Ao longo da história a Lua sempre exerceu um fascínio especial sobre a humanidade. Lendas e mitos surgiram em torno dela em todos os cantos do planeta e em todos os tipos de culturas, não importa o quanto distantes ou díspares. Um aspecto da lua que sempre nos encantou ao longo dos séculos é o dos eclipses, e é aqui que as coisas ficam bastante estranhas.
Eclipses sempre nos causaram igual fascínio e temor. Eles eram um aspecto misterioso e desconhecido, do qual o homem não tinha conhecimento e que dada sua magnitude parecia algo assombroso. Houve ocasiões em que eclipses motivaram pânico em massa e até mesmo alteraram o curso da história. Aqui veremos casos de eclipses que influenciaram guerras com repercussões que reverberaram ao longo do tempo.
O caso mais antigo e talvez o mais conhecido data do ano 585 aC., durante a Batalha de Halys, travada na Anatólia (atual Turquia) entre os medos e os lídios. Aparentemente, a batalha ja seguia longa, sangrenta e árdua, com os dois lados se enfrentando sem um vencedor claro à vista. Em algum momento durante esta batalha incerta, foi relatado que o sol foi apagado por um eclipse solar, lançando escuridão total sobre o campo de batalha. De um instante para outro o dia se transformou em noite. Como resultado, houve um grande alvoroço em ambos os lados da contenda. Os homens gritavam ou choravam, lançavam-se ao chão pedindo proteção aos deuses e havia uma sensação geral de desorientação e pânico. A luta cessou e as tropas olhavam para cima com espanto diante do desconhecido.
Na época, os eclipses eram coisas misteriosas que ninguém realmente entendia e que inspiravam admiração. Não se sabia que esses eclipses eram causados pela Lua que se interpunha entre a Terra e o Sol e, portanto, eram vistos como eventos celestiais portentosos de poderes além de nossa compreensão. Foi por esta razão que a batalha foi interrompida. Tornando tudo ainda mais misterioso, este eclipse em particular foi reivindicado pelo antigo historiador grego Heródoto como tendo sido previsto pelo filósofo grego Tales de Mileto. Heródoto escreveria sobre isso:
"Certo combate corria sangrento, mas quando a batalha estava atingindo seu auge, o dia subitamente se transformou em noite. Este evento foi predito por Thales, o Milesiano, que avisou os jônios sobre ele, fixando para ele o mesmo ano em que realmente ocorreu. Os medos e os lídios, quando observaram a mudança, pararam de lutar e ficaram igualmente ansiosos para que os termos de paz fossem acordados."
Se o relato de Heródoto for preciso, este eclipse é o mais antigo previsto antes de sua ocorrência. No entanto, há algum debate sobre essa previsão, se foi realmente precisa ou mesmo se realmente aconteceu. Foi apontado que o conhecimento astronômico disponível naquela época não era suficiente para Tales prever o eclipse e, além disso, não há menção de quais seriam seus métodos ou como ele teria previsto tal coisa.
Sabe-se, contudo, que houve um eclipse solar naquela data e que este interrompeu a batalha, mas nunca se saberá se Tales realmente o previu com antecedência. Seja qual for o caso, é um curioso relato de um evento celestial que colocou dois exércitos de joelhos.
Outro caso teria acontecido em 413 a.C., durante a Guerra do Peloponeso, uma luta de décadas entre Atenas e Esparta, na Grécia. No final de agosto daquele ano, o exército de Atenas, liderado pelo general aristocrático Nícias, já tinha visto dias melhores. Eles haviam empreendido campanha contra a cidade-estado siciliana de Siracusa em uma tentativa de impedi-los de enviar ajuda à cidade-estado de Esparta. O resultado foi contrário ao desejado, falharam miseravelmente, perdendo centenas de homens e pelo menos sete navios. O exército derrotado, com muitos feridos, acampou ao lado de um pântano escuro e infestado de mosquitos. Haviam muitos homens doentes, incapazes de continuar a lutar. Essa situação crítica ficou ainda pior quando os soldados espartanos chegaram para reforçar os siracusianos. Nicias decidiu erguer acampamento, fazer uma retirada para se reagrupar e conseguir reforços. O plano era se esgueirar sob o manto da escuridão e escapar de seus inimigos. Eles provavelmente teriam sucesso se não fosse por uma intervenção celestial.
Naquela noite, enquanto as forças de Nícias se preparavam para partir, houve um eclipse que deixou a lua com uma aparência vermelha profunda e sinistra. Essa visão atípica aparentemente deixou os atenienses em pânico, especialmente Nicias, que, segundo todos os relatos, estava absolutamente apavorado com o fato daquilo ser um mau presságio. Para o comandante o significado era claro: morte iminente. Depois de algumas conferências com seus sacerdotes e conselheiros, foi determinado que o eclipse era uma má notícia, um sinal do além, e o historiador grego Plutarco diria:
"A própria Lua escurecendo, como isso poderia acontecer e tão de repente? Uma ampla Lua cheia jamais poderia mostrar cores tão variadas. Ninguém era capaz de compreender o que se passava. Eles concluíram que era um evento sinistro e uma insinuação divina de calamidades pesadas por vir."
Foi decidido que, com um mau presságio pairando no céu acima de suas cabeças, seria tolice tentar fugir naquele momento e que eles deveriam adiar sua retirada. Infelizmente os espartanos e siracusianos aproveitaram ao máximo esse atraso, lançando-se para atacar. Houve uma batalha naval massiva que terminaria com uma surra severa que deixou os atenienses praticamente dizimados. Uma força conjunta de reforços atenienses e etruscos os ajudou a evitar serem completamente massacrados, mas uma vez cercados por uma força inimiga muito superior, os navios foram destruídos e o porto bloqueado. A força ateniense seria sufocada durante um esforço para abrir caminho por terra, e eles conseguiram chegar apenas à alguns quilômetros até o rio Anapo, onde foram massacrados ou capturados pelos espartanos. Nicias seria executado não muito depois disso, e tudo por causa daquele eclipse vermelho-sangue. A dramática derrota na Sicília foi o início do fim do domínio ateniense.
Um relato semelhante vem do ano 331 a.C. Na época, Alexandre III da Macedônia, mais conhecido como Alexandre, o Grande, estava se preparando para o que se tornaria a famosa Batalha de Gaugamela, contra seu inimigo mortal, o imperador Dario III da Pérsia. Alexandre estava em uma situação difícil na época, suas forças eram menores do que as dos bem equipados e bem armados persas. O resultado da batalha parecia sombrio para os gregos. Na verdade, houve quem pensasse que enfrentar o exercito persa era uma loucura e que os macedónios estariam condenados se prosseguissem. Enquanto eles se moviam em direção ao campo de batalha de Arbela, na Assíria, perto da vila de Gaugamela avistaram o exército inimigo. Nesse momento, ocorreu um eclipse total da Lua que passou a brilhar com um sinistro halo de sangue vermelho.
Os astrólogos gregos foram rápidos em assegurar aos soldados que aquele fenômeno significava que o sangue do inimigo seria derramado naquela noite. O rumor se espalhou entre a tropa e a contagiou de tal forma que o moral se elevou imediatamente.
Do outro lado, o súbito eclipse aparentemente causou o efeito inverso com medo e tumulto se instalando entre os persas. Os homens, supersticiosos como eram, interpretaram o eclipse vermelho-sangue como um terrível presságio de destruição. As tropas aparentemente se tornaram confusas e desorganizadas. Os conselheiros e astrólogos de Alexandre, o Grande, tentaram persuadir seu líder a atacar naquela noite enquanto o inimigo estava desorientado pelo eclipse e a moral macedônia era alta, mas Alexandre recusou, optando por deixar o acampamento inimigo descansar, dizendo a famosa frase "Não vou roubar uma vitoria."
Considerando seu exército em menor número, talvez fosse tolice não aproveitar o momento, mas Alexandre venceria a batalha no final, em parte devido a suas táticas superiores e ao uso inteligente de forças de infantaria leve, mas também devido ao profundo efeito que o eclipse teve tanto no moral de seus homens quanto no medo que atingiu o inimigo. A derrota persa na Batalha de Gaugamela levaria à queda do Império Aquemênida e de Dario III, e os historiadores acreditam que ele se deu pelo menos em parte graças ao eclipse da Lua de Sangue.
Mais recentemente, houve um caso da Guerra Revolucionária Americana. Na época os eclipses ainda assustavam as pessoas e o próprio primeiro presidente dos Estados Unidos, George Washington, descobriu que informações sobre eclipses poderiam ser valiosas para o esforço de guerra. Em 8 de janeiro de 1777, poucos dias depois de suas impressionantes vitórias sobre os britânicos em Trenton e Princeton, o general Washington agradeceu em uma carta ao Conselho de Segurança da Pensilvânia por uma mensagem que dizia:
"De acordo com os cálculos astronômicos, na próxima quinta-feira, entre as 9 e as 11 horas da manhã, um grande Eclipse do Sol será visível aqui, talvez não seja errado nesta ocasião precaver-se de um medo supersticioso no Exército que poderia acontecer caso os Homens fossem inesperadamente surpreendidos com esta aparição."
De fato, um eclipse ocorreu e despertou muita superstição e medo nos homens, sendo julgado que "poderia afetar as mentes dos soldados e trazer algumas consequências ruins".
Avisados do evento, a situação foi contornada e os homens acalmados. Do outro lado, entre os britânicos, houve confusão.
Curiosamente, mais de um ano depois, em 24 de junho de 1778, um eclipse solar total foi registrado como visível por combatentes das Carolinas à Nova Inglaterra e, neste caso, foi considerado um bom presságio. Talvez tivessem razão, porque as tropas de Washington ficaram no comando do campo de batalha e venceram.
Esses casos apenas aumentam a intriga e o mistério que a lua há muito tem para nós, especialmente em uma época em que os eclipses eram vistos como algo mais do que apenas um fenômeno planetário normal. Não parece importar se esses eventos realmente tiveram algum efeito mágico, apenas que as pessoas envolvidas acreditavam que assim acontecia.
Como dizem, as estrelas indiferentes dançam, executando seu balé cósmico, e os homens espantados vislumbram e tentam interpretar seu significado. Sem jamais serem capazes de conhecê-lo.
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