sábado, 13 de abril de 2013

Mesa Instável: Minha primeira aventura de DREAD inspirada no filme Amargo Pesadelo (Deliverance)


Algumas semanas atrás tive minha primeira experiência como narrador de DREAD.

Fiz uma resenha a respeito desse genial RPG na postagem anterior e recomendo que todos leiam esse artigo para saber do que estou falando (Resenha Dread).

Dread é um RPG de horror diferente, os testes são realizados removendo e assentando peças em uma Torre de Jenga. A medida que o jogo avança, as coisas vão ficando cada vez mais complicadas uma vez que, se a Torre composta de 54 peças de madeira desabar, aquele que causou o desmoronamento pode perder seu personagem.

Eu achei a ideia de Dread tão original que comprei o PDF do livro e uma Torre de Jenga no começo da semana e no final da mesma já estava pronto para narrar. Em geral, tenho por costume nunca mestrar antes de jogar um novo sistema, mas, francamente não conheço ninguém que já tenha narrado Dread. Então um jogo desses merecia a exceção.

Li as três aventuras que acompanham o livro básico mas nenhuma delas me deixou especialmente pilhado, eu queria algo diferente e depois de pensar por alguns instantes sobre algum filme ou estória que reproduzisse uma situação limítrofe de horror, uma ideia recorrente começou a tomar forma... DELIVERANCE!


O pessoal das antigas deve saber do que estou falando. Talvez tenham assistido, assim como eu, a esse filme em algumas de suas várias apresentações na sessão Corujão ao longo dos anos 80. E esse filme passava sempre de madrugada, dado seu teor barra pesada.

Para quem não conhece, Deliverance (aqui no Brasil intitulado Amargo Pesadelo) é um filme de suspense lançado em 1973. Baseado no conto homônimo de James Dickey, a estória de sobrevivência e crueldade sempre me deixou apavorado. É um daqueles filmes em que você realmente rói as unhas e fica tenso, querendo saber como diabos os pobres coitados arrastados para o pesadelo irão escapar da roubada
em que se meteram.

Muita gente que não viu o filme deve quem sabe conhecer o lendário "duelo de banjos":


Enquanto eu lia as regras de Dread, a ideia de adaptar Deliverance foi ganhando corpo. Algumas situações pareciam se encaixar perfeitamente na temática do jogo. Tomei a liberdade de inserir mais alguns elementos de horror na estória e no fim fiquei bastante satisfeito com o resultado. Tanto que narrei esse cenário em duas oportunidades.

A primeira no encontro de RPG do Saia da Masmorra e a segunda aqui em casa.

Na primeira (ironicamente a única em que tirei fotos) a sessão infelizmente não terminou devido ao tempo curto, o jogo começou às 15:30 horas e nesse dia em especial, o encontro se encerrou às 18:00.

Já aqui em casa, tive tempo de preparar melhor as coisas e corrigir algumas outras. O resultado foi ótimo, com jogadores realmente preocupados com o que ia acontecer com seus personagens. E a sessão contou com uma das cenas mais sanguinolentas que eu já narrei em todos os tempos. Sério, minha mulher que estava jogando levantou da mesa porque ficou horrorizada com a descrição do destino de seu personagem... e em termos de jogo, ela encara numa boa as bizarrices de Cthulhu.

Amargo Pesadelo (tanto o filme quanto a adaptação para Dread) começa com quatro amigos dirigindo para o interior do estado de Geórgia, nas profundezas do Sul (o Deep South) dos Estados Unidos. A coisa acontece nos anos 70. Um deles, Lewis (no filme interpretado por Burt Reynolds) convence os demais a descer um rio que está prestes a desaparecer para a construção de uma imensa represa que irá inundar todo o vale. Lewis pretende fazer uma última descida de canoa através do rio, a derradeira antes das corredeiras do Talahasse sumir. É uma região selvagem e erma de floresta, habitada por caipiras que vivem em montanhas (os Hill Billies), isolados de todo e qualquer contato com a civilização. Os companheiros de Lewis, são Ed, Drew e Bobby, cada um deles bem sucedido em sua carreira, mas sem qualquer experiência com a vida no campo. Eles concordam com a proposta de Lewis acreditando que vai ser uma mudança benéfica de ares, a chance de "fazer algo diferente" num final de semana.


Antes da sessão começar, pedi que os jogadores respondessem uma série de perguntas sobre os personagens. Preparei as questões em cartões e deixei claro que eles deviam responder dentro do espaço do cartão a fim de não ficar muito longo. Algumas das perguntas eram bem capciosas, mas o pessoal encarou numa boa e nenhuma pergunta ficou em branco. Logo eles já estavam bem familiarizados com seus personagens.

No início da aventura, os quatro amigos chegam a um vilarejo quase deserto - todos que viviam na região estão se mudando e apenas alguns moradores mais teimosos ainda resistem. A aura de estranheza é acentuada pelas diferenças culturais entre os personagens e os habitantes do lugar, um bando de caipiras pra lá de estranhos. Os personagens ("forasteiros da cidade grande") não conseguem se dar bem com os moradores e as tentativas de ganhar a confiança deles, esbarram no receio de ser muito cedo para puxar peças da Torre.

Seja como for, o grupo consegue barganhar com os caipiras e se encaminha para o ponto onde vão começar a descer o rio. Após alguns preparativos e uma descida acidentada (em que uma das canoas acaba virando!) os personagens resolvem montar acampamento em uma margem. À noite eles tem a impressão de ouvir ruídos estranhos e um deles acaba levantando de madrugada, andando como sonâmbulo para dentro da mata onde tem um sonho no mínimo bizarro. Apesar da noite mal dormida, o pior ainda está por vir...

Na manhã seguinte, os personagens seguem viagem através das corredeiras. Mas a real ameaça não é o traiçoeiro Rio Talahasse, e sim um bando de montanheses sádicos que o grupo tem o azar de encontrar e que passam a atormentá-los ao longo do restante da aventura.

Nessa parte eu tomei a liberdade de alterar um pouco o roteiro, tirei uma cena de violência extrema que está no filme, por achar que violência sexual não ia ficaria legal na mesa. Em compensação acrescentei uma motivação extra para os caipiras, algo chapinhado de filmes como "Quadrilha de Sádicos" (The Hill have Eyes) e "O Massacre da Serra Elétrica" (The Texas Chainsaw Massacre) que encaixou perfeitamente no contexto da aventura e concedeu um toque de sobrenatural, surreal e bizarro.

Eu não posso esquecer de elogiar o sistema de regras no que diz respeito a gerar insegurança e tensão entre os jogadores. Apenas mencionar que um deles teria de tirar peças da Torre de Jenga fazia com que eles pensassem em outras alternativas (das mais engenhosas) para superar os obstáculos. Mas é claro, tinha momentos em que eles tinham de puxar peças e é claro, mais cedo ou mais tarde a Torre ruiu. E como resultado algo "HORRÍVEL" aconteceu com os personagens responsáveis pelo desabamento.

Peço desculpas por estar sendo tão vago nos detalhes... mas não quero entregar os detalhes da aventura já que pretendo narrar mais uma vez para outro grupo.

O que posso dizer é que os vinte minutos finais da estória, com os dois personagens sobreviventes tentando escapar desesperadamente da perseguição empreendida pelos maníacos, foram possivelmente os mais tensos que já mestrei. Lá pelas tantas os jogadores estavam tão nervosos com a possibilidade de ter de puxar peças da Torre de Jenga que aceitavam numa boa sofrer penalidades. E foi numa dessas que mais um dos personagens acabou sofrendo um acidente doloroso com uma moto-sera. O mais legal é que o jogador nunca ficou sabendo o que aconteceu com o personagem uma vez que concordamos que ficaria mais legal se ninguém soubesse se ele ainda estava vivo ou não. Na conclusão apenas um dos personagens viveu para deixar o vale, completamente louco e ferido, é verdade, mas essas coisas fazem parte de uma boa estória de horror.

O veredito final é que Dread não é apenas um sistema inovador, ele tem como mérito transbordar a tensão da aventura para fora da mesa. Quando os jogadores tem que decidir o que fazer, e puxar peças de uma Torre já bamba, é a única opção as coisas ficam muito interessantes. Sem sacanagem, o sobrevivente teve de tirar oito peças no final e nunca vi uma Torre de Jenga tão instável.

Já estou pensando em outros cenários para serem adaptados, já que essa primeira experiência se mostrou tão boa.

Fotos da Sessão do Saia da Masmorra:

Mesa de Dread na Galeria da Point HQ em Ipanema durante o Saia da Masmorra.
O material do jogo - As fichas, a Torre de Jenga, algumas cartas e dados (apenas para tirar na sorte algumas coisas).

Os quatro personagens da aventura eram exatamente os quatro do filme.

A Torre já parecendo um queijo suíço.

A arte de remover peças e reposicionar no topo.

A Torre de Jenga já começa a balançar.

2 comentários:

  1. É muito inspirador ver como você consegue tirar ideias para aventuras de todo lugar! Adoro esse blog. Me ajuda muito nas aventuras.

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