segunda-feira, 30 de julho de 2012

Loucuras na Belle Époque - Os Insanos Cabarés de Paris em 1890



Nos tempos modernos, você pode encontrar cabarés decadentes e clubes góticos na maioria das grandes cidades modernas. Mas, voltando ao final do século XIX, as opções deviam ser bem mais limitadas. Certo?

Bem, em termos...

Se você estivesse em Paris durante a Belle Époque, poderia visitar lugares bastante curiosos.

A Paris da década de 1890 tinha algumas opções favorecendo um estilo de vida noturna que poderia ser classificado como sobrenatural. Cada um destes estabelecimentos apresentava truques de cena maravilhosamente bizarros que deixariam mesmo os frequentadores de clubes atuais de boca aberta.

No livro "1899 Bohemian Paris" escrito por William Chambers Morrow e Cucuel Édouard, os autores apresentam três nightclubs que funcionaram no Boulevard Clichy um dos redutos boêmios da Cidade Luz que também hospedava o célebre Théâtre des Deux Ânes (Teatro dos dois Burros), o Musée de l'Erotisme (Museu do erotismo) e o famoso Moulin Rouge

Destinos absolutamente inusitados para beber e se divertir como o Cabaret du Néant ("O Cabaret do Nada"), também funcionavam ali.

Nesta boate precursora dos clubes góticos, os visitantes ponderavam sobre sua própria mortalidade enquanto sentavam em cadeiras que eram lápides, se apoiavam em mesas construídas na forma de caixões e bebiam drinks que recebiam sugestivos nomes de doenças. Atendentes vestidos de monges medievais e coveiros serviam os clientes sempre dispostos a compartilhar um ou outro trecho de poesia macabra. 

Morrow conta: "Grandes e pesados ​​caixões de madeira, serviam de mesa e como decoração do ambiente que remetia a algum tipo de tragédia ou catástrofe de grandes proporções, uma peste ou um terremoto quem sabe. As paredes eram decoradas com caveiras e ossos, esqueletos em posições grotescas, quadros de natureza morta, batalhas e até mesmo guilhotinas, armaduras e instrumentos de tortura adornavam as paredes. A morte era um tema recorrente, com direito a cortinas negras, velas e flores negras". 

Um cliente podia entrar e relaxar enquanto o barman vestido como um bispo profano preparava um drink chamado "Micróbio de Cólera Asiática", "Câncer de Fígado" ou quem sabe ainda "Germe de Tuberculose". Tudo servido em taças esculpidas na forma de crânios humanos. Algumas mulheres entre os visitantes riam, outras estremeciam diante do ambiente decadente, há rumores que mais de um cliente desmaiou ao se deparar com o tema da decoração que incluía ainda um caldeirão onde bebidas caseiras eram preparadas por supostas bruxas. 


"Bebam, meus caros!" gritavam as "feiticeiras" remexendo os caldeirões: "bebam essas poções nocivas, que contêm venenos cruéis e mortais!"


Após algumas libações na notória "Salle d'Intoxication" (Sala de Intoxicação), os clientes podiam seguir para um dos outros aposentos, onde os anfitriões usavam espelhos e recursos de ilusão de ótica para alterar a imagem refletida, transformando os frequentadores em sombras ou esqueletos. Infelizmente esse lugar assombrado não sobreviveu a Segunda Guerra Mundial.

Mas o "Cabaret du Néant" não era a única casa noturna de arrepiar em Paris. Morrow descreve outro estabelecimento chamado "Cabaret de l'Enfer" ("Cabaret do Inferno"), um clube noturno com tema satânico também instalado na vizinhança de Montmartre. De acordo com o relato dos clientes, talvez tenha sido o ponto de encontro mais perturbador da sua época.

"Entre e seja condenado, o Maligno espera por vocês todos no interior dessa casa demoníaca!" rosnava o porteiro aos gritos com uma voz áspera e abrasiva. O homem de pele negra vestindo um smoking e cartola vermelhos era uma visão bizarra que preparava os clientes para o que iriam encontrar na casa. A entrada da casa levava os clientes a adentrar a bocarra aberta de um gárgula medonho como se todos estivessem sendo engolidos. 

No interior claustrofóbico tudo remetia a um inferno estilizado a moda da Divina Comédia de Dante, com paredes pintadas de vermelho, máscaras medonhas penduradas em pilastras douradas, estalactites pendendo do teto cavernoso, cercas de ferro batido em forma de lanças e até um enorme trono que simulava o lugar de honra do diabo. Fumaça criada com gelo seco fazia com que o ambiente assumisse uma aparência onírica. As atendentes, mulheres usando roupas de couro vermelho e maquiagem remetendo a sucubus e anões fazendo as vezes de diabretes corriam de um lado para o outro levando bebidas e refeições.    

Toda noite, pontualmente à meia-noite um ator vestindo a indumentária de um sacerdote era arrastado para o palco e lançado em um enorme caldeirão de ferro pelos diabretes. Essa era a senha para começar a música e abrir o salão para os clientes dançarem. Artistas avant-garde, pensadores e diletantes frequentavam o cabaré considerado por muitos a mais decadente casa noturna de Paris. Dizem que a Grande Josephine Baker chegou a visitar o cabaret em mais de uma ocasião arrancando suspiros dos clientes.

    
O clube funcionou até meados de 1952, sendo que durante a Segunda Guerra Mundial fechou suas portas não pelos excessos, mas por ter trocado o ator vestido de padre por uma personagem imitando os trejeitos de Adolf Hitler, bigode e suástica incluídos. Os alemães que ocupavam Paris obviamente não acharam graça na brincadeira.

Bem ao lado do "Cabaret de l'Enfer" funcionava sua contraparte o "Cabaret du Ciel" ("O Cabaret do Céu"), um bar temático onde anjos davam as boas vindas aos visitantes e damas formosas vestidas com togas e louros nos cabelos dançavam provocativamente ao redor dos clientes. Como relatou Morrow, o entretenimento era presidido pelo próprio São Pedro, que ungia o público com vinho e champanhe.


Voando pelo salão, acrobatas vestidos de anjos evoluíam graciosamente em trapézios. O teto pintado de azul celeste com nuvens brancas remetia a um paraíso. Garçons usando auréolas douradas e asas com penas brancas traziam as bebidas e se despediam dos clientes dizendo coisas como: "As saudações do céu para ti, irmãos! Eterna bem-aventurança e felicidade para todos vocês. Prepare-se para encontrar teu grande Criador e não esqueça de deixar uma gorjeta para o garcon! "[...]

São Pedro, carregando a Chave dos portões do Paraíso conduzia uma apresentação quase-teatral em que uma procissão de anjos usando túnicas azuladas e sandálias vagava pelas mesas servindo bebidas douradas aos clientes. "Aqueles que beber desse néctar divino será perdoado de todos os seus pecados!" declarava o santo a medida que servia cálices de cristal para os presentes.

Nenhum destes cabarés sobreviveu aos dias atuais, mas com certeza eles marcaram época pela criatividade e inovação na maneira como atendiam os clientes e faziam com que eles fossem absorvidos pela atmosfera ao mesmo tempo acolhedora e assustadora.

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