terça-feira, 11 de julho de 2017

"Grande como uma Ilha" - Monstros Marinhos da Mitologia Escandinava


"O maior e mais terrível monstro dos mares"

Era dessa forma que um documento náutico redigido no século XII tratava do avistamento de uma criatura lendária para os povos do norte da Europa.

A criatura presente no folclore da Escandinávia é conhecida como Kraken, uma besta que habita as profundezas insondáveis e gélidas do mar. Ele é definitivamente um monstro marinho, ainda que não uma serpente, uma baleia de proporções colossais ou um peixe gigantesco como a maioria dos monstros marinhos são descritos. O Kraken era um monstro diferente que tomava emprestado a forma de criaturas bizarras.

De muitas formas, o Kraken das lendas parecia o resultado da combinação de um polvo gigante e de uma lula de dimensões inacreditáveis. Certamente que ambos os animais são capazes de crescer até proporções assustadoras, atingindo comprimentos tentaculares que podem chegar a mais de 12 metros (40  pés). O Kraken das lendas, entretanto, era maior, muito maior. Ele superava as maiores lulas e octopus encontrados nos oceanos da Terra. Se levarmos em conta as narrativas épicas sobre avistamentos do monstro, estaríamos falando do maior animal do planeta. As lendas à respeito da criatura, dão conta de que seus tentáculos poderiam atingir incríveis 80 metros de comprimento total. Os olhos vítreos da besta teriam nada menos do que um metro de diâmetro e sua boca poderia engolir um homem adulto de uma única vez. 


O Kraken dos mitos seria capaz de puxar embarcações para as profundezas, afundar grandes barcos afogando as tripulações em acessos de fúria incontroláveis. Sim, o Kraken era descrito como algo a ser temido. Entre as muitas narrativas existentes algumas dão conta de incríveis façanhas que eles poderiam realizar com seu tamanho e força titânicas.

O mero rugido do Kraken seria capaz de estourar os tímpanos dos marinheiros se produzido a menos de 100 metros deles. Um agitar de seus tentáculos poderia criar ondas gigantes, com mais de 15 metros que viravam embarcações. O aperto dos pseudópodes, grossos como troncos de árvores, era capaz de despedaçar barcos à remo como se fossem gravetos. Suas ventosas quando se fixavam em uma pessoa jamais soltavam, e se elas se prendessem na face de um pobre coitado, arrancavam seu rosto por inteiro. Ainda segundo as narrativas, a carne da criatura era tão grossa que arpão algum a penetrava. E mesmo as maiores baleias fugiam da fera quando ela saia à caça. Faminto, o Kraken era uma verdadeira força da natureza. Nada podia pará-lo, nada poderia detê-lo.

Mas, se levarmos em conta todas as lendas da mitologia da Escandinávia, o Kraken pode não ser o maior monstro marinho.


Uma das narrativas náuticas mais famosas é creditada a Orvar-Oddr, um renomado herói Escandinavo, cujas aventuras fazem parte de um crônica redigida em 1200. Ela contém algumas das descrições mais fantásticas sobre criaturas marinhas. Muitos historiadores e especialistas em folclore nórdico acreditam que ele se refere ao mito do Kraken, mas elas abrem espaço para interpretações..

O texto, em um trecho, afirma o seguinte:

"Vou contar a vocês sobre dois tipos de monstros marinhos que habitam as águas gélidas. Um deles é chamado Hafgufa (névoa marinha) e outro é o Lyngbakr (costas de urze). Ele (o lyngbakr) é a maior baleia do mundo, já o hafgufa é o mais perigoso monstro do mar. É da natureza dessa criatura engolir barcos e homens, e até mesmo baleias por inteiro, se elas estiverem ao seu alcance. Ele fica submerso por dias, e quando vêm à superfície parte a água apenas o suficiente para que seu enorme nariz em forma de bico apareça do lado de fora. A criatura aguarda até a mudança das correntes e então mergulha uma vez mais. Se durante o tempo em que ele está respirando um barco o atrair, tudo estará perdido para esses marinheiros. O monstro capta o cheiro dos homens e dá início à sua caçada que termina geralmente em naufrágio"



Ele continua mais adiante:


"O Hafgufa possui enormes bracos (tentáculos) que são compridos como pontes e mais grossos do que qualquer corda jamais fiada. Ele agarra os membros dos homens e os puxa com força lançando-os ao mar. Quando surgem na superfície eles se agarram em qualquer coisa e as puxam para o fundo na expectativa de ser comida. Homem ou barco, pouco importa, o abraço da Hargufa é a perdição".

A descrição parece bastante adequada à lenda do Kraken se consideramos que os braços da Hafgufa seriam tentáculos, mas mesmo o Kraken com seu tamanho parece tímido diante dessas criaturas gigantescas. 

A respeito do lyngbakr, o marinheiro relata:

"Os lyngbakr são as ilhas que desaparecem misteriosamente afundando de uma hora para outra. Todo homem do mar já viu uma ilha desaparecer, mas a maioria não tem explicação para tal coisa. A explicação é uma só, o lyngbakr vem à superfície e dorme com parte de seu dorso para fora. Por muito tempo, a criatura fica imóvel e nesse tempo, a "ilha" é coberta de terra e até mesmo vegetação - as urzes nas costas do monstro que dão nome a ele são as plantas que se fixam com mais facilidade. Se tempo suficiente passar, até montes se erguem nas suas costas. Ignorando a origem da ilha, e até mesmo que se trata de um ser vivo, pessoas passam a habitar a superfície das costas da imensa baleia, sem saber do que se trata. Não há nada que um homem possa fazer para perturbar o sono de um lyngbakr e este pode dormir por séculos. Algumas vezes no entanto, aqueles que moram em tais ilhas sentem o chão estremecer e se mover sob seus pés como se o solo fosse acometido por tremores. Nada mais são do que os espasmos do monstro. E quando ele desperta, tudo aquilo que está sobre ele, sejam casas ou pessoas, acaba sendo arrastado para o fundo quando ele mergulha".


Um documento do século XVI, o lendário Konungs skuggsja, que pode ser traduzido como "O Espelho do Rei" (sobre o qual já falamos aqui no blog - Leia no Link) descreve a Hafgufa como algo muito grande: 

"Existe um monstro que permanece um mistério, e que só é mencionado quando se fala de seu tamanho que para a maioria das pessoas é inacreditável. Apenas alguns poucos podem falar a respeito dele com autoridade, pois são raros os indivíduos que o vêem e sobrevivem. Tal monstro não aparece perto da costa onde os pescadores lançam suas redes, mas em águas profundas. Não se sabe quantos deles existem, provavelmente não mais do que um ou dois em toda extensão marítima. O nome deles em nosso idioma é Hafgufa. A criatura vista da superfície mais parece uma ilha do que um animal. Dizem que é possível desembarcar e andar sobre ele por horas sem chegar ao outro lado. Quando ele está dormindo é inofensivo, permanece imóvel por dias, mas quando desperto é mortal pois se alimenta de tudo que consegue alcançar".

O mesmo livro descreve os horríveis hábitos alimentares da Hafgufa:

"É dito que faz parte da natureza desses monstros empregar estratégias para atrair presas. O Hafgufa costuma vir à superfície esticando sua bocarra para fora e soltando um sonoro arroto. Este libera na superfície uma quantidade de peixe semi-digerido que fica boiando acima dele, o que atrai cardumes inteiros, grandes e pequenos, interessados em se alimentar. Mesmo homens em barcos de pesca são atraídos pela fartura de pesca. Mas estes não sabem o perigo que correm. O monstro mantém sua bocarra aberta e quando sobre ela estão presas suficientes, ele simplesmente as puxa, engolindo tudo para seu interior. Assim que o estômago está cheio, a Hafgufa fecha suas presas e mergulha".


Além desses relatos, existe uma terceira fonte escrita pelo marinheiro sueco Jacob Wallenberg. Seu livro, Min son på galejan (que pode ser traduzido como "Meu filho nos baleeiros"), publicado em 1750, tenta diferenciar o Kraken e outros monstros marinhos:

"O Kraken das lendas é um animal mortal. Ele se mantém no fundo do oceano, cercado de cardumes que servem de comida e são alimentados pelo seu excremento em contrapartida. O Kraken não precisa respirar, vindo à superfície quando atraído pela presença de comida. Nesse caso, pode atacar embarcações e devorar homens depois que os barcos são feitos em pedaços pela sua investida. Seus tentáculos são letais, podendo agarra e puxar as presas para sua boca".

Contudo, Wallenberg deixa claro que existem "peixes maiores nesses mares":

"Há animais que superam o Kraken em tamanho atingindo as dimensões de pequenas ilhas, atóis e fjordes. São tão grandes que em suas costas cresce um ambiente propício a ser usado como moradia por seres humanos e toda sorte de animais terrestres. Árvores e terra seca pode surgir no dorso desses seres e até pequenos montes. Não há dúvidas de que esses são os Leviatãs".

Hoje em dia, avistamentos e histórias a respeito de Krakens e outros monstros marinhos gigantescos são bastante raras, quase inexistentes. Isso sugere duas possibilidades: Esses monstros imensos não existem e jamais existiram, ou eles se tornaram extintos séculos atrás. 

Seja qual for a verdade, a lenda persiste e continuará por muito tempo.

3 comentários:

  1. Bacana King!! Essas historias de monstros marinhos são sempre boas! Se puder falar de Atlântida em outra oportunidade seria show. Sou fã do blog 👊

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  2. Opa Maurício, já falamos a respeito de Atlântida aqui no Mundo Tentacular, dá uma olhada nesses dois artigos:

    http://mundotentacular.blogspot.com.br/2011/07/atlantida-dos-mythos-de-cthulhu.html

    http://mundotentacular.blogspot.com.br/2014/08/continentes-miticos-mu-lemuria-e.html

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  3. Olá! Boa noite! Poderia me indicar em qual trecho (ou sequer página) do texto original diz que o Hafgufa possui "braços"? Eu procurei em todos os lugares e não achei nenhuma fonte... Se puder me indicar, agradeço! :)

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