quinta-feira, 5 de março de 2015

Resenha do Cenário Degraus para o Abismo


Degraus para o Abismo – uma resenha.
Por Eli Andreoli

“Após alguns anos no ramo da investigação particular, posso dizer que já vi um pouco de tudo, e isso é o suficiente para subestimar casos que parecem resolvidos antes mesmo de se levantar a bunda da cadeira – mas isso não é um conto de Sherlock Holmes e esse erro de julgamento é um grande risco em minha profissão.

Cometi esse tolo equívoco quando o Dr. Cordeiro nos contratou para investigar o desaparecimento de Otávio Camargo: um playboy de vida desregrada cujos colunistas sociais dos jornais adoravam acompanhar suas traquinagens para dar mais assunto às dondocas da alta sociedade carioca que adoravam um mexerico sussurrado nos cantos dos salões dos bailes chiques da zona sul. Se dependesse de Otávio, os jornalistas especializados em fuxicos jamais ficariam sem emprego – um jovem relaxado, irresponsável que jamais trabalhou na vida e não conseguia terminar a faculdade devido à total incapacidade de ficar longe da boemia.

Tão logo o advogado da família Camargo nos informou que seu cliente desaparecera, supus que deveria ser mais uma traquinagem de um jovem que jamais saíra de sua infância, mas que já tinha idade para se apresentar legalmente como dono de seus próprios orifícios nasais. Isso obscureceu meu julgamento e essa tola análise prematura custou a vida de dois de meus associados e quase cobrou de mim também seu preço em sangue. Jamais imaginaria que um caso que julgava enfadonho iria me lançar à uma trama sinistra na qual posso dizer que só saí vivo por pura providência divina.

Apesar de sair dessa intempérie com vida, jamais poderei dizer que saí ileso, pois decerto foram fatos nefastos que se cravaram a fogo em minha agora fragilizada mente. Ninguém acreditaria nas medonhas experiências que vivi e nem no relato fantástico que posso dar. Sei apenas que em um par de dias minha vida monótona foi chacoalhada e me mostrou o horror que nenhum homem jamais deveria saber que existe.” – Relato de Dr. Edgar von Farber, Médico Forense e Investigador Particular.

Degraus para o Abismo é um cenário escrito pelo já conhecido Luciano Giehl e publicado pela Terra Incógnita. Uma excelente opção para quem busca uma alternativa em português para se divertir com jogadores experientes ou iniciantes no mundo aterrorizante dos Mitos de Cthulhu. Mestrei o cenário tão logo quanto eu o recebi e o resultado foi realmente muito bom. Portanto venho fazer uma breve resenha e relato sobre a sessão de jogo – tentando obviamente deixar esse texto longe dos malditos spoilers.


Ambientado no Rio de Janeiro de 1926, a história gira em torno do desaparecimento de Otávio, um playboy desregrado, herdeiro único cujo pai se encontra em leito do hospital, fragilizado e doente. Dr. Cordeiro é o responsável por administrar os negócios da família e contata os investigadores para desvendar onde estaria metido o embrulhão. A única pista de seu paradeiro é que seu inseparável amigo Edgar fora encontrado completamente desnorteado no meio do Campo de Golfe de Gávea e levado ao Hospital de Alienados da Praia Vermelha. Diagnosticado com sintomas de estresse pós-traumático, após estabilizada sua histeria entrou em catatonia profunda.

O cenário oferece flexibilidade ao Guardião para optar quanto ao papel dos investigadores no cenário. A história assume que os investigadores são Detetives Particulares, mas permitem também jornalistas em busca de um furo, membros da família Camargo (talvez interessadas na herança), policiais, psicólogos que receberam o paciente catatônico, dentre outras maneiras dos investigadores se relacionarem com o desaparecido. Nenhum investigador precisa ser versado no paranormal, já que o cenário se encarregará de lançar os personagens em fatos inacreditáveis que mudarão suas vidas para sempre.

Uma vez iniciada as investigações elas se desenrolam de uma forma supreendentemente rica em detalhes, porém fluída, jogando gradualmente as investigações de um caso comum e entediante à uma trama sórdida que envolve o obscuro mundo dos mitos. Para transitar de uma investigação banal à uma trama mortal, o cenário conta com alguns Recursos (Props, para os puritanos). São textos relativamente curtos e objetivos, o que agiliza o cenário e faz com que aqueles jogadores que não gostam muito de ler não percam o interesse na história (principalmente no caso de iniciantes nos Mitos de Cthulhu).

Um ponto interessantíssimo do cenário que explora uma das formações geológicas que mais trazem teorias controversas para a antropologia e história nacional. A Pedra de Gávea – um local real – é localizado no Rio de Janeiro, cujas inscrições nas paredes das cavernas fazem com que estudiosos reflitam sobre a própria história do país. Você nunca ouviu falar da Pedra de Gávea? Vamos lá, faça uma pesquisa rápida no Google, tenho certeza que achará intrigante as hipóteses levantadas sobre esse misterioso local que faz parte de nossa história e folclore.


Uma crítica positiva ao cenário, é que o Guardião consegue se sentir à vontade para expandir ou comprimir o tempo de jogo conforme sua necessidade, alterando pouco ou até nada da descrição do cenário, bastando para isso o Guardião ser menos ou mais detalhista. A sessão pode durar de poucas 2 horas até uma tarde (ou noite) inteira se assim o grupo desejar. Além disso permite que seja uma sessão isolada no meio de uma campanha ou até mesmo o início de uma.

Um ponto crítico no cenário depende do Guardião considerar-se ou não um purista e fiel às histórias Lovecraftianas. Afinal, uma característica dos cenários de Luciano Giehl (que considero um purista) é que normalmente as investigações preliminares não apresentam riscos mortais aos investigadores, mas isso tudo muda quando se chega ao clímax do cenário. São muitos rolamentos e uma falha ocasionalmente pode levar algum investigador a óbito prematuro. Em minha mesa, metade dos investigadores morreram por terem azar nos dados, mesmo não estando em combate. O Guardião deve refletir se o nível de dificuldade da cena final pode prejudicar ou não a diversão do grupo, principalmente se o cenário for inserido em uma campanha. Contudo, como uma sessão isolada, o Guardião não deve se incomodar mandar uma ou duas almas para o limbo.

Quanto ao livro, este é distribuído digitalmente em formato PDF. São 15 páginas mais capa, sabiamente já preparadas para impressão preto e branco. As imagens são fotomontagens que ajudam a deixar o Guardião e aos jogadores se ambientarem ao cenário. A única crítica ao livreto encontra-se no fato de não haver um apêndice com todos os Recursos (Props) reunidos para serem impressos de uma única vez, tendo que imprimir algumas páginas em duplicata, desperdiçando um pouco de tinta e algumas folhas.

Enfim, é um excelente cenário. Recomendo tanto para mestres experientes ou talvez iniciantes nas artes do obscuro. O livro é distribuído em PDF pela Terra Incógnita, tem um preço módico de R$9,90 e pode ser comprado a partir do link: http://www.terraincognitaeditora.com.br/

2 comentários:

  1. Parabéns Luciano. Espero narrar esse cenário para meu grupo em breve.

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  2. Cara, excelente análise. Vou narrar em breve essa aventura para uns amigos.

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