Na década de 30, o transatlântico norte-americano de 150 metros chamado SS Morro Castle era o máximo do luxo nos Sete Mares.
Entre 1930 e 1934, o Morro Castle realizou várias viagens na linha entre Cuba e Nova York, atraindo uma constante clientela, mesmo nos duros anos da Grande Depressão. Seus ricos passageiros aproveitavam a viagem por águas internacionais para burlar a Proibição que estava em vigor no período. À bordo do navio jogo e bebida eram perfeitamente legais e a travessia até Cuba seguia em ritmo de festa sem hora para acabar. O navio tinha uma folha de serviço limpa, oferecia acomodações de alto luxo, era rápido, fazendo a linha em pouco menos de 60 horas, e contava com a procura de homens de negócios americanos e cubanos, além de turistas de todas idades.
Mas tudo isso estaria para mudar, e o opulento SS Morro Castle, estaria destinado a se transformar em um grande mistério.
Em 8 de setembro de 1934, o navio partiu do Porto de Havana conforme o previsto numa viagem de retorno para sua casa em Nova York. Era uma viagem de rotina, embora o capitão da embarcação, o experiente Robert Wilmott, que havia feito a travessia incontáveis vezes, falecera na noite anterior, vítima de um ataque cardíaco. O Capitão foi substituído às pressas pelo seu Primeiro Oficial, William Warms. A despeito disso, a partida ocorreu sem nenhum contratempo, sem que ninguém pudesse prever a trágica sequência de eventos que estava prestes a se desenrolar.
Tudo começou com uma tempestade de vento forte, seguido de um inexplicável incêndio que começou no compartimento de carga no deck inferior. O fogo foi alimentado pelos ventos, que ajudaram as chamas a se espalhar sem controle e causar um apagão em todo navio. Com a embarcação imersa na escuridão, com fogo e fumaça tomando conta de tudo, foi inevitável conter o pânico à bordo. A Guarda Costeira foi acionada para realizar a operação de resgate, mas os ventos e as ondas dificultaram a ajuda. Para piorar, o novo comandante mostrou-se incrivelmente incapaz de lidar com uma situação de crise. Ele cometeu erros fatais, como por exemplo, manter os motores em funcionamento e seguir a rota traçada, ao invés de rumar para a costa. O maior erro, no entanto, foi demorar excessivamente para emitir o sinal de socorro que só foi lançado 38 minutos após o início do incêndio. A essa altura, o Morro Castle já estava perdido.
Tornando as coisas ainda piores a tripulação do navio, em geral, era formada por pessoal inexperiente, muitos deles meramente desesperados por qualquer trabalho em meio a Grande Depressão. Muitos, jamais haviam trabalhado em alto mar. Medidas de precaução e de segurança não eram regulamentadas. As portas corta fogo eram de madeira, os alarmes de incêndio falhos e muitas mangueiras haviam sido removidas para não atrapalhar os passageiros. Quanto aos botes salva vidas, eles haviam recebido uma grossa demão de tinta semanas antes e estavam grudados de tal forma que solta-los era uma enorme dificuldade. Os treinos contra incêndio com a tripulação, obrigatórios desde o início do século, não haviam sido realizados e o pessoal de bordo sequer sabia como montar as mangueiras. Pior ainda, os coletes tinham amarras complicadas e muitos não sabiam como vestir o traje. Alguns se equivocaram de tal forma que ao invés de ajudar, os coletes acabaram provocando afogamento.
O Capitão Willmott tinha ordens expressas de agradar aos passageiros e tornar a viagem o mais prazerosa possível, por conta disso resolveu ignorar o protocolo que previa orientar os passageiros em caso de emergência durante a viagem.
No fim das contas, o navio inteiro era uma armadilha mortal. Os móveis e interiores eram decorados com madeira e o verniz os deixavam altamente inflamáveis. Segundo historiadores, em cada viagem, o pessoal de manutenção aplicava camadas de verniz para deixar os interiores em perfeito estado de conservação e brilho. Contudo, essas camadas extras serviram para alastrar o fogo e deixá-lo incontrolável. Foram tantas coisas erradas que desafiavam explicação, que tudo mais parecia uma trágica comédia de erros.
Em poucos minutos, o inferno tomou conta do Morro Castle. Os momentos finais da tragédia foram marcados pelo horror e caos, quando a situação se tornou um "cada um por si". Passageiros discutiam com tripulantes, os últimos salva vidas eram disputados com violência, pessoas foram pisoteadas enquanto outras saltaram para as águas geladas preferindo morrer afogadas ao invés de sufocar ou queimar.
Quando tudo terminou, os corpos de 137 passageiros e tripulantes, dos 549, possivelmente mais, estavam boiando nas águas turbulentas. O esqueleto chamuscado do grande navio foi arrastado até os bancos de areia de Asbury Park em Nova Jersey, de onde ele seria rebocado como uma enorme carcaça para ser desmantelado em águas rasas. A visão da imensa embarcação na praia causava uma estranha sensação de perda e estranheza. As pessoas vinham de longe para ver o Leviatã enquanto ele lentamente se desmanchava.
Alguns estavam interessados em registrar com fotografias, mas outros queriam levar um pedaço do navio como lembrança de sua tragédia. A maré era tão baixa que as pessoas conseguiam andar até a estrutura do navio para tocá-lo, enquanto outros pagavam para se aproximar em botes alugados.
Eventualmente o navio foi rebocado e desmontado por equipes que removiam metal para ser reaproveitado. O navio ficou seis meses no ancoradouro. Os moradores locais se queixaram do fluxo de curiosos que vinham ver. Mas o que realmente causava incômodo era um carregamento de peles não tratadas que ficaram em um dos compartimentos de carga. A mistura das peles com água salgada causou um fedor de putrefação insuportável. Parecia que o navio era um gigantesco cadáver apodrecendo.
Enquanto isso, uma investigação foi iniciada para definir exatamente o que havia acontecido à bordo Morro Castle naquela noite fatídica. Teria sido um acidente ou alguém deveria ser culpado pela enorme tragédia?
Um dos pontos que geravam controvérsia era a súbita morte do Capitão, falecido na véspera da fatídica viagem. Parecia estranho que o Capitão Robert Willmott tivesse caído morto, vítima de um ataque cardíaco, especialmente pouco depois de realizar um exame físico que atestou sua saúde perfeita e nenhum histórico de problema cardíaco. Para tornar tudo ainda mais suspeito, o corpo de Willmott que deveria ser levado para os Estados Unidos para uma autópsia, jamais chegou ao seu destino. Muito se especulou a respeito do que aconteceu, mas a verdade é que não se sabe. O cadáver que deveria ser despachado, nunca o foi, e supostamente, por um erro grosseiro de documentação em Havana, ele acabou sendo enterrado como indigente.
Como uma falha dessas pode ter acontecido? Alguns suspeitam que uma autópsia revelaria a presença de alguma substância que causou a morte de Willmott. A suspeita se intensificou quando o nome de um tripulante, o Operador de Rádio George White Rogers começou a ser citado repetidas vezes.
No início, Rogers era tratado como um herói. Ele tomou a iniciativa de enviar o sinal de socorro, ainda que o Capitão tivesse ordenado que ele aguardasse. Sua ação provavelmente havia salvado muitas vidas. Ele parecia ser um dos mocinhos, mas para os investigadores contratados, havia indícios de algo estranho. Para começar, Rogers foi uma das últimas pessoas a ver o Capitão Willmott com vida. Isso não quer dizer muita coisa, mas quando o histórico do operador foi examinado, descobriram muitos indícios. A ficha criminal dele era extensa, mas de alguma forma ele conseguiu ocultar seu passado da companhia marítima. Rogers não era apenas um ladrão e assassino condenado, mas também já havia sido preso por sabotagem e por ameaças de terrorismo contra um antigo empregador. Ele chegou a formular um plano para incendiar um cargueiro em que trabalhava e só não levou adiante por ter sido denunciado por um comparsa preso antes.
As pessoas próximas a Rogers o classificavam como um sujeito estranho, irascível e propenso à violência. Muito inteligente segundo análises de perfil realizadas no exército, ele se graduou em engenharia como um dos primeiros de sua turma. No entanto, ele era famoso entre os colegas por arranjar brigas, beber e por ser extremamente vingativo. Em certa ocasião teria enviado a um professor com quem discutiu uma bomba. O comportamento dele seria condizente com o que chamamos hoje de sociopata.
A suspeita era que Rogers poderia ter envenenado Willmott e que teria provocado o incêndio criminoso, mas os investigadores não conseguiram encontrar provas e evidências, além das especulações. Ele não chegou sequer a ser processado pelos incidentes. Entretanto, curiosamente, ele viria a ser preso alguns anos mais tarde pela tentativa de assassinato de um policial. Na ocasião, Rogers construiu uma bomba com a qual pretendia matar o tenente Vincent Doyle. Ironicamente, Doyle era um colega de Rogers, já que este estava trabalhando para a polícia. Em meio a uma até então inocente conversa a respeito do incidente Morro Castle, Rogers teria se gabado de que poderia ter causado a tragédia usando acelerantes, compostos químicos e outros métodos típicos de sabotagem. Doyle começou a desconfiar do colega e que ele poderia ser o responsável pelo ocorrido. Rogers percebeu que havia se incriminado e preparou uma bomba que chegou a detonar no escritório de Doyle, mas que miraculosamente não o matou. No fim das contas, o Tenente conseguiu apontar quem teria colocado o explosivo e Rogers admitiu sua culpa, sendo condenado a 10 anos de prisão.
A pena foi cancelada para que Rogers servisse na Segunda Guerra, como engenheiro de explosivos (!) ensinando alunos a detonar pontes, construir bombas improvisadas e, entre outras coisas, sabotar navios. Uma de suas aulas teóricas envolvia detalhes de como provocar incêndios incontroláveis usando acelerantes. No fim da guerra, Rogers foi preso novamente por explodir a casa de um vizinho, matando duas pessoas. Ele morreu enquanto cumpria pena na Prisão estadual de Trenton. Todos os registros a respeito dele desapareceram pouco depois, supostamente por Rogers ter participado de operações secretas durante a Guerra. Alguns afirmavam que ele foi responsável por destruir quilômetros de estradas de ferro e pontes na Europa ainda sob domínio nazista. Infelizmente, ninguém sabe ao certo o que ele fez nos tempos da Guerra pois sua folha de serviços sumiu.
Quanto a culpa pela tragédia do Morro Castle, o Capitão suplente Warms, o Chefe Engenheiro Eban Abbott, e o Gerente da Linha e vice-president Henry Cabaud foram julgados e presos sob acusação de negligência criminosa. Eles foram condenados e mandados para a cadeia, mas não demorou até que recursos aliviaram a sentença e eles acabaram liberados. Algumas pessoas começaram então a suspeitar que havia uma conspiração interessada em acobertar os acontecimentos.
Uma das suspeitas mais curiosas envolve acordos entre os governos dos Estados Unidos e de Cuba, na época aliados. Acredita-se que poderia haver um acordo para utilizar o SS Morro Castle para o transporte secreto de armas e munições. Segundo rumores, os Estados Unidos estavam financiando a entrega de armamentos para o governo da ilha enfrentar guerrilheiros desde o início do século. Mais sério ainda, as armas seriam despachadas para várias outras nações na América Central e Caribe. Haviam leis vigentes que proibiam a venda de armas, sobretudo porque os americanos estavam praticamente dando as armas de graça aos seus vizinhos.
Para alguns, Rogers teria sido contratado por militares insatisfeitos com os acordos, para provocar a destruição do Morro Castle e acabar com a distribuição de armas. A suspeita de que Rogers era uma espécie de espião, treinado em técnicas de sabotagem sempre foi cogitada. Uma pena que ele tenha morrido na prisão, sobretudo, depois de conversar com um repórter investigativo que planejava escrever um livro sobre suas atividades. A morte de Rogers jamais foi explicada, ele foi encontrado enforcado no chuveiro da prisão. Ninguém sabe quem o matou ou por qual motivo. O repórter que entrevistou Rogers também teria morrido em um estranho acidente rodoviário, embora não haja muitas informações a respeito. Eles teriam sido silenciados por conspiradores interessados em manter segredo sobre suas ações ilegais?
Até os dias atuais, os registros a respeito da tragédia do Morro Castle permanecem secretos e não podem ser consultados pelo público. É outro mistério que chama a atenção: Por qual motivo registros sobre o acidente de um navio civil seriam arquivados sob ordens militares? Os registros deveriam ter sido liberados em 1987, mas uma emenda decidiu manter os arquivos lacrados até 2030, quase um século após os acontecimentos. O que os arquivos secretos contém e o que a investigação apurou?
Quem estaria disposto a esconder a verdade? Considerando o tamanho da tragédia e a comoção causada na época, seria justificável manter tudo por baixo dos planos, mas passados tantos anos, qual seria a razão para persistir o sigilo? Teria sido a conspiração algo tão grave e desprezível à ponto do segredo permanecer por tanto tempo? Setores do governo teriam ordenado a destruição do navio, ao custo da vida de inocentes, para esconder algum esquema?
Passados tantos anos, as respostas para essas perguntas, se é que existem, continuam nos arquivos lacrados. Contudo, não será de se surpreender que, ao chegar na data especificada para liberação das informações, estas sejam uma vez mais negadas. O incêndio do SS Morro Castle permanece como um mistério sem solução e tudo indica, assim permanecerá por muito tempo.
estados unidos sendo estados unidos(minúsculas intencionais).
ResponderExcluirFaltam portanto 9 anos para sabermos a verdade. Isso se não estenderem o prazo rssssss
ResponderExcluirum dos mistérios/conspirações mais intrigantes que já li por aqui. meus parabéns.
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