terça-feira, 11 de fevereiro de 2020

RPG do Mês: ALIEN RPG - Ambientação e Cenário (Parte 1)


No espaço, ninguém irá ouvir os seus gritos.

Bem, talvez seus amigos sentados ao redor da mesa, ouvirão.

Nessa primeira parte da Resenha, vamos falar de ALIEN RPG, um dos grandes lançamentos do ano passado e uma sensação na GenCon 2019. Mas antes de discorrer sobre o jogo em si, vamos falar um pouco sobre o filme no qual ele se baseia para contextualizar a coisa toda.

Alien é uma das franquias de ficção-científica mais populares e respeitadas de todos os tempos. Quando o primeiro filme Alien (batizado aqui no Brasil com o ótimo subtítulo "O Oitavo Passageiro") foi lançado em 1979, ele imediatamente se tornou um clássico divisor de águas no gênero.

O filme não subestimava a inteligência do público ou tratava questões sobre futuro, tecnologia e niilismo de forma descompromissada. O futuro retratado em Alien estava longe de ser uma space opera empolgante como Star Wars e menos ainda uma ode a um futuro ideal, como Star Trek. Alien tentava ser realista em suas previsões, mesmo as mais obscuras e temerárias.

Alien era pessimista para dizer o mínimo. 

Não havia glória, conquista ou honra no espaço. Nesse futuro negro, a humanidade se lançava no espaço não em nome de sonhos, mas em busca de lucro. A Conquista do Espaço se devia principalmente à ganância de Megacorporações como a Weyland-Yutani, que desejavam explorar uma infindável fonte de riqueza. O espaço é oportunidade e tudo que existe nele, não passa de recursos a serem coletados. Homens e mulheres à serviço das Companhias, muitas vezes mais poderosas que nações, cobiçavam seu lugar ao sol, subindo nos ranks das grandes corporações pisando nos colegas.


Nesse mundo inclemente, vidas humanas são extremamente baratas. Colonos são despachados para planetas terraformados, luas abandonadas ou cinturões de asteroides perdidos no vazio sideral. Estes pioneiros estão lá para ganhar a vida, receber alguns trocados e criar suas famílias. Naves gigantescas cruzam distâncias absurdas carregando tripulações condicionadas a dormir em câmaras de suspensão. Viajam sob os cuidados de Computadores ironicamente chamados de Mãe. Assumindo o papel de caminhoneiros espaciais, eles vagam pelas rotas comerciais, transportando suas cargas valiosas. 

Em mundos inóspitos, tropas de Fuzileiros são incumbidos de limpar ameaças e varrer para baixo do tapete qualquer obstáculo à colonização. Esses soldados testados nas piores condições, atuam nos limites, portando armas destrutivas para cumprir seu sangrento trabalho. Enfrentam piratas, criminosos, desordeiros e coisas piores. "Junte-se aos Fuzileiros e conheça o Universo", é seu slogan.  

Mas nem todos na ambientação são humanos. Escondidos em meio às pessoas normais existem seres artificiais - androides programados para parecerem e se comportarem como humanos ainda que não o sejam. A maioria deles serve lealmente aos seus criadores inescrupulosos, agindo furtivamente, espionando e conspirando em segredo.  

O espaço em Alien é sujo, escuro e perigoso. Impera nele uma carestia extrema, não apenas de comida, bebida e conforto, mas de coisas ainda mais básicas, como ar, gravidade e calor. Em geral as pessoas comuns nunca tem o suficiente e todos disputam as migalhas que caem da mesa dos poderosos. Os restos são disputados com unhas e dentes, nada é dado, tudo precisa ser conquistado.

No Mundo de Alien a humanidade atingiu os confins do universo, esperando que mais cedo ou mais tarde encontrasse alguma forma de vida irmã. Qualquer coisa que provasse que não estamos sozinhos no cosmos. Nada foi achado! Isso criou a incômoda sensação de que realmente não existe nada no vazio infinito. 

Ou será que existe? De forma inesperada o contato com uma forma de vida alienígena foi estabelecido, e o cenário que já era ruim, se torna digno de pesadelos.


O fatídico incidente envolve a tripulação do Cargueiro Nostromo, que em sua viagem para casa responde a um misterioso pedido de socorro e tem sua rota desviada. A tripulação é levada até o pequeno planeta LV-426 na orla exterior da Galáxia. Lá descobrem uma nave alienígena acidentada e dentro dela uma carga inesperada: ovos. Com um dos tripulantes contaminado por um organismo alienígena, a tripulação se vê mergulhada num horror indescritível quando a criatura se revela como um implacável parasita. "Um Organismo quase perfeito" como define o Oficial de Ciências, um ser adaptado para sobreviver, construído para matar e se reproduzir.

Esse primeiro e desastroso contato é apenas o cartão de visitas para ainda mais horror. Décadas mais tarde, o mesmo planeta LV-426 é terraformado e colonizado. Mas quando se perde o contato com as famílias lá alocadas, Fuzileiros Coloniais são mandados para fazer o Resgate. Mais uma vez, as coisas não saem como esperado e o resultado é caos sem precedente.

Finalmente, os sobreviventes da trágica expedição militar se acidentam em outro planeta inóspito, dessa vez Fiorina 161, uma Colônia Penal. Os tripulantes e prisioneiros não sabem que à bordo se encontrava um clandestino indesejado.

Agora o ano é 2180 e rumores a respeito desses estranhos acontecimentos se espalham entre colonos, militares e agentes corporativos. Seriam apenas boatos infundados a respeito de formas de vida alienígenas ou há algo de real nessas histórias? Será que existem mais dessas criaturas espalhadas pelo cosmo? E como elas podem contribuir para enriquecer ainda mais as Corporações?

É nesse panorama que se desenvolve a ação de ALIEN RPG, jogo que pega os três primeiros filmes, resumidos acima, e dá ao Narrador a chance de prosseguir nessa história contando a sua própria sequência de eventos.

Caras, vou ser curto e grosso: Eu AMO Alien.

(Ok, não amo particularmente a trama de Prometheus e Covenant, filmes que servem como prequel para a história original, mas a saga continua incrível.)


Anos atrás até existiu um RPG lançado ao mesmo tempo que Aliens, o Resgate (1986), mas ele jamais foi muito popular e nunca teve muito apelo entre os jogadores. Alien precisava ser mais amplo, mais vasto do que histórias de Fuzileiros Espaciais. Eu sempre me perguntei porque não havia um jogo capaz de tomar emprestadas todas as ideias desse universo tão rico e cheio de possibilidades.


Ano passado, a Editora sueca Fria Ligan (ou Free League, responsável por Tales from the Loop, Forbidden Lands, Coriolis, entre outros) anunciou que Alien seria seu próximo lançamento. A repercussão foi imediata entre os fãs. Aqueles que conhecem o trabalho da Free League sabem da inquestionável qualidade de suas ambientações. 

E como fazem bons livros esses suecos! 

É material de primeira qualidade: maravilhosamente escritos, belissimamente ilustrados e luxuosamente acabados. A Free League nos últimos anos vem se estabelecendo como uma das novas queridinhas dos fãs de RPG, abocanhando uma fatia suculenta do mercado internacional de jogos de mesa. ALIEN RPG é apenas a sua última investida para conquistar ainda mais jogadores e diga-se de passagem, uma jogada pra lá de inteligente. Ao buscar inspiração em uma franquia cinematográfica famosa (sejamos francos: que jogador de RPG não viu Alien?) a Free League ganha enorme atenção e muitos jogadores em potencial.

Quando fiquei sabendo que ALIEN seria lançado, soube imediatamente que era um livro que eu precisava ter. Ainda que fosse um jogo mediano eu ia querer ler a respeito dele e saber como os autores encaixariam os fatos que vimos nos filmes e como a ação iria transcorrer nesse cenário.

Mas ALIEN está longe de ser um "jogo mediano", senhoras e senhores, é oficial, esse é um baita jogo!


ALIEN RPG consegue capturar com maestria a essência do universo dos filmes, costurando a trama com muitas possibilidades para contar histórias. Alien é mais do que um jogo a respeito de astronautas ameaçados por monstros em naves imensas. Ele abre um leque de opções que servem perfeitamente para aventuras one-shot, mas que também se propõem a rolar campanhas longas. Não se assuste portanto, se esse jogo ganhar espaço na sua mesa regular.

Tudo bem, reconheço que talvez eu seja suspeito para falar de Alien já que é uma das minhas franquias favoritas no cinema (apesar de Prometheus e Covenant terem tentado arranhar esse amor). 

Quando eu era moleque fiquei apavorado após assistir uma cópia VHS de Alien, o Oitavo Passageiro. Depois vibrei com Aliens, o Resgate que por muito tempo foi um dos meus filmes favoritos. Mesmo o terceiro e quarto filmes da série tem lá seus méritos. Até hoje, sempre que um desses filmes está passando na televisão eu paro o que estiver fazendo para assistir. Conheço trechos inteiros de cor e posso falar horas sem parar a respeito de detalhes de bastidores, cenas estendidas e personagens que integram a trama. Sim, meu Nível Nerd como Fã de Alien beira o Hardcore.

Eu tinha esperança de que ALIEN RPG seria um bom jogo, mas não fazia ideia do quão bom seria o resultado final.

Ainda que não seja somente um jogo de Horror, ALIEN RPG obviamente bebe dessa fonte. 


Situações limítrofes de pânico, monstros abomináveis espreitando em corredores escuros, coisas aterrorizantes brotando do peito de vítimas, planetas inóspitos varridos por catástrofes naturais estão na ordem do dia. Tudo retratado ali parece cuidadosamente projetado para tirar o sono dos jogadores e um bom mestre terá material de sobra para construir uma narrativa marcante, pontilhada de cenas que serão lembradas pelos jogadores por muito, muito tempo.

Eu mal posso esperar para me embrenhar nesse mundo.

A medida que fui lendo (e praticamente devorando) as páginas do livro básico, um tremendo tomo com 392 páginas, as ideias para aventuras foram aparecendo quase que imediatamente, o que eu sempre considerei um ótimo sinal, ainda mais em uma nova ambientação.

É preciso mencionar a qualidade gráfica e acabamento dos livros da Free League. Não é de hoje que eu faço elogios rasgados ao material publicado por esses caras e aqui não será diferente. ALIEN é daqueles livros que mais parecem uma obra de arte do que um livro de RPG. 

A primeira coisa que deve ser dita é que ele é escuro. Extremamente escuro como o próprio espaço profundo. 

As páginas em papel superior são brilhantes, cobertas de ilustrações coloridas feitas pelo genial Martin Grip, um dos pilares da Free League. Não é de hoje que esse cara já se tornou um dos meus artistas favoritos em livros de RPG. Ele consegue construir cenas de uma dramaticidade e impacto impressionantes. Para ter uma ideia do que estou falando, basta apreciar as ilustrações nesse artigo, todas elas pinçadas do livro básico.


O texto que compõe o livro é distribuído em pequenas janelas que imitam os terminais de acesso dos computadores de Alien. É uma opção curiosa e ao mesmo tempo ousada: os textos são incrivelmente sucintos, indo direto ao ponto sem muitas firulas. Ainda assim, tudo é muito bem escrito e explicado, tornando a leitura bastante rápida e fluida. 

Os capítulos também são bem distribuídos, com um índice que facilita localizar os temas abordados em cada seção. Ao todo, o livro se divide em 13 capítulos, com informações sobre Sistema, Ambientação, Dicas para o Mestre (aqui chamado de Mother em alusão ao Computador Mu/th/er), Equipamento, Regras para Combate entre Naves, Criação de Mundos, Sistemas para evocar Pânico e Informações detalhadas sobre os temíveis Xenomorfos que dão nome ao jogo.

Além disso, o livro possui uma aventura pronta para lançar os jogadores direto na ação: "Hope´s Last Day" (O Último dia de Esperança), um cenário que se passa justamente em LV-428 pouco antes dos acontecimentos descritos no filme Aliens, o Resgate. Apesar de curta, a aventura serve muito bem ao propósito de apresentar o sistema e ambientação aos novos jogadores. Escrita com muitos detalhes e uma fartura de exemplos, o cenário dá um perfeito one shot.

Bom, a essa altura os leitores devem estar se perguntando a respeito do sistema de ALIEN RPG. 

É claro, vamos falar a respeito dele em detalhes, mas isso vai ficar para a segunda e final parte dessa resenha. Então, fiquem conosco e nos acompanhem, pois há muito a ser dito sobre esse incrível jogo.

2 comentários:

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    1. https://www.rpgplanet.com.br/forum/noticias/alien-rpg-vai-chegar-ao-brasil-pela-editora-new-order

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