sexta-feira, 21 de janeiro de 2022

Innsmouth - A verdade sobre a Cidade dos Híbridos e Abissais


A segunda parte do artigo à respeito do vilarejo de Innsmouth. Nesse artigo revelamos muitos dos mistérios e segredos da cidade, informações que poucas pessoas tiveram e que apenas os habitantes locais ou indivíduos envolvidos com os acontecimentos na cidade possuem. A História verdadeira de Innsmouth permanece oculta por um véu de Horror e Blasfêmia. Remover esse véu permite vislumbrar o que realmente aconteceu, mas também revela terríveis verdades. Algumas delas, difíceis de aceitar.

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Desde o início a região que hoje corresponde à cidade de Innsmouth foi habitada por uma raça de seres humanoides marinhos, os Abissais. Essas criaturas consideravelmente mais antigas que o próprio homem nasceram nos mares da Terra, e embora anfíbios, preferem habitar as profundezas dos oceanos. Na Costa da Nova Inglaterra, os Abissais construíram em tempos remotos uma cidadela de rocha e coral que chamavam Y'ha'nthlei. O lugar não era apenas um refúgio para eles, mas também possuía um vasto templo dedicado ao seu Deus máximo, o Grande Cthulhu.

Os nativos americanos que habitavam essa faixa costeira estavam cientes da presença dos Abissais. Os chamavam de "O Povo da Água Profunda" ou ainda de "Demônios Marinhos". Eles os temiam, pois haviam sido vítimas repetidas vezes de suas incursões por terra. Os Abissais vinham de tempos em tempos em busca de caça, de escravos e pior, de fêmeas com os quais pudessem reproduzir. Embora não fossem humanos, os abissais se mostravam geneticamente compatíveis com as fêmeas humanas, e para aumentar seu número, costumavam capturar e submeter mulheres. Estas davam a luz ao que se convencionou chamar de híbridos, espécimes que possuíam características de ambas as raças, nascendo como humanos, mas que, sob as devidas condições apresentavam uma gradual transformação que os tornava mais abissais do que humanos. A transformação os levava à desejar viver sob as ondas, na companhia dos outros de sua espécie.


Os nativos americanos da Confederação Pawtuxet enfrentaram, os abissais repetidas vezes e sabendo o que eles desejavam, se afastaram daquele lugar declarando que constituía um tabu viver ali. Apenas os loucos, os tolos ou aqueles de alguma forma comprometidos com os abissais escolhiam viver naquela parte escura da costa. Alguns híbridos também viviam ali, banidos pelos Pawtuxet e tratados como abominações, subexistiam da pesca e do que os abissais lhes davam, enquanto ainda não estavam prontos para migrar até sua cidadela submarina.

Os colonos britânicos chegaram em meados de 1600 e após fazer uma exploração da área, se estabeleceram no afluente do Rio Manuxet. Foram atraídos pela fartura de pesca sob a qual os abissais tinham influência. Para a raça submarina, era interessante permitir que humanos se estabelecessem ali, para seus planos de proliferação pudessem florescer. Os primeiros colonos enfrentaram grandes dificuldades, mas o maior desafio para eles era lidar com a presença de "coisas que observavam à distância", como um dos colonos descreveu em um diário. Muitos chegaram e partiram aterrorizados pelos avistamentos do que consideravam monstros marinhos. Alguns dos que ficaram não tiveram a mesma sorte e foram arrastados pelos abissais interessados em testar a compatibilidade genética dos recém chegados.

Innsmouth, pequena e insipiente, pouco mais do que um vilarejo formado por pescadores se desenvolveu ao redor do rústico cais que os primeiros homens do mar construíram. De lá, podiam lançar seus pequenos barcos para as águas profundas, lançar as redes e retornar com um farto proveito. De fato, logo surgiu a fama de que um pescador precisava apenas lançar suas redes na água, pois a pesca nunca faltava naquelas águas turvas. Mal sabiam que esse era um duvidoso presente oferecido pelos abissais, um agrado para que eles se fixassem naquele lugar por tanto tempo desabitado.


A cidade cresceu ao sabor do comércio marítimo. Innsmouth era um ponto estratégico e com o tempo, foi abençoada com o progresso que impulsionou o crescimento do cais que por sua vez atraiu navios que viajavam pela costa da Nova Inglaterra. De uma modesta vila de pescadores, Innsmouth se tornou um entreposto comercial de médio porte - jamais tão grande quanto Marblehead ou Rockport, mas ainda assim adjacente para os mercadores que iam e vinham de Boston. Os marujos que vinham de terras distantes reconheceram os sinais de que havia algo de estranho no pequeno porto, algo sinistro. Para os homens do mar que conheciam os portos das Indias aquele lugar tinha uma aura desagradável, como se uma presença escamosa estivesse à esgueira. E realmente, esta estava presente. Os híbridos estavam sempre no cais, perambulando e reportando aos abissais quais navios estavam vindo, para onde iam e o que traziam. Algumas dessas embarcações, sobretudo as que levavam passageiros se perdiam em suas viagens e nenhuma alma era recuperada.

Os Abissais de Y'ha'nthlei estavam satisfeitos com a movimentação que lhes trazia escravos e fêmeas, mas isso mudaria quando teve início a Guerra de Independência Americana. Para conter a revolta, a Coroa britânica enviou marinheiros e naves de guerra que varriam a costa em busca de inimigos - encontraram no lugar disso, indícios de que as lendas sobre monstros marinhos eram reais. Os abissais se irritaram com a presença da marinha e sua intromissão nos seus planos. Concluíram que ela precisava ser removida e para isso apoiaram o esforço dos revolucionários fornecendo a eles ouro e joias recuperadas de velhos naufrágios. Também ajudaram mais diretamente, afundando ao menos um navio da marinha real.

Quando o conflito terminou, havia uma nova nação, nascida das cinzas da guerra e Innsmouth experimentou novo surto de crescimento. A bandeira americana tremulava sobre o porto aberto a todas embarcações. Foi nessa época que os empreendedores mais ousados foram beneficiados com oportunidades que se traduziram em riqueza. Um jovem marinheiro chamado Obed Marsh, nascido e criado nas docas de Innsmouth cresceu em importância até se tornar Capitão por volta de 1820. Era um dos mais jovens capitães a fazer a lucrativa rota levava até as Indias. Havia retornado de sua jornada inaugural com os porões de seu navio cheios de mercadorias que fizeram a riqueza de seus empregadores. Mas um visionário como Marsh queria ser seu próprio patrão e com isso em mente fundou uma firma de Transporte Marítimo, a Marsh Shipping & Trade Co com escritório central em Innsmouth. Na época, o comércio florescia e transporte marítimo era um negócio extremamente rentável.


Marsh foi um dos primeiros a estabelecer uma nova rota para os Mares do Sul, comandando pessoalmente seu primeiro navio. Corria em suas veias o sangue dos abissais, ele era um híbrido com antepassados entre os primeiros habitantes de Innsmouth. O Capitão Obed havia herdado a paixão e as habilidades náuticas que o tornavam um perfeito homem do mar. É pouco provável que a essa altura ele próprio conhecesse sua ascendência. Entretanto, os nativos da Polinésia com quem ele estabeleceu contato amistoso imediatamente o reconheceram pelo que ele era e aceitaram ajudá-lo. Com os devidos contatos, Marsh acumulou verdadeiras fortunas a cada viagem. Isso lhe permitiu expandir suas riquezas e fundar também uma Companhia de Pesca em Innsmouth.

Rico e influente, Marsh havia se tornado um dos homens mais poderosos de Innsmouth, sendo igualmente respeitado e temido. Seu estilo arrojado de negócios e a forma como tratava os rivais renderam-lhe a fama de implacável. Ele havia sido acusado de prejudicar os negócios de seus competidores, inclusive contratando piratas para atacar os concorrentes. A influência de Obed Marsh apenas crescia, até que finalmente ele teve um revés. Dois de seus navios com a respectiva carga foram perdidos numa tempestade colocando-o em uma situação delicada. Para saudar os débitos sua companhia quase foi arrastada para o precipício e junto com ela a economia de Innsmouth. Restaram-lhe apenas três embarcações de sua frota original: o Columbia, o Hetty e o Estrela de Sumatra.

Naquele mesmo ano, em uma de suas viagens à Polinésia, Marsh foi levado até um sacerdote híbrido que lhe revelou sua origem e ofereceu uma barganha com o abissais. Ele prometia que as criaturas fariam de Marsh um homem rico e poderoso além de seus sonhos. Em troca, ele transformaria Innsmouth num santuário para os híbridos e terreno fértil para os abissais conduzirem seus experimentos. O ambicioso Capitão aceitou a barganha que foi sacramentada com seu casamento com três mulheres nativas, todas elas híbridas.


De volta dessa viagem que mudou sua vida, Marsh usou o dote que os Abissais lhe ofereceram, um verdadeiro tesouro de ouro, para liquidar suas dívidas e adquirir as demais companhias, obrigando os pescadores a trabalhar para ele. Assim, ele forjou um monopólio sobre a indústria pesqueira na Baia de Innsmouth consolidando de uma vez por todas seu poder. O ano era 1836 e Marsh decidiu se estabelecer permanentemente em Innsmouth onde mandou construir uma enorme mansão para comportar sua nova família longe de olhares curiosos.

Nas cercanias de Devil´s Reef, as esposas não humanas de Marsh entraram em contato com os abissais que viviam em Y'ha'nthei para cumprir as condições da barganha. Eles favoreciam os barcos de pesca da companhia com um constante suprimento de frutos do mar e ocasionais artefatos valiosos recuperados de naufrágios. Ao mesmo tempo, os concorrentes eram afugentados ou tinham as redes rasgadas. Marsh adquiriu a Igreja Congregacional perto das docas, que havia sido abandonada alguns anos antes. Lá ele mandou estabelecer a recém inaugurada Ordem Esotérica de Dagon, uma sociedade que deveria congregar pescadores e homens do mar. Na realidade, a Ordem era uma fachada para o funcionamento de um templo devotado aos Grandes Antigos. O próprio Capitão Obed Marsh havia presenciado e participado ativamente de rituais semelhantes na Polinésia. Ele foi instruído pelas suas esposas a se tornar o Preceptor do Culto e logo estava diante do altar presidindo os ritos sagrados.

A Ordem Esotérica de Dagon era um culto de adoração às apocalípticas divindades marinhas, Marsh no papel de Sumo Sacerdote, comandava os rituais. Atrás das pesadas portas do Templo, vítimas inocentes eram afogadas ou tinham suas gargantas cortadas em altares de pedra, uniões blasfemas ocorriam na calada da noite diante das estátuas de Cthulhu, Dagon e Hydra, enquanto nomes esquecidos eram sussurrados. O número de adoradores aumentou com a promessa de riqueza fomentando os sonhos loucos dos cultistas. Seu objetivo era promover o despertar do Grande Cthulhu e quando tal data funesta chegasse, eles iriam desfrutar de uma nova era, na qual eles seriam os escolhidos pelo Deus das Profundezas.


As atividades da Ordem Esotérica ocorriam longe dos olhos dos curiosos, com os não iniciados apenas supondo o que realmente acontecia na Sede da Ordem. Sequer poderiam imaginar que eram coisas muito piores do que suas suposições mais dantescas. Marsh e seus asseclas sequestravam forasteiros e os entregavam aos abissais como sacrifícios ou no caso de fêmeas como companheiras para procriação. Sabendo que poucos teriam coragem de se erguer contra eles, as ações do bando eram feitas com pouca descrição. Em 1846, o xerife local, decidiu dar um basta no que vinha acontecendo em Innsmouth. Após flagrar um ritual ocorrendo em Devil´s Reef ele deu ordem de prisão a seis membros da Ordem e os prendeu na delegacia local. A reação da Ordem foi violenta e colocou em andamento um plano no qual já vinham trabalhando: Tomar a cidade inteira.

No começo da noite, Marsh e seus ajudantes do culto, vestindo os trajes da congregação cruzaram a cidade e se encaminharam para a Delegacia onde libertaram seus colegas e prenderam as autoridades. Em seguida, arrastaram o xerife e três dos seus delegados até Devil´s Reef onde os degolaram em um ritual para invocar os abissais em grande quantidade. A massa de cultistas, híbridos e abissais então ganharam as ruas de Innsmouth capturando todos habitantes que poderiam lhes causar problemas. Em meio a loucura, os levaram até a praça central, mataram os homens e ofereceram as mulheres e crianças como escravas. Os humanos que foram poupados do massacre, alguns por medo, outros mediante suborno, prometeram que jamais falariam sobre o que aconteceu naquela noite sanguinolenta.

A Família Marsh havia se consolidado de fato no poder, e ninguém mais desafiaria sua autoridade e a da Ordem de Dagon. Para justificar as mortes, um aviso foi emitido para as cidades próximas falando de uma epidemia que se espalhou por Innsmouth que por isso, seria isolada. As notícias desencorajavam qualquer contato com o mundo exterior e numa época em que temia-se o contágio de doenças, ninguém realmente se importou em verificar os informes. A cidade ficou fechada por meses, período em que os Marsh se livraram de todas as pistas do que realmente havia ocorrido.



Quando os primeiros forasteiros foram até a cidadezinha para verificar como haviam enfrentado a crise, acharam os Marsh no comando da cidade e aliados apontados por eles nas principais funções administrativas. Todos os outros, nas palavras deles, haviam morrido na terrível epidemia que havia sido contida. Haviam casas e prédios abandonados, lojas fechadas e uma aura sinistra ainda maior do que o normal. Ninguém, no entanto, ficaria tempo suficiente em Innsmouth para saber detalhes de sua tragédia.

Pouco tempo depois, a Companhia de Transporte Marítimo fechou suas portas e os Marsh passaram a se dedicar inteiramente às atividades pesqueiras. Com mais peixes do que poderiam desejar, os pescadores trabalhando para a Família não tinha de que se queixar. Aqueles que serviam aos interesses da Ordem Esotérica e aos abissais também ganhavam em troca de sua devoção presentes recuperados das profundezas. É claro, havia uma contrapartida. Os homens que aceitaram servir aos abissais provavam a sua devoção oferecendo suas esposas e filhas à raça marinha para gerar novas crianças e repovoar Innmouth. Com isso, a população de híbridos aumentou consideravelmente amarrando o último nó da barganha hedionda que tornou todos habitantes cúmplices. 

Como efeito direto da interação com os abissais, muitos habitantes começaram também a manifestar o que se convencionou chamar de "Aparência de Innsmouth" uma condição física que dava ensejo a muitos questionamentos por parte daqueles que encontravam os afligidos pela primeira vez. Embora fosse tratada como uma doença degenerativa, a condição era tão somente um estágio intermediário da transformação de híbridos em Abissais completos. Entre as características básicas, a aparência ocasionava feições bizarramente modificadas com semblantes batráquios: olhos vítreos, bocas rasgadas e pele escamosa. Os cultistas estavam pouco a pouco se transformando nas mesmas criaturas que haviam acolhido em seu seio.


Marsh pouco se importou, apesar da metamorfose ser permanente ele estava disposto a viver dessa forma pela eternidade. Deformados além de qualquer eco de humanidade, os primeiros a experimentar a mudança tiveram de se afastar do convívio com as pessoas normais. Não era possível mais os reconhecer como os seres humanos que eles um dia foram. Mesmo aqueles que tinham um menor grau de degeneração atraíam olhares desconfiados. Aos poucos, os comerciantes de Innsmouth foram perdendo seus contratos e deixados de lado pelos seus parceiros comerciais. Ninguém queria fazer negócios com o povo degenerado de Innsmouth que foi caindo em um esquecimento progressivo. A ruína econômica desencadeou um efeito devastador na cidade que mergulhou na sua solitária decadência.

Em 1878 Obed Marsh, inteiramente transformado em um abissal, escolheu se juntar aos de sua raça na cidade submarina de Y'ha'nthlei. Não havia mais como esconder o que ele havia se tornado e por isso sua morte foi anunciada. De tempos em tempos, ele retornava para presidir algum ritual na cidade, mas sua existência agora estava devotada às profundezas. Os filhos e netos de Marsh assumiram a direção de Innsmouth como seus herdeiros de direito. Os anos que se seguir foram de relativa tranquilidade na cidadezinha à medida que ela mergulhava cada vez mais em seu isolamento e abandono. Poucas pessoas se importavam em ir até lá e menos ainda em ficar por aquelas bandas. Innsmouth se tornou sinônimo de um lugar pouco amistoso e assustador, com uma população estranha que ninguém queria conhecer. Nem mesmo a criação da Refinaria de Metais de Innsmouth, um novo empreendimento criado com o intuito de escoar o ouro resgatado pelos Abissais trouxe algum alento à economia.

No início dos anos 1920, os netos de Obed Marsh deram início a negócios escusos de contrabando de bebida. A Lei Seca criava uma oportunidade boa demais para ser negligenciada pela gananciosa família, sobretudo por Robert Marsh, neto de Obed que se mostrou o mais empreendedor dos herdeiros. O esquema era simples, mas funcionava perfeitamente; envolvia esconder nos barcos de pesca carga de uísque canadense que eram deixadas por contrabandistas nas ilhotas. Uma vez que o gabinete do xerife era controlado pelos Marsh, não havia ninguém para causar problemas. Depois de desembarcadas no porto, os engradados eram colocadas em caminhões e enviados para os mercados consumidores na Nova Inglaterra. O lucro era nada menos que exorbitante e havia razões para crer que os negócios conseguiriam impulsionar um novo ciclo de riqueza para os Marsh. 

Mas acontecimentos além do previsto provariam que eles estavam errados e que a ambição cega causaria a definitiva derrocada dos Marsh e de Innsmouth. Na terceira e última parte dessa série, falaremos do incidente que ficou conhecido como a Invasão de Insmouth, uma operação militar que revelou os horrores ocultos da cidade.

5 comentários:

  1. Cara isso me lembrou muito o a história do jogo chamado SINKEN CITY

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    1. Na verdade o jogo Sunken City é baseado no conto "A Sombra sobre Innsmouth" que explora a história de Innsmouth.

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  2. Sempre pensei que os homens de innsmouth, que eram oferecidos para os abissais já que obed precisou se casar com as 3 esposas e o velho louco que ao meu ver se negou a se casar.

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  3. Texto com marca de qualidade do ISO Ctchuliano!

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