terça-feira, 14 de março de 2017

Visões Aterradoras - Explicando as Alucinações sofridas por Assassinos e Vítimas



"Estes pensamentos horrendos e sanguinários, do que nasceram? 
Como puderam povoar a minha mente de modo tão vívido"?

Macbeth


Um dos aspectos mais sinistros no caso de Jesse Pomeroy, o Menino Demoníaco que aterrorizou Boston no século XIX, talvez sejam as declarações dele a respeito do Demônio Vermelho, uma espécie de alter ego que ele assumia sempre que ele estava prestes a cometer um de seus horríveis crimes.

[Se você não leu o artigo a respeito desse caso chocante, leia o link]

O Demônio Vermelho nas palavras do próprio assassino seria uma entidade independente, uma criatura maligna que se manifestava sobre ele e lhe conferia capacidades sobrenaturais. Pomeroy afirmava que o demônio lhe concedia força, rapidez, furtividade e a capacidade de ficar virtualmente invisível. A criatura teria ocultado Jesse e uma de suas vítimas, Horace Millen quando os dois estavam numa praia bem diante de testemunhas que não perceberam a presença de assassino e vítima a poucos metros de distância. Mesmo enquanto Millen chorava e pedia ajuda, duas pessoas próximas foram incapazes de ouvir as lamúrias.

Ao relatar essa história, o assassino afirmou categoricamente que a crença de que era "ajudado" por uma criatura sobrenatural foi essencial para ele continuar matando. De fato, Pomeroy atestou que se não tivesse sido capturado, provavelmente continuaria colecionando vítimas inocentes: "O Demônio me inspirava e ajudava a fazer isso".

Ao descrever os crimes, tanto as surras quanto os assassinatos de maneira minuciosa, Jesse explicava ver a si mesmo na forma do Demônio Vermelho, uma criatura com pele escarlate, olhos brancos e chifres. Enquanto utilizou um depósito de ferrovia como seu covil, ele chegou a pendurar um espelho na parede, para que pudesse ver a si mesmo na forma diabólica. O garoto contou aos seus entrevistadores que ao pintar o rosto com tinta vermelha ou sangue, sentia de imediato a presença do Demônio Vermelho. Era como uma senha para que ele pudesse se transformar.


A Psiquiatria reconhece que assassinos em série, desenvolvem cada qual, um elaborado ritual pessoal no qual fantasiam com determinado acontecimento. Quando este cenário, visto e revisto em suas mentes incontáveis vezes, é trazido para a realidade, eles são arrebatados por um turbilhão de emoções. Do ponto de vista neurológico, seus cérebros se ativam, produzindo elementos químicos em enorme quantidade capazes de promover delírios alucinatórios.

Muitos assassinos que sofrem de Esquizofrenia e outras Desordens Psicóticas também recorrem a elaboradas fantasias para justificar seus crimes. Alguns se vêem como indivíduos diferentes, capazes e perfeitamente inabaláveis. Outros enxergam a si mesmos no papel da vítima, isso quando não imaginam a vítima como alguém que desejam ferir. Não são raros aqueles que acreditam que há pessoas ao redor testemunhando o crime, os que ouvem vozes, sentem cheiros e que se vêem transportados a outros lugares significativos. A avassaladora onda de elementos químicos produzidos pelos seus cérebros e liberados pela consumação da fantasia, manifesta todo tipo de experiência. 

Jefrey Dahmer, o Canibal de Millwaulkee via a si mesmo como um homem bem mais forte do que realmente era. Ed Gein e Ted Bundy enxergavam respectivamente em suas vítimas, as figuras da mãe e de uma antiga namorada. A visão os preenchia de uma profunda determinação e os impulsionava a matar impiedosamente. O maníaco Andrei Chikatilo ouvia as prostitutas que se tornariam suas vítimas rindo dele momentos antes, mesmo quando elas estavam em silêncio. O Filho de Sam (apelido pelo qual assassino David Berkowitz ficou conhecido), escutava vozes dando ordens em meio aos latidos de cães da vizinhança, comandando-o a matar. Richard Ramirez acreditava que Satã enviava mensagens em meio aos solos de guitarra de bandas de heavy metal compelindo-o a matar. Durante o estado de frenesi atingido nos crimes que praticou, ele via a si mesmo como um demônio, em um delírio muito semelhante ao de Jesse Pomeroy.

Muitos pesquisadores contemporâneos acreditam que Pomery delirava com o "Demônio Vermelho" como uma forma de externar suas frustrações pessoais. Uma vez que ele tinha um histórico de agressão, sofrendo frequentes maus tratos por parte de seu pai, ele criou um Alter Ego capaz de não apena suportar essa brutalidade, mas redirecioná-la aos outros. Jesse via a si mesmo como uma criança fraca, mas quando surgia o Demônio Vermelho, se tornava poderoso e capaz de ferir as pessoas da mesma maneira que seu pai o feria. Jesse se igualava ao pai, compartilhava de sua força e autoridade.


Não é totalmente estranho, portanto, que assassinos durante o frenesi experimentem alucinações, mas o que dizer das vítimas que descrevem assassinos como se fossem demônios, monstros e criaturas não-humanas?

Não são raros os testemunhos de vítimas que sofreram violência extrema ou tortura e que descrevem seus algozes como monstros sobrenaturais. Até recentemente, muitos desses testemunhos eram desqualificados em face de suspeitas de que o criminoso pudesse estar usando um disfarce no intuito de aterrorizar a vítima. Também não se podia descartar a possibilidade do assassino usar drogas (PCP, LSD etc) ou outras substâncias capazes de provocar alucinações.

Contudo, um estudo aponta que alucinações podem ocorrer em pessoas que não sofrem de doenças mentais. Privação severa do sono, inanição e desidratação podem resultar em alucinações. A transição do estado desperto para o de sono e vice versa repetidas vezes também pode gerar um esgotamento e ocasionar alucinações. Finalmente, o stress desencadeado pelo choque pós-traumático (PTSD) e por situações extremas (como tortura) são catalizadores eficazes de delírios alucinogênicos. Segundo o estudo, vítimas de violência extrema podem enxergar seus agressores como monstros ou demônios. Em alguns casos, as vítimas experimentam não apenas alucinações visuais e auditivas, mas também olfativas e tácteis que são consideravelmente mais raras. 

Uma gravação feita pelo atroz assassino em série Denis Rader (mais conhecido como B.T.K) com uma de suas vítimas, denota um delírio dessa natureza. A vítima, uma mulher que havia enfrentado uma terrível tortura física e mental, passou a enxergar Rader como um monstro abominável e não como um ser humano. Após repetidas sessões de tortura, ela gritava sempre que ele aparecia na sala que lhe servia de cativeiro. Dizia coisas como "Você é um demônio! Eu vejo como você é de verdade!".  O assassino, em entrevistas posteriores, contou que várias de suas vítimas demonstravam esse comportamento.

Uma das vítimas de Peter Sutcliffe, que escapou de ser morta por ele, descreveu o infame "Estripador de Yorkshire" como uma criatura infernal, com direito a pernas de bode e chifres. Ela foi incapaz de fazer seu reconhecimento positivo durante o julgamento. Tudo o que ela lembrava era de estar frente a frente com um monstro demoníaco e não com um homem.


Outro sobrevivente, dessa vez atacado pelo maníaco da Costa Oeste dos Estados Unidos, o infame Zodíaco, agonizou aos pés do assassino após ser repetidamente esfaqueado. Apesar de ter escapado com vida e de ter visto o matador a poucos metros, tudo que ele conseguiu descrever foi que ele exalava um fedor insuportável de enxofre.

A tese muito debatida, é que a mente da vítima cria alucinações para aplacar o horror pelo qual está passando. É uma maneira do cérebro processar a informação interpretando que "nada no mundo real poderia ser tão terrível". Essa teoria ainda é muito controversa entre pesquisadores encontrando defensores e ainda mais, críticos.

Poderia ser essa a explicação para vários "monstros assustadores" que as pessoas acreditavam existir no passado, como vampiros e lobisomens. A origem desses monstros da ficção, tudo sugere, tem raízes na realidade e em monstros muito reais de carne e osso.

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