Existe uma lenda muito estranha contada há gerações em Woolpit. A estória teria surgido em algum momento do século XII e desde aquela época sofreu alterações, mantendo contudo a sua base e a estrutura central.
A lenda relata o misterioso aparecimento de duas crianças; uma menina e um menino, que tinham a pele marcada por uma incomum tonalidade esverdeada. Elas falavam um idioma estranho, mas eventualmente uma pessoa do vilarejo conseguir compreender o que elas diziam e traduziu suas confusas palavras. As crianças afirmavam ter vindo de um lugar mágico chamada Terra de St. Martin onde os habitantes tinham a tez naturalmente esmeralda. Segundo as crianças St. Martin se localizava no céu, sendo uma ilha flutuante onde sempre era dia e no qual o sol sempre brilhava. Na ilha existia uma única cidade, mas seus habitantes viviam em habitações subterrâneas alimentando-se exclusivamente de sementes verdes e da luz do sol.
Embora a lenda seja normalmente relevada ao reino do mito e folclore, é possível haver algo mais nessa inocente estória?
De acordo com o mito, as duas crianças permaneceram em Woolpit e foram batizadas pelos habitantes locais, que as adotaram. As crianças se tornaram uma espécie de atração e todos queriam conhecê-las e hospedá-las. Elas ficaram em Woolpit por várias semanas, sob os cuidados de um renomado dono de terras Sir Richard Calne, até que o menino adoeceu e morreu de uma moléstia desconhecida. A menina, no entanto, sobreviveu e passou a ser chamada de Agnes. Com o tempo, a cor esverdeada foi desaparecendo até sumir por completo, quando ela chegou a adolescência. Agnes teria continuado a viver no vilarejo, casou com um rapaz local que mais tarde se tornou embaixador de Henrique II. Ela teve quatro filhos, todas crianças nasceram com a coloração incomum, mas esta desapareceu poucos dias depois.
A estória foi encarada como uma simples fábula de contos de fada, com crianças vindas de uma terra mágica e flutuante. O típico background de um reino mítico e de faz de conta. Existem, no entanto, aqueles que acreditam em algo mais estranho e afirmam que as crianças verdes seriam ou alienígenas ou híbridos resultantes da mistura entre humanos e uma raça de seres extraterrestres. Na Idade Média, as pessoas não teriam capacidade de compreender a verdadeira origem das crianças e seria mais fácil criar uma alegoria para explicar de onde elas teriam vindo, daí o surgimento de St. Martin, uma terra que flutuava no espaço onde era sempre dia - talvez a descrição de uma estação orbital alinhada com a face do sol.
Os defensores dessa contestada teoria sugerem que as crianças teriam sido deixadas acidentalmente no planeta ou enviadas para colher informações sobre a vida dos habitantes. Alguns documentos encontrados por estudiosos citam que as crianças não apenas desconheciam o idioma, mas eram absolutamente ignorantes dos costumes e tradições mais simples. Não conheciam sequer o nome de comidas ou o gosto de frutas. Desconheciam também muitos objetos de uso diário e não faziam nenhuma ideia dos costumes religiosos amplamente praticados em toda região. Há um documento datado do século XIV redigido pelo monge William of Newburgh, um conhecido historiador medieval que viveu em Yorkshire. Ele que menciona a lenda das crianças verdes e fala dos jovens tendo descido dos céus em uma espécie de "barril metálico" que veio do céu. O tal barril (uma espaço-nave?) teria sido guardado na sacristia da Igreja de Woolpit, mas um dia o objeto simplesmente desapareceu.
Outra fonte para a lenda é reputada a Ralph of Coggeshall (que morreu em 1228), e que foi o abade chefe do Monastério de Essex entre 1207 e 1218. Em seus documentos, Coggeshall cita a lenda como um acontecimento real investigado por enviqados reais que se impressionaram não apenas com as declarações do bom povo de Woolpit - que juramentaram a narrativa dos fatos, mas por terem conhecido pessoalmente as crianças e atestado que elas eram incrivelmente inteligentes e prendadas. Segundo Coggeshall, a menina, posteriormente batizada de Berta (e não Agnes) aprendeu a falar o idioma inglês apenas ouvindo as pessoas ao seu redor. Berta tinha tamanha faciliadde para idiomas que aprendeu latim e francês em poucas semanas.
O mais curioso a respeito desse registro feito pelo abade é que ele foi incluído na Chronicon Anglicanum (A Crônica Britânica) um volume escrito sob ordens do Rei Stephen para conter toda a história das Ilhas Britânicas. Na época o Rei advertiu os autores de que superstição e crendices deveriam ficar de fora desse trabalho, já que ele deveria se concentrar exclusivamente em fatos e aconteciemtnos ligados a história britânica. Apesar da ordem real, o livro continha muitos trechos curiosos incluíndo o relato de avistamento de dragões, visitas ao reino dos elfos e sequestros orquestrados pelo temido povo fada.
A explicação mais razoável para o mistério pode ser também a mais simples.
Médicos contemporâneos sugerem que as crianças podiam sofrer de uma rara condição chamada Hypochromic Anemia, causada por uma dieta muito pobre em certos nutrientes e o consumo determinante de certas substâncias. Essa síndrome atinge as células vermelhas do sangue fazendo com que a pele assuma uma coloração esverdeada clara. A doença era conhecida até o século XVIII por um nome característico: Chlorosis. O termo formulado no início de 1600 pelo Professor de Medicina, Jean Varandal se referia diretamente a coloração verde-amarelada da pele das pessoas sofrendo do mal - a palavra Chloris significa esverdeado em grego. [E é o nome do elemento Cloro, que na natureza é verde amarelado]
Seria perfeitamente compreensível que as crianças de Woolpit fossem órfãos ou simplesmente tivessem sido abandonadas pelos seus pais e forçadas a sobreviver nas florestas dessa região selvagem. Na Idade Média o abandono de crianças em florestas era uma prática muito comum, sobretudo em épocas de grande privação, gerando seca ou fome. As crianças teriam vivido em condições bastante insalubres, sendo obrigadas a habitar cavernas no subsolo e sair apenas quando o sol estava alto, criando assim a crença em uma terra onde sempre era dia.
Há rumores que o idioma usado pelas crianças fosse algo semelhante ao flamenco, idioma usado pelos povos que viviam na atual Bélgica. Na época em que as crianças apareceram, inúmeros mercenários vindos das Terras de Flandres lutaram nas guerras britânicas. Muitos desses mercenários traziam consigo suas próprias famílias, mulheres e crianças que os seguiam onde fosse necessário. É possível que as crianças verdes fossem órfãos de uma dessas famílias que acabaram se perdendo em uma das majestosas florestas do interior da Grã-Bretanha. Para aumentar ainda mais as suspeitas dessa possibilidade, muitos desses mercenários que vieram combater, eram naturais de St. Martell, um nome incrivelmente próximo de St. Martin, a suposta terra mágica de onde as crianças verdes alegavam ter vindo.
Antropólogos que se dedicaram a estudar a lenda defendem que as crianças verdes poderiam ser um fenômeno de "crianças selvagens", tendo crescido nos recônditos florestais sem a supervisão ou proximidade de um adulto, desenvolvendo suas próprias regras e noções de sobrevivência. Encontradas próximas a cidades, essas crianças muitas vezes são incapazes de compreender as noções básicas da vida em sociedade e tendem a encontrar dificuldades para se adaptar. O aparecimento de crianças selvagens em várias partes do mundo - inclusive na Grã-Bretanha, é um acontecimento conhecido e analisado por especialistas em comportamento social.
Há ainda uma outra possibilidade, a de que, embora a estória esteja presente em duas fontes, não passasse de uma invenção dos cronistas da época. Sabe-se que embora os historiadores britânicos do período fossem surpreendentemente corretos ao descrever acontecimentos políticos e religiosos, também escreviam sobre eventos claramente absurdos.
Para aumentar ainda mais a estranheza da estória, eis aqui um detalhe final que torna a fábula ainda mais sensacional. No século XVI, um estudioso britânico que vivia em Suffolk e atendia pelo nome de Mark de Cloister, um alegado discípulo do Dr. John Dee, escreveu um tratado a respeito de acontecimentos trágicos e previsões obtidas por intermédio da astrologia e da comunicação com anjos - ou seja, ciência legítima para a época!
Cloister escreveu em seu tratado intitulado "Previsões para uma Era Tumultuada" que a Britânia e de fato, todo o mundo estaria próximo de entrar em um tempo de grande agitação política, culminando em guerras, genocídio e tragédias. O estudioso disse que o prenúncio dessa Era de Agitação ("A Time of Troubles") seria o surgimento de duas crianças gêmeas que seriam encontradas em uma floresta britânica. Essas crianças poderiam ser reconhecidas por ter a pele esverdeada "como as crianças surgidas no vilarejo de Woolpit durante a regência do Rei Stephen".
Ia além em suas previsões fantásticas, dizia que a aparição dessas notáveis crianças verdes predataria uma Invasão da Britânia por povos vindos das Terras do Norte, que teriam os cabelos claros e uma predisposição belicista. Estes conquistadores estariam dispostos a cruzar o Canal Inglês e marchar sobre as cidades britânicas incendiando todas aquelas que resistissem a sua investida. Por fim, a Inglaterra inteira arderia em ruínas.
Agora o mais fantástico: sabendo da lenda e de suas implicações como Propaganda de Guerra, os Nazistas usaram a estória das Crianças Verdes de Cloister para justificar uma vitória esmagadora sobre a Grã-Bretanha durante a Segunda Guerra. Supostamente existiriam arquivos nos quais o Alto Comando Alemão conduziu investigações sobre o surgimento de crianças com a pele esverdeada na Inglaterra no início dos anos 1940, pouco antes da Guerra ser declarada. O Projeto era chamado Operação Grün Kinder. Sabendo do interesse dos Nazistas em lendas e crenças medievais, o rumor não é totalmente absurdo.
Seja como for, nenhuma "criança verde" foi encontrada em território britânico desde o século XII.
E desde então, para todos os efeitos, as Ilhas não foram invadidas por nenhum inimigo.
boa história
ResponderExcluirInteressante.
ResponderExcluirExistem muitas estórias que julgamos fábulas mas q de fato são reais, e acima de tudo nem tudo que relegamos ao campo da ficção de fato é fantasia.
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