quarta-feira, 29 de abril de 2020

Tripulação Desaparecida - O fatídico encontro marítimo do Ellen Austin


O mar sempre guardou grandes mistérios que se tornariam, com o tempo, lendas. Boa parte destas jamais foram resolvidas demonstrando o quão vasto e inexplorado é o reino oceânico. Desde que nossa espécie se lançou além das ondas, em direção ao horizonte, encontramos situações que não fomos capazes de explicar. A lista de mistérios envolvendo os mares parece inesgotável. 

Um caso em especial merece reconhecimento, como o grande enigma que é. Ocorrido nos anos 1800, envolvia uma embarcação que cruzou o infame Triângulo das Bermudas e desapareceu sob circunstâncias jamais explicadas até hoje.   

A escuna de três mastros com 68 metros e pesando 1,812 toneladas tinha o nome Ellen Austin. Sua carreira marinha se iniciou em 1854, quando ela foi construída nos estaleiros de Damariscotta, no Maine. Durante sua carreira, a embarcação serviu à vários propósitos, sendo que o mais frequente foi o de cargueiro, operando na rota marítima entre Liverpool e Nova York.

O Ellen Austin parecia uma embarcação como qualquer outra, mas ela tinha uma fama desagradável entre os homens do mar. Vários marinheiros que serviram à bordo relataram um tratamento abusivo por parte dos oficiais. De fato, o Capitão Henry Garrick era especialmente temido, tendo sido acusado de tortura e brutalidade repetidas vezes. Ele era descrito como um tipo violento que apoiava o uso indiscriminado da chibata para disciplinar seus comandados. Apesar de ter sido acusado de cometer maus tratos, as acusações foram arquivadas e nenhum processo foi levado adiante. Apesar disso Garrick permanecia no comando do Ellen Austin.


Em 1859, o Ellen Austin se converteu num Navio de Passageiros, transportando imigrantes da Europa para a América. Sádico e cruel, Garrick costumava sujeitar os passageiros a humilhações, reduzindo provisões e ordenando o confinamento nos alojamentos inferiores. Dizia odiar o fedor que vinha dos imigrantes e instruía seus homens a espancar aqueles que o desafiavam. Uma segunda infração poderia ser punida com o transgressor sendo atirado no mar. Os boatos eram de que a cada viagem, no porto de destino desembarcavam menos passageiros do que haviam embarcado.

À época, o jornal New York Times proclamou o seguinte a respeito da embarcação:

"Os oficiais do Ellen Austin possuem grande notoriedade. Muitos mencionam a crueldade dos homens que servem à bordo dessa embarcação, destacando agressões, surras e conduta imprópria (uma forma delicada de dizer abuso sexual, à bordo). O Ellen Austin tem por costume ignorar inspeções das autoridades portuárias. Seus passageiros reclamam frequentemente de tratamento desumano e cruel nas viagens empreendidas".   

Henry Garrick continuou sendo Capitão do Ellen Austin até se aposentar, e apesar das repercussões negativas de seu comando, ele jamais sofreu qualquer sanção. O novo Comandante, o Capitão A.J. Griffin assumiu em 1874. A embarcação continuou fazendo a linha entre a Inglaterra e os Estados Unidos e mais tarde o longo percurso entre Nova York e San Francisco. Segundo rumores o navio se envolveu em uma série de situações que incluíam colisões com outras embarcações e incêndios à bordo, estando à ponto de naufragar em certa ocasião, após ser colhido por uma terrível tempestade. 

Alguns diziam que a embarcação tinha algo de estranho... Mencionavam que parecia pesar uma aura negativa sobre o navio e as pessoas mais sensíveis se sentiam oprimidas em seu interior. A maioria destas era incapaz de descrever a sensação, se limitavam a dizer que ele simplesmente parecia ruim.


Verdade ou mentira, no ano de 1880, o navio daria início a sua mais estranha jornada, que escreveria o nome Ellen Austin no hall dos mistérios marinhos mais debatidos.

Em 5 de Dezembro de 1880, o Ellen Austin partiu de Liverpool com destino a Nova York no que deveria ser sua última viagem nessa rota, já que a embarcação havia sido vendida para um consórcio alemão. A jornada transcorreu sem nenhum evento estranho até a chegada do navio ao Mar de Sargaço no início de janeiro de 1881. Nas primeiras horas de uma manhã enevoada, dois marinheiros que estavam de vigília avistaram uma embarcação sem nome flutuando à deriva diante deles. Não parecia haver ninguém no comando e nenhum tripulante foi visto. Ao invés de ordenar a aproximação, o Capitão, suspeitando que poderia se tratar de uma armadilha de piratas, instruiu o imediato a manter distância e observar o misterioso navio pelos próximos dois dias. Este continuou em seu movimento errático, sob a vigilância cuidadosa dos oficiais do Ellen Austin.      

Como parecia não apresentar perigo, o capitão Griffin se aproximou do navio imerso em uma densa névoa que parecia acompanhá-lo. Todas as tentativas de comunicação falharam e o estranho navio à deriva parecia abandonado. Mais estranho ainda era o fato do nome ter sido raspado. Um grupo subiu à bordo tomando o cuidado de carregar consigo armas para se defender de qualquer surpresa inesperada. Descobriram que o navio à deriva estava em excelentes condições de navegação, sem avarias ou danos que justificassem seu abandono. Não havia qualquer sinal de luta que pudesse indicar um ataque pirata ou motim. Contudo, não encontraram viva alma nele.

A equipe de abordagem localizou a cabine do capitão, mas estranhamente o diário de bordo havia sumido. Objetos pessoais da tripulação e passageiros foram deixados nas cabines - inclusive dinheiro e objetos de valor. As rações estavam em ordem, suprimentos intocados, até mesmo a carga permanecia intacta, um precioso carregamento de madeira de alta qualidade avaliado em uma pequena fortuna. Por que a tripulação abandonaria essa carga valiosa? Por que deixariam a segurança do navio para se lançar ao mar? E por que tão repentinamente? Ninguém era capaz de dizer.


Considerando que nada foi roubado e que o navio se encontrava em boas condições, perfeitamente funcional, a conclusão mais razoável é que a tripulação foi forçada a evacuar, ainda que o motivo fosse incerto. A valiosa carga e o navio abandonado pareciam uma oportunidade de ouro para o Capitão do Ellen Austin, uma que poderia fazer de todos à bordo homens muito ricos. As leis do mar dizem que um navio à deriva levado até um porto pode ser reclamado por quem o resgata. O Capitão enviou seu Imediato e uma pequena equipe à bordo do navio misterioso com o intuito de conduzi-lo até o Porto de Nova York, onde poderiam reclamar sua posse.

A ideia era boa e tudo parecia correr conforme o planejado, mas então uma violenta tempestade se formou subitamente. Nuvens escuras cercaram as duas embarcações e ventos fortes agitaram as águas até então tranquilas. A tempestade despencou furiosamente e por dois dias as tripulações simplesmente perderam o contato uma com a outra. Quando finalmente os céus clarearam e o mar se tornou plácido, o navio misterioso havia simplesmente desaparecido. Ninguém conseguia entender o que podia ter acontecido. Não era normal que uma tempestade, não importando o quão forte fosse, fizesse uma embarcação sumir daquela maneira.

Apenas no dia seguinte os vigias de serviço avistaram o navio perdido no horizonte. Quando o Ellen Austin se aproximou, a tripulação esperava ver seus colegas, ms não havia ninguém à vista. Novamente os homens que estavam à bordo pareciam ter sumido sem deixar rastro. Estranhamente o diário do Capitão não estava presente, assim como havia acontecido anteriormente. 

Seguiu-se uma acalorada discussão entre os oficiais e o Capitão com os marinheiros à bordo do Ellen Austin a respeito de como proceder. É preciso compreender que os marinheiros eram em sua maioria supersticiosos e que os incidentes transcorridos passavam a impressão de que o misterioso navio era amaldiçoado. Se um segundo grupo fosse enviado até ele, era bem possível que este tivesse o meso destino do primeiro. O capitão pesou todas as possibilidades, mas no fim das contas, a carga era tão valiosa que a ganância acabou falando mais alto e ele decidiu enviar outro grupo para comandar o navio.


Os homens estavam aterrorizados de colocar os pés lá, mas os oficiais foram persuasivos. Eles receberam armas e a promessa de que as duas embarcações navegariam o mais perto possível uma da outra de modo que se surgisse algum imprevisto poderiam oferecer ajuda. O argumento do Capitão era que a mesma coisa não poderia acontecer novamente. Os navios ficaram perigosamente próximos e seguiram viagem esperando que as surpresas terminassem. Mas é claro, não foi isso que aconteceu...

De acordo com a história contada, embora o mar estivesse calmo, um denso nevoeiro surgiu do nada envolvendo as embarcações e prejudicando a visibilidade. À despeito da proximidade entre os navios, logo tornou-se impossível ver alguns poucos metros adiante. Eventualmente, o Ellen Austin conseguiu deixar a área mais densa do nevoeiro, mas quando o fez, emergiu do outro lado sozinho. O Capitão ordenou que entrassem novamente no nevoeiro, que disparassem foguetes de sinalização e soassem buzinas, mas de nada adiantou.

Quando finalmente o nevoeiro começou a se dissipar o navio misterioso não estava em lugar nenhum. Ele havia desaparecido mais uma vez levando consigo a equipe à bordo. Dessa vez, o Capitão concordou com a tripulação que o melhor seria seguir para Nova York como planejado. 

O estranho relato do alegado encontro com o navio fantasma e sua tripulação ausente vieram à público em um artigo publicado no Daily Deadwood Pioneer em 1906, mais de duas décadas depois do ocorrido. A história teria sido ouvida em uma audiência pelas autoridades navais, mas estas consideraram o acontecimento inexplicável e decidiram censurar a história e o testemunho de quem estava à bordo do Ellen Austin. Mas como censurar uma história como essa?

De fato, as narrativas sobre o estranho encontro marítimo se tornaram um rumor recorrente entre marinheiros que faziam esse mesmo trajeto. Muitos temiam sequer tentar oferecer uma explicação para o incidente. Ninguém sabia realmente o que pensar, mas a história continuava a ser contada. Considerando a localização onde os fatos transcorreram e os mistérios à cerca do célebre Triângulo das Bermudas, logo surgiram muitas teorias sobre o que poderia ter acontecido. Algumas delas realmente fantásticas.


Ao longo dos anos a narrativa cresceu, sendo contada e recontada inúmeras vezes, com trechos acrescidos ou omitidos. Com tantas versões é difícil afirmar qual a versão mais fiel e até dizer ao certo se o incidente não passa de um fato exagerado ou uma história inteiramente fabricada. Sem testemunhas e dados oficiais é bem possível que tudo não passe de fantasia, mas quem pode dizer com certeza absoluta?

Em casos espetaculares como esse, torna-se virtualmente impossível separar fato de ficção. Mas há alguns poucos registros oficiais presentes nos arquivos do Lloyds de Londres. Através destes, é possível confirmar a existência de um navio chamado Ellen Austin que fazia a rota New York e Liverpool na época em que o incidente foi relatado. O nome do capitão A.J. Griffin também está correto nos registros existentes. Também há menções de uma viagem realizada em dezembro de 1880. Mais impressionante, nos registros consta a descoberta de um navio abandonado, encontrado nessa viagem, carregando uma carga valiosa de madeira. Mas isso é tudo. Estranhamente, não há mais nenhuma informação sobre o que a tripulação fez após o encontro e se o Capitão Griffin ordenou a abordagem do navio à deriva. Todo o restante da narrativa foi omitido, como se algo importante como a descoberta de um navio à deriva, não fosse digno de nota.

O que teria acontecido nessa misteriosa viagem? Como tal historia poderia ter sido censurada à ponto da verdade se perder dessa maneira? O que poderiam as autoridades querer ocultar obrigando as testemunhas a omitir os detalhes do incidente? 

Há tantas perguntas não respondidas nesse incidente que chega a ser uma tarefa frustrante tentar responder as questões. É provável que jamais venhamos a saber e o mistério do Ellen Austin esteja fadado a ser um dos casos mais estranhos da longa lista de incidentes inexplicáveis ocorridos no Triângulo das Bermudas. 

domingo, 26 de abril de 2020

Armas Mágicas - O Mistério das Magníficas Espadas Ulfberth


Alguns dos mais interessantes mistérios do passado envolvem artefatos que desafiam qualquer explicação e cuja verdadeira origem contradizem todas análises. Por muitos anos foram encontrados em diferentes partes da Escandinávia, no Mar Báltico e em outras regiões do Norte da Europa uma coleção de espadas que datam de um período entre 800 e 1000 da Era Cristã. Armas tão sensacionais que muitos reputavam a elas fama de serem mágicas.

Espadas eram armas relativamente comuns, usadas como ferramenta por guerreiros e saqueadores vindos do Extremo Norte do Continente. A tecnologia de metalurgia conhecida nos reinos nórdicos permitia a produção de armas de qualidade mediana. As lâminas demandavam constante manutenção e mesmo assim, elas não eram feitas para durar. O uso contínuo enfraquecia o metal e resultava no surgimento de fissuras, isso quando elas não entortavam ou quebravam. 

Contudo, algumas espadas em especial possuíam características únicas e se mostravam incrivelmente resistentes. Estas armas traziam a inscrição Ulfberht gravada na lâmina e emoldurada por duas cruzes. Elas eram muito mais afiadas e duráveis que as demais. De fato, é difícil explicar como tais armas foram construídas já que se diferem de tudo que existia no período, levantando muitas questões sobre quem as teria forjado e que técnicas foram empregadas.       


O maior mistério à respeito das Espadas Ulfberht é justamente como elas foram feitas pelos armeiros da época. Essas armas eram forjadas usando um processo conhecido como derretimento de caldeirão, que resulta num aço incrivelmente puro, com alta concentração de carbono responsável por torná-lo muito mais forte. A grande questão é que esse método envolve um tipo de conhecimento que só seria adquirido séculos mais tarde. Para construir essas espadas em particular, seria necessário aquecer o ferro a uma temperatura de pelo menos 1600 graus célsius, ponto em que as impurezas contidas nele se liquidificam e outros ingredientes, como o carbono são adicionados para criar o aço. É um procedimento altamente complexo e difícil de ser obtido. O resultado era uma espada leve com menos impurezas. Com o acréscimo do carbono a lâmina conseguia permanecer afiada por mais tempo, diminuindo o risco de entortar e quebrar.    

As espadas eram realmente impressionantes. Elas foram criadas com uma tecnologia que só foi desenvolvida durante a Revolução Industrial entre 1800 e 1900, quase mil anos depois delas terem sido forjadas. Quando estas espadas apareceram, o processo usado pelos ferreiros para se livrar das impurezas era rudimentar. Envolvia misturar gordura e malhar o ferro enquanto esfriava com um martelo por horas e horas. Não existiam fornalhas no período capazes de atingir a temperatura necessária para criar um aço de tamanha qualidade.

Não é por acaso que estas espadas se destacavam na era dos Vikings. Elas eram armas incrivelmente superiores que deviam causar espanto em todos na época, já que eram muito mais eficientes em combate. Para todos os efeitos, Espadas Ulfberht eram o mais próximo que existia de artefatos lendários que só podiam ser tratados como mágicos.


Ferreiros e armeiros modernos já tentaram recriar a composição única dessas espadas usando apenas a tecnologia disponível no período. Todos que aceitaram o desafio concluíram que era uma tarefa muito difícil, senão impossível. Para tanto, era preciso conhecer alguns segredos do Oriente Médio, onde lâminas com concentração de carbono eram produzidas com um metal chamado Aço de Damasco. Essa tecnologia poderia ter sido trazida por comerciantes que atravessavam o Mar Cáspio e desciam o Rio Volga em uma longa jornada. Mas o lendário Aço de Damasco era um segredo muito bem guardado. A técnica para produzir tais armas constituía um mistério guardado à sete chaves pelos mestres ferreiros da cidade. É pouco provável que estes compartilhariam o segredo com estrangeiros. Além disso, as espadas Ulfberht parecem ter sido criadas com uma técnica diferente das espadas do Oriente Médio.

O mais provável é que alguém no norte da Europa tenha conseguido desenvolver por conta própria um método exclusivo para a criação das armas. Para tanto, esse alguém teria de ter realizado um incrível salto de lógica que lhe permitiu desenvolver uma tecnologia própria. Seja lá quem foi e como tal façanha foi alcançada, seu nome e método se perderam no tempo.        

Além da avançada tecnologia, outro mistério acerca das armas é o seu nome. Ninguém sabe ao certo o que significa o nome Ulfberht, cuidadosamente gravado na lâmina dessas espadas. Gravações como essa eram feitas apenas pelos maiores artesãos do período e somente aqueles que detinham maior prestígio criavam tal marca de reconhecimento.


A maioria dos estudiosos acreditam que o nome se refere ao Mestre que forjou a arma, no entanto, a medida que mais "Espadas Ulfberht" foram encontradas, chegou-se a conclusão que elas foram feitas ao longo de mais de duzentos anos. Isso tornaria impossível que o mesmo armeiro tivesse construído cada arma. Com isso, alguns pesquisadores passaram a considerar que o nome se referia ao nome de uma família ou de uma marca de comércio. Linguistas acreditam que o nome tem uma raiz Franca, mas não se sabe nada além disso. Também permanece desconhecida a razão pela qual o nome seria gravado em um processo tão trabalhoso e arriscado que podia danificar a arma se não fosse feito corretamente. Seja qual for o motivo, o nome deveria carregar algum tipo de status, reconhecimento e poder.

Um historiador disse a respeito dessa marca:

"É perfeitamente possível que alguns considerassem que a marca na lâmina era mágica. Seria a marca que proporcionaria à espada suas formidáveis propriedades e que a tornaria superior. Nomes eram algo muito importante. Nomear uma arma concedia a ela e seu dono uma fama indissociável".

Além de não saber quem criou as espadas, ou como, também é um mistério onde elas foram feitas. A sugestão mais comum é que elas teriam sido forjadas no Norte da Europa, já que praticamente todas foram encontradas nessa região. É possível ainda que elas tenham sido criadas no Reino de Francia, que era conhecido como uma espécie de capital para os armeiros do período, ainda que nada produzido lá se iguale a essas armas em particular.


A única coisa que se sabe é que as Espadas Ulfberht eram extremamente caras. Constituíam um item de luxo, símbolo de status e renome para quem as portava. Em termos de comparação ter uma espada dessas na cintura seria como ter uma Ferrari último modelo. Um guerreiro com uma Espada Ulfberht provavelmente era reconhecido no campo de batalha como alguém poderoso, bem sucedido e de grande renome.

Assim como acontece hoje em dia, marcas importantes eram alvo de falsificadores. Historiadores encontraram lâminas convencionais do período, obviamente em estado de conservação muito inferior, que traziam o mesmo símbolo das Espadas Ulfberht. Estas provavelmente foram forjadas para faturar em cima da fama das originais, o que leva a crer que elas eram bastante conhecidas. 

Outra suposição é que o método para criação dessas espadas devia ser um grande segredo. Isso ajuda a explicar porque não existem registros de como elas eram confeccionadas e sobre seus criadores. Curiosamente, a manufatura de Espadas com a marca de Ulfberht pararam inteiramente em algum momento do século X. Lâminas com qualidade semelhante só foram surgir na Europa 1000 anos mais tarde. Não há como saber a razão pela qual a criação de tais armas subitamente parou, mas há teorias de que o segredo era conhecido apenas por algumas poucas pessoas que podem ter morrido na mesma época. Também é possível que as rotas de comércio que traziam o ferro de qualidade, necessário possam ter sido cortadas ou que o segredo tenha simplesmente se perdido entre uma geração e outra. 

Mas não há como saber...

O que tornava essas espadas especiais, permanece um mistério para os pesquisadores modernos. Uma intrigante anomalia de uma história perdida que concedia a estas armas requisitos de encantamento e magia.

sexta-feira, 24 de abril de 2020

As Muitas Máscaras de Nyarlathotep - Parte III


"A fascinação de um Deus Negro ou de um anjo caído, 
em cujos olhos reluz um brilho de caprichoso humor".

Que tal mais alguns avatares de Nyarlathotep para fechar a nossa série de artigos sobre as muitas Máscaras do Caos Rastejante.

Lrogg
(L'gy'hx)

A abominação conhecida como Lrogg é cultuada pelos estranhos seres que habitam o planeta L'gy´hx. Esta raça de criaturas metálicas com o corpo cubóide, reverenciam Llogg com um misto de terror e fanatismo, acreditando que ele é o Senhor da vida e da morte. Para agradá-lo e obter mais tempo de existência oferecem a ele estranhos rituais de auto-mutilação. Humanos que inadvertidamente testemunharam esses rituais o descreveram como desconcertante e perturbador. Não se sabe quais são os objetivos de Lrogg, mas tudo indica que ele seja uma entidade especialmente perversa.

Felizmente ele não é cultuado em nenhum lugar da Terra. Isso não significa que ele não tenha, de alguma maneira, visitado nosso planeta, estabelecendo contato com seres humanos. Cogita-se que ele esteja conectado com o Assombro nas Trevas e ao Pai de Todos os Morcegos, venerado por tribos aborígenes na Austrália. Em ambos os casos, eles são avatares de Nyarlathotep.

Lrogg tem a aparência similar a de um imenso morcego com duas ou mais cabeças que parecem emitir um silvo ultrassônico enervante. Ao bater suas grandes asas, estas produzem um tipo de faísca ou chama negra. Não há consenso a respeito de que tipo de energia é essa, mas ela é extremamente perigosa. Seres vivos em contato com esta sofrem efeitos danosos duradouros. Lrogg é capaz de voar em nossa atmosfera ou no vácuo espacial e usa telepatia para se comunicar.

Deus Esfolado
(Turquia)

Esse terrível avatar é o patrono de uma perigosa Seita sediada na Turquia e espalhada por algumas partes da Ásia Menor e Europa Oriental, os Irmãos do Deus Esfolado. O Culto conta com um número considerável de seguidores fanáticos que operam no submundo da Turquia e coordenam ações de sequestro, assassinato e toda sorte de crime. Eles costumam utilizar lugares abandonados como templos onde coordenam seus rituais consagrados que envolvem quase sempre o ato de torturar e esfolar a pele de suas infelizes vítimas. Os cadáveres sem pele são um tétrico cartão de visita dos Irmãos.

Os líderes do Culto estão sempre à procura de artefatos e objetos de natureza mística que são oferecidos à sua divindade em troca de poder e conhecimento. Seus líderes também possuem um extenso repertório de feitiços envolvendo pele, carne e sangue. A Mitologia da Seita inclui profecias e oráculos sobre o Fim dos Tempos.


O Deus Esfolado se assemelha a um homem com mais de dois metros de altura, com a pele totalmente removida deixando à vista músculos e órgãos internos. Na testa ele possui um terceiro olho dividido em três lobos que emana uma luminosidade amarelada. Um tipo de energia profana emanada entidade fazendo com que a pele de todos que estão a pelo menos 100 metros dele se contorça e coce.

Esse avatar raramente se pronuncia, satisfazendo-se observando tortura e sofrimento à sua volta. Se por alguma razão alguém o desagrada, ele utiliza um horripilante ataque conhecido como Olhar do Esfolador. A vítima desse olhar tem a pele imediatamente arrancada de seu corpo como um traje descartado. O choque é tamanho que na maioria das vezes a pessoa morre imediatamente, aqueles que sobrevivem experimentam uma agonia indescritível.

Pai das Larvas
(Peru)

Um avatar extremamente obscuro que habita uma antiga pirâmide Inca no interior do Peru. A entidade foi capturada nessa construção e é incapaz de deixá-la em face de inscrições mágicas gravadas em ouro nas paredes. Para sobreviver ela conta com um Culto formado por mortos-vivos que vagam pelo interior do Peru matando e drenando sangue e gordura de suas vítimas, material que é coletado e então regurgitado através de uma fissura na pirâmide para que o Pai das Larvas se alimente.

A entidade é simplesmente repulsiva, mas dotada de inteligência sendo capaz de enviar sonhos e controlar serviçais à distância. Seus planos sempre envolvem sua libertação e algum tipo de vingança contra a humanidade. Seu nome, decorre do fato da pirâmide onde ele está preso atrair milhares de moscas que por sua vez produzem incontáveis larvas. O fedor produzido é indescritível.


A criatura em si, parece uma massa de carne apodrecida, recoberta de tumores e pústulas fervilhando com milhões de larvas e coberto por moscas que zunem incessantemente. Tentáculos gotejantes se estendem da massa principal e se esticam para agarrar qualquer coisa que se aproxime. Alguém tolo o bastante para se aproximar pode ser capturado e absorvido pelo Pai das Larvas em poucos segundos.

Lamuriante Retorcido
(India)

Um horror primal, composto de inúmeros tentáculos agrupados em uma espiral serpenteante que voa pelos céus espalhando caos e insanidade. Ao longe a visão pode se assemelhar a uma coluna de vermes negros ou uma nuvem escura e grotesca. O avatar forma em seu corpo horríveis bocas que gemem e gritam, gargalham e babam produzindo uma cacofonia aterrorizante. Ouvir as palavras incoerentes pronunciadas por essas bocas pode transformar o mais racional dos homens em um completo insano.

O Lamuriante Retorcido é citado com maior propriedade na mitologia Hindu como um dos muitos demônios e entidades malignas que tentam os homens e os levam a cometer atos impensados. Na tradição védica em sânscrito, ele também atende pelo nome de Narhari, um demônio que possui o corpo dos homens com o intuito de causar desgraças e tragédias.


Não existe um culto organizado devotado a esse avatar, mas de tempos em tempos ele pode se aproximar de indivíduos especialmente instáveis e propensos à ator de violência, tornando-se objeto de sua devoção. Estes constroem em sua homenagem altares com troféus e prêmios extraídos de suas vítimas. Acredita-se que loucos homicidas e assassinos em série possam ser de alguma forma levados a matar pela influência do Lamuriante que potencializa suas fantasias e delírios.

Na tradição védica existem certos rituais usados com o intuito de banir o Narhari do corpo das pessoas. A maioria destes entretanto resultam em uma longa e desgastante batalha que nem sempre tem um final feliz. De fato, supõe-se que muitos alegados casos de possessão demoníaca possam estar ligados a presença nefasta do Lamuriante. O Exorcismo da doutrina cristã possivelmente se espelha em alguns rituais para esconjurar essa entidade.

Várias das formas "humanas" de Nyarlathotep quando feridas fisicamente se desfazem, revelando a medonha forma do Lamuriante Retorcido.

Formas Humanas de Nyarlathotep

Nyarlathotep é conhecido por assumir diversas formas humanas, sobretudo quando deseja negociar com mortais. A forma humana mais frequente do Caos Rastejante é a de um homem negro - não apenas de raça negra, mas de pele tão escura quanto piche e olhos de um verde brilhante. O Homem Negro é um Avatar bastante conhecido entre bruxas e feiticeiros, uma espécie de patrono de círculos místicos e cabalas arcanas.

Há suposições de que o Homem da Encruzilhada, o infame negociador de almas, famoso entre músicos de Blues por oferecer sucesso e riqueza em troca de almas, seja um avatar em forma humana. Conhecido em alguns círculos pelo apelido de Royal Pants, ele tem a aparência de um homem negro de meia idade que se veste com ternos finos sob medida e tem um dente de ouro. Esse avatar dispensa especial interesse no meio musical e está sempre cercado de artistas famosos que lhe devem favores. Por vezes, ele oferece instrumentos musicais encantados àqueles que aceitam barganhar com ele.

Outro possível avatar atende pelo nome de Harley Patten, mas ele pode ser conhecido por muitos outros nomes em diferentes partes do mundo. Patten é visto com frequência nos Estados Unidos e há descrições que batem com sua aparência remontando ao século XVII até recentemente. Ele se apresenta como um vendedor de fala suave, sempre disposto a oferecer alguma invenção, máquina ou engenhoca revolucionária a uma pessoa escolhida aparentemente ao acaso. Aqueles que recebem essa dádiva acabam se arrependendo de aceitar os presentes de Patten que sempre resulta em morte e tragédias.
Leeland Gaunt é um fornecedor de objetos desejados que costuma visitar pessoas escolhidas, oferecendo algo que só ele pode conceder. Seus presentes são particulares, pequenos itens muito desejados pela pessoa em questão. Aqueles que aceitam os presentes ficam devendo a Gaunt um favor que acaba invariavelmente conduzindo a algum tipo de desgraça.

O autor de bestsellers, Sutter Kane é uma máscara bastante contemporânea. Ele possui fama internacional e seus romances de horror foram publicados em mais de 98 países. Nos últimos anos, Kane se consolidou como um dos mais lidos escritores do mundo, tendo produzido mais de 20 romances. Histórias perturbadoras e descrições medonhas são suas marcas registradas. Anos atrás um livro escrito por Kane teria causado distúrbios e uma onda de violência. Desde então, ele se tornou um recluso e raramente é visto. Seus livros clássicos continuam vendendo muito, apesar dele não escrever nenhum novo romance desde 1994. Há rumores de que ele estaria trabalhando em um romance há décadas que marcaria seu retorno ao mercado editorial.

Homem da Meia Noite, é um avatar obscuro atuante no Brasil. Ele se apresenta como um homem de barba cerrada, olhar maligno e unhas longas, vestido totalmente de preto e com uma  cartola na cabeça. Afirma ser um opositor ferrenho de todas religiões e se anuncia como um niilista e materialista convicto. O avatar tem um forte desejo de produzir "herdeiros perfeitos" com mulheres especialmente escolhidas para a função de conceber essas crianças. Para tanto, costuma realizar testes - envolvendo tortura e humilhações, para encontrar sua eleita. Seus filhos se tornam párias, profetas, feiticeiros e dementes. A presença magnética do Homem da Meia Noite costuma atrair indivíduos cruéis e de natureza violenta, muitas vezes dados a atos de sadismo e brutalidade. 


Randal Flagg, um sinistro televangelista com discurso de fogo e enxofre é apontado como um perigoso avatar do Caos Rastejante. Flagg costumava aparecer em eventos de sua Igreja sediada nos Estados Unidos, mas há alguns anos suas aparições se limitam a gravações de vídeos e áudio. Ninguém sabe seu atual paradeiro, mas supõe-se que seja no meio-oeste. Seus livros vendem milhões de cópias e sua Igreja possui bases espalhadas em várias partes do mundo. Algumas pessoas acreditam que Flagg será responsável por arregimentar os Escolhidos quando o Momento da Ruptura - o Apocalipse, chegar. Com cada vez mais seguidores é inegável que ele goza de prestígio e grande poder de persuasão.

Além destes:

Há boatos de que um dos Reis Magos que seguiram a Estrela de Belém  até o local de nascimento de Cristo, seria um avatar de Nyarlathotep. Essa teoria jamais foi confirmada e permanece como um apócrifo. Também há boatos de que o brilhante inventor e cientista Nicola Tesla pudesse ser um avatar, embora outras teorias sugiram que Tesla foi um agente da Grande Raça de Yith. Outro avatar misterioso parece ter sido a inspiração para o Fantasma do Natal Futuro, do conto de Charles Dickens.

Quando assume forma humana, Nyarlathotep pode ser destruído por meios físicos normais. Se assim for eliminado, o corpo começa a tremer e inchar, arrebentando para gerar de seu interior a forma monstruosa do Lamuriante Retorcido. Essa tenebrosa entidade se dirige para o céu onde desaparece.

*     *     *

E com isso, fechamos a nossa série de artigos sobre o Caos Rastejante e suas muitas formas.

terça-feira, 21 de abril de 2020

As Máscaras menos conhecidas (e incomuns) de Nyarlathotep


Nyarlathotep.

O Caos Rastejante.

O Mensageiro de Azathoth.

A Alma e o Espírito dos Deuses Exteriores.

O Grande Trapaceiro.

Nyarlathotep talvez seja uma das mais fascinantes criações da obra de H.P. Lovecraft. Pergunte aos fãs hardcore dos Mitos de Cthulhu e do RPG Chamado de Cthulhu e você descobrirá que Nyarlathotep figura na lista dos favoritos, talvez no topo dela. Tudo bem, o "Grande Cthulhu" está no título e pode ocupar a parte mais alta do pódium dos grandes horrores cósmicos, mas cabe a Nyarlathotep um lugar de destaque.

Não é por acaso que algumas das mais importantes campanhas envolvam justamente os planos malévolos do bom e velho Caos Rastejante. O sujeito é tão influente na mitologia lovecraftiana que suas manifestações (ou avatares) aparecem em inúmeras estórias. E talvez seja justamente isso o que torna Nyarlathotep tão especial: o fato dele possuir inúmeras formas.

Chamadas de Máscaras pelos cultistas fanáticos, essas faces de Nyarlathotep variam enormemente e em certos momentos se confundem com o folclore de diferentes povos e lugares. Os avatares de Nyarlathotep, diferente dos horrores mais convencionais dos Mitos estão quase sempre próximos da humanidade: tentando, cobiçando, provocando... eles interagem com os homens, diferente daqueles que sequer percebem a presença dos seres humanos - tratados como formigas ou meras bactérias.

Mas Nyarlathotep não... ele se importa em corromper, espalhar a maldade, a vilania e semear o caos por onde quer que passe. O grande trapaceiro é inegavelmente um humanista. 

Ele estava com a humanidade no momento em que ela surgiu e provavelmente estará junto dela no momento em que ela deixar de existir (possivelmente quando Ele cansar de brincar). 

Nós estamos acostumados a temer e respeitar alguns avatares de Nyarlathotep que se tornaram extremamente populares ao longo dos anos: O Homem Negro (The Black Man), a Mulher Inchada (The Bloated Woman), O Errante das Trevas (The Dweller in Darkness), o Deus da Língua Sangrenta (The God of the Bloody Tongue), o Assombro nas Trevas (The Haunter in the Dark), o Faraó Negro (The Black Pharaoh), o Lamuriante Contorcido (The Wailing Writher)... apenas para citar alguns que foram detalhados no artigo a respeito das cinco máscaras mais populares de Nyarlathotep.

[Leia aqui sobre As Cinco mais terríveis Máscaras de Nyarlathotep.]

Neste artigo, fazemos o caminho inverso e buscamos relacionar as cinco máscaras menos conhecidas e mais incomuns do Caos Rastejante. 

Sem mais delongas, vamos a elas:

O PORTADOR DAS PRAGAS 
(The Bringer of Pests)
Egito Dinástico



Essa máscara de Nyarlathotep não é exatamente desconhecida, afinal, ela é citada diretamente em um dos livros mais importantes e influentes de todos os tempos. O Portador das Pragas figura no Livro do Exodus, na Bíblia. Ele é uma força devastadora libertada pela fúria do Deus de Israel, impingida sobre as terras e o povo do Egito. Ela é a própria essência das lendárias dez pragas que devastaram a outrora orgulhosa Nação do Nilo.

Segundo o livro do Antigo Testamento, as pragas foram lançadas sobre o Egito como uma forma de validar o poder do Deus único e verdadeiro sobre os Deuses falsos do Egito Antigo. E como uma forma de persuadir o Faraó a libertar o povo de Israel que era mantido em regime de escravidão.

A grande questão é: se o Portador das Pestes é na verdade um avatar de Nyarlathotep, o que teria motivado o Caos Rastejante a desencadear sobre o Egito tamanha vingança? Não é o próprio Egito a nação no mundo mais alinhavada aos preceitos de Nyarlathotep? Pelo amor de Cthulhu, olhe o nome dele... quer coisa mais egípcia do que Ny-A-lar-Ho-Tep?

Bem, ao que tudo indica, o povo do Egito durante a Décima Segunda Dinastia parecia incomodar o velho Nyarly. Talvez ele estivesse cansado de se ver associado a Terra dos Faraós e escolheu varrer a nação do mapa submetendo todos a um verdadeiro festival de calamidades (Calamity Palooza). Quem sabe, ele estivesse tentando sedimentar o surgimento de uma nova fé que se espalharia por todo o mundo e nos séculos seguintes serviria como a espinha dorsal da religião ocidental. Entretanto, o mais provável é que Nyarlathotep estivesse entendiado... e assim, assumindo a forma de uma praga viva, deu início a um dos capítulos mais sangrentos da Bíblia.

Nyarlathotep estava... #chateado.

Segundo a Enciclopédia Cthulhiana, essa máscara em particular não possui um culto nos dias atuais (Ufa!). Ela não é exatamente popular, visto que não concede qualquer benefício ou favor aos cultistas, além de doses cavalares de miséria e sofrimento. Não é à toa que Nyarlathotep não a utilize frequentemente, pois quando o faz o circo literalmente pega fogo... para se ter uma idéia, a última vez que essa coisa andou livremente pela terra, escreveu-se um livro inteiro a respeito que ainda é popular milênios mais tarde. 

Descrito como uma monumental nuvem de gafanhotos cuspidores (uma das espécies mais devastadoras desses insetos), o Portador das Pragas faz juz ao seu nome pouco agradável. Grande o bastante para engolir uma cidade, os gafanhotos parecem intermináveis, eles cobrem os céus e obscurecem o próprio sol, transformando o dia em uma noite barulhenta com o ressoar de milhões de asas e quelíceras famintas. Capaz de devastação sem igual, no rastro do Portador da Praga não resta nada a não ser campos desertos, árvores depredadas, animais semi-devorados e ossos humanos limpos de toda carne.

Alternativamente, o Portador das Pragas é capaz de assumir uma forma humanóide gigante, utilizando para isso a massa de milhões de gafanhotos reunidos. A forma se assemelha a um gigante que marcha pelo lugar escolhido devastando tudo em seu caminho. Ele fala com o som produzido pelo canto dos gafanhotos e sua voz é como um trovão zunindo à distância. Não bastasse a devastação dos gafanhotos, supõe-se que a entidade pode deflagrar as demais pragas bíblicas, que para os amigos que faltaram ou não lembram da Escola Dominical são as seguintes: água em sangue, praga de sapos, praga de piolhos, praga de moscas, morte dos rebanhos, furúnculos, tempestade de raios, (os já citados) gafanhotos, escuridão e a morte dos primogênitos.

Uma sacada fantástica é a associação do Portador das Pragas a esse trecho do filme A Múmia (The Mummy) onde os intrépidos heróis conseguem a façanha de invocar a entidade lendo um trecho do Livro dos Mortos. Esses investigadores...


O HOMEM VERDE 
(The Green Man)
(Grã-Bretanha e Gales)



Mas calma... Nyarlathotep nem sempre está de tão mau humor.

Por vezes, ele pode assumir a forma de uma entidade pertencente ao Folclore Celta, uma figura reverenciada pelos povos pagãos e que até hoje inspira algumas meninas wiccan a rodopiar em torno de fogueiras crepitando.

Estamos falando é claro, do Homem Verde. Não, não se trata de um figurante da trilogia Senhor dos Anéis, ou de um Ente de Dungeons and Dragons. A lenda do Homem Verde é muito antiga e associada intimamente aos povos celtas, sendo também comum entre as tribos saxãs. 

O mito do "Jack in the Green" provavelmente nasceu nas Ilhas Britânicas, sendo assimilado por vários povos que vieram a ocupar o lugar. Essa era uma entidade que simbolizava o poder da natureza, a energia da floresta, a capaciadde curativa e renovadora do solo...

Com todos esses atributos aparentemente benignos, é difícil imaginar Nyarlathotep usando esse avatar. Mas ao que tudo indica, essa Máscara não é especialmente maligna ou destrutiva. Para ser absolutamente sincero, o Homem Verde talvez seja o avatar de Nyarlathotep mais inofensivo. Ele não busca a aniquilação da humanidade, seu sofrimento ou sua agonia, tudo que, via de regra, desperta sua alegria. Pelo contrário, o Homem Verde é uma força invocada em rituais antigos com o propósito de renovar os laços entre o homem e a natureza. Sim, é isso mesmo, além de tudo, ele é ecologicamente correto!

Talvez esse seja o grande truque desse avatar: mover a humanidade em uma nova era de paz e amor, e relacionamento íntimo com a natureza... fazer o homem abandonar o lampejo de brilhantismo que gera indústria, modernidade e progresso. Se isso é verdade, o Homem Verde ainda não conseguiu atingir a sua meta e talvez por isso, o culto tenha ficado esquecido por tanto tempo. Redescoberto no último século por indivíduos dispostos a retomar os preceitos pagãos, quem pode dizer se ele não terá sucesso na sua empreitada.

O Homem Verde é descrito como uma enorme criatura humanóide composta de folhas, vinhas e plantas que lhe dão forma. A criatura só é vista em "bosques sagrados" onde surge diante de Grandes Carvalhos, Pedras milenares e arcos de plantas. Com seu surgimento, os devotos cantam e dançam, tentando agradá-lo e assim obter seu favor. Se satisfeito com as homenagens, o Homem Verde oferece a renovação do solo, uma boa safra ou quem sabe uma comunhão com a natureza. O Homem Verde pode aceitar sacrifícios, mas estes não carregam a carga negativa associada a palavra "sacrifício". As "vítimas" são voluntárias e segundo os ritos, se submetem em troca do bem estar de toda comunidade. A morte não é produzida com sofrimento, mas de forma rápida e o menos traumática possível. Em tempos antigos era uma honra se tornar o sacrifício do Homem Verde.

Sabe-se que Nyarlathotep ao assumir essa máscara pode assumir outras formas, mas nenhuma delas é especialmente assustadora. Animais feitos de plantas, enormes árvores com faces humanas e grandes frutas com feições humanas são algumas das opções disponíveis.

A CABRA COM MUITAS PERNAS
(Many-Legged Goat)
(Europa Continental)





Próxima máscara. A Cabra com muitas pernas!

What a hell dude...

Quando a gente fala de cabra, em geral, pensamos em Shub-Niggurath e nas suas crianças, mas parece que Nyarlathotep estava interessado em invadir o pedaço da cabra negra.

Essa entidade obscura também não possui um culto conhecido, embora possa ter havido um culto em sua homenagem em algum momento da história humana. Alguns estudiosos tentam relacionar a Cabra com Muitas Pernas com o mito do Carneiro Dourado, acreditando ter havido alguma corruptela ou erro de tradução. Mas essas suposições não podem ser examinadas, a não ser que documentos nesse sentido sejam encontrados.

Enquanto isso não acontece, ficamos com a pergunta: o que diabos é esse avatar? Para que ele existe? O que ele simboliza?

Perguntas obviamente pertinentes, mas as respostas não são tão fáceis. 

A Cabra com Muitas Pernas só é conhecida através de passagens contidas em alguns livros esotéricos e mesmo assim sua existência é bastante contestada. Uma das fontes cita que esse ser é uma divindade rural, que se manifesta muito raramente, nascendo de uma cabra que gera uma cria com multiplicidade de membros. Um texto sugere que o animal em questão possui um balido que se assemelha ao choro de uma criança, de uma mulher jovem ou de uma viúva (variando de acordo com a fonte consultada), capaz de induzir as pessoas a sofrer alucinações e experimentar visões apocalípticas. Uma vez nascida dessa maneira, a Cabra não vive por muito tempo, ela acaba morrendo, mas antes profere um balido longo e aterrorizante que ocasiona surtos de paranóia, terror e melancolia. Um documento existente na Biblioteca de Dusseldorf, na Alemanha, menciona um suposto caso ocorrido no século XV, no qual o nascimento de uma Cabra com Muitas Pernas, desencadeou uma epidemia de loucura em um pequeno vilarejo no Vale do Reno.

Outra lenda a respeito da Cabra, menciona que tal criatura nasceria de uma mulher e teria as feições de uma cabra com o corpo mais ou menos humanóide, nos moldes das entidades capricornianas da Grécia Antiga. Essa criatura seria um avatar de Nyarlathotep, ainda que mortal e não especificamente maligno. A função do avatar nessa forma seria acumular conhecimento e compartilhar magias e conhecimento místico entre aqueles que decidissem se tornar seus seguidores. Não se sabe de nenhum incidente desse tipo já registrado, e para alguns essa versão da lenda não passa uma fantasia sem qualquer fundamento.

Mas quem pode dizer ao certo...      

TICK TOC MAN
(Tick Tock Man)
(Vários lugares, em especial onde há grande industrialização)



Esse é outro avatar bizarro de Nyarlathotep, de certa fora o extremo oposto do Homem Verde.

Para muitos, essa manifestação só começou a aparecer nos últimos dois séculos, de modo que ainda se sabe muito pouco a respeito dela. É possível que ela seja uma das máscaras mais contemporâneas de Nyarlathotep, surgida a partir do advento da indústria, da automoção e do desenvolvimento mecânico. Alguns teóricos no entanto, defendem que o Tick Tock Man é bem mais antigo, sendo conhecido na Arábia do século XV e na Europa do século XVII quando ele aparecia diante de construtores de relógios que funcionavam por dispositivos de mola e engrenagens intrincadas.

Um documento existente na Universidade de Berna, na Suiça alude para a estória de um relojoeiro no século XVII responsável por construir pequenas maravilhas mecânicas extremamente precisas em sua oficina. Ele teria construído um autômato em tamanho humano que deslumbrava todos que testemunhavam seu funcionamento. Denunciado publicamente por práticas de feitiçaria, o relojoeiro foi preso e o autômato destruído. Rumores mencionando que o autômato fora visto andando sozinho se espalharam pelos cantões suíços. Alguns supunham que o autômato teria adquirido vida própria e consciência tamanha sua perfeição. Outros no entanto, defendem que Nyarlathotep teria simplesmente dominado o autômato e o transformado em uma de suas máscaras - o obscuro Tick Tock Man.

Não se deixe enganar peolo nome simpático... o Tick Tock Man é algo bastante bizarro.


Para começar ele não é uma criatura viva, no sentido literal. O Avatar assume a forma de um ser artificial, composto de molas, roldanas, engrenagens e mais atualmente fiação, transistores e servo-motores. Seu corpo é uma síntese perfeita de homem e máquina. Hastes de metal servem como ossos, placas metálicas são sua carne, fios fazem as vezes de veias e capilares, enquanto fluídos oleosos são o equivalente ao seu sangue. Essa casca metálica é habitada por uma inteligência artificial extremamente avançada. O Tick Tock Man em suas primeiras aparições parecia funcionar apenas mecanicamente, mas há indícios de que mais recentemente ele possa funcionar com carvão, vapor ou mais comumente eletricidade. Em algumas descrições, a entidade pode utilizar um polímero de borracha moldada que imita a pele humana, se disfarçando dessa forma para assim andar entre os homens sem chamar tanta atenção.


O Tick Tock Men, assim como a maioria das formas de Nyarlathotep existe com o único propósito de semar o Caos e a Loucura. Ele costuma se aproximar de cientistas e concede a eles através de sonhos a inspiração necessária para a construção de um corpo mecânico para onde ele transfere sua essência. Essa forma pode variar muito de acordo com a época e os recursos disponíveis: um cientista vitoriano pode inventar um autômato movido a vapor, enquanto um engenheiro na Tóquio dos dias atuais pode construir um computador extremamente avançado. Uma vez assumindo essa forma, o Tick Tock Man fornece ao seu "criador" ideias e ajuda na realização de cálculos complexos que eventualmente levam a saltos de lógica notáveis. 

Um dos objetivos principais dele é fornecer a cientistas planos para armas devastadoras e outras tecnologias perigosas. Acredita-se que tenha sido uma manifestação do Tick Tock Men quem concedeu a inspiração para a criação de armas ao longo das eras, desde as armas de cerco, até a metralhadora, passando pelos caças até o míssil inter-continental. Teóricos dos Mythos imaginam qual será a próxima inovação tecnológica patrocinada por esse avatar de Nyarlathotep. Alguns apostam na criação de máquinas inteligentes que eventualmente acabarão por sobrepujar a própria raça humana.  

A EQUAÇÃO KRUSCHTYA
(Kruschtya Equation)
(Rússia, mas se espalhou pelo mundo)





E chegamos ao Top da lista de avatares realmente estranhos de Nyarlathotep.

Nem precisei ir muito longe para escolher a mais estranha e incomum Máscara utilizada pelo Caos Rastejante. Sem dúvida, ninguém tira o posto da Equação Kruschtya.

A Equação não é apenas um complexo teorema de matemática quântica que quando solucionado serve para invocar Nyarlathotep. Ele é muito mais do que isso. A própria equação é um avatar por si só. O teorema incrivelmente sofisticado está muito além da compreensão da maioria das mentes mortais ainda que seja conhecido por raças alienígenas como os Sham, os Mi-Go e os Yithians. Mesmo aqueles dotados de extrema genialidade e brilhantismo matemático levam centenas de horas de trabalho árduo para decifrar as fórmulas e chegar a uma conclusão. Aqueles que mergulham nessa complexa tarefa muitas vezes acabam adquirindo uma obsessão compulsiva e são consumidos pelo seu próprio trabalho, perdendo gradualmente a razão. Matemáticos brilhantes se deixaram contaminar pela Equação Kruschtya e acabaram enlouquecendo por completo em suas tentativas de obter uma solução.

Conhecida apenas por alguns pequenos círculos fechados, a Equação é uma espécie de lenda urbana, discutida por acadêmicos e por estudantes de matemática pura em busca de um desafio monumental. Na década de 1960, a Academia de Matemática de Moscou possuía um time especializado em tentar desvendar os mistérios da Equação Kruschtya. Há boatos que Dmitri Russalkin, um brilhante matemático soviético tenha conseguido chegar ao fim da Equação. Contudo, não se sabe ao certo pois Russalkin desapareceu depois que a Academia foi destruída em um bizarro terremoto que estranhamente afetou apenas as fundações desse prédio. No auge da Guerra Fria, espiões norte-americanos se apoderaram de um microfilme contendo parte da solução para a Equação, supostamente resultado do trabalho de um cientista húngaro à serviço dos nazistas na Segunda Guerra. Um grupo de matemáticos foi reunido para a tarefa de desvendar a equação, mas os resultados não foram os esperados. Três cientistas desapareceram do complexo, localizado em Los Alamos e os registros da pesquisas foram destruídos.

As pessoas que se envolvem com a Equação Kruschtya acabam atraindo a atenção de Nyarlathotep, coisa que nunca é agradável. O Caos Rastejante preenche a mente dos pesquisadores com noções bizarras e conhecimento alienígenas que não pertencem a ele. O indivíduo passa a falar em idiomas estranhos e desconhecidos, tem estranhas inspirações e menciona acontecimentos ou fatos que não aconteceram (ou que ainda estão para acontecer). Sua linguagem se torna cada vez menos coerente a medida que seu cérebro processa cada vez mais rápido as informações. O indivíduo não consegue parar de trabalhar, sua mente se volta inteiramente para a resolução, enquanto seu corpo se deteriora lentamente pela falta de descanso, exercício e mesmo alimento.


Por fim, a Equação Kruschtya cobra o alto preço pela sua resolução. No instante que a solução é contemplada, a mente do pesquisador se torna uma com Nyarlathotep e ele passa a compreender os segredos mais profundos do Universo. Tamanho acúmulo de informações é devastador e o indivíduo acaba por se tornar, ele mesmo, um avatar do Caos Rastejante.

Pouca coisa pode ser feita para salvar alguém que decifra a Equação Kruschtya. Tais indivíduos continuam vivos, mas sua mente se perde, cooptada por um saber absoluto dos segredos cósmicos, algo que nenhum ser humano é capaz de absorver e ao mesmo tempo preservar a sanidade. Alguém com tamanho conhecimento se torna um perigo em potencial pois suas revelações são devastadoras. Matar o indivíduo libera Nyarlathotep que parte de maneira dramática, assumindo alguma forma monstruosa no processo. Não há nenhuma forma conhecida de apagar esse conhecimento ou restaurar a mente de quem resolve a  Equação Kruschtya. Tetsuo Susiato, um brilhante matemático japonês, que segundo alguns foi o último pesquisador a resolver a Equação (em meados de 2005), vive atualmente em um sanatório para doentes mentais em Nagoya.

Há rumores que o físico Stephen Hawkins chegou muito perto de resolver a Equação, o que desencadeou a sua condição física confundida com um caso incomum de Esclerose Lateral Amiotrópica (ELA). Acredita-se que Hawkins esteja envolvido em um programa que busca compartimentalizar o estudo da Equação afim de não destruir a mente dos pesquisadores no processo. Pelo programa, cada grupo estuda apenas uma parte do teorema. Até o momento, o programa não teve sucesso, mas os trabalhos prosseguem desde meados dos anos 1980.

Bem é isso...

Cinco Máscaras que nos fazem pensar a respeito da natureza de Nyarlathotep.

domingo, 19 de abril de 2020

As Muitas Máscaras de Nyarlathotep - Parte II


"Pois Nyarlathotep é mais de um. 
Ele é muitos, e muitos são Ele quando decide barganhar com os mortais"

Ainda há muitas máscaras de Nyarlathotep, o Caos Rastejante.

A Névoa Rastejante
(Terra dos Sonhos)

Nyarlathotep parece interessado em atormentar a humanidade em todas as partes do mundo. Onde quer que a humanidade se instale, o Caos Rastejante parece estar sempre à sua espera. Na Terra dos Sonhos, para onde nossa consciência migra enquanto dormimos, não poderia ser diferente.

A Névoa Rastejante é um avatar de Nyarlathotep que se manifesta apenas na realidade onírica conhecida como Terra dos Sonhos. Nessa dimensão ele assume a forma de uma névoa de coloração fosforescente doentia, que surge inesperadamente como se brotasse no próprio ar. Esse nevoeiro se move na direção que desejar, mesmo contrário aos ventos mais fortes. As nuvens rodopiantes que compõem a criatura são tão densas que qualquer pessoa envolvida por ela é incapaz de ver alguns poucos centímetros adiante. No interior da criatura ouve-se uma cacofonia de sussurrantes dissonantes que as pessoas envolvidas supõem pertencer a indivíduos conhecidos.


A característica mais desconcertante da Névoa Rastejante envolve a capacidade de transportar as pessoas envolvidas em sua massa para longas distâncias. Qualquer um transportado dessa forma tem a impressão de movimento, independente de suas ações. Quando o nevoeiro escolhe se dispersar, elas descobrem terem sido transportadas para outra localização.

A Névoa Rastejante não possui nenhum culto conhecido na Terra dos Sonhos, e é tratada pelos seus habitantes como uma manifestação neutra.

Efígie do Ódio
(Vários lugares ao redor do mundo)

Esse estranho avatar de Nyarlathotep está relacionado diretamente a guerra, genocídio e conflitos de todo tipo. Ele surge em lugares assolados por grande violência e tem um efeito catalizador da brutalidade, fazendo com que os envolvidos em uma contenda se tornem cada vez mais irracionais, selvagens e incontroláveis. Guerras civis e rebeliões com certeza foram potencializadas pela presença maléfica da Efígie do Ódio.

A aparição repentina da entidade invariavelmente sinaliza como uma escalada repentina na violência praticada por facções inimigas. Há rumores de que ela esteve presente na Terra de Ninguém no Somme e Ypres, no dramático cerco a Stalingrado, nos campos congelados da Coreia, nos barrancos do Gran Chaco durante a Guerra do Paraguai e nas ruínas fumegantes de Saravejo. É provável entretanto que ele se manifeste há muito mais tempo e que tenha surgido em conflitos desde as Termópilas até a Expansão Qin.


Esse bizarro avatar tem a forma de um totem macabro construído à partir de diferente matéria prima encontrada em um campo de batalha. Árvores retorcidas, munição descartada, armas destruídas, ossos e carne putrefata podem ser alguns dos materiais usados. A medida que o conflito se intensifica o totem vai crescendo até ganhar o aspecto de uma torre de onde despontam enormes asas de morcego. Ao redor da estrutura podem ser vistos cadáveres uniformizados em diversos estágios de decomposição, alguns deles se movendo involuntariamente e murmurando. Quando a criatura atinge um determinado tamanho, ela abre suas asas e voa sobre o campo de batalha. Todos aqueles que veem a forma sombria, são acometidos por um frenesi sanguinário que os impele a matar seus inimigos. Quando essa névoa vermelha se dissipa, as vítimas em meio a cadáveres despedaçados raramente se recordam do que aconteceu. 

Há boatos de que a Efígie do Ódio exerce controle sobre cadáveres reanimados podendo formar uma verdadeira legião de mortos-vivos para cumprir sua vontade. Acredita-se que o totem também pode criar simulacros humanos que se apresentam como brilhantes conselheiros militares, dispostos a convencer comandantes a intensificar o nível de hostilidade. Estes também podem oferecer estratégias agressivas e armas avançadas que resultam em uma maior mortandade.

Para mais a respeito da Efígie do Ódio: Veja aqui

Horror Flutuante
(Haiti e algumas nações do Caribe)

Um dos avatares mais obscuros de Nyarlathotep, o Horror Flutuante é uma divindade conectada a raras seitas vodu que operam no Caribe, sobretudo no Haiti. Seus cultistas são fanaticamente devotados aos mais perversos rituais que envolvem frenéticas danças ao som de tambores, orgias e auto-mutilação.

O Horror Flutuante é um aspecto que conjura dor e sofrimento e ele exige que seus seguidores sejam capazes de suportar horríveis torturas, bem como causar imensa dor em seus inimigos. Seus templos se encontram na parte mais afastada e inacessível de florestas, bosques ou pântanos, onde os cultistas se reúnem conclamados pelo som furioso de tambores e guiados por sonhos abomináveis. Essas reuniões podem durar dias e são verdadeiros festivais de perversidade. Se as festividades forem especialmente atrozes, o Horror Flutuante poderá se manifestar fisicamente para aceitar os sacrifícios que lhe forem oferecidos e em troca conceder presentes aos participantes.


A criatura se assemelha a uma enorme massa formada por milhares de filamentos espinhados e entrelaçados uns sobre os outros. A coisa flutua no ar como um imenso balão que respira e treme. Ao aceitar um sacrifício, o Horror Flutuante se abre e lança esse emaranhado de filamentos fazendo com que elas se enrolem na vítima escolhidas que são então arrastadas para seu interior. Os espinhos perfuram a pele do alvo e a cada movimento se enterram mais fundo na carne causando uma agonia indescritível. A pior parte é que a vítima pode permanecer viva por semanas no interior do Horror Flutuante que demonstra grande satisfação em consumir seus sacrifícios dessa maneira. Muitas vezes ao se manifestar, o Horror traz em seu interior os restos de suas prévias vítimas que são vomitados para que novas tomem seu lugar. Aqueles que sobrevivem a essa provação algumas vezes se tornam acólitos ou sacerdotes do culto.

Rumores insistem que o Horror Flutuante foi invocado pouco depois do devastador terremoto que destruiu Port-au-Price em 2010. Na ocasião seus cultistas buscaram culminar a tragédia com um sacrifício em grande escala.

Rainha de Vermelho 
(Várias partes do mundo)

A Rainha de Vermelho é uma personagem mítica que personifica o poder oculto atrás dos grandes líderes. O avatar no entanto atende apenas à sua própria agenda. Ela é um agente do caos e da destruição que se insinua nos círculos de poder, seja em cortes aristocráticas ou em meio a políticos, militares ou religiosos. Seu propósito é escolher algum indivíduo e alçá-lo à uma posição de destaque. A Mulher de Vermelho sempre age nos bastidores, concedendo vantagens políticas, revelando segredos de inimigos e oferecendo presentes valiosos. Tudo isso auxilia seus protegidos que logo se veem numa condição de importância e influência.

A Mulher de Vermelho é manipuladora, mas faz com que seus protegidos acreditem estar sempre no controle da situação. Invariavelmente ela guia seus escolhidos na direção da tirania, corrupção e paranoia e na maioria das vezes, estes acabam se auto-destruindo. Nada lhe dá mais prazer do que perverter mentes idealistas e ingênuas.

No passado, ela assumia a forma de uma mulher de berço nobre, dotada de carisma extraordinário. Em tempos mais recentes, o avatar se adaptou às novas correntes do poder: ela pode surgir como uma poderosa agente de Hollywood, uma implacável financista de Wall Street ou a secretária de ideologia de um partido. Seja qual for a forma escolhida, a Rainha de Vermelho age de maneira imoral e cruel para alcançar suas metas, recorrendo a charme, persuasão e intimidação.


Na forma humana a Rainha Vermelha tem a aparência de uma mulher de grande beleza e magnetismo. Ela é uma mestre da sedução e intriga, lendo com clareza as linhas de poder, se aproveitando de aliados e jogando-os contra inimigos. A Rainha irradia uma aura hipnótica que ajuda a convencer as pessoas a atender suas ordens, sem que essas sequer percebam. O nome Rainha de Vermelho advém pela sua flagrante preferência por roupas dessa cor. Outra curiosidade sobre sua aparência é que ela tem heterocromia, ou seja, olhos de cores diferentes.

Supõe-se que muitos governantes ao redor do mundo e em diferentes épocas, notórios pela sua tirania e vileza, tenham sido aconselhados pela Rainha Vermelha usando diferentes elementos culturais. O avatar não se vale de um culto, mas obviamente tem a devoção completa de seus protegidos.

A Rainha Vermelha pode assumir uma forma monstruosa quando ameaçada ou para punir alguém que a desagrada. Essa forma remete às antigas lendas de "mulheres demoníacas" presentes em várias culturas. 

Shugoran 
(Malásia)

Também identificado como "Homem Negro com a trombeta", Shugoran é um tipo de bicho papão na cultura Malaia. A lenda é conhecida também em outras áreas da Asia (nas Filipinas e Tailândia) e Oceania (Indonésia e Timor) com algumas pequenas alterações. Uma versão de Shugoran também está presente no folclore do povo maori na Nova Zelândia.

Shugoran é tratado como um emissário da morte e de maus presságios. Ele costuma aparecer em lugares onde alguma tragédia ou desgraça iminente está para acontecer. A criatura possui um grande tromba (por vezes tratada como uma trombeta) que é soprada produzindo um ruído trovejante que parece vir dos céus. Aqueles que escutam esse estranho barulho experimentam uma sensação de desalento e maus pressentimentos. É possível que o ruído esteja ligado a ondas de suicídio, pânico, agitação social e crimes.


O avatar raramente é cultuado, visto ser extremamente temido pelo que representa. Contudo, tribos do perverso povo Tcho-Tcho que habitam a Malásia veneram Shugoran como o arauto da destruição. Eles lhe oferecem tributo na forma de sangue e o brindam com rituais nauseantes. Os Tcho-Tchos também o convocam para levar à cabo vingança contra aqueles que os ofenderam.

Shugoran tem a forma de um grande humanoide com pele negra e escamosa, dotado de estranhas barbatanas nas costas e antebraços, além de uma longa proboscis que se assemelha a uma tromba descendo pela face. Ele fixa essa tromba na boca de um desafeto, quando este está dormindo, e exerce uma sucção extremamente forte. A vítima desse ataque morre imediatamente, o cadáver apresenta uma coloração arroxeada na face e seus pulmões são violentamente projetados para fora da boca. O avatar também é capaz de produzir versões menores de si mesmo: criaturas serviçais que são oferecidas como guardiões ou servos para seus seguidores fieis. Essas criaturas se assemelham ao próprio Shugoran mas são menores e menos poderosas.

sexta-feira, 17 de abril de 2020

Freud - Resenha da hipnótica Série do Netflix


É bom deixar claro logo na primeira frase dessa resenha: Não espere um retrato fiel à respeito do pai da psicanalise na nova série do Netflix, Freud.

Nela, o famoso psiquiatra de Viena, instrumental para que a sociedade moderna viesse a compreender as raízes de suas aflições, é apresentado de maneira bastante diferente. Estamos acostumados a associar a imagem do renomado Dr. Sigmund Freud a um senhor de terno e gravata, cabelos ralos e grisalhos e charuto na boca. Nem lembramos que como todas as pessoas, Freud também já foi jovem, inexperiente e cheio de dúvidas a respeito de seu trabalho. Como todo gênio prestes a dar um grande passo por intermédio de uma teoria inovadora, ele também estava sujeito a incertezas e estas são o pano de fundo para a série. Isso e, é claro, capturar um serial killer

A série austríaca Freud, produzida pelo canal Netflix, está longe de ser uma biografia a respeito do personagem título. Até onde se sabe, o bom Doutor jamais se envolveu em algo remotamente próximo de uma investigação criminal, quanto mais em conspirações palacianas, grupos extremistas separatistas e praticantes de magia negra. Mas é tudo isso que vemos nos oito episódios que compõem a primeira temporada da produção que está disponível para os assinantes.


O resultado poderia ser estranho, mas acaba sendo intrigante.

Nem sempre séries inspiradas por indivíduos ilustres do mundo real obedecem aos ditames da história, não é raro que eles acabem se tornando paródias de quem realmente foram. Algumas vezes o resultado dessa "adaptação" acaba sendo ridículo, como na versão de Abraham Lincoln caçador de vampiros, exagerada como a personificação incorruptível de Eliott Ness ou extravagante como a figura do grande Leonardo da Vinci, em Da Vinci Demons. É fácil deslizar na ficção e criar algo que não passa de uma alegoria da realidade.

O Freud da série é absolutamente fictício e vive situações absurdamente fantasiosas. Entretanto, se o espectador estiver preparado para aceitar isso, e disposto a encarar o bom doutor como um tipo de Sherlock Holmes, irá se divertir.


Na série, Freud (Robert Finster) é um jovem e idealista médico, cheio de planos e disposto a tudo para provar suas teorias. Como residente no principal hospital de Viena, capital do então poderoso Império Austro-Húngaro, Freud luta para ser levado à sério. Em pleno final do século XIX, os demais médicos o veem como uma espécie de charlatão que recorre à controversa prática da hipnose para tratar de seus pacientes. Incapaz de provar seu ponto de vista, sua carreira está na corda bamba, sendo ridicularizado pelas suas ideias e com os superiores prestes a dispensá-lo. Ele recorre a artimanhas, amigos boêmios e extrato de cocaína para suportar a pressão.

O destino resolve dar uma guinada nas coisas quando Freud, na qualidade de médico, acaba sendo convocado pelo rígido Inspetor de Polícia, Alfred Kiss (George Friedrich) para auxiliar na investigação de um violento assassinato. O caso se mostra apenas a ponta do iceberg. Eventualmente a parceria os levará a mergulhar em uma sequência de crimes brutais no coração de Viena, cometidos por pessoas importantes da sociedade local. Freud e Kiss acabam forjando uma inesperada aliança na qual médico e investigador terão de confiar um no outro e desafiar pessoas poderosas se quiserem revelar quem está causando a onda de crimes.

A dupla de protagonistas se complementa de forma magistral: enquanto Freud busca apreciar os crimes de um ponto de vista racional e compassivo, Kiss é pura obsessão e desejo de justiça. Os dois receberão ajuda de uma terceira personagem, a médium Fleur Salomé (Ella Rumpf), jovem recém chegada à cidade que demonstra notáveis habilidades psíquicas. Freud percebe que Fleur pode ser de grande ajuda na investigação e por tabela comprovar suas teorias sobre o poder da hipnose. Mas será que eles conseguirão expor os responsáveis pela grande conspiração e pelos macabros acontecimentos?


Freud é uma série investigativa na qual o mistério vai sendo revelado lentamente, em meio a reviravoltas e cenas de grande impacto. Em alguns momentos as sequências invocam uma aura delirante e decadente, com uma Viena ao mesmo tempo escura e assustadora. O glamour da bella epoque não resiste a imagens cruas que invocam doença, pobreza, brutalidade e a hipocrisia do período. Dos famosos cafés aos reluzentes palácios, dos casebres ordinários aos hospitais abarrotados, a Capital Imperial é reconstruída nos mínimos detalhes com todo seu esplendor gótico.

Com uma produção extremamente caprichada, Freud é um espetáculo visual. Figurino, direção de arte e iluminação funcionam perfeitamente, construindo o cenário no qual a trama se desenvolve. A escolha do elenco também é perfeita. Os personagens possuem rostos marcantes e os atores - todos eles austríacos, tem atuações na medida certa. Robert Finster defende bem seu papel como um Freud em certos momentos perdido em divagações e alucinado com cocaína. Contudo, são Ella Rumpf como a médium atormentada por um passado traumático e George Friedrich como um obstinado homem da lei quem brilham mais intensamente. O Inspetor Kiss é aliás um dos personagens mais intrigantes, com sua noção dúbia de honra e justiça e uma atuação poderosa.


O roteiro se vale de elementos interessantes do período histórico, uma época de grande intriga quando o Império Austro-Húngaro enfrentava a ameaça de dissidentes e rebeldes. O panorama político não poderia ser mais conturbado e no horizonte já podiam ser vistas as nuvens escuras que acabariam resultando na Grande Guerra. Outro assunto que ganha destaque é o início do movimento espiritualista, quando sessões de mediunidade atraíam a atenção da alta-sociedade. Além do espiritismo, o mundo do oculto também e retratado, com direito a lendas, folclore e bruxaria desempenhando um papel marcante na trama.

Mais do que um drama policial, Freud consegue construir uma atmosfera de suspense e, em certos momentos, do mais puro horror. Algumas cenas são bastante impactantes, com doses generosas de sangue, sexo e violência que jamais parecem gratuitas.

Cada episódio tem um título sugestivo: Dissociação, Regressão, Desejo, Catarse e assim por diante. Eles apresentam as ideias contidas na teoria de Freud levadas a prática por circunstâncias absurdas, no caso, uma série de crimes macabros. Aqueles que assistirem aos episódios esperando algo mais convencional, podem se desapontar, mas a série jamais deixa de ser interessante.


Para quem quer fugir da mesmice dos dramas policiais procedimentais, e ter acesso a algo diferente, Freud é uma boa pedida. E pede por uma maratona nesses dias de confinamento.

Com o interesse global que a série causou, tudo indica que em breve tenhamos uma segunda temporada. O episódio final deixa propositalmente algumas pontas soltas e nos faz imaginar como ela pode continuar. Se conseguir manter o nível, que venha logo.

Trailer: