O Museu Smithsonian foi fundado em 1846, graças aos esforços do acadêmico britânico James Smithson, que tinha como objetivo construir uma organização devotada ao compartilhamento do saber e desenvolvimento do conhecimento. Pouco mais de 20 anos após de sua fundação, o icônico prédio do Museu, apelidado de "Castelo", em face do seu estilo arquitetônico neo-medieval, irrompeu em chamas.
Era um dia frio de inverno em Washington, a Capital dos Estados Unidos onde o Museu foi erguido às margens do Rio Potomac. Operários fazendo um serviço na Galeria de Arte no segundo andar instalaram um forno no aposento que servia como alojamento. Um desvio no respirador fez com que as cinzas se acumulassem no interior da chaminé. Quando a chaminé entupiu, um operário abriu o respirador deixando o ar entrar e isso reavivou as brasas. Fagulhas começaram a se espalhar e logo se alastraram pelas paredes pintadas com tinta a base de óleo. O resultado foi um verdadeiro inferno de chamas. Uma nuvem de fumaça negra cobriu o prédio, podendo ser vista de grande distância.
Relatos da época descrevem a extensão da destruição dos tesouros do Smithsonian: valiosos trabalhos de arte, pinturas renascentistas, estatuário, espécimes científicos da fauna e flora americana, material antropológico recolhido junto de nativos americanos; tudo ardeu rapidamente. Os documentos do instituto, compostos de papéis oficiais, arquivos e trabalhos científicos que ficavam em uma biblioteca também foram atingidos. O fogo subiu para o andar superior atingindo aposentos administrativos, salas de reunião e o grandioso auditório para duas mil pessoas, danificando também o telhado. Por sorte, o andar térreo, onde se localizava o grosso das mostras permanentes e exposições, sofreu menos danos, causados, sobretudo, pela água usada para combater o fogo.
O Castelo também era a casa de algumas pessoas cujas vidas foram profundamente afetadas pelo incêndio. Mary Henry, que vivia no prédio descreveu a cena da seguinte forma:
"Foi uma visão grandiosa ainda que triste. As janelas estouravam com o calor, as chamas ardiam altas, em vermelho e laranja dentro dos aposentos repletos de tesouros inestimáveis. Era como se o inferno tivesse brotado no interior do prédio, varrendo tudo em seu caminho em um turbilhão. Uma verdadeira tempestade de chamas, que faminta devorava aquilo que levou-se tanto tempo para reunir".
O Diretor do Museu, Joseph Henry e sua família viviam na ala leste do prédio. Ele descreveu o início do incêndio como se a noite tivesse chegado mais cedo naquele dia:
"Tudo ficou escuro pela fumaça negra e ouvimos explosões em todo canto". Um dos operários que estava trabalhando no prédio correu para socorrer Henry e sua família. O diretor escreveu: "Um homem bateu nervosamente a porta e quando abri mal o reconheci, estava coberto de fuligem e quase sufocando: O prédio está em chamas, precisamos sair, disse ele".
A Família, composta por pai, mãe e quatro filhos, correu para fora, mas no caminho ainda conseguiram recolher alguns objetos valiosos das exposições, salvando obras inestimáveis no último momento.
O Paleontólogo Fielding Meek, um acadêmico extremamente introvertido e parcialmente surdo, vivia em um pequeno cômodo sob a escadaria que levava a Sala de Leitura. Ele estava trabalhando em seu escritório quando sentiu o cheiro de fumaça. Ao abrir a porta tudo ficou imediatamente escuro. Imaginando que se tratava de um incêndio ele buscou baldes de água que serviam para esse tipo de emergência. A seguir comandou alguns funcionários a buscar água em um poço do lado de fora, mas com o frio a água havia congelado. Meek logo percebeu que não havia como salvar o museu então ele fez o que estava ao seu alcance, arrancou cortinas, embalou o que podia e atirou pela janela para que fosse recolhido por quem estava do lado de fora. Ele salvou o que pode de manuscritos, desenhos, mapas e livros.
Dois homens que ajudaram na evacuação do prédio, o explorador Tenente James Melville Gilliss e John Varden, um dos fundadores do Museu, morreram semanas mais tarde, provavelmente em decorrência da fumaça que inalaram. Considerando o tamanho do incêndio, foi um verdadeiro milagre que ninguém tenha morrido na conflagração.
O incêndio do Museu Smithsonian coincidiu com os dias finais da Guerra Civil. O dramático conflito entre Norte e Sul, uma preocupação constante para os moradores de Washington, foi por alguns dias substituída pelo tristeza da população pelo que ocorreu no Smithsonian. Os jornais noticiaram o lamento das pessoas, e de muitas mães e viúvas que comparavam a destruição do Museu com a morte de seus maridos e filhos.
Ao menos, os arquitetos do Museu, haviam tido o cuidado de substituir os pilares de sustentação, originalmente de madeira, por uma estrutura reforçada de ferro, o que evitou o colapso de todo o prédio. Além disso, o incêndio ficou confinado no segundo e terceiro andares, e embora as perdas tenham sido consideráveis, muita coisa pode se salva graças a um esforço coletivo de bombeiros e civis que se revezaram na tarefa de remover o que fosse possível e combater as chamas.
Após a tragédia, o Diretor Henry, um bom amigo do Presidente Lincoln conseguiu obter um depósito em um campo militar para hospedar as coleções que haviam sido salvas. O presidente também forneceu um destacamento de soldados para auxiliar nos trabalhos de limpeza, remoção de detritos e reconstrução do Museu. Sob a liderança do General Montgomery Meigs, soldados trabalharam dia e noite para recolocar o telhado em apenas três dias - uma verdadeira façanha!
Eventualmente o prédio foi reconstruído, com apoio do governo e do setor privado. Muitas famílias tradicionais e abastadas da Costa Leste se empenharam em oferecer doações na forma de dinheiro ou novas coleções de arte e artefatos para substituir o que foi perdido.
O ideal propagado era que o Smithsonian pudesse se reerguer e sobreviver às dificuldades pela qual passasse. E de fato, a despeito de incêndios, enchentes, tufões, tempestades, guerras e problemas, o Museu Smithsonian continuou existindo e ampliando sua importância até se tornar o que é hoje: uma das maiores e mais respeitadas Instituições do mundo.
O Museu Smithsonian hoje |
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É, eu sei...
Está muito recente e pode parecer absurdo comparar ou esperar um desfecho semelhante para a nossa realidade.
Os mais pessimistas dirão que nós não temos o mesmo comprometimento ou interesse sedimentados em nossa cultura. Dirão também que falta dinheiro, vontade do governo e interesse popular em levar tal coisa à cabo. Além de tudo, temos assuntos mais importantes a tratar, como Saúde, Segurança, Educação...
Provavelmente não estarão totalmente errados.
Mas é preciso ao menos buscar alguma luz no final desse túnel.
Se uma coisa a Ciência Natural sobre a qual o Museu Nacional dedicava sua existência nos ensinou, é que, a Natureza trabalha em ciclos. E em ciclos estão contidos os extremos de Luz e Trevas, Vida e Morte, e claro, Destruição e Reconstrução.
É bem verdade que tesouros inestimáveis se foram. Não há como repor essas coisas e quem diz o contrário, está se enganando ou não passa de um idiota. Artefatos insubstituíveis que ensinavam a respeito do nosso Passado e serviam para entender o Presente, se perderam. Eles não poderão mais ser usados como um espelho para nosso Futuro. Não há como negar a aspereza das palavras: Nosso legado foi seriamente abalado.
Mas ainda estamos aqui e continuaremos aqui. Talvez nosso papel não seja o de dar continuidade ao Legado, mas começar um novo.
Piegas? Ufanista? Delirante? Pode ser tudo isso e muito mais... desde ontem tenho me sentindo bastante triste e desanimado.
Mas se a gente não começar achando que pode, nem começar a gente vai.
ótimo texto,é como disse,se não podemos repor o que se perdeu então ao menos podemos colocar algo novo,e dessa vez tomar medidas para que isso nunca mais venha a acontecer.
ResponderExcluirComo sempre um ótimo texto. Mas eu sou dos que apoiam deixar o Museu Nacional como está, como uma exibição de nosso fracasso e para que nenhuma outra tragedia do gênero se repita.
ResponderExcluirLuciano, Já acompanho seu blog há tempos e só tenho de concordar com você. É possível sim reconstruir o museu. Moro no Rio e sei da falta que ele já faz.
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