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Desde que tive contato com o cinema espanhol, nunca mais vi os filmes com teor fantástico da mesma forma. Os cineastas espanhóis têm uma forma singular e única de narrar suas lendas. Uma forma não-linear que aguça a perspectiva do telespectador. Em suas películas o fantástico ou o horror não está diretamente ligado ao susto visual ou ao terror ‘americanizado’ daquilo que é considero grotesco e pavoroso. O fragmento fantástico do cinema espanhol está intricadamente ligado com a progressão da história, envolto a narrativa, tecendo uma trama inverossímil que vai se encaixando pouco a pouco, transformando-se em algo surpreendente com a conclusão dos fatos.
Já são clássicos do cinema espanhol filmes como “El Laberinto del Fauno (O Labirinto do Fauno)”; "Espinazo del Diablo (A Espinha do Diabo)" de Guillermo del Toro, “El Orfanato (O Orfanato)” de Juan Antonio Bayona e o fantástico “REC” de Jaume Balagueró e Paco Plaza. Filmes únicos!
No entanto, o cinema fantástico espanhol, graças ao sagrado Cthulhu, ainda tem muito a nos apresentar. Tive essa concepção assistindo “La Herencia Valdemar (O Legado de Valdemar)” do diretor José Luis Alemán. Um dos pouquíssimos filmes que tive o prazer de assistir e presenciar uma abordagem séria da cosmologia literária do fantástico escritor H.P Lovecraft.
O LEGADO DE VALDEMAR - Uma história que oculta um passado sombrio
O início do filme é centrado em Luisa Llorente, uma perita em avaliar construções antigas que é encarregada de coordenar um inventário de posse de bens de uma mansão vitoriana pertencente à família Valdemar. Ao chegar ao local a moça se depara com estranhos eventos sobrenaturais e uma estranha criatura com feições humanas que parece habitar a mansão desde tempos inomináveis.
À primeira vista, os vinte minutos iniciais parecem banais ou até mesmo nada reveladores, criando uma impressão de repetição ou algo que já vimos anteriormente no cinema americano. No entanto o filme vai moldando um novo eixo, criando uma narrativa não-linear após o desaparecimento inexplicável da corretora de imóveis. Até exato momento, Luisa Llorente era a personagem central da trama. Com o seu desaparecimento a empresa, por razões desconhecidas, não deseja o envolvimento da policia. Portanto, contratam o detive particular, Nicholas Tramel que fica responsável pelo caso.
Tramel faz uma longa viagem de trem ao vilarejo aonde se encontra a Mansão Valdemar. Em sua companhia a empresa designou Nora, uma mulher fria e direta, presidente da Fundação Valdemar. Nora tem a incumbência de colocar o detetive Tramel diante dos fatos que permeiam o legado Valdemar. É a partir deste ponto que a trama começa ficar cada vez mais interessante.
RUMO AO SÉCULO XIX
Nora inicia a sua narrativa sobre o casal Beatriz e Lázarus Valdemar. Apartir de agora o filme adentra em outra atmosfera. Aprofundando-se nas veredas do século XIX, criando os fragmentos que permeiam os mistérios que fazem jus ao título do filme. Conta-se então a história de Lázarus, um homem aparentemente feliz, apesar de sua esposa ser incapaz de dar-lhe um primogênito. Diante do infortúnio da natureza, mas muito apaixonados, ambos adotam várias crianças, tornando a mansão em uma espécie de orfanato.
É neste ambiente que Lázarus exercita sua segunda paixão, a fotografia familiar. Todavia, depois de um tempo ele se cansou das fotografias familiares e começou a praticar novas experiências incomuns, chegando até aprofundar-se no ocultismo. Entre várias experimentações e truques ópticos como difusões, fundos negros e exposições duplas. Lázarus descobriu algo revelador, a fotografia psíquica.
Foi então que ele teve uma grande idéia. O espiritismo era algo novo e preste a se tornar uma moda. Lázarus começou a ganhar fortuna fazendo sessões espíritas. Prometendo aos seus participantes a certeza do último registro ao lado de seu ente querido. Tais sessões acabam chamando a atenção de Alester Crowley (mago e charlatão inglês) que propõe fazer um ritual proibido, conhecido como “O Ritual de Dunwich”.
H.P LOVECRAFT
O Ritual de Dunwich é inspirado em um conto do escritor de literatura fantástica H.P Lovecraft. O suposto ritual é mencionado no conto “O Horror em Dunwich”. Dunwich, segundo o conto do autor, é um vilarejo localizado em Massachusetts, um dos 50 estados dos Estados Unidos da América, localizado na região da Nova Inglaterra. Neste vilarejo oculto entre penhascos e floresta, por volta de 1747, era praticado estranhos rituais de evocações que clamavam por seres ocultos além das montanhas. O ritual consistia, sendo a narrativa fantasiosa do autor, abrir o portal entre as dimensões que separam a nossa realidade do desconhecido.
A narrativa do filme é justamente inspirada neste conto de Lovecraft. Crowley, a fim de persuadir Lázarus, conta-lhe sobre todo o sortilégio do conhecimento adquirido. No entanto o ritual sai do controle, evocando uma criatura inominável das profundezas do desconhecido.
CURIOSIDADES DO FILME
La Herencia Valdemar tem algumas coisas muito interessantes que não podem passar em branco. A primeira delas é a impecável caracterização de época e a perfeita simetria narrativa que torna o enredo interessante, narrando de forma concisa à cosmologia do universo tétrico de Lovecraft. O próprio José Luis Alemán proferiu em uma entrevista sobre as dificuldades de se fazer um filme baseado na obra do escritor. Justamente devido à profundeza de detalhes que existe em seus contos e a profundidade da narrativa, muitas vezes, com ausência de diálogos. Mas após a experiência de assistir ao filme, garanto que o diretor teve muito êxito.
Outro fato interessante sobre o filme são os personagens que se apresentam. Para a execução do ritual de Dunwich o mago Alester Crowley traz em sua companhia quatro figurinhas interessantes do século XIX. A Sra. Belle Gunnes uma das maiores serial killers de sua época.
Podemos dizer que a dona Gunnes é a própria personificação da Viúva Negra, pois todos os seus casamentos terminavam com uma morte inesperada. Narra à história que ela já matou mais de 40 pessoas durante uma década. Todas as mortes envolviam heranças e seguros de vida.
Temos também, a Sra. Lizzie Borden, uma solteirona da Nova Inglaterra que ficou popularmente conhecida pelo homicídio duplo a machadadas brutais de seu pai e sua madrasta. Alguns murmúrios dizem que ela era lésbica e sua madrasta não aceitou tal situação. Sim, Lizzie Borden também é o nome de uma banda de Heavy Metal (Leia-se glitter metal) muito conhecida nos anos 80. E por fim, outras duas personalidades bem conhecidas: o escritor Bram Stoker, autor do Drácula e o musicista italiano Sr. Luglio Fuchini.
La Herencia Valdemar é o primeiro filme em toda a história do cinema espanhol feito sem subsídios do governo espanhol. E também o último filme de Paul Naschy, que faleceu em 30 de novembro de 2009.Os efeitos especiais ficam por conta de Reyes Abades, mestre consagrado responsável também pelos impressionantes efeitos visuais de “El Laberinto del Fauno (O Labirinto do Fauno)”do diretor Guillermo del Toro.
FICHA TÉCNICA
Diretor: José Luis Alemán
Elenco: Silvia Abascal, Jimmy Barnatán, Lino Braxe, Ana Bullón, Ignacio García-Bustelo, Luis García, Óscar Jaenada, Soraya Padrao.Produção: Íñigo Marco
Roteiro: José Luis Alemán
Fotografia: David Azcano
Trilha Sonora: Arnau Bataller
Ano: 2010
País: Espanha
Gênero: Suspense/Drama
Eu já li pela wired várias pessoas falando mal deste filme, porem eu assisti e gostei muito, pois fugiu totalmente aos cliches gore dos filmes de terror atuais, sem falar nas citações e referências a Lovecraft.
ResponderExcluirEstou aguardando ancioso a parte dois, porem temo que possam estragar a história deixando-a muito gore etc. Mas o Xothian que aparece no trailler me deixou muito curioso.
Cara, assisti a 1ª parte e achei excelente, e já estou atrás da 2ª parte depois que vi o trailer! Vale muito a pena!
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirAcabei de assistir a segunda parte de La Herencia Valdemar, e o que posso dizer, um filmaço. Bem feito, história boa e bem armada, além das aparições de Cthulhu serem fiéis, e de excelente efeito especial. Vale a pena. Para mim, em minha modesta opinão, a melhor adaptação dos Mythos para as telonas e/ou telinhas. Quem precisar do link para download só pedir, evidentemente não vou colocá-lo, pois não pedi e logo não tenho a autorização do mestre tentacular para tal. Um grande abraço a todos, e parabéns pelo incrível blog.
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