Quando se fala na obra de H.P. Lovecraft, sua novela mais famosa "Nas Montanhas da Loucura" (At the Mountains of Madness) sempre se destaca.
Escrita em 1931, Montanhas é um épico de suspense, ficção e terror. Lovecraft utilizou de expedientes que na época eram novidade: utilizar lugares e fatos do mundo real, buscar fontes jornalísticas para emoldurar sua trama e principalmente, se valer da ciência e tecnologia para embasar sua história. O resultado é uma narrativa repleta de dados tão fieis que tudo soa incrivelmente fidedigno. Da maneira como foi escrito, Montanhas soa como um relato real escrito por um cientista ou explorador, dando conta de acontecimentos ocorridos durante uma dramática expedição a um dos lugares mais inóspitos e perigosos do planeta - o Continente gelado da Antártida.
Para quem não está familiarizado com a literatura lovecraftiana e caiu de paraquedas nessa resenha, cabe falar um pouco do sujeito.
H.P. Lovecraft é um dos maiores (para alguns o maior) expoente da literatura de Horror nos EUA no século XX. Seus textos macabros englobam diferentes gêneros do horror clássico, do terror gótico passando para o folk horror, transitando pela ficção científica, sempre com enorme competência e um estilo inconfundível. O Horror Cósmico é sua criação mais significativa e contribuição marcante ao terror. O gênero se refere a um horror tão profundo e desconhecido, absurdamente alienígena para a humanidade que a exposição prolongada a ele causa a loucura. No cânon de Lovecraft, entidades ancestrais vindas das estrelas distantes se principiaram sobre a Terra no inícios dos tempos e se tornaram Deuses que influenciaram cultos e seitas macabras. Estas aguardam ansiosas pelo dia em que estes deuses despertarão. Lovecraft explora o pessimismo nihilista ao máximo, apresentando uma visão perturbadora de um mundo à beira da devastação e de uma humanidade esmagada por forças que ela é incapaz de compreender.
O valor da obra de Lovecraft só foi reconhecido muito depois de sua morte, graças ao resgate de seus escritos por amigos e admiradores que foram os primeiros a perceber a genialidade do seu trabalho. Desse momento em diante, a redescoberta de Lovecraft foi radical. Ele não apenas se tornou famoso na literatura, mas sua obra inspirou filmes, séries, jogos de computador, games, cards, RPG e muito, muito mais.
Na literatura, os contos de Lovecraft foram reunidos em antologias que reúnem suas histórias mais famosas. De edições simples a volumes de luxo que mais parecem tomos como o célebre Necronomicon, é possível achar Lovecraft em diversos formatos.
Isso nos leva ao artigo e resenha que você está lendo nesse momento.
Seria a combinação de texto e imagem a melhor forma de apreciar os contos de Lovecraft?
Ao folhear o segundo volume de "Nas Montanhas da Loucura" belissimamente ilustrado pelo talentoso artista francês François Baranger, é difícil não dizer que sim.
Lovecraft é, em grande parte, um escritor que aproveita as paisagens que está descrevendo, sejam elas físicas ou emocionais. Suas visões são viscerais exatamente porque seu vocabulário é avançado e cheio de detalhes intrincados. As imagens imponentes no livro permitem que o leitor se concentre e não se distraia com uma palavra com a qual não esteja intimamente familiarizado. E isso é algo que percebi lendo o primeiro volume da novela. Talvez esta tenha sido minha experiência mais agradável ao ler Montanhas da Loucura, que alguns consideram demasiado rebuscado. O texto flui mais fácil, em comunhão com as imagens. A grandiosidade das descrições se encaixa perfeitamente com o visual geral. Os desenhos têm espaço para respirar acompanhando a prosa do texto.
A arte de Baranger é tão complexa e elaborada quanto a escrita de Lovecraft. Ela complementa o texto, dando margem a interpretações fantásticas de paisagens ermas e de um ambiente selvagem. A maioria das ilustrações se debruça sobre paisagens impossíveis e a insignificância da presença humana em lugares onde o homem nunca deveria estar. Mas há cenas mais intimistas evocando descobertas que drenam a sanidade, arqueologia e astronomia que nunca deveriam ter existido, silhuetas de criaturas estranhas ao nosso mundo, cenas de ação e muito mais. Cada desenho é diretamente relevante para o texto que é sobreposto acima dele.
O artista equilibra cenas de ação, imagens do passado e imagens propositalmente nebulosas ao longo das página. Baranger tem um olho clínico para extrair da narrativa as cenas mais marcantes, sem jamais, no entanto, ser óbvio. Suas cenas de horror são aterrorizantes bem dentro da proposta do impensável e imponderável. É uma façanha considerável dar forma a coisas que Lovecraft não se furta em dizer que são por demais bizarras para serem descritas adequadamente.
O livro é apresentado em uma versão luxuosa, com capa dura e páginas em papel de altíssima qualidade. Visualmente o livro segue o padrão da primeira parte, o que faz todo sentido. O tamanho das páginas fornece uma tela ampla para o artista, que oferece imagens que poderiam facilmente se tornar pôsteres. Não há molduras ou espaços em branco, o texto é colocado dentro das imagens para total impacto das cenas. A Darkside Books se esmerou em fazer o material o mais fiel possível à edição americana e, de fato, comparando as duas, eu até acho que a edição brasileira tem cores mais vivas que sua contraparte estrangeira.
Para quem adquiriu a primeira parte de Nas Montanhas da Loucura, esse Volume II é praticamente obrigatório. Não apenas por se tratar da conclusão da história (aqui temos os capítulo 6 a 12), mas por ser uma continuação que sustenta a mesma proposta. Com imagens deslumbrantes que acentuam a narração ao máximo, essa é possivelmente a versão definitiva da novela. Dificilmente alguém conseguirá fazer algo melhor e mais evocativo.
Aos fãs do Horror Cósmico e de arte, esse livro é simplesmente imperdível.
Leia aqui a resenha da primeira parte:
E aqui está o link para a Editora Darkside.
Esse é compra obrigatória...
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