Imortalidade tem sido uma busca incessante do homem desde o início dos tempos. Não faltam exemplos de pessoas ao longo da história que afirmaram ter encontrado uma maneira (geralmente estranha) de alcançá-la.
Nossa bizarra história começa com um homem chamado James Bernard Schafer. Nascido em 1896, ele era bem educado, rico e com graduação como médico PhD. Infelizmente era também membro ativo da Ku Klux Klan. Além disso, estava ligado a estudos do paranormal, esoterismo e ocultismo. Na década de 1920, Schafer começou a chamar a atenção das pessoas ao criar uma organização chamada Fraternidade Real dos Mestres Metafísicos, um grupo com um estranho ditado que resumia sua área de atuação: "Nosso trabalho é ajudar pessoas a ajudar a si mesmas".
Embora a Organização fosse voltada para "ajudar", ela estava muito mais para um tipo de culto. E foi com a criação desse grupo que Schafer realmente começou a se desviar na direção de coisas bizarras, levando a um caminho sem volta através de práticas místicas, comportamento perigoso e um plano que visava criar uma criança que viveria para sempre.
Nessa época, Schafer chamava a si mesmo de "O Mensageiro", e estava fazendo algumas alegações improváveis. Ele dizia ter poderes sobrenaturais, sendo capaz de ler mentes, curar doenças e o mais espetacular, "desmaterializar" objetos e pessoas que escolhesse. Schafer desfilava na sede do grupo com um terno branco imaculado, vestindo óculos escuros e tendo um sorriso misterioso. Os demais membros esperavam que ele fizesse constantes revelações, e ele os respondia com discursos motivacionais enigmáticos. Para qualquer pessoa ouvindo seus conselhos, aquilo claramente não passava de bobagem, mas Schafer conseguia soar razoável. Pior, ele era convincente e persuasivo!
A Organização foi se tornando então cada vez mais misteriosa, apresentando crenças e rituais secretos exclusivos para os iniciados. As aulas e seminários aconteciam em sedes da Organização que começou a se espalhar rapidamente, conquistando popularidade. Revelar sua doutrina era estritamente proibido e aqueles que desafiavam as regras do culto, podiam ser repreendidos ou até banidos.
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James Schafer, médico e psiquiatra de sucesso |
Uma das doutrinas centrais dos Mestres Metafísicos envolvia a crença de que doenças, problemas mentais e a própria morte nada mais eram do que estados de fraqueza que poderiam ser afastados através de um condicionamento mediúnico. Os membros aprendiam uma técnica secreta, supostamente criada no Oriente e ensinada a Schafer, que lhes permitia "destruir pensamentos negativos". Essencialmente eles acreditavam que um estado de meditação profunda lhes permitia apagar tudo aquilo que era indesejável na existência humana. Com a meditação adequada, era possível mergulhar em sua própria psique e extirpar lembranças desagradáveis, manipular memórias, curar qualquer doença conhecida pela humanidade e para os mestres, viver eternamente. Os "pensamentos negativos" eram expulsos através desse método de destruição e como resultado era possível atingir incríveis resultados.
Schafer, ou melhor, o Mensageiro, afirmava que em seu transe era capaz de voltar no tempo, habitando o corpo de suas prévias encarnações, ascender a um nível de consciência que lhe permitia falar com os mortos, enxergar o invisível e até comungar com seres superiores, Deuses de esferas distantes. Havia, no entanto, algumas regras a serem seguidas para que a frequência mediúnica ideal fosse atingida: nada de álcool, café ou cigarros. Castidade e obediência estrita aos preceitos estabelecidos. A doutrina também impunha uma dieta vegetariana que condenava o uso de sal e de uma vasta quantidade de alimentos. A comida disponível para os membros do culto tinha de ser produzida especificamente pelos "Preparadores" que trabalhavam para os Mestres Metafísicos. O alimento processado e vendido aos membros, aprovado pela Ordem, tinha todas as substâncias necessárias para limpar o corpo das toxinas negativas. A substância semelhante a leite em pó supostamente era criada por um método conhecido apenas pelos Mestres. Se a pessoa não gostasse daquilo, podia também jejuar até quase morrer de fome. Isso também funcionava!
Os membros se reuniam ao menos uma vez por semana nas sedes chamadas de Templos Metafísicos ou Casas de Transformação. Nessas ocasiões aprendiam técnicas de meditação, transe, expansão da mente, lançar-se no passado remoto, no futuro distante e finalmente a destruição dos pensamentos negativos. É possível que muitos dos rituais ocorressem com pessoas em um avançado estado de desnutrição e desidratação, que poderiam ser assim mais facilmente manipuladas. É possível ainda que os Mestres fizessem uso de drogas para manipular o comportamento e até de hipnose. Fato é que muitos dos membros da Ordem alegavam viajar através do tempo e espaço, conhecendo lugares distantes e viver em eras passadas. Entre os testemunhos haviam aqueles que diziam ter visitado o Egito dos Faraós, a Corte de Elizabeth I, os tempos da Revolução Americana e a Idade Média. Um dos objetivos da Ordem era mapear todo o conhecimento e redigir um grande tratado de conhecimento e saber sobre a humanidade, uma Enciclopédia que relataria a história através de testemunho direto.
Todos os interessados em participar eram bem vindos na Fraternidade Real dos Mestres Metafísicos, mas o preço para receber o aprendizado era de 250 dólares para a primeira aula (algo em torno de 4 mil dólares em valores atuais). Dali em diante, doações eram bem vindas, algo chamado "oferta de amor", que podia tomar a forma de dinheiro vivo, objetos de valor e até mesmo a propriedade de imóveis. Foi com esse esquema que a Ordem conseguiu expandir seus templos e se tornar uma espécie de rentável máquina de fazer dinheiro.
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Schafer e seu plano mais ambicioso |
Muitos podem se perguntar como alegações tão bizarras feitas por alguém excêntrico como James Schafer podiam soar convincentes, mas esse é o perigo dos cultos. Seus líderes prometem mundos e fundos, que estão ao alcance dos que se dedicarem de corpo e alma à sua proposta. As pessoas, de certa forma, querem acreditar naquelas promessas e se dedicam de corpo e alma a elas. Se por acaso não atingem o efeito desejado, são convencidas de que não se dedicaram o bastante.
Foi com essa proposta que Schafer arregimentou uma legião de membros que eram separados em três graduações: Estudantes, Adeptos e Mestres Metafísicos. Em meados de 1930, a Ordem contava com milhares de seguidores dispostos a sustentar as necessidades do Culto. Mais incrível ainda, a medida que os membros iam se destacando, Schafer os convencia a trabalhar de graça para a Ordem como "professores". Através de uma "Rede Cósmica" eles eram levados a acreditar que podiam espalhar os ensinamentos para novos alunos. Não havia "salário" ou qualquer compensação por esse serviço, nada além de outro dogma convenientemente chamado de "passar a mensagem adiante". Anualmente ocorriam festivais em que cada candidato a Mestre Metafísico precisava doutrinar ao menos uma centena de novos membros afim de se graduar. E os proponentes conseguiam muito mais!
Através de doações e "certificados da irmandade", que custavam 100 dólares, a Ordem obteve muito dinheiro até que eventualmente em 1938, Schafer pode comprar um opulento terreno de 24 acres vizinho da Propriedade do milionário William Kissam Vanderbilt em Long Island. Lá ele criou o primeiro retiro da Ordem chamado de "Paraíso da Paz". O grupo também adquiriu o Teatro Adelphi em Nova York, mudando seu nome para "Centro Radiante", realizando lá seminários toda semana.
Schafer até buscou isenção fiscal alegando ser um "Líder Religioso", ocasião em que se gabou de ter mais de 100 mil seguidores em todos os Estados Unidos e partes da Europa. As atividades da Ordem a essa altura já haviam se tornado conhecidas e atraíam a atenção da imprensa que tentava desmascarar sua verdadeira face. A revista Time chamou os Mestres Metafísicos de "uma mistura bizarra de Rosacruz, Ciência Cristã, Ficção Científica e Culto de auto aperfeiçoamento" que se valia de métodos perigosos para ludibriar seus membros. Havia suspeita de que membros eram impedidos de deixar as sedes e templos, além do uso corriqueiro de coquetéis de drogas para condicionamento mental.
Mas quando aparentemente não parece ser possível tornar tudo ainda mais estranho, surge um detalhe que colocaria os Mestres Metafísicos entre os cultos mais estranhos de que se tem notícia. Como sempre, a ideia partiu de James Schafer e envolvia criar uma Criança Messiânica Imortal.
Em 1939, Schafer deu início a seu bizarro experimento tornando-se o Guardião Legal de uma bebê de três meses chamada Jean Gauntt. A mãe de Jean permitiu que a Ordem assumisse todos os aspectos educacionais da criança para que desse a ela uma vida que ela mesma, uma pessoa pobre, seria capaz de oferecer. Longe de ser um gesto de boa vontade, o plano do Mensageiro era criar a criança através do Método Metafísico, uma forma de criação que faria da "Bebê Jean" uma espécie de Messias para a Ordem. Ela jamais conheceria dúvidas, teria acesso a todo conhecimento e para todos os efeitos, jamais conheceria doenças, visto que seria virtualmente imortal. A Bebê Jean seria a real herdeira da Fraternidade dos Mestres Metafísicos e sua redentora para a eternidade. Era uma maneira de explicar convenientemente porque Schafer, o Mensageiro em pessoa, continuava envelhecendo. Na sua concepção, ele havia obtido o saber tarde demais, e apenas a preparação de uma criança desde a sua tenra idade, geraria o Messias almejado.
Para os iniciados, Schafer dizia que Jean seria responsável por "abrir a mente da humanidade", "revelar as verdades mais profundas" e "destruir de uma vez por todas os pensamentos negativos". Ela seria capaz de abrir o canal dos homens com suas encarnações através das eras, estabelecendo o vínculo de cada pessoa com suas múltiplas encarnações, fazendo com que os membros pudessem compartilhar seu saber e viver eternamente, quando e onde, bem entendessem.
Scahfer teria dito em uma entrevista concedida em 1940:
"Não posso imaginar maior dádiva para a humanidade do que a que estou oferecendo. Essa criança irá triunfar sobre a morte. Um bebê é como uma tela em branco, ela aprenderá as doutrinas e naturalmente irá se desenvolver até o ápice, tornando-se o indivíduo mais importante de todos os tempos".
A Bebê Jean foi transferida para a Sede do Paraíso da Paz onde ficaria sob a atenção solene dos Mestres Metafísicos, os únicos que tinham permissão para ficar com ela. A criança receberia a "Dieta da Eternidade" e absorveria o saber através das palavras dos Mestres 24 horas por dia. Ela seria treinada em técnicas mentais que removeriam de seu corpo e mente qualquer sinal de doença. Para os membros do culto, a Bebê Jean era a representação de suas esperanças e de tudo que a ordem propagava. Sua imagem era vendida para os novos membros como uma verdadeira redentora.
Nas reuniões, os Mestres apresentavam um relatório dos avanços obtidos. A Bebê supostamente aprendera a falar com apenas 4 meses, era capaz de raciocinar como um adulto, mostrava pleno discernimento da sua condição superior e em pouco tempo estaria pronta para se dirigir aos seguidores. Extra oficialmente corriam rumores ainda mais bizarros: a Bebê era capaz de ler a mente das pessoas, de argumentar como um filósofo treinado, flutuar no ar, mover objetos sem as mãos e de se projetar mentalmente no passado e futuro.
Contudo, apesar de todas as aspirações, o experimento de James Schafer, o Mensageiro dos Metafísicos duraria apenas 15 meses.
Em dezembro de 1940,a mãe verdadeira da Bebê Jean mudou de ideia a respeito do papel de sua criança como Messias, exigindo que ela lhe fosse devolvida. A mãe estava sendo impedida de ter contato com a criança e ela alegava que as promessas feitas pela Ordem não estavam sendo seguidas. Auxiliada por um grupo de advogados contratados e pagos por setores da mídia, em especial jornais, a mãe conseguiu levar o caso até a Corte de Justiça.
Num tumultuado julgamento, vários ex-membros da Ordem foram trazidos para prestar depoimento, relatando quais eram as bizarras crenças e doutrinas da ordem. As revelações acabaram causando enormes estragos à credibilidade do culto e arranhando sua base de seguidores. Pela primeira vez a ordem perdia membros à olhos vistos, junto com recursos financeiros que começavam a minguar. O Juiz pediu que a Bebê Jean fosse levada ao julgamento e os seguidores puderam ver pela primeira vez o bebê messias. Ficaram decepcionados ao constatar que se tratava de um bebê como qualquer outro, sem nenhum sinal da sua suposta inteligência superior.
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Bebê Jean e sua mãe unidas novamente |
Entretanto, o testemunho que derrubou de vez a Ordem dos Metafísicos foi o do próprio James Schafer em pessoa, que chamado a falar em juízo acabou caindo em contradição em numerosos pontos. Ele foi tratado como uma fraude e como o pior dos golpistas, sendo em seguida acionado por milhares de pessoas que se diziam lesadas pelos seus esquemas. Por fim, os processos resultaram em sua condenação por sucessivos desfalques e roubo. Ele foi enviado para a Prisão de Sing Sing em 1942.
Quando Shaefer foi liberado da prisão, ele abriu uma escola por correspondência para prosseguir em seus ensinamentos e também deu início a uma revista sobre a Metafísica. Ele continuou tendo um padrão de vida elevado, embora jamais comparável ao que ele desfrutou anteriormente. Em 1955, ele e sua esposa foram encontrados mortos na garagem de sua casa. Eles deixaram o motor do carro ligado e morreram por envenenamento causado por monóxido de carbono, deixaram uma simples nota de suicídio.
A Bebê Jean cresceu e teve uma vida relativamente normal. Ela eventualmente soube de sua estranha criação, quando era apenas um bebê destinado a se tornar o "messias da humanidade", contudo, como seria de se esperar não tinha qualquer recordação disso. Ela faleceu aos 74 anos após uma vida corriqueira na qual casou, trabalhou e teve filhos.
Surpreendentemente o Culto dos Mestres Metafísicos ressurgiu e desapareceu ao longo dos últimos 50 anos. Suas ideias estranhas foram propagadas, alteradas e reconfiguradas repetidas vezes, contudo ele não conseguiu o mesmo grau de aceitação ou de seguidores que teve nas décadas de 30 e 40. Hoje ele é apenas uma curiosa nota de rodapé histórica da qual poucos ouviram falar. Mas um dia ele foi o centro da vida de muitas pessoas.