quinta-feira, 17 de setembro de 2020

Fantasmas no Deserto Gelado - Narrativas de Assombrações na Antártida


O desolado continente da Antártida conjura sobre si uma imagem infernal de desertos prístinos e paisagens gélidas. Trata-se de um território que não foi feito para o homem e onde tudo parece conspirar contra sua presença nele. Mas é claro, ele continua atraindo nossa atenção e exploradores se aventuram em seus perigosos limites, decididos a conquistar essa fronteira final. Nessa relação de vida e morte, muitos nunca retornam.

O que poucas pessoas falam a respeito é que a Antártida também possui lugares assombrados onde medo e terror se mesclam com o clima impiedoso. 

Um dos lugares mais sinistros no continente não oferece muito para ver, já que não passa de uma velha cabana abandonada e exposta aos elementos na isolada Ilha de Winter, parte do arquipélago argentino. A casa, que oficialmente atende pelo nome de British Faraday Station (Estação Britânica Faraday), ou simplesmente Estação F, foi construída em 1947 por James Wordie, que foi membro da Expedição Endurance liderada por Sir Ernest Shackleton em 1914-1917. Ela foi usada como observatório e base para pesquisas de geofísica, meteorologia e estudos sobre a ionosfera. A casa seria usada por décadas antes de ser completamente abandonada quando as operações principais foram transferidas para a Ilha de Galindez que oferecia condições melhores. A casa original, a Wordie House ainda se mantém como uma casca vazia em meio a paisagem branca, abrigando todos os seus fantasmas.


Os poucos que estiveram lá nas últimas décadas relatam histórias sobre acontecimentos estranhos no interior do abrigo erguido com madeira e tijolos. Dizem que objetos se movem espontaneamente, que pequenos incêndios começam sem causa aparente e que ruídos tétricos, de coisas sendo arranhadas e de passos podem ser ouvidos. Mas não é só isso: há também presenças invisíveis, uma sensação esmagadora de estar sendo observado e um senso de ameaça tão forte que muitos se dizem fisicamente acossados. Mais de uma expedição cancelou a estadia prolongada na casa depois de alguns poucos dias, preferindo seguir para outros abrigos a despeito de serem menos confortáveis. Há relatos feitos por conceituados cientistas a respeito desses incidentes, narrativas de pessoas sérias que nada teriam a ganhar inventando tal coisa.

A Casa Wordie foi investigada pelo programa de televisão Destination Truth que se propõe a visitar lugares assombrados. Na ocasião, a equipe experimentou incidentes estranhos durante sua estadia, incluindo objetos caindo das prateleiras, portas fechando sozinhas e o inquietante som de interruptores de luz sendo ligados e desligados sem que ninguém estivesse presente. Mas a descrição mais contundente é a da sensação pesada e ameaçadora que permeava essa cabana no fim do mundo. Os apresentadores e nem a equipe conseguiam definir o sentimento: era como estar em um lugar que decididamente não queria receber visitas. Como se uma força consciente estivesse de alguma forma conspirando para que as pessoas fossem embora e jamais voltassem.

A fonte dessa força permanece desconhecida, assim como a certeza do que ela realmente seria. Muito se discute se pode ser um fantasma ou uma assombração no sentido clássico de alguém ter morrido lá e seu espírito continuar presente nas paredes. Mas na Casa Wordie, o espectro parece ser algo diferente do convencional, não o fantasma de uma pessoa, mas um depositário de emoções e medos acumulados que de alguma forma teria permanecido ali. À luz da parapsicologia, fortes sensações, sobretudo de pavor e apreensão, podem dar origem à áreas em que os tormentos um dia experimentados continuam reverberando indeterminadamente. E quem for suficientemente sensitivo é capaz de captar tal coisa.


Nesse caso, a Casa Wordie seria um perfeito exemplo de local capaz de represar sensações fortes. Inúmeras expedições se abrigaram ali ao longo das décadas, temendo pelo desfecho, pelas interperies e pelas suas próprias vidas. Seria possível que estas tivessem partido, mas deixado para traz emoções duradouras? Aqueles que visitaram o local, mesmo os mais céticos, acreditam que a possibilidade existe.

Incidentalmente, a mesma equipe do programa Destination Truth explorou outro lugar com fama de assombrado na região. Trata-se de Deception Island que foi deixada para apodrecer nos tempos difíceis da Grande Depressão quando o preço do óleo de baleia que era produzido lá despencou. O local não é mais do que um ajuntamento de velhos depósitos e um cais decrépito ocupando uma triste praia pedregosa numa das ilhas mais escuras do arquipélago. Antigos barcos de pesca e baleeiros permanecem lá, enferrujando no pier semi-congelado. Basta um breve olhar para sentir que se trata de um lugar esquecido.

Construído no fim do século XIX, o local um dia foi usado como porto para baleeiros que predavam as águas gélidas do atlântico sul. Os arpoeiros arrastavam baleias mortas até a costa onde a carne delas era fervida em enormes toneis de ferro para extração de óleo. Pedaços delas também eram colocados em ganchos e pendurados nos depósitos. Os ossos por sua vez, eram pulverizados para serem aproveitados como adubo. Deception Island foi um lugar de trabalho brutal, com homens endurecidos pelo serviço extenuante e pelo clima implacável. Ela chegou a receber até 60 habitantes antes de fechar suas portas para sempre, alguns jamais partiram como comprova o pequeno cemitério nos fundos do local.


A equipe do programa de TV viu coisas muito estranhas em sua passagem pela ilha: aparições, vultos, sombras e vozes inexplicáveis. Também reportaram ter ouvido batidas secas vindas de um dos depósitos, não por acaso, onde havia uma imensa pilha de ossos de baleia. Um dos maiores mistérios, entretanto, envolvia uma figura sombria que parecia espreitar o local, como se estivesse curiosa com a súbita aparição de visitantes depois de tanto tempo sozinha. O grupo usou um aparelho de leitura térmica que captou essa presença desconhecida próxima de uma janela, quando não havia ninguém lá. Um estranho ruído de leves batidas, que foi interpretado como código morse, também foi captado por um microfone instalado na antiga sala de comunicações da estação. Coisas realmente sinistras de serem vistas e ouvidas, sobretudo quando se está há quilômetros da civilização em um lugar tão austero.

Um lugar possivelmente ainda mais assombrado na Antártida é a Ilha de Ross, que foi o palco de uma grande tragédia em 1979. Na época, alguns serviços turísticos ofereciam a bravos viajantes uma oportunidade de conhecer o continente e viver uma aventura diferente. Em 28 de novembro de 1979, um avião saindo da Nova Zelândia carregando 257 pessoas seguiu para Ross Island com objetivo de fazer um sobrevoo panorâmico. Ocorre que a equipe não tinha experiência voando em condições polares e a visibilidade no dia em questão era realmente ruim. Quando o piloto baixou o avião para que os passageiros pudessem ter um vislumbre da Geleira de Ross, a perda momentânea de visibilidade fez com que o avião alterasse o curso e só tarde demais percebesse que estava indo na direção da elevação conhecida como Monte Erebus. O avião se chocou espetacularmente contra a montanha matando todos à bordo.
 
Os corpos foram resgatados do solo congelado e levados até a Estação McMurdo, uma base norte-americana na ilha, o único lugar habitado em quilômetros. Lá aguardariam até serem transportados de volta à Nova Zelândia. Com tamanha tragédia cercando o incidente não é surpresa que o local tenha se tornado palco de várias assombrações. Visitantes e a equipe da Estação McMurdo contam ter visto aparições de passageiros vagando sem rumo pela tundra congelada ou aparecendo pela própria base. Também ouvem sons de vozes, gemidos e até mesmo gritos de horror carregados pelo vento. Esses espectros, por vezes horrivelmente mutilados, jamais interagem com aqueles que os veem, e é especulado se eles próprios sabem que estão mortos. Para alguns parapsicólogos quando grandes tragédias ocorrem, ecos de memórias de alguma forma ficam impressas na paisagem como a imagem de um filme. Isso explicaria o testemunho de várias pessoas que afirmam categoricamente ter visto um avião fantasma (que não produz som) sobrevoando a Ilha na mesma rota fatídica que o levou até o Monte Erebus.


Não por acaso, após o acidente fatal, companhias aéreas civis foram descredenciadas para voar sobre a Antártida e apenas vôos especiais que servem aos exploradores recebem autorização. Mesmo os mais experientes pilotos sabem que voar sobre a Antártida é complicado em face das mudanças climáticas, tempestades repentinas, rajadas de vento e baixa visibilidade. Os voos muitas vezes são realizados com o uso de aparelhos.  

Também na Ilha de Ross pode ser encontrado outro lugar assombrado que celebra uma tragédia que teve repercussão em todo mundo em 1913. A trágica expedição britânica Terra Nova, liderada pelo audaz explorador Robert Falcon Scott tinha natureza científica e visava ser a primeira a chegar ao Polo Sul. Infelizmente, ela não apenas falhou em conseguir sua primazia, mas todo o grupo que atingiu o Pólo morreu na jornada de volta. 

O incidente causou grande comoção já que Scott era visto como um herói nacional na Grã-Bretanha, igualmente admirado e celebrado pelas suas façanhas. Os restos da expedição, e de seus membros, só foram encontrados oito meses depois. O mais irônico é que o acampamento final deles estava apenas alguns quilômetros de distância de um abrigo com suprimentos que os salvaria. Scott e seus comandados, no entanto, não tinham mais forças para prosseguir e acabaram perecendo exauridos física e emocionalmente. Só é possível imaginar como foram os seus momentos finais, sabendo que não havia escapatória, ainda que esta estivesse logo adiante - tão longe, tão perto.  

Um memorial, na forma de uma cruz com o nome dos exploradores, foi erguido pelo grupo de resgate que encontrou os corpos. É um rumor persistente desde sua construção que o memorial se tornou um lugar fantasmagórico que atrai não apenas o espírito dos membros da malfadada expedição, mas também outras pessoas que tiveram mortes trágicas na Antártida. Testemunhas afirmam que figuras etéreas, vultos e sombras costumam ser vistas rondando os arredores do Memorial Terra Nova. O som de soluços amargos e de choro pode ser ouvido, segundo alguns.


Há um senso de profundo pesar e tristeza pairando no ar, um sentimento que alguns se referem como uma aura inquietante e não-natural. Para algumas pessoas, meramente permanecer ali por mais tempo que o necessário atrai pensamentos funestos, de aflição e melancolia. Alguns até contemplam ideias sobre suicídio como a solução para seus problemas. De fato, visitar o local não é agradável.

Como se não bastassem esses sentimentos incômodos, há manifestações que permeiam o local: sons anômalos de vozes, gritos, choro e sussurros carregados pelo vento. Também existe a impressão de que próximo da cruz, o clima gélido parece ainda mais congelante.

O que dizer de todas essas histórias macabras? Seria possível que fantasmas de exploradores e visitantes mortos na Antártida ficaram presos no continente gelado pela eternidade, capturados em uma espécie de loop que os obriga a reviver para sempre seus últimos (e piores) momentos?  

Tais histórias nos recordam que mesmo nos limites da civilização, em um reino afastado de gelo e vento, lugares assombrados podem existir. Mesmo elementos tão severos são incapazes de afastar presenças espectrais que espreitam. E há algo de especialmente triste em imaginar esses espíritos solitários habitando um dos lugares mais inóspitos do mundo.

2 comentários:

  1. No passado, a Antártida foi um continente como qualquer outro certo? Tanto que até fósseis de animais da época dos dinossauros já foram encontrados. Imaginem o que não deve estar escondido debaixo de tanto gelo.

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  2. A antártica realmente é um lugar misterioso e fantástico.
    https://bardodanevoa.blogspot.com/

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