Scott desejava utilizar o Discovery novamente em uma segunda expedição, mas o almirantado havia vendido o navio para a Hudson's Bay Company alguns anos antes, e eles se recusaram a desfazer o negócio. Após considerar várias possíveis embarcações, Scott comprou o Terra Nova, que havia sido usado como baleeiro e barco de treinamento desde o retorno da Antártida quando ele serviu como barco de apoio.
Levantar fundos para a expedição era um processo lento e difícil, voluntários para compor a tripulação em contraste era algo fácil de se obter. Os pedidos vinham de todo o mundo e mais de 8,000 homens enviaram suas credenciais pleiteando um lugar na expedição.
Scott fez algumas escolhas que podem muito bem ter refletido nos resultados da expedição. Ele optou por não levar cães, talvez influenciado ainda pela experiência prévia na expedição Discovery. Ao invés de animais ele recorreu a tecnologia adotando trenós motorizados que ainda estavam em fase experimental e que jamais haviam sido usados até então (transporte motorizado ainda era uma tecnologia primitiva). Para compor a tração, a expedição levaria também pôneis. A decisão foi polêmica, já que anos antes o ex-parceiro de Scott, convertido agora em rival, Ernest Shackleton, os havia utilizado sem sucesso na sua própria expedição.
Scott planejava fazer uso pleno dos trenós motorizados até onde fosse possível, estabelecendo depósitos com suprimentos ao longo do caminho. Os pôneis seriam usados para transportar e arrastar os trenós até a geleira, o obstáculo mais difícil de ser transposto. Utilizando os trenós, a equipe esperava conseguir se deslocar mais rapidamente e com um desgaste menor da equipe.
A jornada do Terra Nova foi tumultuada e cheia de imprevistos. O navio enfrentou tempestades e mares agitados desde que saiu da Nova Zelândia. A expedição perdeu animais, pôneis e cães, além de maquinário e geradores elétricos quando parte da carga se soltou esmagando os pobres animais no compartimento de carga. Em 8 de dezembro de 1910 o primeiro iceberg foi avistado e no dia seguinte, na latitude 65°8'S, o Terra Nova entrou oficialmente em águas da Antártida. O navio prosseguiu encontrando grandes pedaços de gelo flutuante o que forçou o barco a reduzir sua velocidade e consumir reservas preciosas de carvão.
Em 30 de dezembro, Scott escreveu, "Nós estamos passando por águas congeladas desviando por um triz de enormes icebergs. Mas nada irá deter nosso avanço". Na véspera do primeiro dia de 1911, o majestoso Monte Erebus apareceu no horizonte branco e os homens puderam comemorar. Eles tentaram se aproximar da costa em Cabo Crozier, mas as águas revoltas impediram que os botes à remo fossem baixados. Cair nessa água gélida seria fatal e Scott não quis arriscar, apesar dos homens estarem ansiosos por descer em terra.
Dessa forma, McMurdo Sound seria a próxima parada. Em 4 de janeiro, o Terra Nova ancorou no gelo e a carga começou a ser desembarcada na grossa geleira. Os pôneis estavam especialmente felizes em poder finalmente pisar em terra firme. Os animais corriam livremente pela neve e os homens brincavam como crianças. A equipe realizou algumas filmagens enquanto a carga era desembarcada pelos guindastes e Scott fincava a bandeira britânica naquele que seria o lar da expedição nos próximos anos.
Em um primeiro momento os trenós motorizados se mostraram muito úteis. O equipamento acondicionado em grandes caixas de madeira era colocado em trenos e puxado até o local escolhido para montar a base. Após retirar o equipamento, as caixas se transformavam nas paredes do abrigo que seria construído. Infelizmente Scott e a equipe não contavam com os problemas mecânicos que começaram a se tornar cada vez mais frequentes. O frio extremo fazia com que o combustível nos veículos congelasse. Pior do que isso, um dos trenós acabou rompendo uma camada de gelo fino e afundou no mar para desespero dos homens à bordo. Felizmente ninguém se feriu gravemente, mas o veículo se perdeu.
As cabanas foram erguidas rapidamente, o sistema de aquecimento foi colocado em ordem e um depósito de combustível montado. A cabana principal, usada como área comum pela equipe media 50 pés de comprimento por 25 de largura e possuía um sistema de calefação alimentado com gerador elétrico e carvão. Além disso, as placas de compensado eram insuladas para conservar o calor por mais tempo. O abrigo possuía uma sala de recreação com gramofone e vários discos, uma sala de reunião, cozinha, refeitório e enfermaria. Todas as comodidades possíveis, considerando a localização. Após montar a Cabana principal, os homens começaram a construir cabanas individuais para hospedar entre 3 e 6 homens com mais privacidade.
Assim como a Expedição Discovery, o objetivo principal da Terra Nova era chegar ao Polo Sul. É claro, haviam dezenas de outros projetos científicos que a equipe realizava diariamente, mas as energias eram conservadas para a tarefa mais importante. Existia uma espécie de corrida para atingir o Pólo Sul e os ingleses estavam disputando diretamente com os noruegueses liderados pelo veterano Roald Asmundsen que também estava à caminho da Antártida. Para os ingleses era uma questão de orgulho e patriotismo conquistar o Polo antes de seus adversários.
Depósitos começaram a ser cavados a cada 17 milhas e abastecidos com suprimentos, combustível e provisões para que a equipe pudesse se abastecer ao retornar. Os pôneis, no entanto, estavam encontrando dificuldades em se adaptar. Os animais escorregavam e afundavam na neve macia e não conseguiam puxar o equipamento.
Pouco antes do inverno, a equipe norueguesa aportou na Baía das Baleias e começou a montar seu campo. A equipe era bem menor, mas todos tinham vasta experiência na exploração polar. Além disso, haviam trazido um grande número de cães e trenós. Estava claro para Scott que era necessário correr contra o tempo, os noruegueses se adaptaram rapidamente e logo estariam prontos para partir.
Enquanto isso, os pôneis continuavam sendo um constante problema, três animais chegaram a ser devorados por baleias assassinas depois de cair na água. Antes do fim do inverno, restavam apenas 10 pôneis, dos 19 trazidos pela expedição.
A equipe realizou algumas viagens de trenó ainda durante o inverno para treinar com o equipamento motorizado. Entre os componentes desse grupo estava o jovem explorador Apsley Cherry-Garrard, que se tornaria um famoso aventureiro e autor do livro "The Worst Journey in the World". Em uma dessas jornadas, a Cabo Crozier, os pesquisadores fizeram importantes descobertas à respeito dos Pinguins da espécie Imperador que haviam sido descobertos poucos anos antes. O inverno permitiu que a equipe coletasse várias informações científicas valiosas, mas embora Falcon Scott estivesse envolvido em cada projeto, sua mente retornava frequentemente para a questão do Pólo. Ele deixaria tudo pronto para que pudesse partir assim que possível.
Scott decidiu que a equipe que empreenderia a jornada em busca do Pólo Sul contaria com apenas quatro outras pessoas além dele. O time escolhido era o seguinte:
Scott decidiu que a equipe que empreenderia a jornada em busca do Pólo Sul contaria com apenas quatro outras pessoas além dele. O time escolhido era o seguinte:
Dr. E. A. Wilson conhecido como "Uncle Bill", chefe cientista e médico da expedição.
Captain L. E. G. Oates, um soldado de carreira especialista em animais.
Lieutenant H. R. Bowers, respeitado pela sua habilidade e conhecimento do clima.
Petty officer Edgar "Taff" Evans responsável pelos esquis e trenós.
A Jornada até o Polo
Com o grupo definido, os suprimentos foram colocados nos trenós motorizados e despachados na frente enquanto uma caravana com pôneis seguia mais atrás com suprimentos extras e combustível. Essa era conduzida por homens que não iriam até o final da jornada, mas seriam um apoio vital. Logo um dos trenós acabou se acidentando em uma fissura e foi abandonado na neve. A jornada não havia começado bem e Scott sabia que os noruegueses também deveriam estar à caminho aproveitando a significativa melhora no tempo.
A distância da base para até o Pólo era de aproximadamente 1766 milhas estatutárias (uma distância equivalente a ir de Nova York até Chicago). Cada etapa da viagem, calculada minuciosamente por Scott devia ser rigorosamente cumprida a fim de não atrasar o progresso. O tempo era essencial. Eles viajaram durante a noite com temperaturas que jamais subiam além do zero Fahrenheit (-18°C). Lutando constantemente com deslizamentos de neve, o grupo conseguiu chegar ao campo One Ton no décimo-quinto dia de jornada. Havia uma constante preocupação de que os trenós não conseguiriam seguir por áreas muito acidentadas. Finalmente o último trenó foi abandonado e dali em diante o caminho teria de ser feito pelos animais. Por volta do vigésimo dia, a caravana alcançou o Campo Vinte e os pôneis começaram a morrer. Os pobres animais simplesmente não tinham mais força e tinham de ser sacrificados um por um quando ficavam fracos demais.
Cada membro da equipe então começou a puxar uma carga de 100 quilos pela neve fofa que afundava até os joelhos. Alguns homens foram afetados por cegueira da neve e o progresso foi se tornando cada vez mais difícil. Em um dia a equipe conseguiu se deslocar apenas 4 milhas. Era um inferno!
A comitiva chegou ao acampamento trinta e cinco no dia 3 de janeiro e se despediu dos cinco escolhidos por Scott para seguir até o objetivo final. Os homens se despediram amargamente, a jornada que tinham pela frente não causava mais inveja a ninguém, mesmo assim nenhum deles mudou de idéia. faltavam ainda 169 milhas até o Pólo Sul. Eles haviam ido longe demais e não iriam retornar.
Scott e os outros seguiram a rota usada por Shackleton, e conseguiram seguir adiante do ponto onde seu rival havia retornado. Além dessa marca o caminho era acidentado e cheio de perigos encobertos pela neve macia, pisar em um lugar em falso poderia ser fatal. Faltavam apenas 97 milhas para chegar ao destino, mas esse trajeto lhes custou 10 dias em virtude do clima que havia piorado: nevascas e deslizamentos eram uma constante.
Os homens estavam esgotados, eles andavam de quatro pela neve testando cada porção à frente para não cair em uma fissura oculta. Em 16 de janeiro o tempo melhorou e eles conseguiram fazer um progresso maior. Testando as coordenadas concluíram que deviam atingir o Pólo Sul no dia seguinte.
No final da tarde do dia seguinte, Bowers percebeu algo à frente que parecia ser uma espécie de abrigo no meio da neve. Meia hora depois o grupo alcançou um acampamento improvisado onde encontraram uma bandeira tremulando na ponta de um esqui fincado na neve. Era a bandeira da Noruega marcando o ponto exato onde a equipe rival havia chegado. Scott havia perdido a corrida.
Em 17 de janeiro, ele escreveu em seu diário "...um dia horrível..." , uma forte ventania fazia com que a temperatura atingisse quase insuportáveis 30 graus negativos a medida que o explorador escrevia; "Bom Deus! Este é o lugar mais terrível em que já estive e tudo fica ainda pior quando sabemos que todo o esforço foi realizado sem que tenhamos chegado primeiro".
A equipe norueguesa contando com equipamento e experiência superior, chegou ao pólo no dia 18 de dezembro, 30 dias antes dos britânicos. O percurso escolhido através dos Montes Transiberianos, uma rota descoberta por Amundsen, se mostrou mais acessível no final das contas.
Além da bandeira tremulando, a equipe de Scott encontrou também uma carta endereçada ao Rei Hakoon da Noruega que identificava a equipe que havia atingido primeiro o objetivo.
A viagem de
regresso começou
relativamente bem,
mas o tempo, inevitavelmente piorou e o desânimo recaiu sobre a equipe. Scott
escreveu no dia 21
de janeiro
"Oates está se sentindo frio por dentro e a fadiga parece ter tomado o corpo de cada um de nós", e no dia 23 de janeiro "Wilson percebeu que o nariz de Evans havia congelado -.ficou branco e duro, finalmente começou a escurecer. Não há dúvida que Evans sofrerá nos próximos dias".
Os homens estavam esgotados e acidentes se tornaram cada vez mais frequentes. Wilson sofreu de cegueira da neve, enquanto o pé direito de Oates congelou e os dedos começaram a cair. Evans perdeu além do nariz vários dedos da mão. Scott também sofreu uma queda e feriu seriamente o ombro. A equipe parecia estar se desintegrando lentamente. Pedaço por pedaço. Era impossível afastar o sentimento de que o fim se aproximava.
Perderam-se
em um trecho acidentado ao descer a Geleira Beardmore e enfrentaram um verdadeiro pesadelo passando dois dias quase ao relento, incapazes de encontrar uma saída do lugar. Com os suprimentos quase no fim, eles levaram algum tempo até localizar o depósito que havia sido deixado para trás contendo provisões. "Foi um imenso alívio encontrar os suprimentos. Um alívio que não pode ser exprimido em palavras... Ontem talvez tenha sido a pior experiência de toda a viagem e tivemos uma sensação horrível de insegurança".
Em 16 de fevereiro, Scott escreveu: "Evans está quase irreconhecível, creio que sua mente não está mais sã. Ele se afastou do grupo e tem demonstrado um comportamento errático. Ontem, nós o perdemos de vista e chegamos a imaginar que ele havia tido algum tipo de surto. O encontramos na hora do almoço, estava de joelhos, a roupa desarrumada, as mãos nuas sem as luvas com um olhar febril e selvagem. Tivemos de colocá-lo no trenó pois não parecia seguro deixá-lo por conta própria. Poucas horas depois, já no campo que erguemos ele entrou em coma. Ele morreu em silêncio por volta da meia-noite".
O tempo continuava conspirando contra eles, como se fosse uma entidade viva e tirânica que desejava eliminá-los. A temperatura já havia caído para insustentáveis -40 C e a esperança parecia ter abandonado os aventureiros. Em 5 de março a anotação reflete o pessimismo de Scott: "Oates pediu para que fosse deixado para trás. Ele não quer atrasar o restante da equipe e foi difícil convence-lo do contrário. Nós o carregamos até onde foi possível. A noite ele estava ainda pior e enquanto descansávamos após a longa marcha, nosso amigo reuniu suas forças e se afastou do acampamento dizendo que se afastaria apenas por alguns instantes".
Oates havia se afastado para morrer solitariamente para não ser mais um fardo para os companheiros, uma vez que sabia que suas condições iriam piorar ainda mais. Seus pés estavam tão feridos e congelados que o processo de calçar as botas havia se transformado em uma verdadeira tortura. Ele havia andado os últimos quilômetros apenas de meias e não podia dar mais um único passo.
O último acampamento foi erguido em 19 de março a apenas 11 milhas do próximo depósito de suprimentos. Uma nevasca os castigava impiedosamente. Scott sofria de congelamento em seus pés, Wilson e Bowers também não estavam nada bem e o grupo havia decidido aguardar naquele ponto até que o clima amenizasse. Mas foi justo o contrário, a ventania era cada vez mais forte e o frio congelante. Eles jamais deixaram esse acampamento ficando sem suprimentos e combustível. muito cansados e famintos para enfrentar o clima. Em 29 de março Scott fez sua anotação derradeira:
"Desde o dia 21 nós enfrentamos um vendaval contínuo. Nós só temos combustível para ferver duas xícaras de chá a alimentos para mais dois dias. Nós estamos dispostos a seguir para o próximo depósito, mas observando através da porta da tenda a cena continua é desoladora. Não acredito que as coisas irão melhorar a essa altura. O fim não pode estar longe... é uma pena, mas não posso escrever mais".
A tenda e seus ocupantes congelados foram encontrados 8 meses mais tarde em 12 de novembro daquele ano. Os cadáveres estavam deitados em abrigos improvisados e ao que tudo indica Scott foi o últimno a morrer pois os outros dois pareciam parcialmente cobertos.
A equipe de resgate respeitosamente ergueu um mausoléu usando pedras e restos dos trenós e esquis da equipe. os corpos foram enterrados nesse local e uma missa foi rezada por um capelão que acompanhou o grupo de busca. O diário da trágica expedição foi colocado em uma lata de metal dentro da mochila de Scott a fim de ser preservado e servir de epitáfio para seu esforço.
A equipe conduziu uma busca pelo corpo do Capitão Oates, mas ele jamais foi encontrado, apenas uma bolsa e uma bota foram achados próximo ao último local em que ele foi visto com vida segundo o diário.
Uma equipe de exploradores anos depois trouxe da Inglaterra uma cruz de ferro e uma placa de granito que foram fixadas sobre o mausoléu de pedra. Na placa lia-se a seguinte frase:
"Neste lugar pereceu um grupo de galantes cavalheiros..." e o nome dos cinco aventureiros que jamais retornaram:
Lieutenant H. R. Bowers
Petty officer Edgar "Taff" Evans
Captain L. E. G. Oates
Captain R. F. Scott
Dr. E. A. Wilson
Petty officer Edgar "Taff" Evans
Captain L. E. G. Oates
Captain R. F. Scott
Dr. E. A. Wilson
A placa e o mausoléu estão lá até hoje.
ótimo post cara! ancioso pelo "O Limiar das Trevas"...
ResponderExcluirmuito interessante
ResponderExcluire bem escrito