segunda-feira, 10 de julho de 2023

Resenha "Nas Montanhas da Loucura" - A incrível parceria entre H.P. Lovecraft e François Baranger


"Nas Montanhas da Loucura" é conhecida como uma das mais espetaculares histórias do genial H.P. Lovecraft.

Escrita em 1931 e publicada apenas um ano antes de sua morte precoce em 1937, Montanhas pode ser considerada como um dos trabalhos mais complexos do autor. O tema, o embasamento científico, o realismo exacerbado, tudo foi exaustivamente pesquisado para que o resultado fosse uma história que se assemelha a uma jornada verossímil de um grupo de cientistas até o que era, então, a fronteira final do planeta: o Continente gelado da Antártida. A narrativa concebida como um relato feito por um dos sobreviventes está repleta de termos científicos, de descrições técnicas e inúmeras referências usadas na época.

Para muitos especialistas em literatura, Nas Montanhas da Loucura é um dos pontos altos da carreira de Lovecraft que se mostrava perfeitamente à vontade unindo Terror e Ficção Científica - uma mistura que hoje é normal, mas que na época constituía uma grande inovação. Não por acaso ele serviu como base para a franquia Alien e do cultuado O Enigma do Outro Mundo. Os fãs também consideram esse conto (de fato, uma novela dada a sua extensão), um de seus trabalhos mais emblemáticos, servindo de inspiração para outros contos, quadrinhos, jogos de computador, boardgames e frequentemente cotado para se tornar um longa metragem.

Entra em cena o ilustrador francês François Baranger, um dos artistas mais elogiados e admirados da atualidade. Baranger é dono de um notável portfolio artístico que inclui outra visão de um conto clássico de Lovecraft, "O Chamado de Cthulhu" que recebeu uma resenha aqui no blog alguns anos atrás. Na ocasião Baranger já demonstrava seu talento para compor paisagens grandiosas, ilustrar jornadas épicas e dar forma aos horrores titânicos do Universo do Mythos. O resultado foi magistral, mas ouso dizer que aquela era somente o início de uma empreitada muito mais ousada.

Convocado a repetir a parceria com Lovecraft, Baranger esbanja talento e nos convida a explorar a vastidão dos desertos gelados e os recessos mais escuros do Horror Cósmico em "Nas Montanhas da Loucura".


A história tem um lugar mais que merecido entre as maiores obras de terror de todos os tempos e ilustrar essa saga foi um desafio para o artista. Para isso ele usou um princípio muito inteligente: “Tentei entrar na mente do autor para melhor transcrever seu universo. Não tentei modernizar Lovecraft, mas me ater às suas verdadeiras intenções e descrições.”

O resultado é sensacional.

"Nas Montanhas da Loucura" acompanha os eventos e incidentes de uma malfadada expedição à Antártida no início dos anos 1930. O que é relatado ao leitor é uma jornada de descoberta notável seguida de tragédia sem precedente. Uma viagem científica que cobra de seus membros um preço altíssimo e que revela um horror indescritível. A descida rumo a essa espiral de loucura e as descobertas perturbadoras sobre a origem do homem precipitam a ruína da expedição. 

Nas Montanhas da Loucura é contado a partir da visão do Dr. William Dyer, um geólogo da fictícia Universidade Miskatonic, que presenteia o leitor tanto com os detalhes inocentes da expedição, quanto com os eventos mais sinistros mantidos em segredo até então. Com seu relato, Dyer espera impedir que outra expedição cometa o mesmo erro que a dele e garantir que a verdade permaneça oculta sob o gelo glacial.

O ritmo lento da história constrói meticulosamente a tensão e levanta questões que vão sendo respondidas ao longo da trama. O terror não surge repentinamente, ele espreita em cada canto como uma presença agourenta que desce feito uma sombra sobre os exploradores. 

Esse conto consolidou Lovecraft como um mestre da tensão e do mau presságio. O leitor sabe que algo horrível está prestes a acontecer, que os personagens estão em perigo e que o destino deles será medonho. Mas essa certeza só torna a leitura ainda mais instigante. Para alguns, o estilo pode soar cansativo, mas o verdadeiro brilhantismo dessa história está na forma como ela é construída e como ela vai crescendo em intensidade até a explosão final.


Não é segredo para ninguém que histórias de terror se beneficiam muito da arte. O componente visual fornece outra dimensão à história e empurra o leitor para dentro da experiência. É por isso que os filmes de terror fazem tanto sucesso. Os aspectos audiovisuais dessas narrativas - sustos, música tensa, cenas horríveis - aumentam o drama, o suspense e o terror. Aqui temos algo similar.

A escolha de Baranger para ilustrar essa história gera um casamento perfeito entre texto e imagem. Ele consegue dar forma vívida à imaginação de Lovecraft construindo um panorama grandioso das cenas mais marcantes da novela. A visão de Baranger confere uma nova apreciação da história. Ela ganha asas! Se torna misteriosa. Soa estranha. Distante do cotidiano e de qualquer coisa normal. Mais que isso, inspira admiração e causa certo grau de apreensão.

Brancos ofuscantes, marrom quente, cinza escuro e piscinas negras de escuridão abissal recobrem as páginas. Toda essa paleta de cores fortes se mistura e cria imagens viscerais das montanhas e da megalomaníaca incursão humana às proibidas latitudes da loucura. O universo lovecraftiano com seu pessimismo tétrico fica gravado na mente do leitor com essas paisagens colossais esparramadas ao longo das páginas. As imagens quase queimam em nosso subconsciente.

Baranger retrata vividamente o passo a passo da expedição atraindo os olhos do leitor para um banquete visual. Mesmo que você já tenha lido "Nas Montanhas da Loucura" centenas de vezes, ler essa versão será algo especial e diferente. Para quem não conhece Lovecraft ou sua obra, essa é uma oportunidade de ouro para mergulhar de cabeça e se deixar conquistar por esse mestre do horror e da ficção.


Fisicamente, o livro tem 23 x 30 centímetros, um tamanho adequado para tais imagens. Ele remete àqueles Livros de Arte que costumam adornar o centro de mesa. Essas dimensões permitem uma melhor apreciação dos detalhes que Baranger arduamente trabalhou em cada cena (e que vocês podem constatar nas imagens incluídas aqui na resenha). 

A Editora Darkside, que lançou o álbum "O Chamado de Cthulhu" aqui no Brasil, também é a responsável por essa edição. Nem é preciso mencionar o capricho das publicações da Darkside. Quem coleciona livros e gosta de edições luxuosas em sua estante já deve conhecer bem o catálogo da editora. A capa dura, o papel brilhante de alta qualidade e a excelente tradução de Ramon Mapa são perfeitas. 

É importante, entretanto, salientar que esse é o primeiro volume da obra, ou seja, a conclusão de "Nas Montanhas da Loucura" ainda será lançada pela Darkside provavelmente ano que vem. Muitos se perguntam porque ele não foi lançado em uma edição única, mas esse formato é idêntico ao que foi publicado lá fora.

Para os fãs de longa data ou para os que estão conhecendo apenas agora, o primeiro volume de "Nas Montanhas da Loucura" é uma celebração do gênero e um item quase obrigatório para os fãs do Horror Cósmico.   


Este livro e outros podem ser adquiridos diretamente na página da Editora Darkside no link abaixo. Comprando no site da editora ele vem acompanhado de um brinde exclusivo.

Um comentário:

  1. Espetacular! Já tenho O Chamado de Cthulhu e esperava esse ansiosamente. Tomara que não pare por aí e ilustrador faça outras obras primas (sonho com A Sombra sobre Innsmouth).

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