Enquanto os registros históricos provam que o homem conhecido como Conde de Saint-Germain realmente existiu, sua vida parece desafiar o senso comum sendo material digno de lendas. Ele foi um gênio, um alquimista, um místico, uma alma iluminada ou simplesmente um charlatão?
Embora a data exata do nascimento de Saint-Germain permaneça desconhecida, ele mesmo afirmou ser filho de Franz-Leopold, Príncipe da Transilvânia, e da princesa Charlotte Amalia de Hesse-Wahnfried, que se casaram em 1694. Depois que seus irmãos foram feitos prisioneiros pelos austríacos e seus pais morreram, ele foi criado pelos executores do testamento de seu pai - o duque de Bourbon, o duque de Maine e o conde de Charlerie e Toulouse - e através deles foi apresentado às cortes da Europa como alguém de sangue principesco e descendência quase real.
De acordo com a obra histórica Illustri Italiani de Caesare Cantu, bibliotecário da grande biblioteca de Milão, quando Saint-Germain atingiu a maioridade recebeu educação esmerada na Universidade de Siena, viajou muito pela Itália e Espanha, foi muito protegido pelo Grão-Duque da Toscana e, eventualmente, herdou o considerável legado de seu pai, o que pode ser o motivo pelo qual ele nunca pareceu precisar de dinheiro.
Pouco se sabia sobre ele até 1740, quando Saint Germain começou a aparecer em vários registros históricos como um homem de aparentes trinta e poucos anos que se movia em círculos vienenses da moda e era conhecido por suas roupas incomumente sombrias, predileção paradoxal por diamantes espetaculares e propensão a contar histórias extraordinárias sobre sua vida passada. Discursava sobre ter participado de momentos históricos importantes, por vezes como ator e noutras como testemunha. Afirmava ter conhecido a Sagrada Família (Jesus, Maria e José) intimamente; que esteve presente nas Bodas de Canaã; que foi um bom amigo de Santa Ana, mãe da Virgem Maria e que pessoalmente propôs sua canonização no Concílio de Nicéia em 325 CE, além de ter testemunhado os dias finais do Império Romano.
O Saint-Germain daqueles dias era amplamente falado como uma figura enigmática e notável que praticava a alquimia, era um joalheiro experiente, havia viajado pela Europa, África, Índia, China e Pérsia, era conhecido por falar fluentemente muitas línguas, incluindo chinês , hindu e persa, compunha música e tocava violino. (Peças de música, datadas de 1745 e 1760, supostamente compostas e certamente assinadas por Saint-Germain, podem ser encontradas no Museu Britânico em Londres). Ele estava ainda profundamente envolvido com numerosas ordens esotéricas, incluindo os Rosacruzes e os Templários, e havia rumores de ser capaz de transformar metais básicos em ouro. Ele frequentemente descrevia máquinas que tinham semelhanças notáveis com locomotivas e navios a vapor (que não haviam sido inventados na época) e havia sugestões de que possuía a Pedra do Alquimista, havia bebido da Fonte da Eterna Juventude e tinha aproximadamente 4.000 anos.
Tudo isso pode parecer uma invenção absurda, contudo, o mais curioso é que muitas pessoas na época realmente acreditavam nesses boatos e defendiam que as façanhas de Saint Germain podiam ser ainda maiores. Saint-Germain segundo rumores produzia milagres de cura, falava com autoridade sobre ciência e teologia, manipulava poderes mágicos, podia invocar anjos e demônios, lia pensamentos, conjurava tempestades e gerava descargas de raios da ponta de seus dedos. Alguns diziam que ele era o Judeu Errante da lenda, fadado a viver eternamente ou que ele era Longinnus, o legionário que perfurou o corpo de Cristo na Crucificação. Esses boatos ajudaram a alimentar o mito sobre sua real identidade.
No que diz respeito à frequente fala sobre objetos futuristas de Saint-Germain, a biblioteca de Troyes, na França, possui um documento assinado por ele, no qual descrevia inúmeras máquinas estranhas como o fonógrafo, o computador e o avião. Ele também relatava uma experiência que parecia notavelmente semelhante às viagens espaciais modernas:
"Nos movemos pelo espaço em uma bala de prata a uma velocidade que não pode ser comparada a nada que exista atualmente... Em uma fração de segundo, as planícies abaixo de nós estavam fora de vista, e a Terra se tornou uma nebulosa tênue. Fui carregado e viajei pelo empíreo por um tempo incalculável a uma altura imensurável. Corpos celestes giraram e mundos desapareceram sob mim... foi uma jornada além das esferas do tempo e espaço".
Muitos acreditavam que Saint-Germain era um trapaceiro, mas muitos também o levavam a sério – inclusive os governos dos principais países europeus, pois o Conde, além de ser considerado um homem notável, também tinha a reputação de estar envolvido na política. Por um lado, foi acusado pela polícia francesa de ser um espião prussiano, por outro, era suspeito pelos prussianos de ser um agente russo. Para complicar ainda mais, em novembro de 1745, em uma Londres obcecada por conspiradores jacobinos e seus simpatizantes franceses, ele foi preso pelas autoridades, acusado de ter cartas pró-Stuart em sua posse. Ele alegou indignado que as cartas haviam sido plantadas nele e acabou sendo liberado.
Comentando o caso em uma carta datada de 9 de dezembro de 1745, Horace Walpole, o famoso historiador britânico e estimado homem de letras, escreveu a seguinte descrição: “Ele [Saint-Germain] esteve aqui esses dois anos , e não sou capaz de dizer quem ele é ou de onde, mas uma coisa é certa, trata-se de um homem com inúmeras qualidades". Ele também escreveu que Saint-Germain "cantava e tocava violino maravilhosamente", mas acrescentou que no fundo ele era "louco e pouco sensato".
Outro aspecto desconcertante sobre Saint-Germain tornou-se popular depois que o Conde, segundo o Marechal de Belle Isle, o curou de uma doença grave e foi recompensado sendo levado a Paris. Lá o agradecido marechal colocou a sua disposição um laboratório para seus experimentos alquímicos. Segundo o historiador Touchard la Fosse, pouco depois da chegada de Saint-Germain a Paris, ele participou de uma soirée organizada pela idosa condessa von Georgy, viúva do embaixador francês em Veneza. A senhora lembrava de ter conhecido alguém com o mesmo nome e aparência de Saint-Germain em Veneza na década de 1670. Quando o surpreendentemente jovem Saint-Germain confirmou à condessa envelhecida que o homem que ela conhecera há tantos anos era ele mesmo, ela mal pôde acreditar, pois se fosse verdade, ele deveria ter quase cem anos de idade. No entanto, Saint-Germain insistiu que ele era o mesmo homem e que era de fato muito velho. Quando a condessa atônita afirmou que ele devia ser "um demônio", Saint-Germain, disse-lhe para não usar tais termos e deixou a sala incomodado.
Uma possível comprovação para a afirmação de Saint-Germain de que ele era o homem conhecido da condessa von Georgy em 1670 foi registrada pelo barão Charles Henry de Gleichen, um diplomata dinamarquês. Em suas memórias publicadas, o Barão Gleichen afirmou que o compositor Philippe Rameau e um parente do embaixador francês em Veneza lhe garantiram que conheceram Monsieur de Saint-Germain no início de 1700, quando, segundo eles, ele parecia ser um homem. de cerca de trinta anos.
Em certa ocasião, Saint-Germain teria confidenciado a convidados de uma festa que vivia há séculos e que tal milagre se devia ao fato dele ter dominado habilidades mágicas que lhe permitiam tal coisa. "A vida eterna está ao meu alcance! De fato, acredito que não posso ser capaz de morrer", teria dito.
Os amigos de Saint-Germain também diziam que ele era muito afeito de diamantes. O Barão Gleichen contou que o Conde mostrou algumas pedras notáveis – um grande número de brilhantes coloridos e outras pedras de tamanho e perfeição incomuns. "Pensei estar diante de tesouros lendários e ele confirmou que se tratavam de pedras obtidas do tesouro do próprio Rei Salomão".
Muitos assumiam que esses diamantes também podiam ser produto de experimentos alquímicos. Certamente acreditava-se na época que Saint-Germain era um alquimista capaz de transformar metais comuns em ouro, vidro em diamante e ovos em gemas coloridas. Sua obsessão pela alquimia era notória, sendo em determinado momento considerado o místico mais famoso da Europa. Ganhou fama como bruxo e só escapou de inquéritos movidos pela Santa Inquisição por ter amigos influentes, inclusive no clero.
Suas habilidades alquímicas também teriam permitido a ele produzir o Elixir da Vida Eterna. Essa seria uma explicação para os rumores de que Saint-Germain era lembrado por anciãos que o haviam encontrado décadas antes e por que ele sempre parecer jovem. Um último aspecto de sua personalidade foi intensificado pelas repetidas afirmações de que ele nunca comia – e certamente nunca foi visto comendo ou bebendo em público.
Em 1758, ainda em Paris, Saint-Germain foi apresentado a Luís XV pelo marechal de Belle Isle no salão da amante de Luís, Madame de Pompadour. Parece ter encantado os dois, pois dois anos depois, em 1760, ele foi enviado por Luís XV a Haia como seu representante pessoal. Sua missão era firmar o tratado de paz entre a Prússia e a Áustria. Enquanto estava na Holanda, ele se desentendeu com seu ex-amigo, o notório namorador Casanova. Isso pode ter incentivado a inimizade do ministro das Relações Exteriores de Luís, o duque de Choiseul, que convenceu o Rei de que Saint-Germain o havia traído e deveria ser jogado na Bastilha. Para salvar o pescoço, Saint-Germain fugiu para a Inglaterra onde se estabeleceu graças a amigos.
Posteriormente, um artigo do London Chronicle de 3 de janeiro de 1760, mencionava a então amplamente divulgada "juventude eterna" do Conde de Saint-Germain, declarando: "Ninguém duvida agora, embora a princípio tenha sido pensado ser pura fantasia. Na verdade, todos acreditam que, entre outras coisas, o Conde conhece uma fórmula para todas as doenças e que é capaz de viver eternamente."
O que se sabe é que Saint-Germain definitivamente existiu, e que era realmente um sujeito muito estranho – um músico e compositor, um linguista surpreendente, uma autoridade em história mundial, um mago e alquimista com 4.000 anos de idade – e que, ao pelo menos de acordo com os registros históricos, viveu um tempo notavelmente longo.
No entanto, a partir deste ponto, os fatos registrados tornam sua vida muito mais concreta.
Em 1762, o Conde participou da deposição de Pedro III da Rússia o que levou Catarina, a Grande, ao trono. Um ano depois, ele ficou famoso por realizar experimentos alquímicos em seu laboratório no castelo renascentista em Chambord, a sudoeste de Orléans. Lá, além de realizar a transmutação de metais, também criava tempestades, prendia demônios em garrafas e confabulava com anjos. O Castelo era frequentemente visitado por nobres que vinham de longe para testemunhar seus milagres. Ele recebeu uma propriedade na Holanda onde estabeleceu outro laboratório no qual fazia tintas e corantes, além de forjar anéis e amuletos mágicos que protegiam aqueles que os usavam. Depois de desaparecer da Holanda com cerca de 100.000 florins, materializou-se na Bélgica, desta vez autodenominando-se Marquês de Monferret – e lá, em Tournai, montou outro laboratório alquímico.
Em 1768, Saint-Germain apareceu na Rússia na corte de Catarina, a Grande, a quem havia ajudado a subir ao trono. De acordo com o conde Alexei Orlov, então chefe das Forças Imperiais Russas, ele foi um diplomata inestimável e conselheiro do palácio durante a guerra russo-turca de 1768-70. Como recompensa, foi nomeado oficial de alto escalão do Exército russo – posição que assumiu sob o irônico pseudônimo de General Welldone. Mas, ao invés de colher os benefícios de sua posição de prestígio no final da guerra, ele escolheu deixar a Rússia e ir para a Alemanha, onde, com seu amigo e aluno, o príncipe Charles de Hesse-Cassel, realizou mais experimentos alquímicos, além de estudar a Maçonaria e o Rosacrucianismo.
Uma década antes disso, em 15 de abril de 1758, Voltaire, o famoso filósofo francês, em uma de suas muitas cartas a Frederico, o Grande, descreveu Saint-Germain como "um homem que sabe de todos os temas e que nunca morre". Ele então acrescentou: "Acho bastante provável que este homem o visite nos próximos cinquenta anos". Embora essa visita nunca tenha acontecido, em 1779, a princesa Amalie da Prússia, irmã de Frederico, o Grande, conheceu Saint-Germain e se interessou por ele, tratando-o como "um homem fascinante e misterioso".
Os registros paroquiais na Igreja Católica de Eckernforde, na Alemanha, dizem que o Conde Saint-Germain morreu em 27 de fevereiro de 1784 e foi enterrado no cemitério local. Se isso for verdade – e supondo que Saint-Germain tivesse cerca de trinta anos em 1701 – isso o colocaria no momento da morte com pelo menos 110 anos de idade, embora não aparentasse mais de 40.
Embora o enterro de Saint-Germain esteja registrado na paroquia de Eckernforde, muito mistério envolve sua morte. Para começar, ele teria morrido quando seu bom amigo e discípulo, o príncipe Charles de Hesse-Cassel, estava ausente, e com apenas duas mulheres sem nome como testemunhas de seu falecimento. Para aprofundar o mistério, o príncipe Charles ordenou a destruição de todos os papéis supostamente inestimáveis que pertenciam a Saint-Germain – em suas próprias palavras, "para que não fossem mal interpretados".
Quase imediatamente, rumores de que Saint-Germain ainda estava vivo se espalharam como fogo. O motivo para simular a própria morte é que ele havia ganho muita fama pela Europa e as pessoas se perguntavam como era possível ele continuar vivo.
Em 1785, um importante congresso de Maçons foi realizado em Paris e contou com a presença de Rosacruzes, Cabalistas, Illuminati e membros de outras Sociedades Secretas. De acordo com os arquivos maçônicos, os convidados incluíam o famoso mago, místico e alquimista, Conde Cagliostro, o filósofo Louis Claude de St. Martin, o renomado médico e hipnotizador Franz Mesmer e o Conde de Saint-Germain. Alguns disseram que ele realizou um discurso na reunião e foi muito aplaudido.
Esta não foi a única aparição de Saint-Germain após sua suposta morte. Foi registrado que Mademoiselle d'Adhemar o encontrou ao menos cinco vezes durante um período de muitos anos, começando em 1789, quando também visitou o Rei Gustavo III da Suécia para avisá-lo do perigo de inimigos, e até em 1820, na noite anterior ao infame assassinato do Duque de Berri. Ainda mais estranho é que em seus próprios diários, Maria Antonieta lamentou não ter dado crédito aos avisos de Saint-Germain sobre a próxima eclosão da Revolução Francesa. Alegadamente, Saint-Germain também apareceu diante de Maria Antonieta na prisão, para avisá-la da data e hora de sua execução.
Mas não termina aí... Vinte e oito anos depois, em 1821, a notável educadora, Madame de Genlis, mencionou em suas memórias uma conversa que teve com Saint-Germain durante as negociações de paz de Viena; e no mesmo ano o embaixador francês, o Conde de Chalon, afirmou ter falado com ele na Praça de São Marcos, em Veneza. Em 1842, o nome de Saint-Germain estava sendo mencionado em conexão com Lord Lytton, a quem ele teria ajudado a desenvolver poderes sobrenaturais. Em 1867, uma reunião da Grande Loja dos Maçons em Milão, contou com a presença de Saint-Germain; e em 1896, quando, segundo as evidências, ele teria aproximadamente 245 anos, a famosa teosofista Annie Besant escreveu que o conhecera pessoalmente.
Os céticos argumentam que a lenda sobre a longevidade de Saint-Germain são algum tipo de farsa elaborada, mas seria possível para um indivíduo estender tal farsa por um período tão longo de tempo? Como poderia manter viva em tantos países e culturas diferentes esse rumor? Napoleão III ficou tão intrigado com as histórias sobre Saint-Germain que criou um conselho especial para investigá-lo. No entanto, as descobertas da comissão foram destruídas em um incêndio que consumiu o Hotel de Ville em Paris em 1871 – e muitos estavam dispostos a atribuir esse desastre a algo mais além de coincidência. Boatos afirmavam que a Rainha Victoria da Inglaterra, em 1890 teria enviado agentes de sua confiança para buscar o famoso alquimista e trazê-lo diante dela. Seu objetivo seria garantir a vida eterna. Também há rumores de que o Czar Nicolau II também encomendou um dossiê sobre Saint-Germain, depois que rumores circularam pela corte russa de que ele estaria vivendo em São Petersburgo.
No século XX, as lendas à respeito de Saint-Germain parecem ter gradualmente diminuído, embora em certos círculos místicos seu nome continuasse a ser pronunciado. Com todas essas lendas à respeito de Saint-Germain, o que poderíamos levar em consideração dessa figura misteriosa? Teria sido ele uma alma iluminada e um mago de respeito ou seu maior truque foi construir uma aura lendária ao seu redor? Quem seria ele? Um alquimista imortal? Um vampiro? Uma figura amaldiçoada? Ou um Viajante do Tempo?
Em se tratando do Conde de Saint-Germain, provavelmente jamais saberemos.
Saint-Germain foi tipo o Gandalf da Europa? XD
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