O Rei Rato é um fenômeno raro caracterizado quando uma grande quantidade de ratos ficam presos através de suas caudas de uma maneira impossível de serem soltas. Sangue, sujeira, gelo, excremento ou simplesmente nós são fatores responsáveis por criar esse estranho resultado. Supõe-se que os roedores unidos dessa forma cresçam ao mesmo tempo, experimentando uma calcificação nos ossos da cauda que acaba fundindo os animais para sempre. O número de animais que compõem o Rei Rato pode variar, mas normalmente uma quantidade superior a dez são necessários para evidenciar o fenômeno. Há rumores de espécimes com mais de 50 ratos vinculados dessa maneira.
O Rei Rato por alguma razão é um fenômeno identificado com a Alemanha, onde a maioria das ocorrências foram descobertas. Historicamente, existem várias superstições associadas ao Rei Rato, e ele é visto como um mau agouro,sinônimo de doença, morte e praga.
O nome em alemão Rattenkönig, foi traduzido para o inglês como rat king, e para o francês como roi des rats. Originalmente, o termo não era utilizado para se referir a ratos, mas a pessoas que viviam muito próximas umas às outras, praticamente grudadas, como por exemplo famílias com muitos membros forçadas a dividir uma habitação pequena.
O estudioso Konrad Gesner em seu tratado Historia animalium (1551-1558) reconhecia a existência do fenômeno afirmando "alguns ratos são unidos através de seus rabos formando um novelo indissociável. Esses animais raramente conseguem se mover e são alimentados pelos mais jovens que servem às suas necessidades, como se eles estivessem acima de todos os outros, quase como monarcas dos demais". Um teólogo do século XV chamado Gustav Griss se referiu ao Rei Rato como um exemplo do horror do inferno, onde segundo ele, os homens padeciam amarrados uns aos outros sem poder se mover na mesma direção, como ratos presos pelas sua caudas. O reformista Martin Lutero usou o Rei Rato como analogia para sua filosofia anti-papista: " (...) no alto da estrutura, vive o Papa, o Rei Rato em pessoa, com vários corpos (seus bispos e cardeais) controlados pelos rabos".
Por muito tempo vigorou a crença de que o Rei Rato era um único animal, com vários corpos separados. Ele seria o responsável por gerar os ratos e controlar os animais como um todo.
A menção mais antiga ao fenômeno data de 1454. Um Rei Rato foi descoberto em um depósito de feno em Aachen, no auge de uma peste avassaladora que varria a Alemanha central. O fato foi tratado como uma abominação e fartamente documentado. Acadêmicos foram chamados para analisar a descoberta e estes estudiosos determinaram que aquele horrível animal, sem dúvida, era o responsável pela praga. Coincidentemente, quando o Rei Rato de Aachen foi exterminado, a peste que atormentava a população diminuiu sua intensidade. Isso deu início a crença de que toda epidemia de peste negra era desencadeada por um Rei Rato oculto em algum lugar inacessível.
Em 1538, uma praga atingiu Gelsenkisher com força e para conter a epidemia autoridades tinham liberdade para entrar nas casas à procura do foco, leia-se, o Rei Rato. Em meados de 1600, um nobre que residia próxima a Holstein alegadamente, após descobrir um rei rato no estábulo de sua propriedade, mandou depositar o animal ainda vivo em uma caixa e deu ordens expressas para que ele fosse levado de carruagem e libertado nas terras de um inimigo declarado.
É senso comum que doenças tendem a se espalhar mais rapidamente quando animais estão confinados muito próximos. Dessa maneira o Rei Rato era considerado como a própria personificação da doença. Em 1571 em Bremen a descoberta de um Rei Rato foi comemorada pela população como o fim do martírio e do reinado da Peste sobre a cidade. Quando mesmo depois do animal ter sido queimado em praça pública a praga não terminou, preferiu-se acreditar na existência de um segundo Rei Rato vivendo nos arredores da cidade. Durante o avanço das tropas de Napoleão para o Leste, inúmeros soldados caíram doentes com sintomas de peste, procurou-se então pela origem do mal. Havia o boato que um rei rato estava vagando livre pela região. O temor só foi debelado depois que oficiais informaram que o animal fora encontrado e queimado.
O fenômeno foi gradualmente desaparecendo a medida que o rato marrom (Rattus norvegicus) erradicou o Rato Negro (R. rattus) da Europa em meados do século XVIII. A descoberta de Reis ratos tem sido esporádica na era moderna, contudo recentemente um exemplar foi achado numa fazenda na Estônia, na região de Vorumaa em janeiro de 2005.
Espécimes de rei rato são preservados em alguns museus. O Museu Mauritianum em Altenburg (Thuringia) possui o maior e melhor preservado rei rato conhecido (esse que está no alto do artigo). O espécime mumificado foi encontrado em 1828 na lareira de uma casa em Buchhein. Ele consiste de 32 ratos.
Reis ratos mantidos em frascos cheios de álcool também estão presentes nos acervos de museus em Hamburgo, Göttingen, Stuttgart e Hamelin (ironicamente o local da fábula a respeito do flautista que salvou a cidade guiando ratos para fora de seus muros). O Tartu Ülikooli Zooloogiamuuseum (Museu de zoologia de Tartu, na Estonia) possui um espécime formado por 29 animais. Um rei rato encontrado na Nova Zelândia em 1930, está exposto no Museu Otago em Dunedin, trata-se do único exemplar conhecido que não é formado por ratos negros. Relativamente poucos reis ratos foram descobertos; dependendo da fonte, o número não passa de 50 espécimens ao redor do mundo.
Ratos sempre representaram horror, pois sempre estiveram intimamente ligados a doença e morte. Eles sempre foram animais considerados detestáveis, tanto é verdade que até 1928, ratos não podiam ser mostrados em filmes, existindo até multas para quem o fizesse. O tabu que só foi encerrado pelo filme Drácula, que colocou roedores em evidência, o que causou asco e horror nos cinemas. O filme foi proibido em alguns lugares da Europa apenas por mostrar cenas com ratos.
A suposição de que um rei rato é o causador de uma epidemia incontrolável e a necessidade de localizar seu covil e dar cabo da criatura, surge como uma ótima premissa para uma aventura com foco urbano. Imagine uma cidade medieval murada, com uma população aterrorizada e o rumor persistente de que algo tão bizarro cresce e habita na escuridão, disseminando a doença, controlando outros ratos e provocando mortes.
Usar essa criatura em um cenário medieval, mesmo que seja de fantasia, parece uma ótima pedida. Eu penso que ele ficaria ótimo em Cthulhu Dark Ages, mas não vejo porque a premissa não poderia ser aproveitada em Warhammer (onde ratos são um inimigo essencial), Vampire Dark Ages ou mesmo em Dungeons and Dragons (imagine isso em Ravenloft!).
Para tornar a coisa ainda mais medonha, que tal considerar o rei rato como uma criatura dotada de inteligência, ainda que rudimentar, mas suficiente para que ele formule um plano de ação para enfrentar seu inimigo: o homem. Suponha que um rei rato seja realmente capaz de controlar outros roedores mentalmente ou por feromônios. Dessa forma, como um verdadeiro líder estrategista, ele poderia enviar seus súditos em ataques localizados, selecionar indivíduos doentes para infectar alvos ou simplesmente causar pânico lançando um ataque a uma celebração ou festividade.
Como o Rei Rato pode ter desenvolvido sua inteligência? Ora, o que não falta são ideias. Desde considerar o resultado imprevisível de uma magia ou uma maldição, até supor que "coisas mais negras" estão em ação promovendo o surgimento de um horror dessa natureza.
Para aumentar ainda mais o horror, que tal tornar o rei rato algo ainda mais ameaçador. O que dizem de considerar um rei rato formado por centenas, talvez milhares de indivíduos unidos? O mero ato de tentar se aproximar dessa coisa sem receber mordidas seria uma temeridade. Ou quem sabe um rei rato formado por roedores enormes, do tamanho de gatos ou de cães. Para um horror definitivo, que tal adicionar pessoas medonhamente unidas a massa do rei rato, transformadas elas próprias em ratos humanos coladas por filamentos perpétuos.
Eu também posso imaginar o rei rato como um tipo de "artefato místico". Imagine um estandarte com um rei rato mumificado que poderia ser usado para amaldiçoar, transmitir doenças ou quem sabe exercer controle sobre hordas de ratos famintos.
Uma massa de ratos pretos amalgamados, transbordando doenças desconhecidas, habitando um porão escuro e abandonado enquanto comanda milhares de seus súditos a conquistar uma cidade.
O que pode ser mais adequado a um cenário de horror?
Caramba, isso me deu arrepios.
ResponderExcluirMuito boa a idéia de usar algo com ratos numa crônica. Tive umas idéias aqui. E acho que um inimigo assim vale até para cenários menos ligados ao horror. Que tal uma criatura feérica em Changeling?
LOL Caramba.² Isso sobre o Rei Rato foi algo sobre o qual eu nunca ouvi falar. Me lembrou Gyo, mangá de Junji Ito, em que máquinas são a vapor são construídas e encaixadas em pessoas mortas, de modo que os defuntos saem por aí na máquina alimentada pelo cheiro de morte, até que várias máquinas se enroscam e a coisa fica horrenda.
ResponderExcluir(Encontrei o blog hoje enquanto procurava por Scylla e Caribdes. Cada post um mais interessante que o outro. Parabéns.)
Muito bacana este post. O Rei rato pode ser usado tanto como uma espécie de desafio em Call of Cthulhu (ou outro jogo) como para causar aquela sensação de mal-estar durante o jogo, principalmente se for usada em conjunto com algo papável pelos jogadores (risos maléficos).
ResponderExcluirAdorei o texto, me surpreendeu, recomendo a leitura do livro A invasão dos Ratos, de James Herbert, é angustiante, e nunca imaginei que existisse mesmo um Rei Rato.
ResponderExcluirRapaz, nunca tinha ouvido falar em tal abominação e realmente é um ótimo desafio menor em uma aventura e pode ser adaptado em vários jogos, fiquei tão impressionado que tive que continuar pesquisando, muito interessante! Espero que não encontrem um desse no tal navio fantasma da outra notícia, abraços...
ResponderExcluir*alimentando seu blog com comentários*
ResponderExcluirCara, vi isso no VK (rede social russa) e fui no google confirmar a existencia e... uau! Acho que nunca coloquei ratos em meus escritos, mas... quem sabe né?
Sobre o rei rato nas histórias, acabei de ler O Fabuloso Maurício e seus Roedores Letrados do Terry Pratchett e a história gira em torno de ratos, tendo um rei rato nela (tanto que foi o que me fez chegar a esse blog). Sugiro muito a leitura, é um livro curto, divertido, com uma boa história e que tem partes aterrorizantes.
ResponderExcluirQuando puder vá assistir Alguém - espetáculo de teatro de bonecos para adultos- Grupo Pigmalião Escultura que Mexe de Belo Horizonte. Tá tudo lá!!!
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