No vasto universo do Mythos, a maioria das entidades se mostram totalmente inumanas. São criaturas cuja aparência, forma e conteúdo escapam de uma definição, elas são por si só, coisas bizarras que desafiam a interpretação. Impronunciáveis! Inumanas! Inacreditáveis!
Por vezes, entretanto, entidades do Mythos, podem assumir uma forma humana. Existem Grandes Antigos e Deuses Exteriores que possuem avatares mais ou menos humanos. Nyarlathotep, o Caos Rastejante, é conhecido por ter inúmeras faces, ou avatares muitos dos quais humanos. Hastur possui o humanóide Rei Amarelo, entidade coberta de trapos. Mesmo Yog-Sothoth, por vezes assume a forma de Tawul at'Umr uma espécie de avatar de forma humana. Mas não é uma característica única desses deuses assumir a aparência humana fisicamente. Existem outros horrores que buscam no homem inspiração quando optam por se fazer carne e sangue.
Y'Golonac é uma dessas entidades. Embora a forma grotesca de Y'Golonac não possa ser definida como humana, é óbvio que a humanidade serviu de molde para sua aparência, por mais revoltante que seja ela.
O Grande Antigo (Great Old One) se manifesta como um corpulento gigante acéfalo, morbidamente obeso; uma verdadeira montanha de carne flácida e macilenta. O mero vislumbre é suficiente para causar um misto de repulsa e horror. No escuro, sua palidez amarelada assume um brilho tênue quase fosforescente. A criatura não possui cabeça, o tronco termina em uma pavorosa dobra de carne na altura de onde deveria estar o pescoço. Uma das características mais marcantes do monstro é o fato dele possuir um par de bocas localizadas nas palmas das mãos. Essas bocas parecem, à primeira vista, horrendos cortes transversais, mas quando se abrem é possível ver que cada uma é dotada de fileiras de dentes afiados e de uma longa língua negra. Essas bocas vermelhas e úmidas são a principal arma do monstro. Aqueles que são atacados por ele acabam recebendo mordidas vorazes que arrancam pedaços inteiros de carne e provocam ferimentos dantescos que jamais curam por inteiro. A língua que se estica a até meio metro de distância também é capaz de causar graves ferimentos perfurantes.
Y´Golonac se move de forma vacilante, equilibrando seu enorme peso sob pés pequenos e pernas curtas que não parecem adequadas para uma criatura com seu porte avantajado. Apesar disso, ele é rápido e quando necessário empreende perseguição derrubando qualquer obstáculo em seu caminho.
Não se sabe exatamente se a criatura é capaz de ver, uma vez que ele não possui olhos, mas é óbvio que ela é capaz de se guiar e perceber seus arredores. Supõe-se que Y'Golonac possua algum tipo de telepatia, radar ou sentido aprimorado que lhe permite interagir com que está ao seu redor.
Uma vez que Y'Golonac precisa possuir fisicamente um ser humano quando se manifesta, alguns detalhes de sua anatomia podem variar. Quando a possessão é realizada, a vítima imediatamente sofre uma grotesca transformação, ganhando centenas de quilos de tecido adiposo. Roupas se rasgam, os trajes são reduzidos a trapos e andrajos a medida que suas dimensões aumentam de forma exponencial. A cabeça da vítima encolhe e seca sendo por fim assimilada pelas dobras de pele flácida do pescoço. A palma das mãos se rasgam a medida que em cada uma surge uma longa língua sibilante. Quando Y'Golonac toma um corpo humano feminino os genitais podem formar uma terceira boca, uma espécie de vagina dentada.
Tudo na forma de Y'Gononac sugere que ele seja uma entidade ligada a excessos físicos e decadência. Ele era visto por algumas culturas como uma espécie de Deus dos Exageros dado a rompantes coléricos e dotado de uma fúria irrefreável. Y'Golonac é retratado como uma entidade possuidora de vasta gula e um libidinoso apetite sexual. Uma vez manifestado fisicamente a entidade exige que todas as suas vontades sejam satisfeitas o que pode incluir atos de perversão, canibalismo, tortura e sedição indescritíveis. Nenhum ato é considerado sórdido demais, não há limites quando Y'Golonac deseja satisfazer suas vontades bizarras.
Nos festivais da Grécia antiga, Y'Golonac era invocado no corpo de um homem e adorado por sacerdotisas que se sujeitavam voluntariamente às suas vontades. Para esse culto degenerado, tomar parte nessa orgia era uma honra. Existem rumores que o culto tenha dado origem às celebrações em homenagem ao Deus Baco, embora não se possa saber ao certo.
Em Roma, Y´Golonac também foi reverenciado por seguidores dispostos a testar seus limites. Dizem que conselheiros bastante próximos dos Imperadores Calígula e Nero faziam parte de sectos que invocavam Y'Golonac para seus ritos. Boatos sugerem que o culto também esteve presente na Babilônia e que teria sido proeminente nas lendárias cidades de Sodoma e Gomorra, ambas citadas na Bíblia como lugares pecaminosos. Na Pérsia, onde o secto também ganhou influência antes da fé islâmica se instalar, seus membros se identificavam como os "Filhos das Mãos que se Alimentam". Após esse período na antiguidade, os seguidores foram combatidos e sua influência diminuiu consideravelmente.
A seita experimentou um tímido ressurgimento na França do século XVII. Dizem que o legendário Marquês de Sade participou de encontros patrocinados por esse grupo e que muitas das suas estórias surgiram a partir do que ele viu e experimentou nessas ocasiões. A Revolução que pôs fim a Monarquia também determinou o fim do Culto. Os autos de um processo movido pela Assembléia Revolucionária contra um grupo de nobres parisienses em 1791, incluía a acusação de depravação e sedição libidinosa. Segundo testemunhas havia ainda consórcio com um ou mais demônios, embora alusões a crenças religiosas fossem suprimidas pelo tribunal. Trechos desse inquérito que sobreviveram, mencionavam que o grupo realizava orgias em que um ser medonhamente obeso era invocado por intermédio de um tomo blasfemo. Todos os acusados foram devidamente guilhotinados, contudo pouco se sabe sobre o destino do livro que pertenceu a eles.
Para muitos estudiosos esse misterioso livro seria um dos volumes do mítico "Revelações de Glaaki", um tomo com conhecimento esotérico versando sobre obscuras entidades que integram o aterrador Mythos de Cthulhu. Muitos estudiosos acreditam que o Revelações é formado por um conjunto de onze volumes, mas alguns creem na existência de um décimo-segundo tomo que versa especificamente sobre a pérfida existência de Y'Golonac. Esse volume incrivelmente raro, a ponto de sua existência ser contestada, contém não apenas informações sobre essa Entidade, mas trechos que quando recitados - ou segundo alguns meramente lidos - fazem com que Y'Golonac se manifeste fisicamente. Se essa informação for verdadeira, o mero ato de folhear as páginas do tomo pode se tornar algo perigoso.
Sendo um dos Grandes Antigos mais obscuros, não é estranho que pouco se saiba à respeito da origem de Y'Golonac. De fato, a maior parte das informações disponíveis são na melhor das hipóteses questionáveis.
Uma monografia descoberta em um biblioteca pública no Vale de Severn em 1968 contém informações sobre Y'Golonac e se apresenta como um dos únicos trabalhos sobre o tema. O autor anônimo, explica na introdução que por muitos anos foi membro de um secto que reverenciava essa entidade e que viveu para se arrepender. Como forma de purgar seus "inúmeros pecados" ele escreveu a monografia para que, em suas próprias palavras: "alguém pudesse um dia compreender o que é essa abominação e pôr fim ao seu culto hediondo".
O manuscrito com aproximadamente 100 páginas dispõe que Y'Golonac habita o centro de uma prisão dimensional cercada por uma colossal muralha de tijolos. Nela, o Grande Antigo permanece paralisado como uma estátua titânica, rodeado por criaturas sem olhos que se arrastam sobre ele. A única maneira de Y'Golonac ser libertado, ainda que temporariamente, desse estado de torpor é através da leitura de trechos de suas parábolas contidas em alguns livros, em especial o décimo-segundo volume do Revelações de Glaaki.
A leitura desses trechos faz com que Y'Golonac desperte tomando o corpo do indivíduo que leu as passagens. Uma vez manifestado, ele busca saciar suas vontades e apetites, submetendo qualquer um que esteja a sua volta, seguidor ou não. Essa possessão pode se manter por várias horas, quando a vítima aceita voluntariamente ou alguns poucos minutos quando ela resiste. Ironicamente, aqueles que são possuídos e não reagem a esmagadora presença psíquica de Y'Golonac acabam por reassumir a forma humana quando o Deus se dá por satisfeito. Essas pessoas simplesmente despertam com uma memória fragmentada do que aconteceu. Aqueles que tentam reagir a possessão e expulsar a presença de seus corpos, recebem como punição um choque mental do qual jamais se recuperam. Ao que tudo indica, Y'Golonac não reage bem a quem tenta conter seus ímpetos.
Apesar de ter sido reverenciado no passado, recentemente o Culto de Y'Golonac chegou perto da completa extinção. Os poucos indivíduos que se sujeitaram a participar de rituais envolvendo o Grande Antigo preferem fazê-lo solitariamente. Estudiosos excêntricos, artistas decadentes e ocultistas desesperados são as típicas almas atraídas por esse Deus de vileza. Indivíduos que se submetem frequentemente a corrupção de Y'Golonac apresentam um comportamento obsessivo no que diz respeito a ponografia, sordidez e degradação moral. Não raramente, esse comportamento acaba levando ao crime e violência. Pelo menos três assassinos em série norte-americanos, que demonstravam comportamento sádico, tinham relação direta com Y'Golonac e costumavam ser voluntariamente possuídos por ele. Há boatos que um exemplar do Volume XII do Revelações de Glaaki foi encontrado no porão usado como câmara de torturas pelo assassino John Wayne Gacy. Um volume semelhante supostamente fazia parte da biblioteca do belga Mark Dutroux. É possível que a Unidade de Crimes Comportamentais do FBI mantenha um rígido controle sobre esse livro.
Gostei da ideia do Revelações XII ser uma espécie de texto recorrente... a versão conhecida em Severn pode ter sido até escrita enquanto o autor estava possuído por Y'Golonac, quem sabe? E se todas as cópias do livro forem destruídas, bem, não se preocupe, outra versão, talvez pior, surgirá em outro lugar do mundo. E quem sabe, talvez JÁ existam outras versões, em outras línguas, com outros tratamentos culturais...
ResponderExcluirEm meus devaneios sobre o Mythos eu imagino Y'Golonac como um subproduto (e não um avatar) autoconsciente (e tremendamente egoísta) de Shub-Niggurath. Algo físico e mental ao mesmo tempo, meme persistente e vírus sexualmente transmissível numa só entidade, parcialmente aprisionado além de um "muro subterrâneo", o que não passaria de uma metáfora para desejos reprimidos no inconsciente humano (e inumano, de grandes primatas a carniçais e Deep Ones) que manifestam-se periodicamente e que, como deixam claro as Revelações de Glaaki, quando as estrelas estiverem na posição correta, ensinarão a humanidade novas formas de parecer-se como os Antigos, como também mencionou o Velho Castro em "Chamado de Cthulhu"...
Se não me engano, em Rastro de cthulhu uma das possibilidades sobre Y'Golonac envolve ele ser um avatar de Shub-Niggurath. Perversão acaba eventualmente levando a Shub.
ResponderExcluirOu então uma cria entre Hastur e Shub-Nigurath. Considerando que Hastur tem o famoso avatar de Rei Amarelo (a pele deste deus é amarela, talvez por influencia do pai) e ele representa os excessos. Destes, a perversão de Shub está inclusa. Sua forma humana tbm pode estar relacionada com Hastur.
ResponderExcluir