Não é nenhuma surpresa que mortes sem solução envolvam mistérios impenetráveis e pistas bizarras que se convertem em sérios obstáculos para sua resolução. Há uma razão para que casos insolúveis sejam tão complicados. Por vezes, as pistas que deveriam servir para apontar a resposta se mostram tão incomuns que atrapalham verdade.
De tempos em tempos, aparecem casos que são tão enigmáticos que acabam até se misturando ao reino do sobrenatural. Os mistérios são como nós cegos que quanto mais você tenta desentranhar, mais apertados ficam até um momento em que se sobrepõem uns sobre os outros. Um desses casos envolve a chegada de um homem a um inocente quarto de hotel de onde ele jamais sairia. Um caso que enseja um mistério aparentemente insondável, com direito a indivíduos obscuros, detalhes confusos e pistas que acabam tornando as circunstâncias ainda mais estranhas.
Num frio final de tarde, do inverno de 2 de janeiro de 1935, um homem alto e bem vestido, trajando um sobretudo e chapéu pretos, chegou ao Hotel President de Kansas City, Missouri. Ele chamava a atenção pela altura (devia ter mais de dois metros) e pela constituição física avantajada (um verdadeiro touro). Também chamava atenção a enorme cicatriz na face que descia da altura do olho até um pouco acima do queixo quadrado. O homem não trazia nenhuma bagagem consigo. Ele havia reservado antecipadamente um quarto para aquela noite, requisitando que fosse um aposento interno que não desse para a rua da frente. Pagou a conta adiantado, com dinheiro e assinou no livro de registros o nome "Roland T. Owen", dando como endereço fixo a cidade de Los Angeles.
O mensageiro do hotel, Randolph Propst então levou o sujeito até o quarto 1046. Lá abriu a porta e mostrou o aposento como sempre fazia com os hóspedes recém chegados. Quando fez movimento para abrir as cortinas e mostrar a vista, o sujeito o impediu. Ele colocou sobre a escrivaninha alguns objetos que estavam em seu bolso: um pente, escova de dentes, pasta, uma carteira e cigarros. O mensageiro estendeu a chave para o sujeito que a apanhou e nesse momento o rapaz percebeu que abaixo do sobretudo o sujeito tinha um cinto com coldre onde despontava uma pistola 45 niquelada. O rapaz então deixou o quarto para cumprir suas tarefas habituais.
Duas horas mais tarde, naquela mesma noite, uma camareira do hotel chamada Mary Soptic entrou no quarto 1046 a pedido do hóspede. Ela foi chamada para limpar alguma coisa que teria entornado. Após bater repetidas vezes sem uma resposta, apanhou a chave mestra que carregava e abriu a porta. Lá dentro estava escuro e ela chegou a pensar que o homem estivesse dormindo ou que talvez tivesse saído. Levou um susto ao perceber que ele estava sentado no escuro em uma poltrona da antessala, com um cigarro aceso entre os dedos e um copo de whisky descansando sobre uma mesinha de cabeceira.
Ao perceber a camareira, o homem se recompôs, levantou e foi até o quarto sem olhar para ela. Pediu que limpasse uma poça de whisky que virou no chão e que quando terminasse saísse deixando a porta encostada: "Estou esperando um amigo". Ele foi muito específico quanto a deixar a porta aberta, e mencionou isso pelo menos três vezes enquanto ela limpava o chão. Havia uma quantidade considerável de bebida espalhada, como se um copo cheio tivesse sido entornado ali. Ela percebeu que sobre a mesinha, além do copo, havia um caderno de notas com vários números de telefone anotados. Mary fez como ele pediu e saiu avisando que a porta ficaria encostada.
A camareira passou pelo corredor por volta das 4 da manhã e percebeu que a porta do 1046 ainda estava encostada e a luz apagada no interior. Ela abriu uma fresta e observou por um instante percebendo que o hóspede estava deitado na cama totalmente vestido (com sapatos e chapéu inclusive), olhando fixamente para o teto. A cortina estava aberta e ela conseguia discernir esses detalhes na penumbra. Ela perguntou baixo se estava tudo bem, mas não teve resposta. A moça, percebeu que o homem estava respirando já que seu peito subia e descia ritmadamente. Ela saiu lentamente sem saber o que fazer, e viu que na antessala a garrafa de whisky estava vazia e o telefone fora do gancho. A moça apanhou o telefone e percebeu que do outro lado havia um ruído. Instintivamente ela levou ao ouvido e escutou uma voz masculina dizer: "Don, eu volto em 15 minutos. Espere! Não saia daí!". Percebendo que estava se intrometendo demais, ela colocou o telefone na mesa e saiu em silêncio, deixando o homem imerso em seus pensamentos.
Quando chegou a manhã do dia 3 de janeiro, Mary subiu ao andar novamente e percebeu que a porta do quarto estava fechada, Ela bateu na porta para fazer a faxina e não teve resposta. Usou então a chave mestra e encontrou o homem sentado na poltrona. O quarto estava escuro, as cortinas fechadas e a luz apagada de modo que ela só conseguia ver o interior graças à luz do corredor. Owen estava falando no telefone e parecia pouco à vontade, mesmo assim, fez sinal para ela entrar e apontou o quarto para que ela fizesse a limpeza. Mary escutou trechos da conversa e percebeu que ele falava de uma maneira preocupada. "Eu não estou com fome, já tomei o café da manhã", "Não estou preocupado com isso. Estou cuidando do problema" e "Diga a ele que eu vou viajar".
Mary limpou tudo da maneira mais silenciosa possível. Trocou as toalhas, retirou o lixo do banheiro e deixou o hóspede em paz. Percebeu no entanto que a cama estava arrumada e que uma cadeira havia sido colocada no pé da cama. Sobre essa cadeira havia um coldre marrom pendurado, mas não uma arma.
Mary Scoptic teria um último encontro estranho no quarto 1046 quando respondeu a um chamado de um hóspede no quarto ao lado que pediu um travesseiro extra. Enquanto o atendia ouviu o que parecia ser uma discussão acalorada entre dois homens vindo do 1046. A porta estava encostada e quando ela passou diante dela, percebeu que haviam dois homens ali dentro na antessala. Um deles (ela não soube dizer se era o hóspede ou não) se moveu na direção da porta e rudemente a fechou.
Nas primeiras horas da manhã seguinte, em 4 de janeiro, por volta de uma da manhã, houve uma queixa de um hóspede do quarto vizinho ao 1046. O sujeito, um vendedor de Iowa, reclamava de uma discussão entre um homem e uma mulher no quarto ao lado, talvez houvesse mais pessoas, ele não sabia dizer. Ele completou dizendo que ouviu o som de coisas caindo, como se estivesse havendo uma briga. Um telefonema foi feito pelo gerente do hotel, mas ninguém atendeu no 1046. Como não houve mais reclamações, o gerente assumiu que estivesse tudo bem.
Por volta das 7 da manhã, a telefonista do hotel percebeu que o telefone do quarto 1046 estava desconectado do gancho. Um mensageiro, o mesmo Randolph Probst, que mostrou o quarto ao hóspede, foi enviado para ver o que estava acontecendo. Ele descreveu um incidente esquisito. Após bater a porta e explicar que o telefone estava fora do gancho, o hóspede respondeu que ele poderia entrar. Ao abrir a porta que dava para a antessala, o mensageiro ouviu a porta de acesso ao quarto fechando imediatamente e a chave trancando o aposento. Ele percebeu que o telefone estava no chão, mas este estava em perfeito funcionamento. Avisou que estava tudo em ordem, sem obter qualquer resposta do homem, e saiu sem dizer mais nada.
Por volta das 8:30 da manhã a telefonista disse que o telefone estava novamente desconectado e um mensageiro chamado Harold Pike foi enviado para verificar se havia algum problema no aparelho. Depois de bater repetidas vezes, ele concluiu que o hóspede não estava ou não se importava em responder. Ele escreveu um recado num papel avisando que o telefone poderia estar com problemas e se abaixou para passar por baixo da fresta. Pike percebeu que havia uma sombra ali, como se uma pessoa estivesse ouvindo colado na porta.
Por volta das 11 da manhã, uma camareira foi até o quarto para fazer a limpeza e depois de bater repetidas vezes, usou sua chave mestra para entrar. A antessala estava bagunçada, com o telefone caído no chão e uma garrafa de whisky vazia no canto. Ao abrir a porta do quarto ela se deparou com uma cena bizarra: o hóspede estava deitado na cama totalmente nu com uma arma na mão. Ela chegou a pensar por um instante que ele tivesse cometido suicídio, mas nesse momento ele se moveu bruscamente. Assustada, a faxineira pediu desculpas e constrangida saiu o mais rápido possível.
Dali em diante, havia uma placa de "não perturbe" pendurada na maçaneta.
O dia passou sem maiores incidentes, mas na manhã seguinte dia 5, a placa de "Não perturbe" havia sido removida. A pedido de uma faxineira que queria fazer a limpeza, o mensageiro Randolph Probst foi chamado para acompanhá-la. A essa altura, os funcionários já achavam o hóspede do 1046 um sujeito no mínimo estranho e temiam fazer qualquer coisa no aposento. Probst bateu a porta repetidas vezes e depois de não obter resposta, usou sua chave mestra.
A antessala estava em total estado de desordem, com poltrona e mesa viradas, telefone caído no chão e o fio arrancado da parede. Havia ainda manchas de sangue fresco nas paredes e no chão. O mensageiro foi até o quarto onde viu Owen agachado de encontro à parede, com as mãos no rosto chorando baixo. Estava nu e todo sujo de sangue. Uma arma estava no chão a poucos metros dele. Havia poças de sangue no chão e a trilha de respingos seguia até a cama que estava tingida de vermelho. Isso foi o suficiente para Probst correr em pânico e chamar a polícia.
Quando a polícia chegou, cerca de 15 minutos depois, encontrou o corpo de Owen de bruços, deitado na cama. Concluíram que o homem havia sido esfaqueado repetidas vezes no peito e na garganta, tinha cortes nas mãos e antebraços como se tivesse tentado se defender de um atacante. Muito ferido, rastejou até a cama onde desabou. Apesar dos ferimentos graves, ainda estava vivo, mas as palavras dele eram incoerentes. Ele afirmava ter sofrido um acidente: caído na banheira enquanto tomava banho. Os policiais perceberam que o sujeito tinha um ferimento feio na cabeça causado por um violento golpe. Chamaram uma ambulância imediatamente. Perceberam que havia marcas de contusão nos pulsos e tornozelos, como se ele tivesse sido amarrado com corda e submetido a algum tipo de tortura. Quando os paramédicos chegaram sua condição era crítica, ele foi colocado numa maca e levado para um hospital chegando já em coma e vindo a morrer pouco depois.
Os detetives naturalmente revistaram o 1046 e lá encontraram pistas que pareciam não fazer o menor sentido.
Não havia roupas em canto algum, nenhum sinal de toalhas, fronhas ou cobertores que o hotel fornecia ou que o homem pudesse ter trazido consigo. Tudo havia desaparecido. Curiosamente não encontraram roupas jogadas pela janela ou descartadas em outro ponto. Tudo simplesmente sumiu! Uma enorme quantidade de sangue foi encontrada nas paredes, no chão e na cama que parece ter sido o local onde ocorreu o ataque com faca. No banheiro também havia manchas de sangue, inclusive no interruptor. Pelo tamanho, pareciam ter sido deixadas pelos dedos e pés descalços de uma mulher.
Sobre o criado mudo no quarto havia dois copos de vidro, um deles quebrado e o outro inteiro pousado com a boca para baixo. Um cigarro, um cinzeiro limpo, um isqueiro e um pedaço de barbante estavam ao lado dele lado a lado. Um lixo havia sido usado para queimar papéis, provavelmente a caderneta de telefones que a camareira viu anteriormente. AS folhas estavam rasgadas e só restava a capa plastificada da caderneta.
No chão do banheiro havia algo ainda mais estranho, uma pequena garrafa verde com um líquido de cheiro forte que mais tarde foi analisado. Determinaram que era ácido sulfúrico. O chuveiro havia sido usado recentemente e a torneira da pia estava ligada com água quente correndo. Uma navalha descansava na pia, estava limpa.
As janelas do quarto continuavam trancadas e as cortinas fechadas. A cama havia sido levemente arrastada e na cabeceira de madeira havia marcas de desgaste como se algo tivesse sido amarrado ali, possivelmente as cordas que mantiveram o sujeito aprisionado. Delas não havia nenhum sinal. A arma de fogo estava no chão, um colt 45 niquelado, uma arma de uso das forças armadas - o pente de munição continha apenas 3 cartuchos e havia sinais de que ela havia sido usada recentemente. De fato, o mensageiro lembrou posteriormente de ter sentido cheiro de pólvora no quarto, mas não foram achados projéteis deflagrados ou buracos de bala.
A polícia já tinha dificuldades de traçar uma linha coerente sobre os acontecimentos. Não sabiam quem poderia ter causado os ferimentos ou quando, mas as coisas se tornariam ainda mais bizarras.
Logo descobriu-se que Roland T. Owen não era o nome verdadeiro do homem que alugou o quarto 1402. Estranhamente, havia reservas de quartos em vários outros hotéis de Kansas City sob o mesmo nome, todas pagas em adiantamento. O sujeito embora não tenha aparecido, deixou os quartos em outros 5 hotéis reservados e informou que deveriam ficar à sua disposição caso ele aparecesse, o que não aconteceu.
No Hotel President não havia registro de saída do hóspede que usava o nome Roland T. Owen. Ninguém na portaria, do gerente aos porteiros que ficavam dia e noite na entrada, dos manobristas ao ascensorista, ninguém se recordava do homem transitando pelo lobby ou passando pela porta de entrada. A única lembrança que tinham dele era justamente da tarde em que ele havia chegado. Lembrando que o sujeito era enorme e dificilmente passaria desapercebido.
Da mesma maneira, ninguém tinha ido ao Hotel para visitá-lo, apresentando-se na portaria como mandava a norma do estabelecimento. Para subir para os quartos era necessário se apresentar e um atendente avisar o hóspede pelo telefone. Não havia nenhuma visita o que levou a polícia a assumir que as pessoas que supostamente estiveram com o sujeito - vistas ou ouvidas por testemunhas, também deviam ser hóspedes. A polícia checou cada um dos hóspedes em busca de quem poderia ter visitado o quarto 1046, mas não tiverem qualquer resultado.
Incapaz de entender o caso, a polícia fez circular a fotografia do homem esperando que alguém pudesse reconhecê-lo.
Um taxista chamado Robert Lane viu essa fotografia no jornal e disse que havia encontrado com o sujeito no dia 3 de janeiro. Ele não tinha dúvidas de que era o mesmo homem, lembrava dele ser forte, alto e ter aquela cicatriz. Vestia um sobretudo preto, mas quando entrou no taxi, Lane percebeu algo estranho: o homem não estava vestido abaixo do sobretudo. Ele batia o queixo de frio e tentava esquentar as mãos esfregando uma na outra. Quando perguntou o que estava acontecendo, ele apenas fez sinal para que dirigisse.
O passageiro pediu para ser levado até a Alameda Fenton, que ficava a apenas 4 quadras do hotel. Ele desceu e pediu que Lane o buscasse dali 2 horas no mesmo local. Lane não o fez... depois que o passageiro saltou do carro, ele percebeu que havia uma mancha de sangue no banco de trás e ficou com receio que o sujeito pudesse ser um louco ou estar envolvido com algo ilegal. A última vez que ele viu o passageiro foi quando ele desceu a Fenton sumindo na escuridão. A polícia perguntou para todos os moradores na rua se conheciam o sujeito, mas não obteve nenhum resultado. Ninguém o conhecia ou sabia algo a respeito dele.
Um atendente de bar, que ficava ali perto também reconheceu a fotografia divulgada. Disse ter visto o sujeito no estabelecimento cercado de várias mulheres no dia 4 de janeiro. Ele pagava bebida a todos e havia comprado uma garrafa de whisky que guardou no bolso do sobretudo preto antes de sair. As mulheres que foram interrogadas, todas elas prostitutas conhecidas na região, disseram ter falado com o homem. Ele disse que seu nome era Tom (ou Don) e que era de fora da cidade. Para uma disse que vinha de Salt Lake, outra afirmou que ele tinha vindo de Los Angeles.
Uma mulher chamada Paula Tomison afirmou que o sujeito agia de modo estranho. Não falava coisa com coisa e que em determinado momento perguntou que dia era, o ano e quanto tempo faltava para chegar o Natal, o que ela achou estranho, já que estavam no início do ano. O sujeito queria apenas beber na companhia de alguém (não queria fazer programa). Paula disse que ele estava apreensivo e que não revelou muito. Disse no entanto que era casado, tinha filhos e que trabalhava com seguros "ou algo assim". Fumava muito, ao ponto de acender um cigarro no outro.
Outra mulher Alice Tate disse que percebeu que o homem estava armado. A pistola se destacava no coldre por baixo do sobretudo. Ele percebeu que ela viu a arma e ele a tranquilizou dizendo que "era policial". Alice também chamou a atenção para o fato do homem perguntar que dia era. Em seguida ele disse algo ainda mais estranho: "Quantos anos faltam para 1965?" e desconversou.
Enquanto o funeral era preparado, uma pista em potencial surgiu a partir de um telefonema anônimo de um homem que afirmava ser o cunhado do falecido. A pessoa não quis se identificar, mas disse que a polícia estava seguindo o "rastro errado". Quando a telefonista pediu que ele elaborasse o comentário, ele teria dito "vocês não sabem de nada" e desligou.
Mais estranho ainda: uma vez que o nome do morto era desconhecido ele deveria ser enterrado como indigente, mas na data do funeral, um jornal local recebeu um envelope acompanhado de 200 dólares. Nele havia instruções para que o dinheiro fosse usado para cobrir os custos do enterro do sujeito encontrado no Hotel President, cujo nome seria David Brezinski. A polícia tentou descobrir quem enviou o dinheiro, mas as investigações levaram a um beco sem saída.
Havia um David Brezinski em Salt Lake, mas a polícia descobriu que este havia morrido em 1920 em um acidente ferroviário. O homem tinha uma descrição semelhante ao misterioso hóspede do 1402 mas havia sido cremado após seu falecimento. Novo beco sem saída!
Durante o funeral a polícia ficou atenta, mas não apareceu nenhum amigo ou parente do falecido. Embora uma coroa de flores com as palavras "Amor eterno, Louise" tenha sido enviada. A polícia tentou traçar a identidade do homem sem sucesso. Buscou também uma identificação de quem poderia ser o homem com quem ele havia conversado pelo telefone. Todos os números discados pela telefonista estavam desconectados.
Todas essas pistas e indícios bizarros levaram as autoridades a se deparar com um mistério de difícil solução. Não sabiam quem era a vítima, o que ele fazia, de onde vinha, nem quem o havia visitado e como ele acabara morto. Para todos os efeitos, não tinham a menor ideia de quem poderia ser o assassino.
Owen foi eventualmente enterrado no Memorial Park Cemetery, a cerimônia paga pela misteriosa carta anônima que chegou ao jornal. A trilha começou a esfriar e a polícia não tinha muito com que trabalhar sobre o caso.
Em 1936, uma mulher que se identificou como "Eleanor Ogletree" de Birmingham, Alabama entrou em contato com a polícia do Missouri. A mulher dizia ter visto a fotografia de Owen e lido um artigo numa revista a respeito do caso em Kansas City. Ela imediatamente reconheceu a imagem como sendo de seu irmão Artemus, que havia desaparecido. De acordo com a mulher, ele havia sumido em 1934, sob estranhas circunstâncias. Artemus, ou alguém se passando por ele, havia enviado uma série de estranhas cartas para sua mãe, Ruby Ogletree, todas elas datilografadas. As cartas falavam de um trabalho misterioso sobre o qual ele não podia revelar detalhes. A carta final afirmava que ele planejava visitar a Europa.
Outra pista também ligava o misterioso hóspede ao tal Artemus Ogletree. Uma ligação anônima de um homem chamado Jordan, identificava o morto como Artemus e dizia que este havia salvado sua vida no Cairo, Egito em 1930. Mais estranho ainda, a polícia recebeu dessa testemunha uma carta com fotos de Ogletree nas Pirâmides do Egito. A semelhança entre Artemus e o misterioso Roland T. Owen era impressionante. Até mesmo a enorme cicatriz na face era idêntica a que se podia ver nas fotografias.
Quem seria o misterioso "Jordan" que enviou as cartas e entrou em contato com a polícia cedendo fotos? Seria ele o tal "Don" que estava do outro lado da ligação telefônica atendida pela camareira? Teria ele sido o responsável pela morte de Artemus? Se foi isso, qual a linha correta dos acontecimentos? Quem poderia saber? Essa linha de investigação acabou esfriando e os detetives logo se viram novamente perdidos em uma série de conjecturas e teorias.
Nos anos que se seguiram, as autoridades buscaram pistas, mas nada de conclusivo foi descoberto.
Em 2003, John Horner, um bibliotecário da Kansas City Public Library foi contatado por um telefonema anônimo. A pessoa dizia ser um construtor que havia encontrado uma estranha caixa no sótão de uma casa abandonada em que estava trabalhando. Horner havia escrito uma matéria sobre o caso em 2000 e a pessoa achava que ele poderia se interessar pelo material contido na caixa.
Horner achou ali dentro uma pilha de recortes, fotografias e artigos publicados sobre o Caso Owen/Ogletree juntados ao longo de anos e meticulosamente arranjados de uma maneira muito profissional. As fotografias de cena de crime e de autópsia chamaram especialmente a atenção de Horner que jamais havia visto um material tão completo sobre o fascinante mistério. Uma vez que era material autêntico ele concluiu que o dono provavelmente era um policial que continuou pesquisando o caso mesmo passados muitos anos.
Seja lá quem tenha reunido aquele material, teceu algumas teorias a respeito do que poderia ter acontecido naquele final de semana no Hotel. Sua teoria, datilografada com muito cuidado e guardada em uma pasta descrevia um possível triângulo amoroso entre Ogletree e uma mulher misteriosa chamada Louise, supostamente a esposa de um criminoso ou político influente. O texto conjectura que Ogletree pode ter sofrido um tipo de colapso nervoso e se hospedado no Hotel com o intuito de cometer suicídio. Entretanto, ele teria sido encontrado por alguém contratado para matá-lo em virtude do relacionamento com Louise. Ele teria sido torturado e morrido de maneira medonha bem diante da amante.
Mas é claro, num caso tão bizarro, há outras teorias, algumas esotéricas, para dizer o mínimo.
A mais fantástica se concentrava no fato de que o hóspede supostamente jamais deixou o quarto 1046, mas ainda assim foi visto por testemunhas andando pelos arredores de Kansas City. Teoristas acreditam que de alguma forma Owen/Ogletree tenha se valido de algum conhecimento sobre portais e passagens dimensionais para entrar e sair do hotel. Nesse caso, ele teria usado o quarto como "base de operações", deslocando-se para outros lugares e até quem sabe, outras dimensões. Isso poderia explicar as perguntas dele a respeito da data quando visitou o bar.
Para dar suporte a essa teoria extravagante, algumas testemunhas mencionam curiosos avistamentos no Hotel, ocorridos dali em diante. Nesses encontros inusitados, sempre nos corredores, escadas e salões do hotel, um homem ou a silhueta deste é vista. A figura espectral é descrita sempre da mesma maneira, um homem alto e forte, às vezes, vestindo um sobretudo preto fechado e um chapéu dos anos 1930. Sua expressão sempre é a mesma: perdido, desnorteado e assustado. Algumas testemunhas afirmam inclusive ter falado com a figura misteriosa, e essa ter perguntado a elas onde estava e qual era o ano.
Não por acaso, o quarto 1046 também se tornou o ponto focal de assombrações, com relatos recorrentes sobre ruídos, passos e gritos, mesmo quando o local deveria estar vazio. Funcionários do President descreveram encontros fortuitos com a figura que parece ter a capacidade de atravessar paredes e portas e que costuma ser visto nas imediações do décimo andar, de preferência no corredor que leva ao quarto.
Com tudo isso, o que se pode dizer sobre o Caso do Quarto 1046? Talvez a única certeza que se tenha é que nada é o que parece ser. Não há suspeitos e nem indícios que apontem para algum responsável, tudo o que se sabe é que uma morte aconteceu mas não em que circunstâncias ou quem a causou. Quem era Roland T. Owen e o que aconteceu com ele?
Parece que infelizmente nós jamais saberemos e esse caso continuará para sempre um mistério sem solução.