Não é segredo que o mundo dos ditadores e mesmo de alguns lideres muito populares tem por hábito expressar um comportamento no mínimo excêntrico. Com o poder absoluto, alguns se rendem a um lado obscuro, saciando hábitos, passatempos e buscas que não eram possíveis antes. Talvez não seja algo novo, entretanto, um ditador levou a coisa para um patamar mais alto, invadindo o reino do estranho e do bizarro. Estamos falando do antigo líder da República do Panamá, Manuel Antonio Noriega. Entre seus hobbies estava subjugar pessoas, e de acordo com algumas fontes, ele se valia de métodos pouco usuais para isso, como a boa e velha Magia Negra.
Mas vamos começar do início para entender a história.
Noriega governou o Panamá entre 1983 e 1989 e era o líder de fato do país, um militar e político que aproveitou o vácuo de poder deixado pela morte de Omar Torrijo, que, por sua vez, também havia tomado as rédeas do poder em um golpe em 1968. Noriega tinha laços de amizade com os Estados Unidos muito antes disso. Fontes afirmam que ele era informante e agente infiltrado respondendo à CIA desde 1967. Nas Forças Armadas, Noriega auxiliava os EUA a suprir governos da América Latina com armamento e munições para enfrentar rebeldes e movimentos revolucionários. Embora Noriega tenha conseguido acumular uma enorme fortuna contrabandeando armas para traficantes internacionais de drogas, ele era tolerado pelo governo americano pois ironicamente era considerado uma ferramenta útil no próprio combate às drogas. Noriega lucrava ao receber dinheiro dos EUA e dos Cartéis, restringindo carregamentos para a América e enviando em segurança as cargas apreendidas para outros lugares. A essa altura, Noriega era considerado um mal necessário, e um aliado vital para o governo americano.
Após subir ao poder em meados dos anos 1980, o Panamá se converteu em uma brutal Ditadura Militar, com censura da imprensa, abuso dos direitos humanos, perseguição política a oponentes e expansão militar. A medida que a fome de poder de Noriega foi aumentando, os americanos sentiram que estavam perdendo o controle sobre seu aliado que agora flertava com nações como Cuba, Nicaragua e Líbia. Em 1986 a relação de Noriega e o governo americano se deteriorou por completo e ele recebeu ordens de deixar a presidência e convocar eleições. Os EUA temiam que Noriega pudesse decidir de maneira imprevisível a respeito do futuro do Canal do Panamá que tinha enorme importância para o comércio na região. Os americanos denunciaram a ligação de Noriega com o tráfico internacional, mas o plano não funcionou.
A situação se agravou e os EUA começaram a planejar uma invasão do Panamá caso julgassem necessário. Noriega conseguiu frustrar um golpe de estado e derrotou um candidato de oposição apoiado pelos EUA em uma eleição. Após a morte de um oficial americano, causada por soldados panamenhos, os EUA iniciaram uma invasão ao Panamá, capturaram e extraditaram o ex-presidente para Miami a fim de que respondesse pelos seus crimes.
Embora não houvesse dúvidas de que Noriega fosse um ditador cruel, um dos mais conhecidos tiranos de sua época, as pessoas não sabiam a extensão de seus devaneios bizarros. Durante a operação de Invasão do Panamá, Noriega passou vários dias em fuga, escondendo-se em mansões e propriedades oficiais. Isso permitiu que as forças americanas, em perseguição, encontrassem residências oficiais repletas de coisas muito estranhas.
De acordo com o Agente Especial James R. Dibble, um especialista em cultos e feitiçaria ritual que trabalhava na Divisão de Investigação Criminal do Exército na época, no próprio Palácio Oficial do Governo em meio a mobília, garrafas de champagne e artigos luxuosos haviam diversos objetos que indicavam estar o ditador envolvido profundamente com o que costumava se identificar como "Magia Negra" e "Feitiçaria Ritualística". Entre os itens encontrados e que chamaram a atenção encontravam-se todo tipo de parafernália de ocultismo, amuletos, muitos crânios humanos, símbolos de proteção, estatuetas bizarras, potes contendo ingredientes para magia, carcaças de animais recentemente abatidos, máscaras animísticas, frascos com sangue fresco e outras ferramentas usadas em celebrações de Vodu.
Os objetos foram levados até um sacerdote de Santeria e um de Candomblé, crenças comuns no Panamá que afirmaram serem aqueles objetos voltados para aspectos mais sinistros das religiões, algo identificado como brujeria ou, segundo os especialistas, Palo Mayombe, uma vertente que se vale de sacrifícios de sangue para conquistar o favor de entidades malévolas.
Aparentemente, haviam evidências concretas de que esses rituais de magia negra eram direcionados contra várias pessoas no Panamá como o novo presidente Guilhermo Erdara e alguns outros políticos influentes. Os rituais também se voltavam para Ronald Reagan, George Bush e o congresso dos EUA. Várias fotos desses indivíduos haviam sido rabiscadas, cercadas com símbolos de feitiçaria, banhados com sangue ou atravessados com pregos e espinhos em um esforço para profaná-los. No porão da casa, os investigadores encontraram uma grande pedra negra coberta de símbolos mágicos e guarnecida de correntes fixadas nas extremidades. Haviam restos de sangue na superfície da rocha como se ela tivesse sido utilizada como uma espécie de altar diabólico.
Os nomes de uma dúzia de indivíduos estavam escritos com sangue em um curioso pergaminho. Este havia sido enrolado em um canudo e colocado em um garrafão onde foram então misturados vários ingredientes, tais como as entranhas de um bode, espinhos, ferrões de vespas, pele de serpente e caldas de escorpião. O objetivo desse trabalho era direcionar energias mortais contra os nomes ali escritos e fazer com que uma maldição recaísse sobre os indivíduos listados. Mais assustador é que pela caligrafia, o pergaminho teria sido escrito pela próprio Noriega. Especialistas em Palo Mayombe dizem que apenas iniciados podem escrever esse tipo de maldição, o que comprovaria envolvimento de Noriega com as crenças.
Em outra casa, um retrato de George Bush, então presidente norte-americano, havia sido coberto com uma camada de cera vermelha. Várias velas negras estavam acesas aos pés da foto ao lado de três cálices de cristal contendo sangue. Perto desta foi encontrado um conjunto de sete velas grandes com os nomes de políticos, congressistas e senadores norte-americanos gravados na cera. No interior de cada vela haviam restos de falanges humanas, cabelo e unhas, além de pregos (supostamente retirados de caixões). Numa geladeira foi encontrada algo ainda mais sinistro, uma bandeja contendo um grande sapo boi cuja boca havia sido costurada com linha feita de cabelo humano. O animal tinha sido morto com várias agulhas e no interior de sua boca lacrada estava o nome de Seymour Hersh, repórter do New York Times que havia divulgado a ligação de Noriega com os Cartéis de Drogas.
De acordo com Davis, um livro de magia negra contendo anotações do próprio punho do ditador estava guardado no cofre da Mansão de Noriega. No mesmo aposento que servia de quarto, as paredes receberam símbolos ligados a magia tântrica com o intuito de aumentar sua potência sexual.
Empregados do Palácio Presidencial disseram que duas vezes por mês recebiam ordens de fechar todas as portas e janelas e não sair de seus aposentos sob pena de prisão. Nessas noites o Presidente recebia vários convidados, entre os quais vários membros importantes de seu gabinete e conhecidos feiticeiros de Palo Mayombe. Juntos realizavam rituais e celebrações cujo objetivo era direcionar energias contra oponentes e fortalecer por meios místicos o poder do governo. Há boatos de que os praticantes realizavam sacrifícios de sangue e que as vítimas não eram apenas animais. Nos dias finais do governo Noriega, acredita-se que para fortalecer os rituais, o sangue de mulheres e crianças tenha sido derramado nos altares como forma de garantir sua sobrevivência política.
Ainda segundo os rumores, Noriega estava aprendendo os segredos nefastos da brujeria com um poderoso feiticeiro que prestava a ele consultoria e que tinha poder de decisão oficial. Conselheiros próximos diziam que Noriega consultava esse feiticeiro antes de tomar as suas decisões e que não dava um passo sem a sua aprovação. O nome desse feiticeiro jamais foi revelado, mas acredita-se que ele escapou do Palácio Presidencial pouco antes das tropas americanas chegarem e que deixou para trás várias maldições.
A descoberta mais bizarra envolvendo objetos ritualísticos foi descrita pelo repórter William Branigin em um artigo publicado em 1989:
"Os indícios de que feitiçaria estava sendo praticada no próprio Palácio Presidencial foi reforçada pela descoberta de um ritual de "magia negra destrutiva". No porão da mansão foi encontrado algo que exalava um fedor ocre envolvido em um pano vermelho. O objeto uma vez aberto revelou se tratar do feto completo de um bezerro ainda coberto de placenta e sangue. Ele havia sido colocado em uma bacia ao lado de milho e ovos apodrecidos. O animal havia sido atravessado por dezenas de grandes pregos. Insetos rastejavam sobre a carcaça apodrecida. Um nome foi escrito em um pedaço de pano e costurado no estômago do animal. A tinta havia escorrido e não era possível ler a quem se dirigia a maldição".
Não se sabe ao certo de essa orgia de feitiçaria teve algum efeito nos opositores do Ditador, mas é fato que não o livrou da prisão. Noriega foi capturado e recebeu sua punição sendo condenado por uma Corte Internacional a 17 anos de cadeia. A seguir ele enfrentou uma nova acusação dessa vez movida pelo Governo da França por lavagem de dinheiro. Ele foi enviado de volta para o Panamá em 2011 para responder a outros crimes cometidos durante o seu governo. Noriega morreu em 2017, vítima de hemorragia cerebral.
Esse é um caso bastante estranho e que lança uma aura de bizarrice sobre a biografia de um dos mais conhecidos ditadores do final do século XX. Será que o próprio Noriega era um dos realizadores dos rituais de magia negra praticados no Palácio? Que fim teria levado o feiticeiro que ensinava Palo Mayombe? Até que ponto as alegações de que sacrifícios aconteciam podem ser levadas à sério?
É provável que nunca saibamos ao certo tudo o que aconteceu nos anos de ditadura no Panamá, mas é possível especular o teor blasfemo do Porão Sobrenatural de Manuel Noriega.