Call of Cthulhu foi o primeiro RPG a levar pessoas à insanidade
Por Ed Grabianowski (do site IO 9)
Sem espadas. Sem magos. Apenas humanos comuns, em situações extremamente desesperadoras enquanto tentam desvendar um horror enlouquecedor extraído dos Mitos Lovecraftianos. Essa é a promessa do RPG Call of Cthulhu, e mais de trinta anos após seu lançamento, nós ainda voltamos querendo mais.
Você nem pode imaginar qual o grau de influência de Call of Cthulhu no mundo dos role-playing games de mesa. Lançado pela primeira vez em 1981 pela Editora Chaosium, o jogo passou por sete edições e inspirou uma horda de variações e homenagens. Ele pegou a fantasia heroica de Dungeons & Dragons e a subverteu, tornando investigação o foco de cada aventura ao invés de combate, usando humanos completamente ineptos para enfrentar ameaças, e garantindo que ao invés de uma longa campanha onde eventualmente você se tornará um poderoso mago ou um cavaleiro, você acabe morto ou totalmente insano. Essa noite. E novamente semana que vem.
Call of Cthulhu lançou para longe o conceito de classes de personagens, indo ao encontro de um menu de habilidades baseadas na ocupação profissional do personagem, o que permite construir facilmente qualquer tipo de pessoa que você queira interpretar no jogo. As regras simples, baseadas no sistema da Chaosium, o Basic Role-Playing (BRP), permite adaptar o jogo para várias épocas e ambientações — o livro básico apresenta algumas opções, e outros livros acrescentam períodos para enlouquecer seus jogadores ao longo das eras. E embora cada uma das sete edições tenha sido lançada com o objetivo de manter "novos lançamentos" nas prateleiras (E quem pode culpá-los? O mercado editorial não é fácil), cada edição é completamente compatível com a anterior. Eles fizeram alguns ajustes e acrescentaram umas poucas regras, mas as regras básicas ainda estão ali. O cenário introdutório, "The Haunting," apareceu em todas edições com pequenas alterações, quase imperceptíveis.
Você pode dar uma olhada nas regras do jogo aqui: Regras gratuitas de Call of Cthulhu (em inglês).
Outra grande inovação de Call of Cthulhu são os player handouts (aqui no Brasil chamados de Recursos) para as aventuras. Recortes de artigos jornalísticos, caixas de fósforo, anotações em cadernos, e outras pistas tangíveis acompanham a maioria das aventuras publicadas, incluindo Masks of Nyarlathotep, considerada por muitos a melhor campanha de RPG em todos os tempos. Existe até mesmo um Financiamento Coletivo para a criação de props com qualidade de filme para os handouts dessa campanha (Veja aqui) iniciado ano passado (um que eu perdi, para meu profundo e duradouro arrependimento).
É claro, isso não significa que Call of Cthulhu não tenha seus defeitos. O sistema de combate do Basic Role-Playing pode ser terrivelmente chato, com os personagens parados tentando por horas acertar uns aos outros e errando todas as tentativas. As investigações podem chegar a um beco sem saída se uma pista essencial não for descoberta, o que pode depender de um rolamento bem sucedido, em uma habilidade que nenhum jogador possui. Inúmeras soluções para esses problemas foram sugeridas ao longo dos anos (o sistema GUMSHOE utilizado em Rastro de Cthulhu e Night's Black Agents é um dos meus favoritos), e de muitas maneiras, estes consertaram os problemas e modernizaram Call of Cthulhu até a sua sétima edição.
Minha lembrança favorita de Call of Cthulhu foi ter esbarrado quase sem querer durante uma GenCon (Nota da Tradução (NT) - Convenção anual americana sobre RPG) em um grupo que estava jogando uma aventura não publicada chamada "Black Cow's Milk," (NT - Leite de Vaca Preta) se passando durante o Período da Reconstrução (logo após a Guerra Civil americana). O profundo mistério, a crescente aura de horror, e o clímax absolutamente grotesco ficaram comigo por anos. Os props com fotografias mostrando os enfraquecidos soldados feitos prisioneiros, adicionaram muito a essa experiência e acabaram me fisgando para sempre.
Entrevista com Sandy Petersen
Como esse jogo clássico foi criado? Eu conversei com Sandy Petersen, criador do sistema clássico de Call of Cthulhu em 1981, sobre isso e sobre seus futuros projetos.
io9: Call of Cthulhu foi baseado no Basic Role-Playing System (BRP) que a Chaosium havia desenvolvido, mas o que você criou tem uma diferença significativa do sistema original. Como foi adaptar um sistema para funcionar ao tema e ambientação tipicamente Lovecraftiano?
Sandy Petersen: Bem, adaptar o sistema fez muito bem ao jogo – em um jogo de horror eu penso que nos aproximar dos jogadores é essencial, ao invés de distanciá-los com muitas regras. A grande vantagem do sistema de regras do Basic Role-Playing é que ele é em essência muito transparente. Você possui habilidades e tem que fazer rolamentos de dados, pronto. Isso faz com que os jogadores enxerguem além das regras, e os lança direto na ação.
Call of Cthulhu foi responsávelpor muitas coisas inovadoras, mas na minha opinião a maior de todas foi redefinir o que é Role-playing (interpretação) para que a investigação se torne o centro da aventura. Você poderia falar um pouco a respeito desse aspecto e como foi fazer isso funcionar dentro de uma mecânica de regras?
Petersen: A maioria dos jogos até então eram voltados a um estilo mais centrado no combate. As aventuras giravam em torno de uma série de combates. No gênero horror, o mais fraco dos monstros é provavelmente um cultista, que é por definição, equivalente ao investigador (uma vez que os dois são humanos). Uma coisa como um lobisomem ou um fantasma é aterrorizante a ponto de todo um romance ou filme versar a respeito de suas ações.
Me parecia óbvio desde o início que Call of Cthulhu precisava de um foco diferente, algo além do combate, então eu investi na parte investigativa, que também se encaixa nas estórias e personagens criados por Lovecraft. Eu basicamente substitui combates heroicos por investigação e pela pesquisa para revelar segredos.
Na sua opinião, qual a chave do sucesso para uma sessão de Cthulhu?
Petersen: Sensibilidade com aquilo que os jogadores estão experimentando, e flexibilidade para se adaptar. Você deve reservar o momento de horror para o instante certo, quando os jogadores estiverem realmente se sentindo assustados. Você não deve forçar o temor a eles, isso tem que vir espontaneamente.
Eu tenho uma teoria de que o RPG Call of Cthulhu é um dos principais responsáveis por manter a obra de Lovecraft tão popular para as audiências modernas, mas talvez você tenha uma outra interpretação do fenômeno. Existem outros elementos em ação perpetuando essa "Cthulhu-mania"?
Petersen: No H. P. Lovecraft Film Festival (NT - Evento anual que reúne fãs de H.P. Lovecraft), os organizadores disseram que a popularidade de Lovecraft hoje em dia se baseia em dois fatores, ambos surgidos na mesma época, o início dos anos 1980: um deles é o RPG Call of Cthulhu, e o outro os filmes de Stuart Gordon (NT - Diretor de adaptações de contos escritos por Lovecraft como Reanimator e From Beyond). Eu penso em um outro fator, embora talvez menos visto, que é o surgimento de críticos literários dedicados ao trabalho de Lovecraft, liderados por S. T. Joshi (NT - Um dos maiores especialistas na obra de Lovecraft e autor de vários livros e biografias sobre o autor). Essas três coisas aconteceram simultaneamente. Antes de 1980, Lovecraft era muito obscuro. Quando eu estava crescendo, todas as pessoas que eu conheci que leram Lovecraft, o fizeram porque eu lhes indiquei. Eu os apresentei a Lovecraft. Eu nunca conheci alguém que tivesse feito isso por conta própria.
Você se afastou dos jogos de RPG por alguns anos, deixando sua marca entre os fãs de video-games, recentemente você resolveu retornar aos jogos de mesa através de Cthulhu Wars, Theomachy, e mais recentemente através do Kickstarter do jogo de tabuleiro Orcs Must Die. Como um jogo de defesa da torre como Orcs Must Die! pode ser traduzido para o mundo dos jogos de tabuleiro?
Petersen: Orcs Must Die! no formato de jogo de tabuleiro é uma espécie de combinação entre defesa de torre (colocar armadilhas à medida que os inimigos avançam) e jogo de batalha, no qual você envia seu herói para o combate. Meu desafio foi acelerar o jogo e torná-lo divertido, não apenas no modo cooperativo, mas como um jogo de time, no qual dois grupos defendem simultaneamente sua própria fortaleza dos inimigos.
Qual são os seus próximos projetos em perspectiva?
Petersen: Nós temos o restante do jogo de tabuleiro Cthulhu Wars saindo esse verão para os financiadores e é claro, chegando às prateleiras, e nesse outono, nós estamos lançando o projeto Gods War (NT - Guerra dos Deuses), que é baseado no antigo mundo de Glorantha (NT - uma ambientação ainda mais antiga do que Call of Cthulhu lançada pela Chaosium).
Você pode nos dar alguns detalhes a respeito de Guerra dos Deuses (além do conceito da arte vista aqui)? Eu sei que muitos fãs de RPG estão interessados.
Petersen: Ele é baseado no mesmo sistema de regras de Cthulhu Wars, trata-se de um jogo muito ágil, assimétrico permitindo a interação de vários jogadores. Ele tem lugar durante o mito da criação do mundo - o mapa no tabuleiro muda a medida que a luta entre os deuses faz com que ele seja arrasado e nivelado. Os jogadores constroem templos, capelas, zigurates, e outras estruturas, e os jogadores precisam enviar as suas tropas para lutar no Céu e no Inferno, ainda que a maior parte do jogo se passe no mundo real. As místicas Runas de Glorantha tem um papel chave na trama do jogo.
Raios. Escrevi uma rant e o sistema de comentários so aceita 4,096 caractéres. :(
ResponderExcluirOh bem. Neste caso só posso de dizer que não concordo com o que escreveu neste poste e apontar que o muito do que disse sobre Call of Cthulhu, especialmente nas comparações com GUMSHOE, são apenas mentiras.
É pena que estas concepções falsas sobre CoC continuem apesar de tanto tempo passado. Ainda para mais em gente que tem um blogue dedicado ao jogo. Isto é um anti-serviço para com novatos que possam estar interessados em RPGs "cthulhoides".
Tente fazer melhor da próxima vez. Verifique os seus factos e não confuda a sua opinião subjectiva our rumores de terceiros com eles.
E parabéns pelo blogue. E desculpe a minha primeira postagem aqui ser um puxão de orelhas, ok? :)
Peraí, não entendi. Acho que não ficou muito claro Vargr...
ResponderExcluirO artigo é uma tradução de um artigo originalmente publicado pelo site I09, mesmo assim qual o "anti-serviço que ele presta aos novatos interessados em RPGs Cthulhoides"?
A opinião do autor (Ed Grabianowski) sobre o jogo e a respeito do GUNSHOE são apenas isso, opiniões pessoais, que ele pode exercer sem problema, quanto mais se feitas de maneira educada e embasada. Não acho que o autor foi tendencioso, mesmo porque sua postagem foi bastante elogiosa quanto ao sistema e ambientação. De fato, ele fez muito mais elogios do que críticas e se mostrou um tremendo entusiasta do jogo. Dá mais uma lida n artigo e você vai perceber isso.
Quanto ao puxão de orelha, fique à vontade, mas eu prefiro receber quando tiver culpa no cartório. :)
Peço desculpa. Não me tinha apercebido que era uma tradução. Quem merece o puxão de orelhas é o Ed Grabianowski e não você. :) Não ficou claro pq, como disse, aqui não tem espaço para explicar em detalhe.
ExcluirOpiniões pessoais ou modo educado de escrever não tem nada ver com o que estou a falar. É ao contento que me estava a referrir. O Ed G. tem direiro ás opiniões que quiser, mas não tem o direito de as passar como factos, especialmente quando eles são falsos. O "anti-serviço" do artigo para iniciantes é que cria uma imagem falsa sobre dois jogos, um para pior o outro para melhor.
Se quiser posso escrever o texto outra vez. Pego no que o Ed. G. disse e refuto o que não concordo a que me referi. Só que não vai caber aqui só num poste, mas já que transcreve artigos de terceiros pró site...
Ah, e um detalhe. O que não concordo sobre o que o Ed Grabianowski escreveu não se limita ao tema Call/Trail. Existem várias coisas que ele disse sobre o jogo de Call of Cthulhu em si que pura e simplesmente não são verdade. São falsas e exageradas a tal ponto que me levam a desconfiar que o Ed não conhece o jogo de modo algum tão bem como nos quer dar a entender.
ExcluirAté o título do artigo é problemático. Nunca li um "Tributo" a um jogo que tivesse tanta falsidade e que o arraste pela lama como este. E já li críticas negativas a RPGs que se limitam aos factos e verdade mais do que este.
li recente o chamado de cthulhu rpg, e pra mim isso que o ed fala dos defeitos das regras é mais como alguns jogadores jogam do que um problema das regras em si se ler o d&d a principio o combate tbm parece ser "só ficar parado atacando" se o mestre nao faz os inimigos se "mexerem" no combate os jogadores nao farão com os investigadores.
ResponderExcluirquanto as outras falhas que ele menciona creio uma parte do livro sendo dedicada a " como conduzir um jogo de horror/investigação" sanaria esse problemas.
Exactamente cavaleiro andante.
ExcluirO Ed afirma que o *jogo* tem problemas que não existem e depois apresenta Trail como uma "solução". Isso é um dos pontos que não gosto no artigo, e como disse cria uma impressão errada em pessoas que o leiam e não estejam informadas.
Quanto a conselhos de condução de jogo o manual de CoC já está pejado deles. De facto ocupam uma grande parte do livro e se você acreditar algumas pessoas até se queixam disso e dizem que queriam era mais regras, listas, etc. Agradar a gregos e troianos é difícil.
A edição Brasileira é uma cópia da 6ª, que já tem uns belos anos. Não sei se na 7ª, a mais recente no original Inglês, a parte de conselhos de jogo foi revisada ou expandida mas apostaria que sim. Contudo, não existe mecânica de sistema ou conselho no livro que cure a estupidez pessoal. CoC ou Trail ou D&D, vai sempre haver gente que pura e simplesmente não vai ser capaz de "grocar" o jogo, e tolos que ao presenciarem isso culpam o jogo e acusam-no de falhas.
sim, tem bastante conteúdo para mestres/guardiões, e realmente nao dá pra agradar a todos. d&d precisa de um livro inteiro pra ensinar a ser um Dungeon Master. wod tem seus "chroniclers guides"
Excluiraliais o que é "grocar" ???