por Alex Lucard
Die Hard Game FAN
In Strange Aeons (Em Estranhas Eras) mistura um dos meus jogos contemporâneos favoritos, Numenera, com meu jogo favorito em todos os tempos, Call of Cthulhu.
Die Hard Game FAN
In Strange Aeons (Em Estranhas Eras) mistura um dos meus jogos contemporâneos favoritos, Numenera, com meu jogo favorito em todos os tempos, Call of Cthulhu.
É claro, em se tratando dos Mythos de Cthulhu e da maneira que você está narrando Numenéra tal combinação nem parece tão improvável. Afinal de contas, os dois jogos são em essência a respeito de descoberta e mistério, não combate. Ambos os jogos também possuem personagens continuamente desvendando segredos, desenterrando relíquias de um passado ancestral ou entrando em contato com coisas impossíveis e surpreendentes. No caso de Numenéra, nós temos os cyphers – relíquias tecnológicas dos Oito Mundos anteriores. Em Call of Cthulhu, existem magias, rituais e tecnologia de raças não-humanas, artefatos que permitem viajar mentalmente para outras eras ou invocar seres de imenso poder. Nos dois jogos, os personagens encontram criaturas estranhas, muitas delas difíceis de serem descritas em palavras, porque elas são completamente alienígenas. Em Numenera essas criaturas são formas de vida que surgiram ao longo de milhões de anos ou vieram de lugares distantes. Já em Call of Cthulhu, elas são medonhas monstruosidades de um passado remoto, nascidas quando a humanidade apenas engatinhava.
Quem poderia imaginar que algumas das estranhas criaturas do Mythos, que habitaram a Terra há tantas eras poderiam ainda estar ativas no distante futuro do Nono Mundo. Algumas delas continuam idênticas ao que eram, outras mudaram, sofreram alterações substanciais e mutações que as tornaram ainda mais bizarras e absurdas. Talvez o retorno da humanidade para a Terra seja apenas um experimento dos Fungos de Yuggoth ou as maquinações dos Deuses Antigos. Numenera afinal de contas permite um crossover com praticamente qualquer coisa, inclusive o horror cósmico que por sua vez pode ser acrescentado onde quer que seja ("Just Add Cthulhu", dizia o próprio Monte Cook). Sob esse prisma nem soa tão estranho contemplar a possibilidade de lançar horrores tentaculares em cima dos aventureiros.
In Strange Aeons é um pequeno suplemento com meras dez páginas que conecta as criaturas lovecraftianas e seus temas à ambientação de Numenera. Embora a embalagem seja econômica, ela consegue ser rica em detalhes e vale a leitura.
As primeiras quatro páginas discutem como adicionar os elementos do Mythos ao contexto de Numenéra. Na verdade, nem é tão difícil fazer essa ponte. O Nono Mundo já é rico em coisas incrivelmente estranhas, tecnologia inconcebível, criaturas e lugares igualmente inacessíveis para a compreensão humana. Portanto, não parece que você está misturando as coisas, ao invés disso tudo se encaixa como uma luva. A grande diferença é a maneira como as forças do Mythos afetam os habitantes do Nono Mundo. O Mythos continua absurdo, maligno e corrupto. Mesmo em um mundo de estranhezas ele se destaca como algo radioativo, proibido e perigoso.
Um cypher pode abrir um portão que teleporta os personagens para outras localidades, um artefato do Mythos ao invés disso, abrirá uma passagem através do qual surgirá uma abominação tentacular faminta dos recessos do espaço-tempo. Em Numenéra, um prédio ancestral pode ter sido uma espécie de hospital que guarda uma cura milagrosa para salvar um vilarejo, mas se ele for algo do Mythos é provável que a mesma construção seja um templo cheio de doença e horror. O mais curioso, é que embora o Nono Mundo continue sendo inesperado e algumas vezes assustador, nada nele se compara ao horror do Mythos.
O suplemento dá dicas úteis sobre como narrar estórias em Numenéra com esse twist. Tudo é descrito com uma narrativa reminiscente de um texto lovecraftiano. As coisas são misteriosas e assustadoras na medida certa. Por exemplo, como confiar nos estranhos habitantes de um vilarejo à beira mar que apresentam inquietantes mutações? Como encarar os bizarros ângulos não-euclidianos nas ruínas de uma cidadela abandonada? Uma das coisas mais divertidas é mexer com a paranoia dos jogadores, inserir o Mythos sob um disfarce - como algo tipico de Numenéra, cuja verdadeira natureza só será revelada quando for tarde demais.
Na minha opinião, o mais complicado aspecto da mitologia lovecraftiana a ser combinado com Numenéra envolve a sensação de impotência da humanidade diante de um universo impessoal. Estamos no Nono Mundo, e oito grandes civilizações vieram antes construindo bilhões de anos de história e progresso. Obviamente algumas dessas civilizações se destacaram e deixaram a sua marca no planeta através de realizações inacreditáveis. Nesse contexto, os humanos não são meras formigas diante dos Antigos, eles fizeram algo importante. Além disso, a raça humana teve contato com raças diferentes, seres de estrelas distantes e outras dimensões, e supostamente aprendeu com eles. Como incutir em personagens familiarizados com essas realizações um temor primitivo perante o desconhecido?
A solução oferecida é instigante: talvez cada um dos oito mundos anteriores tenha sido arruinado pelas forças do Mythos. Talvez o despertar dos Antigos constitua um ciclo que marca a destruição de cada civilização. O que acontece quando um explorador de Numenéra descobre que todas as realizações estão fadadas a aniquilação por uma força impossível de ser derrotada? O que acontece quando ele compreende que não importa o que se faça, a espécie humana, está destinada a ser varrida da existência quando o momento chegar, assim como ocorreu com todos os que vieram antes? É um conceito interessante que oferece muito potencial narrativo. Será que os personagens suportarão a verdade sobre a destruição dos outros mundos e a revelação que o Nono Mundo também um dia irá ruir?
Em se tratando de material, esse pequeno suplemento oferece ótimo conteúdo. Ele inclui uma mecânica sobre sanidade, na qual os personagens são afetados perdendo pontos de Intelecto. Há opções para lidar com conceitos de loucura e a gradual insanidade dos personagens. In Strange Aeons oferece também duas novas descrições para personagens (Mad and Doomed/ Louco e Amaldiçoado), que possuem suas própria vantagens, desvantagens, opções para GM Intrusion e Efeitos únicos.
Finalmente temos alguns dos mais famosos monstros lovecraftianos com estatísticas convertidas para o sistema de Numenéra. Lá etão Abissais, A Grande Raça de Yith (que convenhamos é perfeita para Numenéra), os Fungos de Yugoth e até os Shoggoth! Alguns jogadores podem achar criaturas como os abissais pouco assustadoras ainda mais quando comparadas a certos habitantes do Nono Mundo, mas sempre é bom ver uma raça lovecraftiana numa outra roupagem. Além disso, o suplemento fornece conselhos para que o narrador reimagine algumas criaturas sob uma ótica dos Mythos de Cthulhu.
O único porém no suplemento é um apêndice no qual o autor fala das tendências racistas de Lovecraft. Sim, todos sabemos das opiniões infelizes de Lovecraft a respeito de certos tópicos, mas havia a necessidade de falar a respeito disso aqui?
O suplemento exclusivamente no formato PDF pode ser adquirido na página da Monte Cook Games e custa apenas 3 dólares, bem em conta. Fãs de Call of Cthulhu e de Numenéra não terão do que reclamar, já que encontrarão uma perfeita receita para a fusão de dois jogos sensacionais. In Strange Aeons é uma maravilhosa adição ao sistema Numenéra e a prova de que até um pequeno suplemento pode oferecer inúmeras opções.
Para quem perguntou "Nume o que"? Leia a resenha sobre esse fantástico RPG:
Numenéra - parte 1
Numenéra - parte 2
Numenéra - parte 3
Para quem perguntou "Nume o que"? Leia a resenha sobre esse fantástico RPG:
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