da Igreja. Sem provas que pudessem apontar para um responsável, o incêndio foi considerado acidental.

No ano seguinte a Igreja foi finalmente demolida pela prefeitura. O lugar hoje em dia é ocupado por um parque cercado de casas de aparência agradável. Nada resta da Igreja Emmanuel, de seu passado sinistro ou da história de Theo Durrant. 

Nada a não ser lembranças amargas.

2 comentários:

  1. Uhmmm..Será que o fogo consumiu a energia ruim que existia no lugar??Sera que Theo, muito longe de ser a origem do mal, não foi simplesmente mais uma vitima de algum...incubo????

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  2. O mais perturbador nisso é pensar que seria possível alguma força maligna ter sido a responsável por todas essas tragédias.

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